10/11/2020

Vitória no STF: o território é de usufruto exclusivo dos Tremembé do Engenho!

Após anos de batalhas judiciais e violações em suas terras, povo celebra decisão da Suprema Corte que suspende reintegração de posse 

Robson Tremembé: firme na luta!

Por Nanda Barreto, da Assessoria de Comunicação do Cimi

O povo Tremembé de Engenho venceu uma batalha decisiva no Supremo Tribunal Federal (STF) nos últimos dias. A vitória pelo usufruto da terra em que vivem veio depois de uma longa noite escura, de incertezas e violações, sob ataques constantes de grileiros no município de São José do Ribamar (MA) e região. “Foram anos de humilhação, ameaças e muita violência gratuita. Eu tenho 50 anos e meus pais e meus avós já nasceram aqui, não tem como dizer que esta terra não é nossa”, sustenta João Tremembé, do Conselho Indígena do povo. 

O advogado Rafael Modesto, assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), atuou no caso. Para ele, a decisão do presidente do STF, Luiz Fux, que suspendeu a decisão de reintegração de posse contra os Tremembé do Engenho dada pela justiça comum estadual do Maranhão, garante a segurança jurídica ao povo. “Da mesma forma, a decisão permite que os indígenas mantenham a posse de uma área, embora pequena, mas que é de onde retiram a subsistência física e cultural”.

Povo Tremembé roga pelo direito ao bem viver das próximas gerações | Foto: povo

“É triste ver que eles acabaram com o Rio Pindaí, que era onde a gente pescava, bebia, banhava e lavava roupa. Hoje eles jogam esgoto direto na água e o Rio está impróprio para tudo”

Atualmente, o território abriga cerca de 50 famílias em 74 hectares. Zé Domingos Tremembé lembra que a área já foi muito maior. “Isso era grande pra perder de vista, mas eles foram roubando a terra, dizendo que era deles e loteando tudo”, lamenta. Ana Tremembé destaca uma das consequências mais devastadoras desta usurpação sobre o meio ambiente. “É triste ver que eles acabaram com o Rio Pindaí, que era onde a gente pescava, bebia, banhava e lavava roupa. Hoje eles jogam esgoto direto na água e o Rio está impróprio para tudo”. 

Violações constantes
João conta que nos últimos anos, eles viveram verdadeiras provas de fogo, enfrentando 9 pedidos de reintegração de posse sobre seu território desde 2012. “Tivemos muitas invasões, algumas bem tristes, com a destruição das nossas casas, derrubada de árvores sagradas e plantios. Cada vez que eles vem, levamos meses até nos recuperar. Nós ainda estamos sem estrutura de moradia, porque preferimos retomar primeiro as plantações, que é de onde a gente tira o sustento”. (O Cimi noticiou estas invasões nos dois últimos anos. Leia aqui: 2018 e 2019).

Em 2018, tratores devastaram todas as marcas da ocupação tradicional do povo Tremembé de Engenho. Foto: Ana Mendes/Cimi

De agora em diante, explica Rafael, os Tremembé têm as condições jurídicas necessárias para a garantia de que não serem expulsos de suas terras. “Eles também foram reconhecidos no Supremo como legitimados, como povo indígena. Todas as ações que envolvem o povo devem tramitar na justiça federal, nunca na justiça comum estadual”, detalha  o advogado, acrescentando que com a decisão do STF, todas as decisões negativas contra o povo em outros âmbitos da justiça, devem ser anuladas.

Nesse sentido, Rafael reitera que a Fundação Nacional do Índio (Funai) tem a obrigação de dar sequência ao processo administrativo de demarcação. “Para tanto, os indígenas têm o direito de participar, por meio de advogados, de todos os processos nos quais são afetados e pedir o que é de direito, como determinou o STF”, assegura.

Neste vídeo, o advogado comenta as consequências positivas da vitória conquistada no STF:

Celebrar é preciso
Depois de tantos conflitos e violações, não é à toa que os Tremembé passaram os últimos dias celebrando a vitória. “Estamos aqui, com a força da nossa cultura, rituais e cânticos. Nós estamos agradecidos aos parceiros que estiveram do nosso lado. Estamos acendendo velas, rezando pros encantados, orixás e Tupã para festejar a justiça e proteger a mãe Terra e cada um de nós”, afirma Robson Tremembé. 

“Estamos acendendo velas, rezando pros encantados, orixás e Tupã para festejar a justiça e proteger a mãe Terra e cada um de nós”

Ele conta que houve momentos de quase perder a esperança. No entanto, a raiz profunda da ancestralidade os manteve firmes. “Aqui é onde somos, é nossa identidade. O território que a gente vivia antes era muito grande mesmo, mas foram reduzindo. Agora temos esta pequena parte para viver, mas isso é nosso tudo”, sustenta Robson, salientando que as rezas também são direcionadas contra o fantasma do marco temporal. 

Share this:
Tags: