• 24/07/2017

    Entidades denunciam estado de exceção imposto a indígenas e quilombolas por governo federal


    14° Acampamento Terra Livre – Abril de 2017. Foto: Mídia Ninja/MNI

    Por Guilherme Cavalli, da assessoria de comunicação

    A Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro, juntamente com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Sul e a Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas do Rio Grande do Sul divulgaram uma nota pública onde questionam o parecer chancelado pela Presidência da República na última quinta-feira (20).

    O governo federal adotou uma orientação da Advocacia-Geral da União (AGU) que determina a toda administração federal que julgue as demarcações de Terras Indígenas (TI) a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a TI Raposa-Serra do Sol (RR), de 2009. Entre os pontos mais inconstitucionais encontra-se o entrave de que só tem direito à terra os povos que estavam sob posse de seu território em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.

    “Essa nefasta articulação que tem como pano de fundo a sustentação política do atual (e ilegítimo) Presidente da República, objetivando, dentre outras medidas, negar autorização à persecução criminal do mesmo ante o Supremo Tribunal Federal pelo Parlamento”, redigem as instituições signatárias.

    O documento assinado pelas instituições afirma que o parecer “está sendo ardilosa e fraudulentamente utilizada pelo Chefe do Poder Executivo para ludibriar, enganar e corromper princípios constitucionais”. O texto assegura que essas são articulações do governo para “impedir que os direitos dos povos indígenas e quilombolas sejam efetivamente respeitados pelo Estado brasileiro, que, pela elite racista e classista que dele se apoderou, simplesmente advoga verdadeiro etnocídio”.

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    MPF divulga nota pública contra retrocesso em demarcação de terras indígenas

    A partir da análise de conjuntura que denuncia o “compromisso do atual governo com a maximização da exploração capitalista”, a nota pública manifesta as artimanhas governamentais que se “valem de todos os expedientes ao alcance da engenharia jurídica de corte reacionário que permeia esse ilegítimo governo” para sustentar um governo ilegítimo e “ implantar verdadeiro estado de exceção em relação a segmentos sociais vulneráveis politicamente”.

    O governo de Michel Temer, segundo as entidades, deseja “surrupiar direitos dos indígenas e quilombolas, afrontando inclusive normativas internacionais as quais aderiu o Estado brasileiro”.

    O parecer foi assinado por Michel Temer com o objetivo de blindar seu governo – a ser julgado pela Câmara que decidirá se a acusação de corrupção seguirá ou não para o STF. No centro das negociações, como moeda de troca para garantir o apoio da bancada ruralista (41% dos parlamentares da Câmara), encontra-se a agenda ambientalista. Nas últimas duas semanas, Temer direcionou ao Congresso projetos que diminui o tamanho da Reserva do Jamanxim (PA) e aprovou o parecer que paralisa a demarcação das Terras Indígenas. A flexibilização de regras para licenciamento ambiental, a liberação de agrotóxicos e venda de terras para estrangeiros também se apresentam como futuras moedas de troca do peemedebista.

    “Se havia alguma dúvida sobre o desleixo com o ser humano por parte dos atuais governantes do Brasil, o ato em questão é sinal claro de que para além disso, há por parte dessa gente, o compromisso com a barbárie”, encerra a nota das entidades.

    Leia na íntegra:

    Nota para a Opinião Pública
    O governo federal e o estado de exceção em relação a indígenas e quilombolas.

    No dia 20 de julho de 2017, a par de uma clara e inequívoca articulação com a bancada de parlamentares ruralistas formada no Congresso brasileiro, a Presidência da República chancelou parecer  da Advocacia Geral da União que para além de limitar os direitos dos povos indígenas e quilombolas, avança no sentido de constranger o Supremo Tribunal Federal que pautou para o próximo mês de agosto o julgamento de ações que dizem diretamente a esses povos, ou seja, quanto ao direito, ou não, de terem assegurados seus ancestrais direitos à luz do que prevê e fixa a Constituição de 1988.

    Essa nefasta articulação que tem como pano de fundo a sustentação política do atual ( e ilegítimo) Presidente da República, objetivando, dentre outras medidas, negar autorização à persecução criminal do mesmo ante o Supremo Tribunal Federal pelo Parlamento, simplesmente afronta de modo ignóbil e direto a Constituição da República fazendo – o ato chancelado – tábua rasa dos preceitos fixados na Constituição Federal, arvorando-se  em uma decisão da Corte Suprema para uma caso específico e que não tem – e nunca teve – a extensão pretendida pelos setores do agronegócio e da mineração. Ou seja, uma decisão questionável e ainda em discussão tomada por parte do Supremo Tribunal Federal quando julgou, caso pontual (estamos nos referindo a o julgamento concernente à terra indígena Raposa Serra do Sol ), está sendo ardilosa e fraudulentamente utilizada pelo Chefe do Poder Executivo para ludibriar, enganar e corromper princípios constitucionais claros e taxativos de modo a manietar e impedir que os direitos dos povos indígenas e quilombolas sejam efetivamente respeitados pelo Estado brasileiro, que, pela elite racista e classista que dele se apoderou, simplesmente advoga verdadeiro etnocídio.

    Esse texto não permite por sua extensão que nos aprofundemos em detalhes técnicos e legais, mas inexorável e irretorquível que o compromisso do atual governo com a maximização da exploração capitalista não tem limites – o que comprovam outras contrarreformas sociais de autoria do mesmo governo e que vêm sendo arrancadas a fórceps de um Congresso quase que totalmente comprometido com o rentismo e a exploração dos debaixo, contando com forte apoio da mídia burguesa. Para tanto valem todos os expedientes ao alcance da engenharia jurídica de corte reacionário que permeia esse ilegítimo governo, ainda que isso signifique rasgar a Constituição da República e implantar verdadeiro estado de exceção em relação a segmentos sociais vulneráveis politicamente.

