• 08/06/2017

    Seminário discute as articulações do campo e da cidade no Baixo Tapajós


    Foto: Palestina Israel

    Por Fernanda Moreira, do Cimi Norte 2

    Nos dias 5 e 6 de junho, representantes dos 13 povos indígenas do Baixo Tapajós estiveram reunidos com pescadores, quilombolas, movimentos sociais, sindicatos, universidade, diocese e pastorais sociais de Santarém no Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santarém.

    O seminário Indígenas, a floresta, o campo e as águas: vozes e políticas no Baixo Tapajós foi idealizado por membros do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (CITA) e estudantes indígenas da UFOPA com o objetivo de discutir a conjuntura política desfavorável às populações do campo e das cidades e de construir alianças com outras comunidades tradicionais e setores da sociedade para enfrentar as ofensivas desenvolvimentistas do Governo e grandes empresas na Amazônia, o desmonte e as violações dos direitos territoriais e sociais.

    Cenário de ataques e violações

    Durante as discussões sobre a conjuntura política, destacou-se que o projeto de privatização de terras públicas e de expansão do agronegócio e dos setores empresariais e financeiros vem sendo conduzido por sucessivos governos, ameaçando direitos sociais e territoriais, e culmina na ampliação de suas bases legais e administrativas com a atual reconfiguração das forças políticas no Governo Temer.

    Os participantes reforçaram a urgência de se reagir a todas essas ofensivas e resgataram, como horizonte inspirador, a história de luta do povo paraense, desde a cabanagem até os movimentos fundados com base nos princípios da teologia da libertação, nos anos 80 – a implantação das pastorais sociais, a chegada da CPT e a formação de jovens nas Comunidades Eclesiais de Base em Santarém e região.

    Lembraram, ainda, a importância dos indígenas e pescadores na construção de frentes de resistência aos grandes projetos concebidos para a Amazônia durante o Governo Militar e a importância desses eventos de formação política, ao lado das salas de aula e das universidades, para que os jovens continuem essa luta. Também foi ressaltado o necessário apoio institucional da igreja e de outras entidades para que avancem na defesa de seus direitos e territórios.

    O debate sobre a conjuntura política indigenista iniciou com considerações acerca dos golpes e massacres que sofrem os indígenas há mais de 500 anos e de suas ações de enfrentamento ao Estado e a seu projeto de expropriação e saqueamento de terras e de transformação do indígena em determinada categoria de branco – trabalhador explorado ou dependente de produtos industrializados e políticas públicas genéricas.

    Discutiu-se, ainda, as ofensivas anti-indígenas do Congresso Nacional, entre as quais está a CPI da Funai e do Incra, instituída por deputados ruralistas com o objetivo de criminalizar servidores, lideranças indígenas e entidades apoiadoras, como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o Centro de Trabalho Indigenista (CTI), o Instituto Socioambiental (Isa) e a Associação Brasileira de Antropologia (Aba). Na esteira do desmonte e extinção da Funai, foram citados os loteamentos de cargos de presidência e diretoria ao Partido Socialista Cristão (PSC), que apresenta concepções assimilacionistas sobre os indígenas e produtivistas sobre suas terras, bem como cortes orçamentários e demissão de servidores, que atingiram a Coordenação Técnica Local de Santarém, atualmente sem sede e com apenas três servidores, incapaz de desenvolver sua atividade fim. O marco temporal e a submissão do poder judiciário a essas forças econômicas que visam a explorar terras indígenas também foi objeto de consideração.

    Para pensar alternativas de futuro, foram feitas algumas reflexões sobre a necessidade de se levar a sério os povos indígenas e suas concepções de política e de liderança,  fundamentalmente distintas da política não indígena – humanista, personalista e hierárquica. Destacou-se, ainda, a importância de se apoiar, incentivar e expandir as práticas territoriais autônomas, que incluem as próprias formas de educação, saúde e alimentação.


    Foto: Palestina Israel

    Conhecimentos tradicionais e defesa do território

    “Acabamos valorizando tudo o que o branco traz para nós. Essa mesa foi proposta para que a gente traga os conhecimentos indígenas e tradicionais para o centro, para descolonizar nosso pensamento”, afirmou Diego Arapyun, iniciando um espaço de debate sobre os saberes tradicionais. Parteiras compartilharam histórias sobre como aprenderam e como trazem, com cuidado e precisão, novas crianças ao mundo.

    “Minha mãe era parteira e as parteiras da comunidade sempre me chamavam para fazer parto. Fui acompanhando e comecei a fazer sozinha. Sabemos quando a criança vai nascer por causa das contrações. A parteira não sai de perto da parturiente… no médico, eles abandonam a gente. É por isso que morre criança. Sei o abandono que dão no hospital para as mães e crianças morrerem ali”, contou Alaíde dos Anjos.

    Para resguardar esses saberes e os modos de existência indígenas o território faz-se imprescindível. Assim, a mesa seguinte discutia as formas que os povos indígenas vêm encontrando para identificar os limites de suas terras e proteger seus territórios de invasões e da implantação de grandes projetos.

    Foram compartilhadas as experiências de construção de Protocolos de Consulta nos Munduruku e Apiaká do Planalto Santareno e nos Munduruku do Médio e Alto Tapajós, bem como as iniciativas de autodemarcação desses povos e dos Tupinambá que enfrentam os projetos de exploração madeireira na Reserva Extrativista Tapajós Arapiuns.

    “Com a previsão de instalação da hidrelétrica na região do Tapajós, mais de 60 lideranças e guerreiros Munduruku foram destacados para a abertura das picadas na autodemarcação. Isso serviu também como exemplo na luta de outros povos”, relatou Karo Munduruku. “Funai não cumpriu os prazos exigidos pelo MPF. Sabíamos que essa estratégia de não demarcar era também para construir o Complexo Hidrelétrico Tapajós. Como os Munduruku não tinham saída para lutar contra o sistema, foi tomada uma decisão de começar o processo. Munduruku tomaram decisão de não sair de suas terras, somente se fossem mortos. Isso unificou muito o povo Munduruku para poder lutar, e a demarcação está sendo uma forma de dizer ao governo que estamos ali em nossos territórios. Vocês também podem usar isso aqui no Baixo Tapajós para dizer que vocês são donos desse território”.

    Braz Tupinambá, liderança Tupinambá do Baixo Tapajós, conta que iniciaram a autodemarcação há três anos e que também encontram dificuldade e oposição do próprio governo. “Somos 17 aldeias Tupinambá e nosso território está dentro da Resex. Sofremos repressão por parte do órgão que gerencia a Resex [o ICMBio]. Quando você começa com autodemarcação, você começa a incomodar o Governo Federal. Não seu vizinho, mas o governo, porque ele é o gestor dessa Unidade de Conservação… e quando você faz autodemarcação, você reivindica autonomia sobre a terra e isso incomoda o governo, porque ele não vai poder colocar mais empreendimentos lá”.

    Ao mesmo tempo em que se discutia o Protocolo de Consulta Munduruku e Apiaká do Planalto, uma experiência autônoma de formação e discussão nas aldeias, que teve o apoio do MPF e da CPT na produção e finalização do documento, lideranças indígenas participavam de audiência na câmara municipal e recebiam a triste notícia de que o prefeito de Santarém pretende tirar do papel projetos de construção de portos no lago do Maicá “de qualquer jeito”, desrespeitando o direito à consulta e os protocolos indígenas e de comunidades tradicionais que seriam profundamente impactadas, como os próprios Munduruku e Apiaká do Planalto, Pescadores e Quilombolas que também construíram seus protocolos de consulta.


    Foto: Palestina Israel

    Violência no campo

    No último dia do seminário, a discussão foi sobre violência no campo, desterritorialização e criminalização de movimentos sociais, com a participação de Ulisses Manaças, do MST de Belém.  Os participantes lembraram que a história do Brasil e da Amazônia foi marcada pelo conflito pela Terra e que há uma relação direta entre desmatamento, grilagem, trabalho escravo e violência.

    Chamaram atenção para o fato de que o ano de 2016 bateu o recorde de violência no campo dos últimos 35 anos e que até o momento o número de assassinatos no campo já supera o mesmo período do ano passado, com 37 pessoas assassinadas no Brasil em decorrência da luta pela terra. Também foi destacada a violência ideológica, que impõe a lógica do mercado aos trabalhadores rurais, os faz abandonar suas terras ou ceder a pressões de grandes produtores, sendo esse tipo de violência talvez mais difícil de ser combatido, porque menos notado e menos discutido.

    Intervalos das manhãs e tardes e as noites do evento foram regados a rituais e apresentações de Carimbó.

    Diante da conjuntura colocada e em resposta a mais atropelamentos de seus direitos anunciados nos dias do seminário, os indígenas decidiram iniciar um ato na BR 163 e marchar até a Prefeitura Municipal de Santarém, demonstrando seu repúdio a decisões políticas que impactam suas vidas e das quais não participam.

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  • 08/06/2017

    Direitos dos povos indígenas e direito ambiental sob ataque no Brasil, alertam relatores da ONU e CIDH


    Em 2016, a relatora da ONU Victoria-Tauli Corpuz visitou os Guarani e Kaiowá, no MS, e diversas outras terras indígenas no país. Foto: Ruy Sposati

    Por ONU Direitos Humanos, de Genebra/Washington DC

    Três relatores especiais das Nações Unidas e um relator da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) se uniram para denunciar ataques contra direitos dos povos indígenas e contra a proteção ambiental no Brasil.

    “Os direitos dos povos indígenas e o direito ambiental estão sob ataque no Brasil” disseram os Relatores Especiais da ONU sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli Corpuz, sobre defensores de direitos humanos, Michel Forst, e sobre meio ambiente, John Knox, além do relator da CIDH para os direitos dos povos indígenas, Francisco José Eguiguren Praeli.

    Nos últimos 15 anos, o Brasil tem assistido ao maior numero de assassinatos de ativistas ambientais e da terra em todo o mundo, notaram os relatores, chegando a uma média de uma morte por semana. Os povos indígenas estão especialmente ameaçados.

    “Em um contexto como esse, o Brasil deveria fortalecer a proteção institucional e legal dos povos indígenas, assim como dos quilombolas e outras comunidades que dependem de sua terra ancestral para sua existência cultural e material”, disserem os relatores especiais. “É altamente preocupante que, ao contrário, o Brasil está considerando enfraquecer essas proteções”.

    Os relatores de direitos humanos destacaram as propostas de reformas da Funai (Fundação Nacional do Índio), a entidade que apoia povos indígenas na proteção de seus direitos, que já teve seu financiamento drasticamente reduzido. Um relatório recentemente adotado por uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) recomenda que a FUNAI seja reestruturada e que se eliminem suas responsabilidades na demarcação e titulação de terras. Os relatores também expressaram preocupação com as alegações sobre a criminalização arbitrária de numerosos antropólogos, lideres indígenas, e defensores de direitos humanos que teria sido motivada pela atuação dessas mesmas pessoas na defesa dos interesses de povos indígenas.

    “Esse relatório dá muitos passos para trás na proteção de terras indígenas”, alertaram os relatores. “Estamos particularmente preocupados com os processos de demarcação de terras no futuro, assim como pelas terras indígenas que já foram demarcadas”.

    O relatório da CPI também questiona as motivações da própria ONU no tratamento dessa matéria, acusando-a de comportar-se como uma coalisão de ONGs que visa influenciar a política pública no Brasil através de suas agencias, da Convenção 169 da OIT e da Declaração da ONU sobre os direitos dos povos indígenas.

    “O relatório da CPI também destaca que a Declaração da ONU sobre povos indígenas representa grave ameaça à soberania do Brasil, e ainda encoraja o governo brasileiro a abandonar a Convenção 169 da OIT, alegando que ela cria condições para o estabelecimento de povos indígenas inexistentes de forma a expandir arbitrariamente a demarcação de terras no Brasil”, alertaram os relatores.

    “É realmente uma pena que ao invés de promover os princípios garantidos na Declaração, a CPI questiona os motivos por trás dela e os principios da propria ONU, desmontando qualquer avanço obtido até agora,” disseram eles.

    A Sra. Tauli Corpuz expressou especial alarme sobre as acusações de que sua visita de 2016 ao Brasil deliberadamente provocou um aumento no número de povos indígenas reclamando por suas terras, expondo esses mesmos grupos à mais violência. Ela destacou o fato de que algumas dessas comunidades sofreram ataques imediatamente após sua missão.

    Os relatores da ONU e da CIDH também observaram que uma série de projetos de lei estabelecendo o licenciamento ambiental em discussão na semana passada no Congresso poderão diminuir a proteção ambiental. Por exemplo, a legislação proposta eliminaria a necessidade de licenças ambientais para projetos envolvendo a agroindústria e pecuária, independentemente da necessidade, tamanho e localização do projeto e de seu impacto nas terras indígenas ou no meio ambiente.

    “Enfraquecer as proteções ao meio ambiente seria contrário à obrigação dos Estados de não regredir no nível de proteção dos direitos humanos, inclusive aqueles que garantem a proteção de um meio ambiente saudável”, sublinharam.

    Os especialistas advertiram que as leis propostas estavam também em desacordo com a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que garante os direitos dos povos indígenas à conservação e proteção do meio ambiente e protege a capacidade produtiva de suas terras e recursos.

    Tanto o relatório da CPI como o projeto de legislação ambiental foram apresentados por membros do grupo de lobby ‘ruralista’, uma coalizão que representa as associações de produtores rurais, observaram os relatores.

    “As tensões sobre os direitos a terra devem ser tratadas através de esforços pelo o reconhecimento de direitos e para a mediação dos conflitos, e não da redução substancial das garantias aos povos indígenas, quilombolas e à proteção ambiental no Brasil”, disseram.

    Os especialistas da ONU estão em contato com as autoridades brasileiras e monitorando de perto a situação.

    A Sra.Victoria Tauli-Corpuz, Relatora Especial sobre os direitos dos povos indígenas, Sr. Michel Forst, Relator Especial para a situação dos defensores de direitos humanos, e o Sr. John H. Knox, Relator Especial sobre obrigações de direitos humanos relacionadas ao desfrute de um meio ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável, fazem parte do que se conhece como procedimentos especiais do Conselho de Direitos Humanos. Procedimentos Especiais, o maior corpo de especialistas independentes no sistema de direitos humanos das Nações Unidas, é o nome atribuído aos mecanismos de inquérito e monitoramento independentes do Conselho, que trabalha sobre situações específicas de cada país ou questões temáticas em todas as partes do mundo. Os especialistas dos Procedimentos Especiais trabalham a título voluntário; eles não são funcionários da ONU e não recebem um salário pelo seu trabalho. São independentes de qualquer governo ou organização e prestam serviços em caráter individual.  

    O Sr. Mr. Francisco José Eguiguren Praeli, Relator sobre os direitos dos povos indigenas da Comissao Inter Americana de Direitos Humanos, foi eleito em 16 de Junho de 2015 pela Assembleia Geral da OWA para um mandato de 4 anos que termina em 31 de Dezembro de 2019. A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA) tendo seu mandato estabelecido pela Carta da OEA e pela Convenção Americana de Direitos Humanos. A CIDH tem como mandato a promoção e proteção dos direitos humanos no continente americano e funciona como um órgão consultivo da OEA nessa área.

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  • 06/06/2017

    Aty Guasu divulga carta e volta a pedir à União Europeia a criação de “barreiras humanitárias”


    Mulheres indígenas Guarani e Kaiowá. Crédito da foto: Tiago Miotto/Cimi


    "A crise que chega agora para muitos brancos já estava apontada contra nosso povo". A frase está logo no início da carta final da Grande Assembleia do Conselho Aty Guasu, principal organização política do povo Guarani e Kaiowá, reunido entre os dias 29 e 31 de maio deste ano no tekoha – lugar onde se é – Arroio Kora (MS).

     

    "Não há nada de novo, mas talvez desta vez o Karai (branco) se convença de que deve mudar seu modelo de desenvolvimento e construir um modelo que valorize a vida de muitos ao invés do lucro de poucos", segue o documento. Para os Guarani e Kaiowá, a decisão de anos anteriores está mantida: as retomadas seguirão com a própria vida dos indígenas "na linha de frente".

