24/06/2020

Cimi manifesta preocupação e repúdio ao PLC 17/2020, em tramitação no estado de Mato Grosso

Para entidade, projeto do governo estadual busca legalizar a invasão das terras indígenas e legitima a violência contra os povos originários

Povo Bororo, Terra Indígena Jarudore. Foto: Mary Picanço/Cimi

Povo Bororo, Terra Indígena Jarudore. Foto: Mary Picanço/Cimi

Por Assessoria de Comunicação do Cimi

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) encaminhou nesta quarta-feira (24) uma manifestação ao presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, Eduardo Botelho (DEM), pedindo o arquivamento do Projeto de Lei Complementar (PLC) 17/2020.

O projeto, de autoria do governador estadual, Mauro Mendes (DEM), propõe autorizar o registro do Cadastro Ambiental Rural (CAR) de fazendas sobrepostas a terras indígenas com demarcação em fase de estudo, delimitadas ou declaradas em Mato Grosso.

No dia 17 de junho, apesar dos apelos de diversas organizações e entidades, a Assembleia Legislativa de MT aprovou o projeto no primeiro turno da votação, realizada em sessão virtual. Com treze votos a favor, dois contra e seis abstenções, a proposta ainda precisa passar pela votação em segundo turno.

Para o Cimi, ao desconsiderar as terras reivindicadas pelos povos com processos inconclusos, “o PLC 17/2020 legitima a violência e históricos processos de expulsão que levaram alguns povos a não estar na plena posse de seus territórios tradicionais”.

A manifestação salienta que o projeto pode afetar pelo menos cinquenta e duas terras que são reivindicadas pelos povos indígenas no estado de Mato Grosso e ainda aguardam sua demarcação, “além de abrir brechas, inclusive, para a validação de CAR em territórios já regularizados e homologados, o que significaria impactos sobre pelo menos 116 territórios”.

Confira, abaixo, a íntegra da manifestação:

Manifestação de repúdio ao Projeto de Lei Complementar 17/2020

 

“A visão consumista do ser humano, incentivada pelos mecanismos da economia globalizada atual, tende a homogeneizar as culturas e a debilitar a imensa variedade cultural, que é um tesouro da humanidade. Por isso, pretender resolver todas as dificuldades através de normativas uniformes ou por intervenções técnicas, leva a negligenciar a complexidade das problemáticas locais, que requerem a participação ativa dos habitantes”. (Laudato Si, 144)

Ao Sr. Deputado Eduardo Botelho
Presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso

O Conselho Indigenista Missionário – Cimi, vem através desta manifestar sua preocupação e repúdio ao Projeto de Lei Complementar número 17/2020, em tramitação na Assembleia Legislativa de Mato Grosso. Tal PLC autoriza o registro do Cadastro Ambiental Rural (CAR) de propriedades em sobreposição a terras indígenas no estado, potencializando antigos e não solucionados conflitos que vitimam os povos deste estado. Se aprovado, o Projeto de Lei poderá afetar diretamente pelo menos cinquenta e duas terras reivindicadas pelos povos indígenas de Mato Grosso que apresentam pendências para a finalização do processo demarcatório pela Fundação Nacional do Índio (Funai), além de abrir brechas, inclusive, para a validação de CAR em territórios já regularizados e homologados o que significaria impactos sobre pelo menos 116 territórios.

Na manifestação de diversos ministros do Supremo Tribunal Federal – STF, evidencia-se que, ao tratar de direito originário, a Constituição Federal reconhece que os direitos dos povos indígenas sobre seus territórios “independem da conclusão do procedimento administrativo”. Ao desconsiderar as terras reivindicadas pelos povos com processos inconclusos, portanto, o PLC 17/2020 legitima a violência e históricos processos de expulsão que levaram alguns povos a não estar na plena posse de seus territórios tradicionais.

Lembremos que o governo federal vem buscando implementar o retrocesso no que tange ao direito originário dos povos indígenas aos seus territórios. Para isso, utilizou a Instrução Normativa 09/2020, que visa legalizar a invasão das terras indígenas, ao passo que os processos de demarcação seguem paralisados. O PLC 17/2020 está em plena sintonia com tal ação inconstitucional da presidência da Funai que com características de improbidade administrativa, busca atender expressamente aos ruralistas, mineradores, garimpeiros e outros históricos invasores dos territórios indígenas.

É importante ainda reafirmar que artigo 231 da Constituição Federal, que lastreia o direito originário dos povos, afirma sua inalienabilidade e imprescritibilidade e que o Artigo 20, XI, da mesma Carta Magna, elenca as terras indígenas enquanto bens da União, o que fundamenta não estar na alçada do estado de Mato Grosso a discussão de tal matéria.

Postos estes elementos e nos somando às vozes dos povos indígenas, organizações indigenistas, ambientalistas e outras organizações da sociedade civil deste estado, instamos pelo arquivamento imediato do Projeto de Lei 17/2020 e que, em sua esfera, o governo estadual e esta Assembleia Legislativa assegurem as ações que garantam o pleno direitos dos povos indígenas aos seus territórios além de sua efetiva proteção.

Atenciosamente,

Dom Roque Paloschi
Presidente do Cimi
Arcebispo de Porto Velho

Ir. Lúcia Gianesini
Vice-Presidente

Antônio Eduardo C. Oliveira
Secretário Executivo

Cléber Buzatto
Secretário Adjunto

 

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