Assessoria Jurídica do Cimi aponta inconstitucionalidade de projeto que permite passagem de linhas de energia em terras indígenas
Proposta inconstitucional confere ao presidente da República a prerrogativa de dizer quais terras indígenas são de relevante interesse público para passagem de linhões, sem participação do Congresso
A Assessoria Jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) produziu uma nota técnica a respeito do Projeto de Lei Complementar (PLP) 275/2019, que trata da passagem de linhas de energia elétrica em terras indígenas. O projeto foi aprovado pelo Senado Federal no dia 4 de maio deste ano e, agora, segue para análise da Câmara dos Deputados.
De acordo com o texto do autor do projeto, o senador Chico Rodrigues (União Brasil/RR), “o § 6º do art. 231 da Constituição Federal dispõe que o relevante interesse público da União que tenha por objeto a ocupação das terras indígenas e a exploração de recursos naturais nelas existentes, deverão ser regulados por lei complementar”.
Em nota, a Assessoria Jurídica do Cimi reconhece que há a necessidade de investir na estrutura elétrica do estado de Roraima que, além de sofrer com constante instabilidade energética, é o único estado da federação que não está ligado ao Sistema Interligado Nacional (SIN). No entanto, entende-se que a matéria é inconstitucional.
“Consta notável inconstitucionalidade no texto proposto, sobretudo no que afeta aos direitos dos povos indígenas e o que é estabelecido pela Constituição Federal quanto à proteção de suas terras”, diz a nota.
É importante ressaltar, ainda, que, por meio do PLP 275/2019, o senador Chico Rodrigues pretende conferir ao Presidente da República a discricionariedade, sem a participação do Congresso Nacional, de dizer quais são as terras indígenas de relevante interesse público para a passagem de linhas de transmissão de energia elétrica.
Na avaliação dos advogados do Cimi, essa previsão de delegação da regulamentação para o Presidente da República é “oca, padecendo de evidente inconstitucionalidade a proposição legislativa, pois cria uma competência inexistente para o Presidente da República e abrevia o rito democrático para incidir em terras protegidas pela Constituição Federal”.
“Essa matéria não pode, em hipótese nenhuma, ser regida por meio de Decreto, mas tão somente mediante Lei Complementar com deliberação do Congresso Nacional, consultadas as comunidades indígenas afetadas”, completam, em nota.
Nota do Cimi
No mesmo dia em que o PLP 275/2019 foi aprovado pelo Senado Federal, o Cimi publicou uma nota pública a respeito do assunto. Para a instituição, o projeto é mais um “ataque contra os direitos dos povos indígenas do Brasil”.
“Ressaltamos que os povos indígenas são as primeiras vítimas dessa ambição ‘desenvolvimentista’ na qual afeta, diretamente, o modo de vida e a cultura dos povos. Mas eles não são as únicas vítimas desse sistema. Todas as demais populações próximas, bem como todas as formas de vida do entorno e do planeta, correm risco de serem gravemente afetadas e até mesmo extintas. Não se trata de retórica, trata-se de emergência na defesa da vida e de riscos reais, comprovados por estudos científicos”, afirmou o Cimi.
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