     

    Os Guarani e Kaiowá reforçaram o pedido à União Europeia para a criação de "barreiras humanitárias" que impeçam a entrada de produtos do agronegócio no grupo de países do Norte quando afetam de forma genocida a vida dos povos indígenas e demais populações do Sul.

     

    Leia a carta na íntegra:

     

    CARTA DO GRANDE CONSELHO DA ATY GUASU

     

    ARROIO KORA – 31 de maio de 2017

     

    Nós, rezadores, lideranças, jovens e mulheres que somos Conselheiros da grande Assembleia ATY GUASU Guarani e Kaiowa afirmamos em meio a esta crise política e econômica que vive o país que continuamos firmes na luta pela terra e pela liberdade de nossos territórios tradicionais e sagrados.

     

    A crise que chega agora para muitos brancos já estava apontada contra nosso povo a muito tempo e sempre foi causada pelos mesmos inimigos. Pela ganância do agronegócio e pelos setores econômicos nacionais e internacionais que exploram nosso país, compram os políticos e o Congresso Nacional, assassinam nossos povos, destroem a natureza e vendem a terra como mercadoria. Não há nada de novo, mas talvez desta vez o Karai se convença de que deve mudar seu modelo de desenvolvimento e construir um modelo que valorize a vida de muitos ao invés do lucro de poucos. Convidamos a todos os aliados, do campo e da cidade,para lutar junto aos Guarani e Kaiowa contra este modelo opressor e enquanto isso afirmamos que SEGUIREMOS COM NOSSAS RETOMADAS E COLOCAREMOS NOSSA PRÓPRIA VIDA EM LINHA DE FRENTE para que nossas terras sejam devolvidas a nosso povo, para que o agronegócio seja derrotado e para que a vida de nosso povo e de todos os povos possa ser enfim respeitada.

     

    A poucos dias, desabou para fora do Ministério da Justiça, Osmar Serraglio, inimigo declarado dos povos indígenas do Brasil. Isso demonstra que o Presidente quer esconder parte da sujeira ruralista para debaixo do tapete, mas sabemos que o Congresso e os palácios ainda estão cheios deles. Através desta frente Ruralista criaram a CPI da FUNAllNCRA onde passaram a perseguir os povos indígenas e os apoiadores e até mesmo procuradores do Ministério Público Federal. Continuaremos enfrentando os Ruralistas e suas propostas genocidas como a PEC 215 e todas as demais que afetam a terra e seus povos. Não descansaremos até que todos caiam e que caia com eles o presidente Temer.

     

    Combateremos este governo e todas as suas reformas como a Reformas da Previdência, Reforma Trabalhista Rural e as emendas e leis que querem vender as terras brasileiras ao estrangeiro e enfraquecer as terras indígenas, quilombolas e camponesas, Repudiamos a última decisão em relação a Migração que diz que para os povos indígenas não Existem as livres fronteiras. Para nós não existem limites para nossos passos e para que possamos visitar nossos parentes. Continuamos vivendo em nossos YVY RUPÁ e os limites de nossa grande nação não são enquadrados pelas fronteiras dos estados nacionais criados sobre nossos territórios.

     

    Exigências da Aty Guasu:

     

    Em março deste ano, a FUNAI através de seu presidente Toninho Costa na presença do Ministério Público Federal prometeu honrar o compromisso com o povo Guarani e Kaiowa e voltar a cumprir o TAC de 2007 onde estão acordados os estudos e as publicações de muitos dos nossos territórios tradicionais. A FUNAI prometeu que voltaria em Maio com seus técnicos e chefes de setores para repassar ao nosso povo um "Diagnóstico" avançado de como está o estudo em cada uma de nossas terras, o que falta para publicá-las, e de forma imediata recomeçar os estudos e os GTs para finalizar os relatórios circunstanciados que estão faltando desde 2009.

     

    Exigimos que esta reunião aconteça de IMEDIATO e que a FUNAI honre sua palavra. Exigimos também que o MPF não descanse de cobrar multa de 1000 reais da FUNAI todos os dias de atraso até que todos os relatórios de nossas terras estejam publicadas e encaminhados para o Ministério da Justiça como cobra o TAC. Queremos que o MPF multe também o Ministro da justiça pelo não cumprimento de sua função enquanto não se cumpre o TAC e as declarações de nossas Terra.

     

    Exigimos que a FUNAI seja respeitada e que invés de CPI que nasce da loucura e das invenções dos Ruralistas seu orçamento seja respeitado para poder cumprir suas demandas junto aos nossos povos. Hoje a FUNAI tem apenas 40 milhões, o que não permite que o órgão funcione nem nove meses se apenas pagasse seus gastos administrativos e com pessoal sem executar nenhuma atividade de apoio e assistência aos povos indígenas.

     

    Exigimos do Governo Federal a demarcação e homologação de todas as nossas Tekoha. Enviaremos também esta carta ao Exterior, ao Parlamento Europeu, para a ONU, para a Corte Inter-americana para pedir que continuem se esforçando para cobrar que o Brasil cumpra a constituição e demarque nossos territórios. Assim como existem as "barreiras sanitárias" para impedir problemas de saúde entre a América e a Europa, pedimos que os europeus levem em conta as "barreiras humanitárias" e que ajudem a pressionar as empresas que não compre produtos (gado, sementes, cana … ) de produtores que usam nosso território com agronegócio e causam com isso o assassinato de nossas lideranças e o genocídio de nosso povo Guarani e Kaiowa. Lembramos que nos últimos anos foram assinados 390 Guarani e Kaiowa, mais de 16 lideranças importantes de nosso povo e que entre 2015 e 2016 sofremos mais de 33 ataques paramilitares dos fazendeiros.

     

    Não aceitaremos nenhuma proposta de compra de terra para nosso povo. A terra não é mercadoria, não se compra nem se vende. Por isso denunciamos as intenções do governo e dos setores econômicos para tentar negociar as terras ancestrais de nosso povo, comprando outros espaços ou tentando comprar nossas lideranças para construir condomínios, vilas, redes elétricas ou fazer grandes projetos. EXIGIMOS A DEMARCAÇÃO DE NOSSAS TERRAS TRADICIONAIS.

     

    Exigimos também o abandono imediato do MARCO TEMPORAL, uma arma ruralista que esta sendo usada pelo judiciário. No MS, em SP e no STF estão querendo anular nossas terras, trair a constituição e matar nosso povo através deste instrumento de morte. Combateremos com todas nossas forças todo Governo e toda a corte que tentar utilizar este absurdo para destruir nosso direito.

     

    Em relação a Saúde e a educação exigimos respeito dos órgãos responsáveis e que essas políticas sejam destinadas a todas as nossas famílias em especial nas nossas Retomadas. Políticas que são direitos humanos não podem ser negadas para punir aqueles que lutam pela terra. Exigimos que postos de saúde, atendimento de equipes de saúde, escolas e contratação de professores sejam imediatamente implementados nos nossos territórios de retomadas.

     

    Em relação a educação exigimos que aconteça onde os indígenas estiverem, por isso exigimos do MEC respeito a nossa educação diferenciada Guarani e Kaiowa e que crie um diálogo entre MEC e Aty Guasu através do FÓRUM NACIONAL DE EDUCAÇÃO INDÍGENA para regularizar esta situação e começar a pagar esta dívida com nosso povo através da implementação de escolas e contratação de professores.

    Nós da Aty Guasu, exigimos que o estado e os municípios conheçam e cumpram a diretriz nacional de educação escolar indígena de 2012 e diretriz estadual de educação escolar indígena de 2015.

     

    Exigimos também a volta da "Operação Guarani" da FUNAI e exigimos que Polícia Civil, DOF, Polícia Militar não oprima mais nosso povo e respeite as formas específicas de lidar com os povos indígenas através da Polícia Federal sempre acompanhada pela FUNAI.

     

    Em solidariedade aos Camponeses lamentamos e repudiamos aqui os mais de 20 assassinatos contra o povo Sem Terra e do campo neste primeiro semestre. Isso só comprova que o Estado, com suas forças de segurança e junto a milícias privadas continua sendo um opressor daqueles que lutam pela vida. O povo Guarani e Kaiowa demonstra sua solidariedade e reafirma que estamos juntos contra estes massacres promovidos pelo Estado e pelo Agronegócio.