    A releitura, melhor, a interpretação casuísta e absolutamente descompassada   do conteúdo do disposto nos arts. 231 e 232 da Constituição da República, assim como do art.68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, sem embargo das regras regulamentares dessas balizas constitucionais, é meio e modo de, mais do que negar, surrupiar direitos dos indígenas e quilombolas, afrontando inclusive normativas internacionais as quais aderiu o Estado brasileiro.
    O ato de chancela do (ilegítimo) Presidente da República é típico do arbítrio e atentatório aos princípios civilizatórios inscritos no Preâmbulo da Constituição de 1988. Se havia alguma dúvida sobre o desleixo com o ser humano por parte dos atuais governantes do Brasil, o ato em questão é sinal claro de que para além disso, há por parte dessa gente, o compromisso com a barbárie.

    Rio de Janeiro, 22 de julho de 2017
    Comissão de Direitos Humanos – OAB/RJ
    Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas/RS
    Conselho Indigenista Missionário – Regional Sul

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  • 21/07/2017

    Ka’apor e Gamela divulgam cartas em apoio aos Munduruku


    Mulheres Munduruku estiveram à frente da ocupação da UHE São Manoel. Foto: Juliana Rosa Pesqueira/Fórum Teles Pires

    Matéria atualizada em 24/07/2017 às 15:00

    O Conselho de Gestão Ka’apor e o povo Gamela, ambos do Maranhão, divulgaram cartas em apoio aos Munduruku que na última semana ocuparam o canteiro de obras da usina hidrelétrica (UHE) São Manoel, na divisa do Pará com o Mato Grosso. “Não pudemos esta ai, mas estamos com vocês aqui”, afirma a carta dos Ka’apor. “Os direitos nossos a gente não vende e nem negocia, a gente conquista em movimento e com luta com nossos parentes”.

    Há mais de 500 anos o projeto colonizador tem encharcado o chão sagrado com o nosso sangue, mas não conseguiu nos exterminar, manifestam-se os Gamela, vítimas recentes de um brutal ataque que deixou 22 indígenas feridos, cinco dos quais por armas de fogo. Manifestamos nossa solidariedade à luta de vocês contra a destruição dos seus rios, florestas, Lugares Sagrados. Não podemos ficar calados. Vamos pedir a força dos nossos Encantados para guiarem e protegerem vocês na luta que estão fazendo”, prosseguem.

    A ocupação iniciou na madrugada de sábado para domingo (16), e durou até quarta-feira (19), quando os indígenas seguiram para Alta Floresta, onde foram buscar as urnas funerárias que as empresas responsáveis pela construção da hidrelétrica haviam removido para a construção da obra, sem nunca devolvê-las aos Munduruku.

    “A ocupação acaba aqui, mas a luta continua. A gente não tá saindo porque tinha que sair ou porque a empresa mandou não. É porque a gente está indo atrás dessas urnas”, afirmou Kabaiwun Munduruku, uma das lideranças do movimento Ipereg Ayu.

    Os indígenas deixaram o canteiro de obras depois de uma reunião realizada com a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Ministério Público Federal (MPF) e os representantes das empresas responsáveis pelas Usinas Hidrelétricas de São Manoel e Teles Pires (leia dossiê sobre violações de direitos na construção desses empreendimentos).

    Os Munduruku exigem que a Funai dê um parecer contrário à concessão de Licença de Operação à UHE São Manoel, e também cobraram a publicação da Portaria Declaratória da Terra Indígena (TI) Sawre Muybu e a identificação e delimitação das TIs Sawre Jaybu e Sawre Apompu até outubro de 2017.

    A UHE São Manoel é uma entre cerca de 140 projetos de geração de energia previstos na bacia do Tapajós, em que pelo menos 900 mil pessoas serão impactadas, conforme destacou uma carta de organizações da sociedade civil em apoio aos Munduruku. Além da remoção das urnas funerárias, os Munduruku também denunciam a destruição da corredeiras de Sete Quedas do rio Teles Pires, um local sagrado sobre o qual foi construída a UHE Teles Pires, já em funcionamento.

    Outro aspecto denunciado pelos Munduruku é a ausência de consulta aos povos indígenas impactados a respeito da realização desses empreendimentos, conforme determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). No final de 2016, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região ordenou a realização de consulta prévia, livre e informada com os povos indígenas Kayabi, Munduruku e Apiaká atingidos pela obra da UHE Teles Pires.

    Leia as cartas de solidariedade abaixo ou acesse a carta dos Ka’apor em pdf:

    Território Indígena Alto Turiaçu – Maranhão
    Povo Ka’apor
    Jumu’e ha renda Keruhu – Centro de Formação Saberes Ka’apor
    Tuxa – Conselho de Gestão Ka’apor

    Nossos braços e nossas mãos aos parentes, guerreiros e guerreiras do Movimento Ipereg Ayu

    Parentes Munduruku. Não pudemos esta ai, mas estamos com vocês aqui. Vocês mostraram esses dias que só com mobilização e organização a gente vence. Que os direitos nossos a gente não vende e nem negocia, a gente conquista em movimento e com luta com nossos parentes.

    A gente esta acompanhando os esforços, sacrifícios e luta de vocês para chegar até essas barragens que destroem os lugares sagrados em nome do dinheiro, do lucro dos ricos para gerar energia para os ricos. Só vocês conhecem o que os espíritos dos rios e da floresta tem a dizer pra vocês. Assim nós aqui. Só nós sabemos o que os espíritos da floresta, dos rios, da terra tem pra dizer pra nós.

    Os Pariwat, os Karai nunca vão saber, entender o sentido de nossa luta, de nossa vida. Eles podem atacar e querer derrubar a nossa organização e luta, mas não vão conseguir. Por isso parente, a gente unidos, tem que continuar se reunindo, se organizando e lutando do nosso jeito pelos nossos projetos de vida. Nosso futuro não está na cidade, nem venda de madeira e estacas, nem pastos, nem roças grandes, nem agronegócio, nem garimpo, nem barragem, nem projetos do governo. Nossa floresta, nossos rios, nossa terra são sagrados para nós. O mais importante agora é nossos Planos de Vida que vão guiar nossos passos para o bem viver nos nossos territórios.

    Piranta ha johu Katu!


    Conselho de Gestão Ka’apor
    Guerreiros da Floresta Ka’apor

    Carta dos Gamela:

    Aos Guerreiros e Guerreiras Munduruku

    Guerreiras e guerreiros, acompanhamos a luta de vocês em defesa do Território Sagrado contra a violência do Estado brasileiro e das empresas/empresários que avançam com suas ações genocidas, pondo em grave risco a vida de vocês, das florestas, das águas, dos animais… e todo o planeta.

