• 21/07/2009

    Lula debate com índios e bispo do Xingu impactos da hidrelétrica de Belo Monte (PA)

    Amanhã, 22 de julho, a partir das 10h, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva receberá indígenas, ribeirinhos, Procuradores da República, o bispo da Prelazia do Xingu (Pará) e presidente do Cimi, Dom Erwin Kraütler, e o professor Célio Bermann, do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo. A comitiva falará sobre os graves e irreversíveis impactos negativos que podem ser causados pela construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, Pará.


     


    Na avaliação de pesquisadores e dos movimentos sociais locais a hidrelétrica de Belo Monte pode gerar prejuízos sócio ambientais comparáveis aos danos causados pela hidrelétrica de Balbina, construída na década de 1980 no Amazonas, que afetou a vida de milhares de pessoas e provocou um desastre ambiental. As comunidades ameaçadas pela hidrelétrica de Belo Monte apontam falhas na avaliação dos impactos econômicos, ambientais, culturais e sociais. Além disso, ressaltam que, para gerar a energia projetada, seria indispensável a construção de outras hidrelétricas no rio Xingu – o que não está sendo dito pelos empreendedores.


     


    O Ministério Público Federal no Pará (MPF-PA) acompanha há décadas os impasses sobre a construção da hidrelétrica e os impactos já causados, como o aumento de migrantes na região de Altamira (PA). No fim de junho, o MPF-PA ingressou com uma ação por improbidade administrativa na Justiça Federal contra o funcionário do Ibama que aceitou os Estudos de Impacto Ambiental (EIA), apesar de técnicos do Instituto atestarem que o EIA estava incompleto. Anteriormente, o MPF-PA questionou o convênio para a realização desses estudos, pois foram feitos por empreiteiras interessadas na construção da hidrelétrica. Outra ação do MPF-PA requer a revogação da licença ambiental, pois os indígenas afetados não foram ouvidos, como determina a legislação.


     


    Também participarão da reunião o ministro em exercício de Minas e Energia, Mário Zimmermann; um representante do ministério do Meio Ambiente; o presidente em exercício da Eletrobrás, Valter Cardeal; o presidente da Eletronorte, Jorge Nassar Palmeira; o presidente em exercício do Ibama; e o presidente da Funai, Márcio Meira.


     


    Após a reunião, os integrantes da comitiva do Xingu poderão falar com a imprensa.


     


    A reunião acontecerá no Centro Cultural Banco do Brasil (SCES – Trecho 02 – Conjunto 22 – Brasília), onde está a sede da Presidência da República.


     


    Integrantes da Comitiva:


    Dom Erwin Krautler (Bispo da Prelazia do Xingu e presidente do Cimi)


    Antônia Melo da Silva (ribeirinha – Altamira)


    Lucimar Barros da Silva (agricultor – Altamira)


    Idalino Nunes de Assis (agricultor – Altamira)


    Ozimar Pereira Juruna (indígena Juruna)


    José Carlos Ferreira da Costa (indígena Arara)


    Rodrigo Timóteo Costa e Silva (Procurador – MPF-PA – Altamira)


    Felício Pontes (Procurador – MPF – PA – Belém)


    Célio Bermann (Professor IEE – USP)

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  • 21/07/2009

    Curso de formação de professores Kaiowa-Guarani completa 10 anos no MS

    Esta semana completa 10 anos o curso “Ára Verá ”, que é voltado para os kaiowa-Guarani e é pioneiro na formação especifica e diferenciada de profissionais em educação. O curso é desenvolvido na região de Dourados, Mato Grosso do Sul. “Ára Verá” que significa “Tempo, Espaço Iluminado”; um longo sonho dos indígenas e seus aliados que trabalham na área da educação, entre eles a ex-missionária do CIMI Veronise Rossato Lobato.


     


    O curso é organizado pelo Centro de Formação de Professores Indígenas de Mato Grosso do Sul, dependente da Secretaria do Estado de Educação. Dentre as novidades para garantir o curso há a troca de apoio entre a Secretaria do Estado de Educação e a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e o apoio fundamental de professores universitários que voluntariamente dedicam suas horas livres para dar aulas aos estudantes indígenas.


     


    Segundo a professora Maria Leda Vieira de Sousa o objetivo do curso é “formar professores em nível médio que estejam depois habilitados para exercer a docência no ensino fundamental e educação infantil”. É também propósito do curso capacitar professores indígenas para desenvolver “ensino escolar, intercultural e bilíngüe”. O eixo norteador do curso, segundo a professora Leda, é “Tekoha, Ñe´e, e Teko”; terra, língua e cultura, em português. O ensino é dado na base da pesquisa e tem duas etapas: a presencial que se realiza nos períodos de férias e a intermediária que se realiza nas aldeias até onde os professores se deslocam para atender os alunos em seus lugares de trabalho.


     


    Sonho feito realidade


    Segundo relatos, a história do curso começou com os pioneiros “indo de aldeia a aldeia” com o objetivo de ensinar a ler, até que algumas pessoas, entre elas o deputado Pedro Kemp, se sensibilizaram da necessidade de lutar por uma educação escolar que atendesse as peculiaridades culturais do povo guarani. Depois de vários Aty Guasu (grande assembléia) onde foi discutido o assunto criou-se a Escola Guaicurus para a formação de professores.


     


    No ano 1999 iniciou-se o curso Ára Verá e a primeira turma se formou em 2002. Em 2006 um total de 56 indígenas se formou como professores em educação básica e para 2010 a terceira turma se prepara para a formação com 73 educando.


