Barrados pela polícia com bombas na entrada da Funai, indígenas pedem saída do presidente Marcelo Xavier
Cerca de 800 indígenas realizavam ato em frente à sede da Funai e esperavam ser recebidos pelo presidente do órgão; lideranças denunciam truculência e atuação anti-indígena
Na tarde desta quarta-feira (16), povos indígenas foram atacados com spray de pimenta e bombas de gás lacrimogênio e de efeito moral na entrada do prédio da Fundação Nacional do Índio (Funai), em Brasília. Em nota divulgada após o ocorrido, os povos que participam da mobilização na capital federal pedem a saída do presidente do órgão, Marcelo Xavier.
“Trata-se da pior gestão da história da Fundação, que deixou de cumprir a função de proteger e promover os direitos dos povos indígenas para negociar nossas vidas e instrumentalizá-la em prol de interesses escusos e particulares do agronegócio, da garimpo ilegal e de outras tantas ameaças que colocam em risco a nossa existência”, afirma a carta dos povos indígenas.
São cerca de 800 indígenas de 40 povos e de todas as regiões do país que participam da mobilização em Brasília, intitulada “Levante Pela Terra”. A carta que pede a saída de Marcelo Xavier, que chegou ao cargo indicado pela bancada ruralista, é assinada em nome da mobilização.
Desde a semana passada, os povos indígenas manifestam-se em defesa de seus direitos constitucionais e contra medidas anti-indígenas como o Projeto de Lei (PL) 490/2007, que corre risco de ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJC) da Câmara dos Deputados.
Ontem (15), Marcelo Xavier reuniu-se com a presidente da CCJC, Bia Kicis (PSL-DF), para defender o projeto. Apesar das contínuas manifestações dos povos indígenas contra o PL 490 há mais de uma semana em Brasília presidente não ouviu a posição das lideranças sobre o tema.
Os indígenas denunciam diversas medidas contrárias aos seus direitos tomadas pela Funai sob o governo Bolsonaro, visando facilitar a exploração de seus territórios por não indígenas, permitir a certificação de propriedades privadas sobre terras não homologadas, como a Instrução Normativa nº 09, e diminuir a proteção e a assistência a comunidades em luta por demarcação.
Além disso, os povos também denunciam as diversas ações de intimidação e criminalização de lideranças e organizações indígenas. Nos últimos meses, a Funai denunciou indígenas críticos ao governo Bolsonaro e provocou inquéritos para que fosse investigada a ocorrência de “difamação” contra o governo.
Barrados e atacados com bombas
O ataque de policiais ocorreu logo após os cerca de 800 indígenas chegarem ao prédio onde fica a sede nacional da Funai. Na chegada, encontraram as entradas bloqueadas por grande contingente policial.
As lideranças esperavam ser recebidas pelo presidente do órgão indigenista, mas não foram ouvidas – e também foram impedidas pelos policiais de realizarem falas em um carro de som, localizado numa rua oposta ao prédio. O clima ficou ainda mais tenso, e os indígenas logo foram supreendidos pela tropa de choque, que já chegou atirando bombas.
Depois do conflito, ainda cercados pelo contingente policial, lideranças indígenas realizaram uma coletiva de imprensa em frente à Funai, na qual reforçaram o pedido para que Marcelo Xavier deixe o cargo.
Leia a carta na íntegra:
CARTA PÚBLICA DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL SOBRE A FUNAI
Nós, povos indígenas reunidos no Levante Pela Terra, em Brasília, estamos mobilizados há mais de 10 dias contra a agenda anti-indígena que tramita nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, colocando em risco a vida de todos os povos indígenas.
Ainda sob as restrições da pandemia e com maioria de nós vacinados – vacinação que só aconteceu com muita luta do movimento indígena, reunimos mais de 1 mil indígenas de todas as regiões do Brasil e afirmamos: o delegado Marcelo Xavier não é mais o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai)!
Trata-se da pior gestão da história da Fundação, que deixou de cumprir a função de proteger e promover os direitos dos povos indígenas para negociar nossas vidas e instrumentalizá-la em prol de interesses escusos e particulares do agronegócio, da garimpo ilegal e de outras tantas ameaças que colocam em risco a nossa existência.
Um delegado que transformou a Funai na “Fundação da INTIMIDAÇÃO do Índio”, órgão que, hoje, mais se parece com uma delegacia política que persegue e criminaliza lideranças. Edita atos administrativos anti-indígenas, como a Instrução Normativa nº 09 e outras, negocia medidas no Congresso Nacional, a exemplo do lobby que ele apresentou aos inimigos dos povos indígenas na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, pedindo – pasmem! – a aprovação do PL 490.
O PL 490 na prática acaba com a política de demarcação de terras indígenas no país, abrindo possibilidade inclusive de revisão de terras já demarcadas.
Chega de tantos absurdos.
Fora Marcelo Xavier.
Levante pela Terra
Brasília – DF, 16 de junho de 2021