    Nós também estamos sendo atacados – o último ataque ocorreu em 30 de abril deste ano e deixou vários gravemente feridos à bala e com facões – nosso povo está ameaçado de morte por causa da luta em defesa do Território dos nossos Encantados e das nossas futuras gerações, contudo estamos de pé.

    Há mais de 500 anos o projeto colonizador tem encharcado o chão sagrado com o nosso sangue, mas não conseguiu nos exterminar. Nossos parentes semeados se tornam árvores que crescem, florescem e espalham sementes.
    Parentes, mais do que nunca precisamos fortalecer a aliança entre nós e com as comunidades quilombolas, ribeirinhos, camponeses, das periferias das cidades… para defender a vida.

    Manifestamos nossa SOLIDARIEDADE à luta de vocês contra a destruição dos seus rios, florestas, Lugares Sagrados. Não podemos ficar calados. Vamos pedir a força dos nossos Encantados para guiarem e protegerem vocês na luta que estão fazendo.

    Um abraço solidário

    Povo Akroá Gamella
    Viana (MA), 19 de julho de 2017

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  • 21/07/2017

    Temer negocia nossos direitos em troca de favores políticos, denuncia Conselho Indígena de Roraima


    Foto: Beto Barata (PR)

    Por Guilherme Cavalli, assessoria de comunicação

    Em carta direcionada ao procurador geral da república, Rodrigo Janot, Conselho Indígena de Roraima (CIR) pede que a Procuradoria Geral da República (PGR) tome “providencias necessárias e urgentes contra a efetividade de qualquer ato administrativo dos itens inconstitucionais”. O CIR denuncia a inconstitucionalidade do parecer emitido ontem (20) pela Advocacia Geral da União e assonado pelo presidente da República. O embasamento para o parecer corresponde a Ação 3388/RR, que decidiu a demarcação da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol (RR), em 2009.

    Na carta, o CIR recupera os Embargos Declaratórios do Supremo Tribunal Federal (STF) que reprova a decisão como vinculante para demais processos envolvendo demarcação de TI. “A decisão proferida na Pet 3.388/RR tem a força intelectual e persuasiva de uma decisão do Supremo Tribunal Federal, mas não é vinculante, em sentido técnico, para juízes e tribunais, quando do exame de outros processos, relativos a terras indígenas diversas; ” (fls.40-EMB.DECL.NA PETIÇÃO 3.388 RORAIMA) ”.

    Entretanto, mesmo após o julgamento dos embargos de declaração da Petição, quando os Ministros do STF definiram que “a decisão proferida em ação popular é desprovida de força vinculante, em sentido técnico” e que “os fundamentos adotados não se estendem, de forma automática, a outros processos que se discuta matéria similar”, o tema continua a gerar divergências.

    Sob embarco declaratório, permanece estabelecido que a ação envolvendo a TI Raposa Serra do Sol não é uma decisão vinculante para outros julgamentos. Contudo, o conselho representante dos nove povos de Roraima sustenta que o parecer da AGU insiste em direcionar as ações correspondentes as demarcações das terras tradicionais sob a alegação do marco temporal. “Por diversas formas, políticos anti-indígenas tentam oficializar as condicionantes do caso Raposa Serra do Sol como regras a serem efetivas. Isso está proposto tanto na Portaria 303/AGU como no texto substitutivo da PEC 215. Tais proposições visam a negação dos direitos indígenas e em especial ao direito a demarcação das terras indígenas”, comenta a nota do Conselho Indígena.

    A tese do marco temporal nega o direito originário a terra ao propor uma interpretação restritiva dos direitos indígenas e da própria decisão de 2009. Define que só poderiam ser consideradas terras tradicionais aquelas que estivessem sob posse dos indígenas na data de 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição.

    Agronegócio incide sobre os direitos das populações indígenas

    Assinado pelo consultor-geral da União substituto André Rufino do Vale, o parecer optou por teses processuais que acordam com interesses da bancada ruralista. A carta do CIR denuncia que essas ações foram direcionadas na pretensão de ajudar Michel Temer em “negociar nossos direitos indígenas com a bancada de anti-indigena em troca de favores políticos em votos decisivos nas comissões do Congresso Nacional”, analisa o texto. “Os direitos constitucionais não devem se atropelados e curvados a interesses políticos e econômicos”.

    Em um vídeo publicado pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Luiz Carlos Heinze (PP-RS) expõe a articulação da bancada ruralista com o governo de Michel Temer para paralisar as demarcações das terras indígenas. Segundo o deputado, as conversas para a emissão do parecer iniciaram há três meses. “Ainda em abril, [reunimos] com o ministro Padilha, com o ministro Osmar Serraglio e com a ministra Greice. Nós acertamos um parecer vinculante”, comenta Heize ao expor o acordo entre Casa Civil, Ministério da Justiça e Advocacia Geral da União para salvar Temer. No vídeo divulgado na última sexta-feira (14), seis dias antes da AGU divulgar o parecer, Heinze afirma que o documento assinado por Michel Temer e pelo advogado geral da união “unifica” todas as decisões do Supremo Tribunal Federal referente a demarcação das terras tradicionais.

    O fortalecimento do marco temporal como condicionante para a paralização das demarcações das TI é uma das propostas assumidas pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) para o biênio 2016-2017. Em maio de 2016, na reunião do Conselho Nacional dos Secretários de Estado de Agricultura (Conseagri), o presidente da FPA, Marcos Montes (PSD-MG), apresentou a pauta da bancada ruralista. No primeiro item  Direito de Propriedade e Segurança Jurídica destaca-se a tese: “Respeito ao marco temporal e condicionantes do STF oriundos do caso Raposa Serra do Sol (PET 3388/STF). Republicação da Portaria 303 da AGU”.

    Acesse a nota do Conselho Indígena de Roraima

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  • 21/07/2017

    MPF divulga nota pública contra retrocesso em demarcação de terras indígenas


    Foto: Leonardo Prado/Secom/PGR

    O Ministério Público Federal (MPF) se manifestou, em nota pública, contra o parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), aprovado pelo presidente Michel Temer, sobre os processos de demarcação de terras indígenas.