     

    Queremos Reforçar também que somos contrários ao FÓRUM DE CACIQUES que foi criado por Ruralistas da Assembléia Legislativa e tem a função de combater a luta do Conselho da Aty Guasu e do Conselho Terena que estão em luta pela terra e pelos direitos de nossos povos. Este FÓRUM não fala pelo nosso povo e só a ATY GUASU nos representa. Da mesma forma repudiamos qualquer liderança que de maneira individual tente falar em nome da ATY GUASU.

     

    Assinam abaixo, as lideranças participantes da ATY GUASU da Tekoha Arroio Kora -29 a 31 de Maio de 2017.


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  • 06/06/2017

    Habeas Corpus pede uso do idioma e tradução do processo para 19 Kaingang em julgamento


    Crédito da foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil


    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

     

    Está reservado aos indígenas o direito de se dirigir ao Poder Judiciário expressando-se no próprio idioma, e de ter a tradução do processo penal. Assim determina a Constituição Federal, Código Penal, tratados de direitos humanos e a Convenção 169. Reivindicando tais garantias a 19 indígenas Kaingang, em julgamento na Justiça Federal de Erechim (RS), um Habeas Corpus será apreciado na tarde desta terça-feira, 6, pela 8a Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4a Região.

     

    No Habeas Corpus se solicita a tradução do processo penal, ou pelo menos dos trechos envolvendo a denúncia e as partes principais; a presença de intérprete em todos os atos do processo, além do laudo antropológico para realizar a ponte de compreensão entre as culturas indígenas e não-indígenas e para entender a cosmovisão Kaingang. Caso o Habeas Corpus seja indeferido pelo desembargador João Pedro Gebran Neto, relator da peça, a defesa dos 19 Kaingang recorrerá ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

     

    A Justiça Federal, onde o julgamento de mérito tramita, indeferiu a tradução e a presença de intérprete para os réus (os 19 Kaingang) e às testemunhas indígenas da defesa, alertando que analisará caso a caso a necessidade da aplicação ou não do direito. Para o juiz do caso, "os indígenas expressam-se plenamente em português uma vez que se utilizaram do direito ao silêncio na delegacia, disseram ao oficial de justiça que tinham advogado constituído e já são integrados".

     

    O juiz ainda indeferiu o laudo pericial antropológico tendo em vista que "se trata de indígenas que não são isolados, por isso desnecessário aferir o grau de discernimento dos mesmos". A defesa dos Kaingang, composta por advogados da Assessoria Jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), contrapõe os argumentos entendendo que a Constituição de 1988 não traz em si o discurso integracionista reconhecendo a língua, cultura e organização social dos povos.

     

    "A comunidade está muito preocupada, porque o juiz está marcando as audiências de oitiva das testemunhas de defesa e estão com muito medo de ter que falar em português num ambiente atípico como o de uma audiência criminal. Talvez, diante da história de criminalização dos povos indígenas, principalmente ali na região sul, o maior símbolo de resistência Kaingang é a própria língua", argumenta a advogada do Cimi, Caroline Hilgert.

     

    Para Kretã Kaingang, da Coordenação sul da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), os indígenas estiveram proibidos de falar a própria língua por conta de projetos de integração e emancipação dos povos, impedimento que deveria ter acabado em 1988. "Indígenas foram presos e até mortos. Existem regiões do país que perderam a língua, o idioma, por conta dessas proibições. Então negar isso faz parte de uma ideia de genocídio do povo indígena. No caso, da gente Kaingang daí".  

     

    Para o Ministério Público Federal (MPF), os indígenas argumentam que "a ampla defesa e o contraditório só estarão preservados com a presença, em todos os atos processuais, de um intérprete que seja capaz de narrar os acontecimentos no idioma nativo".  Da mesma forma, os procuradores da República argumentam que a defesa entende "o laudo antropológico como essencial para esclarecer o contexto da ação penal e buscar compreender o universo e a cultura do povo Kaingang".

     

    Entenda o caso

     

    Residentes das terras indígenas Votouro e Kandoia, os 19 Kaingang respondem pela morte de dois agricultores que atacaram, em 28 de abril de 2014, um bloqueio realizado pelos indígenas em trecho de estrada vicinal no município de Faxinalzinho (RS). Os Kaingang reivindicavam a demarcação completa do território tradicional, que se arrasta há 17 anos. Na ocasião, cinco indígenas chegaram a ser presos e sequer estavam presentes na hora e local do conflito – todavia, seguem inscritos nos crimes dos quais são acusados no processo penal.

     

    O pano de fundo do conflito envolve a morosidade do Estado em finalizar a demarcação das terras indígenas. Após a publicação no Diário Oficial da União, em 7 de dezembro de 2009, do relatório circunstanciado o procedimento acabou paralisado. Indenizações e reassentamentos de não-indígenas não ocorreram. A tensão aumentou. O bloqueio dos Kaingang, em abril de 2014, buscava exatamente pressionar uma solução, mas acabou atacado pelos dois agricultores a tiros.

     

    A presença Kaingang fez o governo do Rio Grande do Sul reconhecer, em 1918, a terra indígena de 31 mil hectares então liderada pelo cacique Votouro, a leste do Rio Passo Fundo. Após inúmeras distribuições de terras em projetos de colonização, o relatório de identificação e delimitação da Terra Indígena Votouro/Kandoia, da Fundação Nacional do Índio (Funai), determinou apenas 5.977 hectares: 3.100 hectares foram demarcados para a área de Votouro, restam os 2.877 hectares de Kandoia.

     

    Em nota pública, divulgada no dia 29 de abril de 2014, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o Conselho de Missão entre os Povos Indígenas (Comin) e a Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas/RS afirmaram: “Responsabilizamos o governo pelas violências em função de sua omissão e negligência, uma vez que as autoridades eram sabedoras da situação de conflito e nada fizeram, a não ser protelar suas decisões”. O caso trouxe consigo uma tensão gerada na região dos fatos.

     

    Durante discursos realizados em Vicente Dutra, a apenas 123 km de Faxinalzinho, em dezembro de 2013, os deputados federais Alceu Moreira (PMDB/RS) e Luiz Carlos Heinze (PP/RS), durante audiência pública financiada com recursos públicos, incitaram os agricultores contra as populações indígenas e quilombolas. "Não deixe que um canalha desses ponha os pés nas propriedades de vocês", disse o parlamentar ruralista Alceu Moreira. O deputado incentivou que os presentes se armassem e criassem grupos para proteger as terras dos indígenas e quilombolas.



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  • 06/06/2017

    Fim da Reforma Agrária e grilagem de terras legalizadas na Amazônia

    Mais uma vez a Diretoria e a Coordenação Executiva Nacional da CPT vêm a público para denunciar a dilapidação dos direitos dos povos indígenas e comunidades camponesas. Na noite do dia 31 de maio, o plenário do Senado aprovou, por 47 votos a 12, a Medida Provisória – MP 759, que se tornou o Projeto de Lei de Conversão, PLV 12/2017, ao serem introduzidas pelo relator mudanças na redação original. Trata-se da regularização fundiária e de alterações estruturais em legislações sobre terra rural e solo urbano, visando favorecer os interesses da bancada ruralista e do capital imobiliário e retirar empecilhos para que áreas sejam subtraídas ao mercado.

     

    No apagar das luzes de 2016, no dia 23 de dezembro, quase na surdina, o governo de Michel Temer havia baixado a MP 759, um grande presente de Natal para os ruralistas, base de sua sustentação no Congresso Nacional. A MP possibilitava o pagamento em dinheiro de terras desapropriadas para Reforma Agrária, quando a legislação vigente determinava o pagamento em títulos da dívida agrária, a serem pagos em até 20 anos e permitia regularizar áreas até 2,5 mil hectares, quando o limite era de 1,5 mil hectares.

