21/07/2017

Ka’apor e Gamela divulgam cartas em apoio aos Munduruku


Mulheres Munduruku estiveram à frente da ocupação da UHE São Manoel. Foto: Juliana Rosa Pesqueira/Fórum Teles Pires

Matéria atualizada em 24/07/2017 às 15:00

O Conselho de Gestão Ka’apor e o povo Gamela, ambos do Maranhão, divulgaram cartas em apoio aos Munduruku que na última semana ocuparam o canteiro de obras da usina hidrelétrica (UHE) São Manoel, na divisa do Pará com o Mato Grosso. “Não pudemos esta ai, mas estamos com vocês aqui”, afirma a carta dos Ka’apor. “Os direitos nossos a gente não vende e nem negocia, a gente conquista em movimento e com luta com nossos parentes”.

Há mais de 500 anos o projeto colonizador tem encharcado o chão sagrado com o nosso sangue, mas não conseguiu nos exterminar, manifestam-se os Gamela, vítimas recentes de um brutal ataque que deixou 22 indígenas feridos, cinco dos quais por armas de fogo. Manifestamos nossa solidariedade à luta de vocês contra a destruição dos seus rios, florestas, Lugares Sagrados. Não podemos ficar calados. Vamos pedir a força dos nossos Encantados para guiarem e protegerem vocês na luta que estão fazendo”, prosseguem.

A ocupação iniciou na madrugada de sábado para domingo (16), e durou até quarta-feira (19), quando os indígenas seguiram para Alta Floresta, onde foram buscar as urnas funerárias que as empresas responsáveis pela construção da hidrelétrica haviam removido para a construção da obra, sem nunca devolvê-las aos Munduruku.

“A ocupação acaba aqui, mas a luta continua. A gente não tá saindo porque tinha que sair ou porque a empresa mandou não. É porque a gente está indo atrás dessas urnas”, afirmou Kabaiwun Munduruku, uma das lideranças do movimento Ipereg Ayu.

Os indígenas deixaram o canteiro de obras depois de uma reunião realizada com a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Ministério Público Federal (MPF) e os representantes das empresas responsáveis pelas Usinas Hidrelétricas de São Manoel e Teles Pires (leia dossiê sobre violações de direitos na construção desses empreendimentos).

Os Munduruku exigem que a Funai dê um parecer contrário à concessão de Licença de Operação à UHE São Manoel, e também cobraram a publicação da Portaria Declaratória da Terra Indígena (TI) Sawre Muybu e a identificação e delimitação das TIs Sawre Jaybu e Sawre Apompu até outubro de 2017.

A UHE São Manoel é uma entre cerca de 140 projetos de geração de energia previstos na bacia do Tapajós, em que pelo menos 900 mil pessoas serão impactadas, conforme destacou uma carta de organizações da sociedade civil em apoio aos Munduruku. Além da remoção das urnas funerárias, os Munduruku também denunciam a destruição da corredeiras de Sete Quedas do rio Teles Pires, um local sagrado sobre o qual foi construída a UHE Teles Pires, já em funcionamento.

Outro aspecto denunciado pelos Munduruku é a ausência de consulta aos povos indígenas impactados a respeito da realização desses empreendimentos, conforme determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). No final de 2016, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região ordenou a realização de consulta prévia, livre e informada com os povos indígenas Kayabi, Munduruku e Apiaká atingidos pela obra da UHE Teles Pires.

Leia as cartas de solidariedade abaixo ou acesse a carta dos Ka’apor em pdf:

Território Indígena Alto Turiaçu – Maranhão
Povo Ka’apor
Jumu’e ha renda Keruhu – Centro de Formação Saberes Ka’apor
Tuxa – Conselho de Gestão Ka’apor

Nossos braços e nossas mãos aos parentes, guerreiros e guerreiras do Movimento Ipereg Ayu

Parentes Munduruku. Não pudemos esta ai, mas estamos com vocês aqui. Vocês mostraram esses dias que só com mobilização e organização a gente vence. Que os direitos nossos a gente não vende e nem negocia, a gente conquista em movimento e com luta com nossos parentes.

A gente esta acompanhando os esforços, sacrifícios e luta de vocês para chegar até essas barragens que destroem os lugares sagrados em nome do dinheiro, do lucro dos ricos para gerar energia para os ricos. Só vocês conhecem o que os espíritos dos rios e da floresta tem a dizer pra vocês. Assim nós aqui. Só nós sabemos o que os espíritos da floresta, dos rios, da terra tem pra dizer pra nós.

Os Pariwat, os Karai nunca vão saber, entender o sentido de nossa luta, de nossa vida. Eles podem atacar e querer derrubar a nossa organização e luta, mas não vão conseguir. Por isso parente, a gente unidos, tem que continuar se reunindo, se organizando e lutando do nosso jeito pelos nossos projetos de vida. Nosso futuro não está na cidade, nem venda de madeira e estacas, nem pastos, nem roças grandes, nem agronegócio, nem garimpo, nem barragem, nem projetos do governo. Nossa floresta, nossos rios, nossa terra são sagrados para nós. O mais importante agora é nossos Planos de Vida que vão guiar nossos passos para o bem viver nos nossos territórios.

Piranta ha johu Katu!


Conselho de Gestão Ka’apor
Guerreiros da Floresta Ka’apor

Carta dos Gamela:

Aos Guerreiros e Guerreiras Munduruku

Guerreiras e guerreiros, acompanhamos a luta de vocês em defesa do Território Sagrado contra a violência do Estado brasileiro e das empresas/empresários que avançam com suas ações genocidas, pondo em grave risco a vida de vocês, das florestas, das águas, dos animais… e todo o planeta.

Nós também estamos sendo atacados – o último ataque ocorreu em 30 de abril deste ano e deixou vários gravemente feridos à bala e com facões – nosso povo está ameaçado de morte por causa da luta em defesa do Território dos nossos Encantados e das nossas futuras gerações, contudo estamos de pé.

Há mais de 500 anos o projeto colonizador tem encharcado o chão sagrado com o nosso sangue, mas não conseguiu nos exterminar. Nossos parentes semeados se tornam árvores que crescem, florescem e espalham sementes.
Parentes, mais do que nunca precisamos fortalecer a aliança entre nós e com as comunidades quilombolas, ribeirinhos, camponeses, das periferias das cidades… para defender a vida.

Manifestamos nossa SOLIDARIEDADE à luta de vocês contra a destruição dos seus rios, florestas, Lugares Sagrados. Não podemos ficar calados. Vamos pedir a força dos nossos Encantados para guiarem e protegerem vocês na luta que estão fazendo.

Um abraço solidário

Povo Akroá Gamella
Viana (MA), 19 de julho de 2017

Fonte: Assessoria de Comunicação do Cimi
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