    Para a Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR/MPF), a posição do presidente da República demonstra que “o atual governo faz o que os antecessores já faziam: não demarca, não reconhece e não protege terras indígenas”.

    O parecer, divulgado nessa quinta-feira (19), orienta a administração federal a vincular as condicionantes estabelecidas no caso Raposa Serra do Sol para outros processos demarcatório, mesmo tendo o Supremo Tribunal Federal expressamente reconhecido que a decisão tomada na PET 3388 não é dotada de eficácia vinculante para outras terras indígenas.

    Leia a íntegra da nota pública do MPF:

    O Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, é firme desde sempre na determinação do dever do respeito às terras indígenas. A decisão no caso Raposa Serra do Sol é extraordinariamente bela e afirmativa dos direitos originários dos índios às terras de sua ocupação tradicional.

    Todo o esforço do Estado brasileiro desde então é distorcer o conteúdo da decisão do Supremo, para desobrigar-se do seu dever de proteger o direito dos índios às suas terras indígenas.

    O Supremo Tribunal Federal determina ao Estado brasileiro demarcar as terras indígenas, sem hostilizar as comunidades indígenas e respeitar a diversidade étnica e cultural. Também determina que se reconheçam aos índios os direitos às terras quando delas retirados à força e a elas impedidos de retornarem. O Supremo Tribunal Federal, nessa mesma decisão, proclamou que essa dinâmica de ocupação indígena é revelada a partir do saber antropológico posto em prática, respeitando a metodologia “propriamente antropológica”, para evidenciar o que ocupam, como ocupam e quanto ocupam, como permanecem com os laços culturais, religiosos, sociais com aqueles espaços, mesmo quando forçados a deles se retirarem.

    O Parecer 001/2017/GAB/CGU/AGU, aprovado pelo presidente Michel Temer, que pretende ter força vinculante, põe no papel o que o atual governo faz e os que antecederam já faziam: não demarcar, não reconhecer e não proteger. Deliberadamente passa ao largo dos pontos acima referidos e realça limitações definidas pelo Supremo para o caso Raposa Serra do Sol.

    Se marco temporal existe, não está em 1988, mas na continuidade da história constitucional da afirmação dos direitos territoriais indígenas, que se inicia em 1934, repetido em 1937 e 1946, ampliado em 1967 e mais ainda na EC de 1969, e densamente positivado na Constituição de 1988. Esse histórico tem ressonância na jurisprudência consolidada e reiterada do Supremo Tribunal Federal, muito embora tenha sido ignorado pelo parecer.

    O parecer tem apenas um grande mérito: traz as digitais do presidente da República e, portanto, faz dele o responsável direto da política indigenista da sua administração.

    O Supremo Tribunal Federal terá agora em agosto nova e plural oportunidade de debater vários desses temas.
    Os índios nada podem esperar da Administração. A certeza dos índios e a esperança de seu futuro estão nas mãos da Justiça! 

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  • 21/07/2017

    Nota Pública: Michel Temer violenta os direitos dos povos indígenas para tentar impedir seu próprio julgamento


    Foto: Takukam Takuikam

    O presidente Michel Temer aprovou e mandou publicar no Diário Oficial da União o parecer 001/2017 da Advocacia-Geral da União (AGU), que obriga a administração pública federal a aplicar, a todas as Terras Indígenas do país, condicionantes que o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu, em 2009, quando reconheceu a constitucionalidade da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. O parecer simula atender uma orientação do STF, mas, na verdade, os ministros da corte já se manifestaram pela não obrigatoriedade da aplicação daquelas condicionantes a outros processos de demarcação.Importante lembrar que, em 2010, quando a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) apresentou proposta de súmula vinculante sobre o tema, o STF rejeitou o pedido por entender que não seria possível editar uma súmula sobre um tema no qual ainda não havia reiteradas decisões que pudessem demonstrar a consolidação de entendimento sobre o assunto.

    A aplicação daquelas condicionantes a outras situações resulta em graves restrições aos direitos dos povos indígenas. Por exemplo, a autorização que o STF deu para a eventual instalação de infraestrutura para a defesa nacional naquela terra indígena de fronteira poderá, com o parecer da AGU, ser aplicada em qualquer outra região para desobrigar governos, concessionárias e empreiteiras a consultar previamente os povos indígenas, na abertura de estradas, instalação de hidrelétricas, linhas de transmissão de energia ou quaisquer outros empreendimentos que poderão impactar as Terras Indígenas.

    O parecer pretende institucionalizar e pautar as decisões do STF sobre a tese do “marco temporal”, que restringe o direito às terras que não estivessem ocupadas pelos povos indígenas em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Isso representa uma ampla anistia à remoção forçada de comunidades indígenas praticadas durante a ditadura militar. Decisões do próprio STF rejeitaram mandados de segurança contra demarcações fundamentados nessa tese. O parecer da AGU toma partido numa discussão que ainda está em curso na Suprema Corte para impor restrições administrativas às demarcações de Terras Indígenas e ao usufruto exclusivo dos povos indígenas sobre os recursos naturais dessas áreas.

    O parecer aprovado por Temer foi anunciado previamente pelo deputado federal ruralista Luis Carlos Heinze (PP-RS) pouco antes da votação na Câmara do pedido de autorização para que o STF julgue o presidente por corrupção passiva, deixando claro que os direitos dos povos indígenas estão sendo rifados em troca dos votos ruralistas para manter Temer no poder. Heinze é o mesmo parlamentar que, em 2013, afirmou publicamente que índios, quilombolas e gays são “tudo o que não presta”.

    As organizações signatárias manifestam o seu veemente repúdio ao parecer 001/2017 da AGU, que será denunciado em todos fóruns e instâncias competentes. Temos consciência dos inúmeros danos que estão sendo causados ao país e a todos os brasileiros na “bacia das almas” desse governo, mas pedimos o apoio dos demais movimentos sociais e da sociedade em geral contra mais esta violência.