     

    O foco da mudança é favorecer o mercado de terras, inclusive com as áreas de Reforma Agrária, ao impor a liquidação dos créditos concedidos às famílias assentadas. É o que está por trás do objetivo de facilitar a titulação da propriedade. Mais uma página da Constituição Federal de 1988 está sendo rasgada, aquela que estabelece a “função social da terra” (CF art. 5º, XXIII e art. 170, III) e se busca impedir a participação dos movimentos sociais no processo de democratização da terra, o que – todos sabem – é decisivo para que alguma reforma agrária aconteça. Com o mesmo fim, o PLV 12/2017 consolida a legalização da grilagem de terras na Amazônia que já vinha sendo feita pelo Programa Terra Legal. Como tal põe em risco o patrimônio ambiental e hídrico do país e do planeta.

     

    A Medida havia sido aprovada pela Câmara dos Deputados, em votação-relâmpago, que durou menos de 10 minutos, no dia 24 de maio, dia das manifestações em Brasília, quando os deputados da oposição se retiraram do plenário em protesto contra o decreto do governo autorizando o emprego das Forças Armadas “para garantia da Lei e da Ordem” na repressão aos manifestantes. Aproveitando-se da ausência da oposição esta e outras MPs foram aprovadas naquele dia. Uma semana depois o Senado consagra o esbulho. Agora só falta a assinatura do Presidente da República ilegítimo para se tornar lei.

     

    Em meio à crise político-social em que o país está imerso, não se poderia esperar outro comportamento de um Congresso Nacional dominado pelas forças mais retrógradas e violentas, que afastou com base em acusações infundadas uma presidenta eleita pelo voto popular, e que se aproveita do caos instalado para garantir e fortalecer interesses e privilégios de uma oligarquia rural que sempre dominou a nação, agora aliada à elite empresarial-financeira globalizada.

     

    Os pequenos avanços, duramente conquistados, com suor e sangue, pelos povos indígenas e comunidades camponesas, são desmontados e tornados pó.

     

    A CPT e as comunidades do campo sonham e já antevêem que este Congresso golpista e este Governo usurpador em breve serão jogados na lata do lixo da história. E a democracia será restabelecida através de Eleições Diretas já e uma Assembleia Nacional Constituinte exclusiva e soberana. Como diz o profeta Isaías, “Ai dos que subornados, absolvem o criminoso, negando ao justo um direito que é seu. Por isso como a labareda queima o graveto e a palha desaparece na chama, assim a raiz deles apodrecerá” (Is 5, 33-34).

     

    Goiânia, 06 de junho de 2017, Semana do Meio Ambiente.

    Direção e Coordenação Executiva Nacional da CPT

     

    Mais informações:

    Cristiane Passos (assessoria de comunicação CPT) – (62) 4008-6406 / 9 9307-4305

    Elvis Marques (assessoria de comunicação CPT) – (62) 4008-6414 / 9 9309-6781


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  • 02/06/2017

    10ª Assembleia Terena ocorre em terra alvo do marco temporal e onde Oziel Gabriel foi assassinado

     

         

    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi | Fotos: Divulgação/Apib

    Há exatos quatro anos, a reintegração de posse de uma fazenda incidente sobre a Terra Indígena Burity, no município de Sidrolândia (MS), terminou fracassada diante da resistência do povo Terena. Todavia, um tiro de arma de fogo disparado do meio das forças policiais atingiu e matou Oziel Gabriel Terena. Ninguém foi punido, o inquérito acabou arquivado. A Polícia Militar alegou ter usado apenas balas de borracha; já a Polícia Federal, não negou aquilo que chamou de revide. O delegado que chefiou a operação, Alcídio de Souza Araújo, virou vedete dos ruralistas e o caso estopim para a criminalização de indígenas e indigenistas.

    Na época não estávamos sob os desmandos de um governo que loteou a Fundação Nacional do Índio (Funai) para a bancada ruralista, responsável por duas edições seguidas de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) usadas para justificar ataques ao órgão estatal, profissionais de antropologia e organizações indigenistas. Quando Oziel Terena foi assassinado, o trágico sinal parece não ter sido decifrado: a vida política do país piorava de forma rápida e letal para as populações mais vulneráveis. Não por coincidência, meses antes, os povos indígenas ocuparam a Câmara Federal contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215.

    “Hoje não falamos mais em bancada ruralista, mas sim em governo ruralista”, declara o advogado e assessor jurídico da Articulação Nacional dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Luiz Eloy Terena. Este é o contexto da 10ª Assembleia do Povo Terena – Hánaiti Ho’únevo Têrenoe, que termina neste sábado, 3. Com uma programação plural, o encontro buscou envolver os demais povos do Mato Grosso do Sul: Guarani e Kaiowá, Kinikinau e Kadiwéu. As mesas de diálogos e os debates, iniciados na quarta-feira, 31, trataram de temas comuns a estes povos: direitos territoriais, meio ambiente, política, saúde, sustentabilidade, educação e a questão das mulheres indígenas. “A data da morte do Oziel nunca será esquecida. Tem um significado grande nessa caminhada de luta. O momento era decisivo, não tínhamos como recuar. Infelizmente veio a reintegração. O tiro que matou o Oziel partiu do Estado, que deveria dar uma solução, mas preferiu fazer o massacre”, defende o professor Alberto Terena.

    A liderança Terena ressalta que o episódio serve para sempre lembrar ao povo: é preciso seguir na luta pela demarcação das terras. A luta pela qual Oziel foi derrubado não está nem perto de acabar. Depois da morte do indígena, com o governo do PT impondo mesas de diálogo no lugar de consolidar as demarcações, a tese do Marco Temporal ganhou força entre os aliados do ruralismo no Judiciário. As terras indígenas Burity, declarada em setembro de 2010, e Limão Verde, já homologada e registrada, estão enquadradas em processos da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) no Marco Temporal. Nelas vivem mais de 5 mil Terena. A tese busca consolidar como terra indígena a ser demarcada apenas as ocupadas pelos indígenas na ocasião da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. Enquanto estava como ministro da Justiça, o ruralista Osmar Serraglio afirmou que apenas terras fechadas no Marco Temporal poderiam ser demarcadas; as demais, não.

    “É uma covardia sem tamanho porque nos tiraram destas terras à força. Mesmo assim ficamos em algumas porções delas. O que a gente percebe é um momento de perda de direitos, então a gente bate muito na questão da CPI da Funai/Incra, na do Cimi aqui no Mato Grosso do Sul, que na verdade servem apenas para enfraquecer as nossas demandas territoriais. O Marco Temporal serve para acabar com as demarcações e é cruel porque todo mundo sabe a razão do povo indígena não estar sobre a sua terra, que é a expulsão, a violência”, ressalta Alberto Terena. O tema discutido na assembleia serviu também para o fortalecimento de alianças.

    Kretã Kaingang, da Coordenação Executiva pela Região Sul da Apib, participou da Assembleia. “Viemos para deixar firmado o espírito de unidade e compromisso que a luta precisa no Brasil. As bases que não se atentaram ainda precisam se atentar. Nem as terras homologadas estão garantidas com esse quadro. Tem muita gente se mobilizando, e precisa cada vez de mais. Porque tão mexendo ainda com áreas de conservação ambiental, entregando milhões de hectares para a grilagem, tem ataques contra os quilombolas, massacres contra camponeses. Temos de nos unir numa força popular nacional”, destaca.

    A realidade vivenciada pelo Kaingang na região Sul ganhou contornos dramáticos nesta semana. O Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região anulou as portarias declaratórias de quatro terras indígenas no norte de Santa Catarina: Pindoty, Tarumã, Piraí e Morro Alto, todas do povo Guarani Mbya. “Conheço aquela região e é uma catástrofe a decisão do TRF-4. São dezenas de famílias que podem ir pra rua, daí. No Sul são poucas e pequenas áreas, tem reservas também pequenas, mas nem isso querem garantir pra povos que vivem ali milenarmente, caso dos Guarani e da gente Kaingang”, pontua Kretã.

