O Relatório
O Relatório
Histórico
Publicado pela primeira vez em 1996, o relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil é um importante instrumento de denúncia da violência e das violações que acometem os povos originários até hoje no país.
Depois da edição que analisa os dados de 1994 e 1995 e antes de passar a ser publicado de forma anual, em 2003, o relatório foi ainda publicado com dados referentes ao ano de 1996. A partir de 2003, todas as edições do relatório estão disponíveis em formato digital, e desde 2015 o relatório é também traduzido para o inglês.
Como são coletados os dados
O relatório utiliza diversas fontes para construir o seu banco de dados: registros dos onze regionais do Cimi, denúncias de indígenas, boletins de ocorrência, notícias veiculadas pela imprensa e, ainda, informações oficiais da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), obtidas usualmente via Lei de Acesso à Informação (LAI), do Ministério Público Federal (MPF) e da Fundação Nacional do Índio (Funai), dentre outros órgãos públicos.
A diferença de fontes também resulta em diferenças qualitativas na disposição dos dados. Os números oficiais disponibilizados pelos órgãos públicos, especialmente os referentes à violência contra a pessoa, carecem de informações que qualifiquem os dados, como a especificação do nome da vítima, seu povo ou comunidade: são apenas números, divididos por estado ou por Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei). Além disso, estes dados normalmente demoram muito a serem disponibilizados, mesmo quando requeridos via LAI.
É importante ressaltar que os dados, como anualmente ressalta a antropóloga e coordenadora de pesquisa, Lúcia Helena Rangel, são incompletos, parciais e deixam de lado diversos episódios ocorridos nos territórios, pela própria dimensão desta realidade e pela falta de registros e de acesso a contextos e situações variadas. Ainda assim, a antropóloga afirma em seu artigo que “o volume de informações que apresentamos nos permite fazer um balanço a respeito desse lado sombrio que abarca o cotidiano e as grandes lutas dos povos indígenas no Brasil”.
Tipos de violências contra indígenas
A violência tem sido uma constante, que, mesmo sendo absorvida na vida cotidiana dos povos indígenas, não pode ser banalizada, nem encarada como normalidade. Na vida cotidiana as comunidades não se deixam abater, reproduzem-se nos limites de suas possibilidades, criam estratégias de sobrevivência e recriam assiduamente o sentido da vida. Por isso mesmo, este relatório tem sempre o objetivo de colaborar para a construção da paz, zelar por direitos e pela dignidade humana e alertar para a necessidade da concretização de uma política indigenista justa que aponte o rumo da construção de uma ética de respeito à diversidade cultural, social, econômica, política e ambiental.
Por isso, é sempre importante esclarecer que o ponto de vista adotado é o da violência empreendida pelo poder público e por particulares contra os povos indígenas. Os estudos de violência apontaram uma modificação de paradigma nos anos de 1970, a partir da mudança dos focos de violência que passaram a emanar dos redutos civis, cujos sujeitos principais estavam localizados nos guetos empobrecidos das cidades, organizando-se em quadrilhas criminosas de alcance local, nacional e internacional. A violência temida é aquela empreendida pelo civil que rouba, sequestra, estupra e sevicia, portanto, aquela que é praticada pelo bandido que ameaça a sociedade e o Estado. Para essa violência reclama-se a segurança pública e a proteção do Estado. Mas aqui, não falamos desse tipo de violência, mesmo que em algumas situações ela atinja o interior de comunidades indígenas que vivem as pressões próprias do confinamento em territórios exíguos, onde as disputas por espaço e usos da territorialidade criam as bases de competições, conflitos e levam a vícios degradantes.
A concepção de violência utilizada pelo relatório não se restringe apenas àquelas práticas mais obviamente violentas, como os assassinatos, as agressões físicas e as ameaças – reunidas no capítulo “Violência contra a Pessoa”. Ligada à sua história colonial e utilizada, por diversas vezes ao longo destes cinco séculos, a violência contra os povos indígenas no Brasil, com a finalidade explícita e oficial de exterminar estas populações e seu modo de vida tradicional, é muito ampla: envolve o racismo, a discriminação, a negação da identidade dos povos originários, a invasão de seus territórios, a exploração ilegal dos recursos naturais neles existentes e as diversas formas de omissão do poder público em relação à saúde, educação e, especialmente, no que diz respeito à regularização e à proteção das terras indígenas.
Estas diferentes dimensões da violência, nem sempre tão evidentes, mas invariavelmente danosas, estão reunidas e sistematizadas nos capítulos “Violência contra o Patrimônio”, “Violência contra a Pessoa” e “Violência por Omissão do Poder Público”.