    Solicitamos ao Ministério Público Federal (MPF) que requeira a suspensão dos efeitos do parecer da AGU, cujas proposições são consideradas inconstitucionais por juristas de renome. Solicitamos, ainda, que o STF ponha fim à manipulação das suas decisões pelo atual governo, a qual tem o objetivo de desobrigar o reconhecimento do direito constitucional dos povos indígenas sobre suas terras e impor restrições aos outros direitos desses povos.

    Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib)
    Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME)
    Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (ARPINSUDESTE)
    Articulação dos Povos Indígenas do Sul (ARPINSUL)
    Grande Assembléia do Povo Guarani (ATY GUASU)
    Comissão Guarani Yvyrupa
    Conselho do Povo Terena
    Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB)
    Articulação dos Povos Indígenas do Amapá e Norte do Pará (APOIANP)
    Associação Agroextrativista Puyanawa Barão e Ipiranga (AAPBI)
    Associação Apiwtxa Ashaninka
    Associação Brasileira de Antropologia (ABA)
    Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC)
    Associação do Povo Arara do Igarapé Humaitá (APAIH)
    Associação dos Povos Indígenas do Rio Envira (OPIRE)
    Associação dos Produtores Kaxinawa da Aldeia Paroá (APROKAP)
    Associação dos Produtores Kaxinawá da Praia do Carapanã (ASKPA)
    Associação Indígena Katxuyana, Kahiana e Tunayana (Aikatuk)
    Associação Indígena Nukini (AIN)
    Associação Nacional de Ação Indigenista-Bahia (Anai-Bahia)
    Associação Sociocultural Yawanawa (ASCY)
    Associação Terra Indígena Xingu (ATIX)
    Associação Wyty-Catë dos povos Timbira do MA e TO (Wyty-Catë)
    Centro de Trabalho Indigenista (CTI)
    Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP)
    Comissão Pró-índio do Acre (CPI-Acre)
    Conselho das Aldeias Wajãpi (APINA)
    Conselho Indígena de Roraima (CIR)
    Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
    Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN)
    Federação dos Povos Indígenas do Pará
    Federação das Organizações e Comunidades Indígenas de Médio Purus (Focimp)
    Hutukara Associação Yanomami (HAY)
    Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB)
    Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepe)
    Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN)
    Instituto Socioambiental (ISA)
    Rede de Cooperação Amazônica (RCA)
    Operação Amazônia Nativa (Opan)
    Organização dos Agricultores Kaxinawá da Colônia 27 (OAKTI)
    Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi de Pauini (Opiaj)
    Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ)
    Organização dos Professores Indígenas do Acre (OPIAC)
    Organização dos Povos Indígenas Apurina e Jamamadi de Boca do Acre Amazonas (Opiajbam)
    Organização Geral Mayuruna (OGM)

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  • 20/07/2017

    Dallari: Parecer da AGU não é vinculante. É apenas opinativo, inconstitucional e ilegal



                  Dalmo Dallari na TI Tenondé Porã. Foto: Carlos Penteado/CPI-SP

    Por Dalmo de Abreu Dallari, jurista e professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo*

    Como acaba de ser divulgado pela imprensa, os agentes do agronegócio e seus auxiliares subservientes estão montando uma farsa jurídica tendo por objetivo a espoliação das comunidades indígenas, extorquindo delas grande parte de seus direitos às terras que tradicionalmente ocupam, direitos expressa e claramente assegurados pela Constituição.

    Para dar a aparência de legalidade à invasão das áreas indígenas foi montada uma farsa, que, em resumo, seria a simulação de um parecer vinculante emitido pela Advocacia Geral da União e assinado pelo Presidente da República, restringindo os direitos dos índios às terras que concretamente ocupavam quando foi posta em vigor a Constituição de 1988. Quanto a este ponto, o simulado parecer vinculante retomaria a tese nesse sentido que foi intitulada de «marco temporal» na ação referente à reserva indígena Raposa Serra do Sol, em 2009, e até agora não confirmada por decisão do plenário do Supremo Tribunal.

    Antes de tudo, trata-se de um parecer simulado, pois não foi elaborado por solicitação do Presidente da República para esclarecer qualquer dúvida ou para orientar uma decisão. Com efeito, num video que está sendo divulgado pela Frente Parlamentar do Agronegócio o Deputado Federal Carlos Heinze, do PP do Rio Grande do Sul, integrante da bancada do Agronegócio, informa o seguinte : «Nós acertamos um parecer vinculante em decorrência do qual mais de 700 processos envolvendo a demarcação de áreas indígenas serão atingidos, suspendendo essa demarcação».

    Esse é um pormenor fundamental do ponto de vista jurídico: o Presidente da República não solicitou esse parecer e ele não é expressão de uma análise jurídica, mas de uma conjugação de interesses manifestamente ilegal. Por essas razões, o parecer que for encaminhado ao Presidente da República com a chancela da Advocacia Geral da União, como referido no site da Frente Parlamentar do Agronegócio,  não atende aos requisitos legais para ser vinculante, ou seja, para ser legalmente obrigatório.

    Quanto ao efeito vinculante de um parecer, vem muito a propósito relembrar aqui uma notável análise jurídica feita pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, no processo do Mandado de Segurança 24.631-6 do Distrito Federal, fundamentando seu voto, que foi acolhido pela Suprema Corte. O Ministro ressaltou, então, os aspectos doutrinários nestes termos : «A doutrina nacional reconhece, genericamente, a natureza meramente opinativa dos pareceres lançados nos processos administrativos» (MEIRELLES , Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, 28a. ed., São Paulo, Malheiros, 2003, p.189). E acrescenta mais adiante : «se a lei (I) não exige expressamente parecer favorável como requisito de determinado ato administrativo, ou (II) exige apenas o exame prévio por parte do órgão de assessoria jurídica, o parecer técnico-jurídico em nada vincula o ato administrativo a ser praticado, e dele não faz parte. Nesses casos, se o administrador acolhe as razões do parecer, incorpora, sim, ao seu ato administrativo, os fundamentos técnicos; mas isso não quer dizer que, com a incorporação dos seus fundamentos ao ato administrativo, o parecer perca sua autonomia de ato meramente opinativo que nem ato administrativo propriamente é, como bem define Hely Lopes Meirelles».