    O indígena afirma que o Marco Temporal é uma afronta não apenas contra os direitos dos povos, mas “contra o futuro dos nossos filhos e filhas. E isso pra mim não tem outro nome a não ser genocídio, que é quando se tenta de todas as formas fazer com que um povo deixe de existir ou agora ou pra frente”. Além dos casos de Burity e Limão Verde, o STF deverá receber o recurso envolvendo as quatro terras indígenas de Santa Catarina. A situação da Terra Indígena Burity chega a ser emblemática: o dono da Fazenda Burity, local onde Oziel estava ao ser morto, chegou a pedir R$ 200 milhões de indenização pelas benfeitorias – quantia muito acima do valor da terra no MS.

    Alberto Terena, no entanto, explica que não apenas a questão territorial foi abordada na 10ª Assembleia. “Nosso sistema de  saúde anda muito precário, gestão ruim e tocamos muito na questão com a Sesai (que teve representantes no encontro)”, afirma. A Rede de Juventude Indígena (Rejuind) organizou atividades para o público jovem que preenche frações censitárias consideráveis não apenas entre o povo Terena, mas de uma forma geral nos demais povos do país – a população indígena é integrada proporcionalmente por mais jovens se comparada com a sociedade envolvente (IBGE, 2010). Desta forma, ações envolvendo cinema, música, cultura, religiosidade e cosmologia foram discutidas.

    Os debates contaram com a presença de lideranças indígenas, especialistas e indigenistas de organizações e organizações em defesa dos direitos indígenas, caso da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Ministério Público Federal (MPF) e Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Pelo governo federal, representantes da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e do Ministério da Justiça marcaram presença, além da Defensoria Pública da União (DPU) e Advocacia-Geral da União (AGU) – Procuradoria Especializada da Funai.

    Revista Terena Vukápanavo

    Durante o encontro foi lançada a Revista Terena Vukápanavo, organizada por pesquisadores, mestres e doutores terena, com conselho editorial também de pesquisadores Terena e pesquisadores e estudiosos indígenas e indigenistas, dentre os quais Boaventura de Sousa Santos, diretor do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e doutor em Direito dos Oprimidos, João Pacheco de Oliveira, antropólogo do Museu Nacional (RJ) com trabalho voltado aos povos indígenas, Antônio Carlos de Souza, antropólogo especializado em indigenismo, política indigenista e antropologia histórica, além de Luís Roberto Cardoso de Oliveira, doutor em antropologia pela Harvard University (EUA) e especialista em administração de conflitos.

     

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  • 02/06/2017

    JBS: PP concentra metade das doações para deputados ruralistas

    Por Alceu Luís Castilho

    De R$ 31 milhões nas eleições de 2014, R$ 15 milhões foram para o partido; somados, PP, PR, PMDB, PTB e SD concentram 95% das doações para a Câmara.

    A bancada da JBS na Câmara tem suas siglas de preferência. E elas passam longe do PT e do PSDB. Entre R$ 31 milhões doados pela JBS – conforme as delações na Lava-Jato – nas eleições de 2014, 95% (R$ 29 milhões) concentraram-se em apenas cinco partidos: PP, PR, PMDB, PTB e SD. Pelo relato de Joesley Batista, um dos dois controladores da empresa, e do presidente Ricardo Saud, somente o PP reuniu praticamente a metade das oferendas, com R$ 15 milhões.

    De Olho nos Ruralistas mostrou nesta quarta-feira (31/05) que 99 deputados ruralistas foram financiados pela JBS, legal ou ilegalmente, de acordo com as delações. E que 66 desses deputados pertencem à Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Entre eles, constata agora o observatório, PP e PR concentram R$ 14,8 milhões dos R$ 21,6 milhões doados pelo frigorífico:


    O PP é o atual partido do ministro da Agricultura, Blairo Maggi. Antes ele era do PR. Uma de suas figuras mais conhecidas é o deputado paulista Paulo Maluf, ex-prefeito, ex-governador e candidato à Presidência nas eleições indiretas de 1984, contra Tancredo Neves.

    Na lista da JBS, mas não da FPA

    Lembremos que nem todos os deputados que representam os interesses de grandes fazendeiros fazem parte da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Entre 99 políticos ruralistas na planilha da JBS, 23 não fazem parte dessa frente, diretamente financiada pelo agronegócio.

    Entre esses 23 deputados, os nove políticos do PP receberam muito mais verbas do frigorífico que os demais:


    Mesmo os deputados do PMDB, PTB e SD são coadjuvantes do PP e do PR, entre os ruralistas financiados pela JBS nas eleições para a Câmara. E não somente porque os valores totais são menores. Mas porque as doações para deputados do PR e, principalmente, do PP, têm valores maiores.

    E isso pode ser constatado numericamente – conforme mais um levantamento feito pelo De Olho nos Ruralistas. Entre os 22 deputados ruralistas do PP (13 deles da Frente Parlamentar da Agropecuária) que, segundo os chefes do frigorífico, receberam dinheiro da JBS em 2014, apenas 2 receberam abaixo de R$ 500 mil. Vejamos:



    Muito além do PT x PSDB

    Isso não acontece com os outros partidos. Em todos os casos a proporção é inversa: uma minoria recebeu acima de R$ 500 mil. O PTB, por exemplo, só aparece no topo da lista dos agraciados pela JBS por causa da doação de R$ 1,8 milhão para a deputada fluminense Cristiane Brasil. Ela faz parte da FPA, mas não é conhecida pela atividade ruralista – e sim por ser filha do presidente nacional do partido, o ex-deputado Roberto Jefferson.

    Em alguns poucos casos, como o da deputada Bruna Furlan (PSDB-SP), a planilha da JBS indica a doação de valores irrisórios para os padrões das campanhas eleitorais, abaixo até de R$ 1 mil, mas isso não acontece com o PP – que funciona quase como um partido do agronegócio no Congresso.

    A relação da JBS com a Câmara, portanto, nada tem a ver com a injeção de dinheiro nos candidatos majoritários, PT e PSDB no caso de 2014. Em relação ao Senado o quadro só se altera porque um dos senadores financiados, Aécio Neves, foi justamente o candidato tucano à Presidência.

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  • 02/06/2017

    Direitos ameaçados: orçamento do Incra inviabiliza titulação de terras quilombolas


    A comunidade Patauá do Umirizal (Óbidos – PA) é uma das que teve seu processo de titulação paralisado pelo corte de orçamento. Foto: Carlos Penteado/CPI-SP

    O corte orçamentário do Incra ameaça a efetividade dos direitos dos quilombolas. Em 2017, um terço das Superintendências do Incra conta com orçamento anual inferior à 10 mil reais para conduzir os processos

    Os sucessivos cortes no orçamento ameaçam a política de regularização de terras quilombolas. Em sete anos, o orçamento do Incra apresentou uma queda de 94%. Para 2017, o órgão dispõe de apenas R$ 4 milhões para encaminhar mais de 1.600 processos de titulação. Em 2010, eram 64 milhões. Este é o menor orçamento para a titulação de terras quilombolas desde 2003, ano em que o órgão reassumiu a responsabilidade por encaminhar a regularização das áreas.

    Dados obtidos pela Comissão Pró-Índio junto ao Incra indicam que 09 das 30 Superintendências Regionais do órgão têm verba inferior a R$ 10 mil para a regularização de terras quilombolas esse ano. A SR do Mato Grosso, por exemplo, conta com R$ 6.844,00 para conduzir 73 processos. O menor orçamento é da SR de Alagoas de apenas R$ 3.948,00 para encaminhar 17 processos.

    As Superintendências Regionais são responsáveis pela condução dos processos de identificação dos limites do território que resultam nos Relatórios Técnicos de Identificação e Delimitação (RTID). São processos de longa duração que exigem recursos humanos (técnicos de diferentes áreas do órgão, como antropólogos e agrônomos) e financeiros. Há necessidade de diversas viagens às comunidades para o levantamento de dados.  Os custos e tempo gasto variam conforme a região do país, comunidades de difícil acesso no interior da Amazônia demandam custos mais elevados, por exemplo.

    A Comissão Pró-Índio apurou que a SR do Incra de São Paulo gasta em média 60 mil reais para a elaboração de um relatório (RTID) e 2 anos para finalizá-lo. Nesta SR, há 50 processos abertos e o orçamento disponível para 2017 é de 30 mil reais.

    As limitações orçamentárias das Superintendências representam um sério gargalo para a continuidade da maior parte dos processos, já que 87% dos 1.675 processos não tiveram o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) publicado.