    Embora se esteja usando maliciosamente a expressão «parecer vinculante», pretendendo dar-lhe  o caráter de obrigação legal, o parecer emitido pela Advocacia Geral da União é apenas opinativo. Esse qualificativo não torna sem importância os pareceres nem reduz a responsabilidade dos seus emitentes, mas –este é o ponto essencial no caso em exame- ele é apenas opinativo, não é vinculante.

    Outro ponto de fundamental importância refere-se ao conteúdo do parecer. A decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no caso da área indígena Raposa Serra do Sol, não foi até agora confirmada pelo Plenário. Essa infeliz decisão restringiu os direitos das comunidades indígenas às áreas das quais detinham a posse efetiva quando da promulgação da Constituição de 1988, gerando a expressão «marco temporal». A grande demora na apreciação final pela Suprema Corte decorre, precisamente, do elevado número de questionamentos assinalando a inconstitucionalidade da restrição imposta pelo «marco temporal». Com efeito, a Constituição estabelece, enfaticamente, que as comunidades indígenas têm direito às áreas que tradicionalmente ocupam, não se admitindo, como é amplamente sustentado em obras de doutrina jurídica e já foi reafirmado em inúmeras decisões judiciais, que uma terra indígena ilegalmente invadida perca a condição de área de ocupação tradicional de uma determinada comunidade.

    Em suma, o referido parecer não se enquadra em qualquer hipótese legal para ser vinculante e ainda contém inconstitucionalidade manifesta quando adota a tese do «marco temporal». Além disso, tendo em conta o que foi divulgado pelas redes sociais, o processo de elaboração do parecer foi flagrantemente ilegal. Por todas essas razões, ele deve ser ignorado na consideração dos fundamentos jurídicos dos direitos indígenas.

    * Artigo publicado no Jornal do Brasil


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  • 20/07/2017

    Mobilização Munduruku segue para Alta Floresta (MT)


     Fotos: Caio Mota / Juliana Pesqueira

    Alta Floresta – A ocupação do canteiro de obras da Usina Hidrelétrica São Manoel feita pelo povo Munduruku e liderada pelas mulheres da etnia encerrou na noite da última quarta-feira, 19, após reunião realizada entre os indígenas, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), o Ministério Público Federal (MPF) e oa representantes das empresas responsáveis pelas Usinas Hidrelétricas de São Manoel e Teles Pires.

    As pautas de reivindicações dos indígenas foram entregues e os cerca de 200 Munduruku decidiram sair da ocupação e seguir a mobilização até a cidade de Alta Floresta (MT), onde as urnas funerárias dos seus ancestrais estão guardadas.

    Confira na íntegra o texto das reivindicações aqui.

    Há anos os indígenas reivindicam que as urnas sejam devolvidas ao povo Munduruku. Estes artefatos estavam no local sagrado da etnia, a cachoeira de ‘Sete Quedas’, e foram violados pela Companhia Hidrelétrica Teles Pires (CHTP) durante a construção da UHE Teles Pires.

    Doze urnas funerárias estão sob a posse da CHTP desde 2014.

    A procuradoria da Republica em Mato Grosso, em 2015, recomendou que as urnas deveriam ser mantidas pela CHTP até que as lideranças indígenas junto da FUNAI e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) definam um local para elas serem guardadas. Desde fevereiro de 2017, as urnas funerárias do povo Munduruku estão no Museu Histórico de Alta Floresta (MT), local para onde os indígenas que estavam no canteiro de obras da UHE Teles Pires decidiram ir.

    “A ocupação acaba aqui, mas a luta continua. A gente não ta saindo porque tinha que sair ou porque a empresa mandou não. É porque a gente está indo atrás dessas urnas”, afirmou Kabaiwun Munduruku, uma das lideranças do movimento Ipereg Ayu.

    Mobilização

    Há dois meses as mulheres Munduruku iniciaram uma mobilização na aldeia Santa Cruz que reuniu lideranças, caciques, pajés e crianças para reivindicar, entre outras coisas, o respeito aos locais sagrados do povo Munduruku e aos direitos indígenas que vem sendo violados pelas construções de Usinas Hidrelétricas na bacia do Tapajós.

    A mobilização chegou ao canteiro de obras da UHE São Manoel na madrugada do dia 16. Durante os 4 dias de ocupação as obras permaneceram paradas.

    A UHE São Manoel está em fase final de construção e o processo para ter a Licença de Operação está em análise no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA).

    Veja também:
    Povo Munduruku reivindica direitos em hidrelétrica.
    Mulheres pautam ocupação em hidrelétrica



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  • 20/07/2017

    Temer ataca direitos indígenas para tentar se livrar de denúncia no Congresso


    Temer participa de reunião com a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), braço institucional da bancada ruralista. Foto: Beto Barata/PR

    Por Oswaldo Braga de Souza, no site do ISA

    O governo federal adotou uma orientação que restringe drasticamente os direitos indígenas à terra. O presidente Michel Temer aprovou um parecer da Advocacia-Geral da União que obriga toda a administração federal a incorporar elementos da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o caso da Terra Indígena (TI) Raposa-Serra do Sol (RR), de 2009.

    Na prática, grande parte dos processos de demarcação de TIs poderá ser revista e, em consequência, paralisada de vez. Em pouco mais de um ano de gestão, Michel Temer não assinou nenhum decreto de homologação e seus ministros da Justiça não publicaram nenhuma portaria declaratória de TI – as principais etapas do complexo procedimento de demarcação. Assim, o governo Temer poderá passar à história como o que menos reconheceu essas áreas desde a Redemocratização.

    Entre outros pontos, o parecer proíbe a ampliação de TIs e estabelece que órgãos como a Fundação Nacional do Índio (Funai) devem considerar que só têm direito à terra as comunidades indígenas que estavam na posse de seu território em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição – o chamado “marco temporal”. A tese é polêmica por minimizar o histórico de expulsões e violências sofridas por inúmeros grupos indígenas. Se ela prevalecer, um povo indígena que tiver sido retirado de suas terras à força e não conseguir comprovar isso não poderá reivindicar seu território.