    Antônio Oliveira Santos, coordenador de Regularização de Territórios Quilombolas do Incra, confirma a gravidade da situação em entrevista à Comissão Pró-Índio: “Nós estamos evitando abrir novas frentes de trabalho. Estamos priorizando os mais urgentes, o que é possível aguardar, vamos segurando”. Para superar essa situação, o coordenador informou que estão buscando parcerias. Segundo Oliveira, o Incra e a Secretaria Especial de Política Pública e Igualdade Racial acordaram a transferência de recursos para a elaboração de cinco relatórios de identificação de limites nos estados de Alagoas e de Rondônia.

    Direito inviabilizado

    Completamente defasado em relação à demanda, o recurso disponível no Incra acaba por inviabilizar a efetivação a titulação das terras quilombolas, direito essencial para o futuro das comunidades. Assim avalia o procurador da República Luciano Mariz Maia, coordenador da 6ª Câmara do Ministério Público Federal, “O que se vê é uma redução orçamentária que termina por anular um direito fundamental, não se revoga o direito, mas inviabiliza o seu cumprimento efetivo. Trata-se de retrocesso em matéria de direitos humanos que viola, além de vários tratados internacionais, a própria Constituição”.

    Os quilombolas também se preocupam. “O corte de orçamento foi muito grande, já com aquele orçamento não titulava, imagina com esse corte imenso então? ”, questiona Hilário Moraes, coordenador regional da Malungu – Coordenação Estadual das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Pará. “O processo das comunidades do Marajó já completou 13 anos aberto e não temos nem resposta do que aconteceu. Isso tira o sono das pessoas, todos ficam sofrendo e a violência se acirra, já teve morte de quilombola, criminalização dos movimentos que lutam pela terra”, relata Hilário sobre a dramática situação vivida em sua região.

    Cleone de Souza Matos, coordenador da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo do município de Óbidos (ARQMOB), no oeste do Pará, reforça o sentimento de desesperança: “para a gente o impacto foi grande, teve processo que tínhamos esperanças que seria publicado e que está parado. Sentimos que os funcionários da casa querem fazer, mas sem dinheiro fica muito difícil. Com certeza, é muito desanimador paras comunidades que já enfrentam muitos problemas e pressões”. 

     “O orçamento não impacta apenas as metas desse ano do Incra, mas coloca em cheque o futuro das comunidades quilombolas” alerta Lúcia M. M. de Andrade, coordenadora da Comissão Pró-Índio de São Paulo. “A insegurança para as comunidades quilombolas é enorme. O artigo 68 da ADCT da Constituição Federal está sendo inviabilizado”, complementa.

    Até hoje, quase 30 anos após a Constituição de 1988 garantir o direito dos quilombolas à propriedade de seus territórios, o governo federal titulou somente 37 terras, sendo que 11 delas apenas parcialmente. Em 2016, apenas Tabacaria (AL) foi titulada, e em 2017 uma terra recebeu título até o momento – Invernada dos Negros (SC), em janeiro. O total de 168 terras quilombolas tituladas hoje no Brasil foi garantido em grande parte pelas regularizações realizadas pelos governos estaduais.

    Cenário nacional – cortes nas políticas sociais

    A regularização de terras quilombolas não é a única política social inviabilizada pelos cortes orçamentários. No final de março, o governo Temer anunciou um corte de R$ 42,1 bilhões no orçamento público federal, afetando gravemente o Ministério do Meio Ambiente e a Fundação Nacional do Índio (Funai). O recurso disponível para os dois órgãos em 2017 foi cortado pela metade.

    Alessandra Cardoso, assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) alerta que “Além do corte de orçamento, MMA, Funai e Incra passaram por cortes graves de pessoal que impactam diretamente a capacidade do governo de cumprir e executar suas políticas”. O resultado, na avaliação do Inesc, é um aumento nas violações de direitos e acentuação das desigualdades.


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  • 02/06/2017

    Créditos de poluição e colonialismo climático


    Fotos: Daniel Santini e Gerhard Dilger

    Por Daniel Santini, de Xapuri, Acre

    Em encontro em Xapuri, no Acre, povos da floresta criticam políticas de economia verde e demonstram preocupação com novos acordos discutidos entre o governo e a indústria de aviação. Em declaração conjunta, exigem demarcação e reconhecimento de territórios e direitos

    Praticamente ao mesmo tempo em que, em Rio Branco, capital do Acre, empresários e representantes do governo estadual realizaram um encontro para discutir novas fórmulas para compensação do aumento da emissão de poluentes, em Xapuri, cidade de Chico Mendes, representantes de cinco povos indígenas e de comunidades que vivem e trabalham na floresta, apresentaram denúncias de impactos de projetos de economia verde. O Acre é considerado um laboratório para implementação de políticas baseadas na ideia de que é possível compensar poluição gerada em determinadas regiões com a manutenção de florestas em outras regiões.

    Em Rio Branco, o encontro foi realizado dias 25 e 26 de maio no Auditório da Procuradoria Geral do Estado, e teve como principal tema a possibilidade de implementação do esquema “Compensação e Redução de Carbono para a Aviação Internacional”, conhecido como Corsia. Apesar de o nome mencionar redução, o mecanismo em discussão não prevê uma diminuição das emissões dos aviões. Pelo contrário, trata-se de uma alternativa defendida pela Organização da Aviação Civil Internacional (Oaci) para justificar aumento da poluição em troca do não-desmatamento de florestas. Tais mecanismos preveem restrições às comunidades tradicionais, como limitações para práticas de agricultura, pesca, caça e uso de bens florestais. O encontro foi realizado pelo grupo de trabalho Offsets de Carbono Florestal do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas e contou com a participação do senador Jorge Viana (PT-AC), presidente da Comissão Mista de Mudanças Climáticas no Congresso Nacional.

    Em Xapuri, o evento ocorreu de 26 a 28 de maio com boa parte das discussões realizadas embaixo de árvores do quintal de uma pousada local. Intitulado “Os efeitos das políticas ambientais/climáticas para as populações tradicionais”, o encontro reuniu indígenas Apurinã, Huni Kui, Jaminawa, Manchineri e Shawadawa, e representantes de comunidades tradicionais do interior do Acre, além de seringueiros e seringueiras de Xapuri. Frente aos projetos governamentais, marcados pela pouca participação social e transparência, os participantes denunciaram o que chamam de colonialismo climático. Foram criticadas as limitações dos modelos que tentam mensurar impactos ambientais a partir de estimativas de concentração de carbono e de previsões sobre desmatamento, e questionado o real impacto ambiental das atividades e modos de vida dos diferentes povos da floresta.


    Os presentes também defenderam o uso “créditos de poluição” em vez de “créditos de carbono”, termo utilizado nos mercados de compra e venda de poluentes estabelecidos com base em projetos de tipo REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Evitados). Em vez de políticas fundamentadas em restrições ao modo de vida dos povos tradicionais, os participantes defenderam que seja alterado o modelo político-econômico de ocupação da região, com suspensão dos generosos financiamentos públicos para expansão da agropecuária, e projetos de manejo industrial de florestas e monocultivo de árvores.

    Neoaviamento
    Em meio à discussões sobre as propostas de novas políticas para o Acre, estado considerado chave para a expansão de políticas de economia verde, houve espaço para denúncias sobre invasões de terras indígenas, agravadas por políticas públicas desastradas, muitas das quais com apoio internacional, e relatos de violações de direitos e territórios. As denúncias, que indicam a necessidade de maior presença e atenção do poder público em áreas de difícil acesso, foram apresentados em rodas de conversa, com momentos para danças e cantos dos diferentes povos da região.

    Os debates resultaram em um documento conjunto, intitulado Declaração de Xapuri. O encontro foi uma continuidade do trabalho de observação e denúncia de impactos da economia verde no Acre. Em 2013, a Relatoria do Direito Humano ao Meio Ambiente, da Plataforma de Direitos Humanos-Dhesca Brasil, publicou o relatório Economia Verde, Povos das Florestas e Territórios: violações de direitos no Estado do Acre, que denunciou, entre outros, sobre três projetos de REDD no estado . Em 2016, novas inspeções resultaram em outras denúncias envolvendo agências de cooperação internacional alemã.

    O evento em Xapuri foi realizado com apoio das organizações Amigos da Terra Internacional, Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Fundação Rosa Luxemburgo e Movimento Mundial pelas Florestas Mundiais (WRM, da sigla em inglês). 

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  • 02/06/2017

    Indígenas do Araça’í falam sobre a luta no Oeste Catarinense


    Foto: Desacato.info

    Sábado, dia 27 de maio, na Universidade Federal Fronteira Sul (UFFS) de Chapecó/SC, os indígenas Guarani João Barbosa, junto com seu filho Adilson e o Educador de língua Portuguesa João Batista (Kaingang), participaram de um momento de diálogo no Curso Realidade Brasileira, para falar sobre o tema: “Terra Sem Males”, que foi escolhido posteriormente como sendo o nome dessa turma.

    “Dom José Gomes na luta por uma terra sem males”, assim ficou o nome que carrega também o contexto de memória em homenagem à Dom José, líder religioso que pela sua luta em favor dos pobres foi perseguido e ameaçado no período da ditadura militar no Brasil. Em Chapecó/SC onde teve atuação como Bispo, chegou a ser assunto na Câmara de Vereadores, onde a elite conservadora exigiu sua saída da cidade. Mas ele continuou fazendo luta até encantar.

    Durante a noite de sábado então, Jacson Santana, que é representante do CIMI Sul e vive em Chapecó, foi a pessoa que apresentou os representantes indígenas à turma do Curso Realidade Brasileira. O Cacique Guarani João Barbosa falou sobre a situação que passa o Brasil e especialmente, mencionou sobre as condições que vivem as 30 famílias Guarani nas terras do Toldo Chimbangue, em Chapecó-SC, um acampamento que foi cedido pelos indígenas Kaingang que ocupam essa mesma região até que os Guarani consigam garantir a conquista de seu território, que são as terras tradicionais do Araça’í, entre os municípios de Cunha Porã e Saudades, no Oeste do Estado.

    Barbosa falou que no acampamento as famílias vivem desassistidas, como é a realidade da grande maioria dos povos indígenas que foram expulsos das terras, quando da invasão europeia. O processo de colonização ocorrido em meados do século XX, tratou de afastar sistematicamente esses habitantes da terra historicamente ocupada. A implantação de uma cultura capitalista pela colonização gerou uma transformação social, cultural e econômica desse espaço, entre as quais a destituição dos nativos das terras ocupadas. Decorrido menos de um século da privatização do território regional, as populações pré-capitalista reivindicam o direito constitucional pela retomada da terra.

    O Cacique João Barbosa chegou a falar sobre esse sentimento de tristeza, pelos golpes que as populações indígenas vem sofrendo. “Se olhar para mim parece que estou meio feliz mas as vezes estamos tristes. A vida de um cacique as vezes é bem cruel, pode perder até a vida. A sede que eu tenho você também tem, sinto canseira, é a mesma coisa que você sente e por isso eu preciso de apoio, de ajuda”, disse ele.

    João Barbosa falou sobre o sonho da conquista pelas terras tradicionais e disse que esse sempre foi o desejo de muitos Guarani que já encantaram. “Meu pai morreu aos 98 anos com esse sonho, ele não conseguiu, eu estou confiando e desconfiando que vamos conseguir, com o apoio que vocês dão, queremos ter esse direito de viver”, mencionou.

    João Batista que é Educador de língua Portuguesa no Toldo Chimbangue, e já viveu experiências ao ensinar a língua portuguesa em escolas fora da comunidade indígena, também falou sobre essa necessidade de lutar permanentemente pelo território. Batista nasceu no ano de 1979 e em 1985 ocorreu a reconquista do território Kaingang, o Toldo Chimbangue, o nome dessa terra indígena é proveniente de Antônio Chimbangue, que foi o primeiro cacique nesse local.

    Em sua fala, Batista menciona a Lei de Terras, um período onde a terra tornou-se mercadoria, cujos participantes de sua compra, eram pessoas que tinham poder econômico para obtê-la. Diferentemente das populações nativas, que passaram a ter a sua força de trabalho explorada pelos imigrantes europeus e muitos se afugentaram. “Entendo que nosso espaço vai além dos limites da aldeia. Tenho familiares no Rio Grande do Sul, no Paraná, não existe essa delimitação, temos o direito de ir e vi para qualquer lugar. Nós Kaingang quando tínhamos vontade sair do lugar para outro, saía e voltava, meses depois”.

    O Educador ainda comentou sobre a invisibilidade das populações indígenas perante a sociedade. “Somos um povo sofrido, visto como minoria porque é uma sociedade que vive na invisibilidade do poder público que nunca pensa um projeto de acordo com a necessidade dos indígenas. Cada conquista precisa de um movimento, trancar rodovia, precisa que a gente dance, que grite, para que a mídia perceba e o poder público se sinta obrigado a construir projetos, um mínimo de apoio”.


    Bandeirantes/SC

    Os indígenas Guarani viviam nas terras do Araça’í, localizadas entre os municípios de Cunha Porã e Saudades. Com a vinda de colonos europeus, um longo processo de conflitos movimentou esta região. Houve a expulsão dos nativos que passaram a dividir as terras do Toldo Chimbangue, em Chapecó, junto aos Kaigang.

    Em Cunha Porã e Saudades, centenas de agricultores se instalaram e recomeçaram suas vidas. Compraram as terras das empresas colonizadoras, constituíram família e também, construíram a sua história na localidade. No entanto, não conformados com a expulsão, os indígenas Guarani depois de longos anos, retomaram a luta pela demarcação de terras no Araça’í.

    Para resolver a questão sem causar danos aos agricultores, o Governo do Estado propôs no ano de 2012, a compra de uma área de terra no município de Bandeirante, porém, a proposta não foi entendida com naturalidade e tranquilidade por líderes políticos e parte da população de Bandeirante. Uma parte da imprensa local exerceu a função de aprofundar o conflito entre indígenas e não indígenas, divulgando matérias com os seguintes elementos:

    Em Bandeirante, a ideia da instalação da aldeia indígena gerou controvérsias. Para o prefeito eleito, José Carlos Berti, além do choque cultural, outros problemas surgiriam com a vinda dos índios. Ele desafia que alguém lhe apresente um município que desenvolveu e conquistou avanços por ter aldeia indígena. Defende que a área pretendida em Bandeirante não possui nenhum estudo arqueológico apontando que algum povo indígena habitou a área. Berti entende que o povo indígena deve ser levado para onde é seu lugar de origem, e não para Bandeirante. O prefeito eleito acrescenta que o interesse é usar a área para reforma agrária, abrigando agricultores de Bandeirante e região que ainda não possuem terra (RESERVA INDÍGENA, p. 5, 2012c).

    No depoimento do prefeito José Carlos Berti, está evidente o pensamento destacado por Bauman (1998), ao referir-se ao sonho da Pureza. Segundo o autor, toda ação ou condição que ofereça perigo a ordem estabelecida socialmente é vista como negativa, como algo que precisa ser eliminado, que está de fora do plano até então construído. Os indígenas neste contexto, seriam seres impuros, incivilizados, incapazes de manter uma relação de proximidade com a comunidade colonizadora. São neste espaço, excluídos e impossibilitados de defender-se, porque é o sentimento de pureza, de continuidade de uma maneira de vida uniformizada que é colocada em questionamento.

    Os indígenas Guarani seguem na luta pela reconquista de seu território no Araça’í. Depois de inúmeras jogadas políticas pautadas por deputados da região, para que os Guarani fossem à Bandeirante e assim ‘liberassem’ as terras tradicionais para os agricultores, eleitores certos, os indígenas resolveram por bem, permanecer junto ao Toldo Chimbangue e em luta pelas terras entre Cunha Porã e Saudades.

    BAUMANN, Zigmunn. O mal-estar da pós-modernidade. Tradução de Mauro Gama e Cláudia M. Gama, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.

    RESERVA INDÍGENA: Cacique afirma que aldeia não virá para o município. Gazeta Catarinense, São Miguel do Oeste, p. 5, 7 dez. 2012c.

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