    A nova orientação era defendida há anos pela bancada ruralista e sua adoção faz parte da ofensiva de Michel Temer para impedir que o Congresso autorize o andamento da denúncia por corrupção feita pela Procuradoria-Geral da República. Temer acabou rifando os direitos territoriais indígenas em troca dos votos ruralistas. A votação da autorização para que a denúncia contra o presidente vá ao STF deve ocorrer no plenário da Câmara, na volta do recesso parlamentar, em agosto.

    A assessoria da Funai informou que o presidente da instituição não poderia se manifestar sobre o parecer da AGU por estar em viagem ao Pará.

    Processos em andamento

    Conforme nota da AGU, as determinações contidas no parecer deverá ser aplicadas aos “processos de demarcação em andamento”. O texto afirma que a nova orientação “não inova na ordem jurídica, mas apenas internaliza para a administração pública um entendimento há muito consolidado pelo Supremo Tribunal Federal”. A justificativa da medida seria “uniformizar entendimentos e diminuir conflitos sociais e fundiários em todo o país” (leia a íntegra da nota da AGU).

    A advogada do ISA Juliana de Paula Batista explica que o governo tomou a decisão política de impor a todos os seus órgãos uma interpretação que é a mais restritiva possível do direito indígena à terra, contida em uma única decisão que, além disso, não deve ser aplicada obrigatoriamente em outros julgamentos segundo o STF.

    “Não podemos dizer que a decisão do caso Raposa Serra do Sol represente um ‘entendimento consolidado’ do STF porque esse julgamento trata de um único caso concreto que não tem efeito vinculante”, afirma. “Quando se trata de direitos fundamentais, como é o caso do direito dos índios à terra, a interpretação deve ser sempre a mais favorável à proteção das minorias, principalmente quando se considera o processo histórico de violências e vulnerabilidades enfrentado pelos povos indígenas”, argumenta.

    “O que diminui os conflitos no campo é a demarcação das Terras Indígenas. Ao contrário, o que causa conflitos é a mensagem do Poder Executivo e do Congresso de que é possível mitigar os direitos constitucionais dos povos indígenas. Essa é uma mensagem clara de um presidente que pretende se manter no cargo a qualquer preço, inclusive anistiando a grilagem de terras, a invasão de Unidades de Conservação e os desrespeito dos direitos dos povos historicamente violentados”, ressalta a advogada.

    O parecer da AGU determina ainda que a política de Defesa Nacional, a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal, a instalação de equipamentos públicos, redes de comunicação e vias de transporte devem se sobrepor ao usufruto dos índios sobre suas terras. Na prática, isso quer dizer que as comunidades indígenas não precisam ser consultadas sobre ações desses órgãos e projetos como esses que ocorram em seu território.

    “Essa medida é uma forma de negar o usufruto exclusivo dos índios sobre suas terras definido na Constituição e o direito à consulta livre, prévia e informada prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho”, pondera Juliana de Paula.

    Orientação antecipada

    Em 2012, o então advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, publicou a Portaria 303, que incorporava as condicionantes estabelecidas na decisão da TI Raposa-Serra do Sol. Depois de protestos dos povos indígenas, no entanto, ele suspendeu a norma. A medida adotada agora por Temer é ainda mais grave porque deve ser cumprida por todos os órgãos federais, enquanto a Portaria 303 deveria ser obedecida apenas por aqueles subordinados à AGU, como as procuradorias e consultorias jurídicas dos ministérios e dos órgãos a eles vinculados aos ministérios.

    A nova orientação foi antecipada pelo deputado ruralista Luiz Carlos Heinze (PP-RS), um dos mais ferrenhos defensores de Michel Temer. Em um vídeo que circulou nas redes sociais, ele informa que o parecer da AGU foi acertado em uma reunião, em abril, com o então ministro da Justiça e também deputado ruralista, Osmar Serraglio, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, a advogada-geral da União, Grace Maria Fernandes Mendonça, e o assessor da Casa Civil Renato Vieira. O encontro faria parte de uma série de negociações envolvendo também o ex-ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, e o titular atual da pasta, Torquato Jardim.

    No vídeo, Heinze diz que, a partir da adoção do parecer, todos os processos de demarcação de TIs em andamento serão revisados. “Na minha avaliação, mais de 90% dos processos que tem no Brasil são ilegais e serão arquivados”, aposta o parlamentar (veja o vídeo abaixo).

    O deputado é o mesmo que, em outro vídeo, gravado em 2013, em Vicente Dutra (RS), diz que índios, quilombolas, gays e lésbicas são “tudo o que não presta”. Na mesma gravação, ele e o também deputado ruralista Alceu Moreira (PMDB-RS) estimulam produtores rurais a contratar segurança privada para proteger suas propriedades e expulsar índios das terras que consideram como suas (veja vídeo abaixo).

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  • 19/07/2017

    VII Conferência da Via Campesina: Camponeses de 70 países se reúnem no país Basco


    Por Coletivo de Comunicação Via Campesina l Tradução: Cristiane Passos – CPT Nacional

    “Alimentamos nossos povos e construímos um movimento para mudar o mundo!”. Com esse lema, a VII Conferência Internacional da Via Campesina, o maior movimento camponês do mundo, teve início hoje (19), em Derio, País Basco, e seguirá até o dia 24. Cerca de 450 movimentos camponeses, representantes de todas as partes do mundo, se reúnem para continuar a luta contra o capitalismo e propor medidas concretas para construir um mundo alternativo, baseado na dignidade e na Soberania Alimentar.

    Esta Conferência, que é realizada a cada quatro anos, é um encontro único e vibrante dos movimentos camponeses e o espaço mais importante e significativo de tomada de decisões da Via Campesina.

    “É único porque somos um movimento que é tão diverso e mesmo assim unido em nossas lutas. Somos as pessoas que trabalham na terra e que alimentam o mundo, mas nossos territórios estão sofrendo ataques constantes. Enfrentamos, também, um processo de criminalização crescente. Esta Conferência é um passo a frente na internacionalização das nossas lutas, criando estratégias para frear os poderes do capitalismo global e construir um movimento para a mudança”, afirmou Elizabeth Mpofu, camponesa do Zimbábue e coordenadora geral da Via Campesina.

    “A Via Campesina continua crescendo. Atualmente temos umas 200 organizações. Somos um modelo político internacional”, disse Unai Aranguren, representante europeu do comitê de Coordenação Internacional da Via Campesina.

    A VII Conferência Internacional foi precedida pela IV Assembleia Internacional de Jovens (16 a 17 de julho) e pela V Assembleia Internacional de Mulheres ( 17 a 18 de julho), que proporcionou um espaço para os jovens e para as mulheres camponesas do Movimento, para discutirem os desafios que possuem e construírem propostas de luta.

    A Assembleia de Jovens refletiu sobre como são eles os mais afetados pela migração. Além da necessidade dos movimentos sociais investirem em jovens agricultores e promover a reforma agrária, que irá proporcionar o acesso e controle sobre a terra e território, estende-se também para a necessidade de formação sobre práticas agroecológicas camponesas, que hoje são mais urgente do que nunca. Os jovens também manifestaram sua solidariedade à "Marcha em Defesa da Soberania Alimentar e da Mãe Terra", organizada pelo Movimento pela Terra, em Euskal Herria.

    A Assembleia de Mulheres chamou a atenção para os crescentes casos de violência doméstica contra as mulheres, no meio rural e em todas as partes da nossa sociedade patriarcal. Elas também se comprometeram a continuar sua luta para criar um movimento de mudança, baseado no feminismo e na soberania alimentar.

    Durante os quatro dias de programação da Conferência, o movimento camponês irá refletir e debater sobre diferentes temas, como soberania alimentar, agroecologia camponesa, redes de formação independente, direitos dos migrantes, comércio, justiça climática, criminalização dos movimentos sociais e criação de alianças. Será debatido, também, o rascunho da Declaração da ONU sobre Direitos dos Camponeses e outras pessoas que trabalham em áreas rurais, uma iniciativa da Via Campesina, que já conseguiu chegar a um estágio avançado de negociações com o Conselho de Direitos Humanos da ONU. Serão definidas, também, as novas linhas estratégicas de ação do Movimento, estabelecendo o tom da luta nos próximos quatro anos, e serão dadas as boas vindas aos novos membros e lideranças.

    No domingo, dia 23, a Via Campesina, a EHNE Bizkaia (organização anfitriã e representante da articulação mundial no País Basco) e seus aliados, irão marchar com os camponeses locais a Bilbao, em solidariedade com suas lutas em defesa da terra e dos territórios, e contra os grandes projetos de infraestrutura.

    No dia 24 serão realizadas visitas de campo para todos os participantes da Conferência. Foram organizadas, também, mais visitas a áreas rurais em todo o país Basco, entre os dias 26 e 28 de julho, para alguns representantes das nove regiões onde a Via Campesina está presente.

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  • 19/07/2017

    Indígenas Kadiwéu retomam fazenda incidente em território concedido ao povo no Segundo Reinado, em 1864


    Há uma semana 120 indígenas Kadiwéu retomaram parte do território destinado ao povo em 1900 e homologado em 1984. O espaço reocupado na última quinta-feira (13) faz parte das 23 fazendas reivindicadas pelos indígenas em 2012, localizada em Porto Murtinho, pantanal do Mato Grosso do Sul. Contudo, há cinco anos a Justiça Federal sustenta uma liminar que concedeu aos pecuaristas 12 das 23 propriedades que se estendem sobre a terra historicamente destinada ao povo. A retomada desta semana reocupa uma dessas fazendas em que o detentor de título não retornou desde as primeiras ocupações, em abril de 2012.

    Para liderança indígena presente na retomada, este território, além de ser destinado aos Kadiwéu pelo governo, é de pertença aos indígenas pelas lutas travadas pelos antepassado, devido a relação estabelecida com o espaço há centenas de anos. “Nós queremos essa terra. Ela é herança deixada para nós pelos nossos antepassados. Eles lutaram por esse pedaço de chão. Viveram e foram enterrados aqui. É por isso que estamos retomando. Queremos reconquistar essa terra de volta. A terra é vida do índio e esse pedaço é nossa herança”, comenta o senhor.

    “Não queremos confronto. Mas nos preocupamos porque ficamos sabendo por um viajante que estão mandando segurança. Só queremos nossa herança. Queremos a conclusão da demarcação da  terra. Pedimos ao governo que faça a desintrusão e indenizem os fazendeiros”, comenta a liderança em entrevista por telefone. Na retomada de 2012,um historiador, um advogado e quatro lideranças indígenas foram perseguidos por cerca de 20 homens armados em seis caminhonetes. A perseguição aconteceu durante uma visita do grupo ao território dos indígenas.

    Documentos históricos comprovam que o território dos Kadiwéu foi doado a eles ainda no Segundo Império, por Dom Pedro II, como recompensa pela participação dos indígenas, ao lado do Brasil, na Guerra do Paraguai, em 1864. Com extensão de 538,5 mil hectares, a Terra Indígena Kadiwéu permanece com aproximadamente 160 mil hectares usados na pecuária por fazendeiros. A área retomada encontra-se dentro desta porcentagem, que somam 30% do espaço destinado ao povo. Relatos mencionam invasões decorrentes desde 1950. Segundo anciões do povo, tanto o Serviço de Proteção ao Índio (SPI) quanto a Funai oficializavam a ocupação territorial, arrendando a terra aos pecuaristas.

    Mesmo com as documentações, em 2012 a juíza federal Adriana Delboni Tarrico decidiu em favor dos pecuaristas, justificando que "o entendimento ora adotado não significa, de forma alguma, sinalização de quem esteja com a razão, principalmente porque não será nestes autos que a propriedade será definida, mas, sim, tão-somente a posse". A liminar concedida há cinco anos permanece para o território ocupado.
     
    O processo de demarcação, homologação e registro do território dos Kadiwéu foi finalizado pelo governo federal em 1984. Naquele ano, os pecuaristas, que se encontravam dentro dos limites da TI, ajuizaram ação para discutir a nulidade da demarcação da TI. De um total de 585 mil hectares, entrou em litígio 155 mil – registradas em nome da União, de usufruto exclusivo dos indígenas, mas ocupados por cerca de 120 fazendas de gado. Desde 1987, tramina, então, no STF, uma ação que nunca foi julgada. Também a desintrusão da área não ocorreu.

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