     


    Comemoração


    Na próxima sexta feira 24 de julho a partir das 17h haverá um ato de comemoração pelos 10 anos do curso Ára Verá na BR 163, Posto da Capela, Dourados/MS. Entre outras atividades serão apresentados e batizados os cadernos e mapas guarani que fazem parte de uma publicação que “é uma introdução ao mundo dos guarani de hoje na região das fronteiras entre Brasil, Argentina e Paraguai”.

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  • 20/07/2009

    O Pastor dos pobres partiu cumprindo sua Missão


    No dia 16 de julho de 2009, às 13:30h, no hospital Madre Tereza, em Belo Horizonte (MG),  partiu para a eternidade o ex-bispo da diocese de Itabuna e arcebispo emérito de Diamantina (MG), dom Paulo Lopes de Faria, 78, vítima de câncer. Dom Paulo estava internado desde o dia 29 de junho e, na semana anterior tinha feito uma cirurgia para a retirada de um tumor maligno. O corpo de dom Paulo foi velado no Bairro das Indústrias, em Belo Horizonte, e também em Diamantina, na Basílica do Sagrado Coração. E o seu sepultamento ocorreu no dia 18, na Catedral Metropolitana, na cripta da catedral.

     


    O período em que Dom Paulo exerceu o bispado na diocese de Itabuna foi de 21 de dezembro de 1983 a 2 de agosto de 1995. No sul da Bahia, teve uma atuação destacada e inseriu a Igreja Católica em grandes ações sociais. A luta pelos direitos humanos o fez travar uma queda-de-braço homérica com o ex-delegado regional da época, Marcos Ludovico. Em relação aos povos indígenas destacam-se sua posição incondicional de apoio à luta dos Pataxó Hã-Hã-Hãe e o carinho com que tratava as lideranças indígenas. Para os Pataxó Hã-Hã-Hãe mesmo estando longe da Diocese de Itabuna a partida de Dom Paulo foi sentida com muita comoção, em especial pelos mais velhos que tiveram a oportunidade de conviver de perto com o Bispo.


     


    O jornalista Daniel Thame em seu blog (http://www.danielthame.blogspot.com/) traduz com muita fidelidade um perfil de Dom Paulo e a sua forte ligação com as Pastorais Sociais da Diocese de Itabuna em especial com Conselho Indigenista Missionário e a Comissão Pastoral da Terra. O Artigo do Daniel se intitula: “Enfim, perto de Deus”. Dom Paulo Lopes de Faria, o bispo dos humildes, o pastor dos pobres, o ser humano especial que teve participação ativa em todos os movimentos sociais de Itabuna durante mais de uma década; enfim encontrou o seu lugar no mundo. Melhor, o seu lugar na eternidade.


     


    De Dom Paulo pode se escrever, sem parecer piegas, que cumpriu sua missão terrena e agora está ao lado de Deus, lugar destinado às pessoas de bem. E junto de Deus, certamente Dom Paulo continuará zelando pelos mais humildes, que foram a sua razão de viver.


     


    Em Itabuna, a presença de Dom Paulo coincidiu com a eclosão de uma das piores crises, senão a pior, já enfrentada pela Região Cacaueira. Uma crise que jogou centenas de milhares de pessoas na mais absoluta miséria e que formou um imenso bolsão de miséria na periferia de Itabuna. Foi essa gente humilde, desassistida e à mercê de administradores mais preocupados com obras faraônicas do que com investimentos em infra-estrutura e investimentos em programas sociais, que Dom Paulo defendeu, conciliando sua missão de pastor de almas com uma presença marcante nos movimentos sociais.


     


    Dom Paulo não teve medo de enfrentar os poderosos e nem se curvou às inúmeras pressões (vindas de fora e também de dentro da Igreja) para limitar sua atuação à função religiosa. Foi um religioso do seu tempo, num tempo em que à Igreja não cabia apenas oferecer o reino dos céus e o conforto espiritual, mas também o apoio a uma vida digna aqui mesmo na terra.


     


    Não é apenas coincidência o fato de que em seu período de bispado em Itabuna ter se dado no momento em que houve um sopro de renovação na política e o fortalecimento dos movimentos sociais. Não é sua culpa que esse processo tenha se arrefecido. O bom pastor pode até ensinar o caminho, mas não pode evitar que se desvie dele.


     


    Dom Paulo, obviamente, está longe de ser uma unanimidade em Itabuna. Nem isso seria possível para alguém com seu perfil. Mas é, sem sombra de dúvidas, uma das mais fascinantes personalidades de uma cidade que, prestes a completar seu primeiro centenário, está por lhe devotar um merecido tributo. A celebração do primeiro centenário de Itabuna vem a calhar para essa homenagem mais do que justa a alguém que tanto lutou por justiça social”.


     


    Dom Paulo tinha como lema episcopal: “Paulo, apóstolo de Jesus Cristo”, e o foi verdadeiramente, fez crescer em muito a Igreja na Diocese, seu amor e carinho por Jesus nas figuras dos excluídos era ao mesmo tempo um gesto de caridade e encontro com Deus no “outro”. Seu testemunho, sua prática, suas lições permanecerão gravadas em nossos corações, serão constantemente retransmitidas por aqueles que continuam acreditando numa nova sociedade possível e na concretização do Reino de Deus.


     


    Obrigado por tudo e para sempre BOM PASTOR.


     


    Itabuna, 20 de julho de 2009


    Conselho Indigenista Missionário

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  • 20/07/2009

    Entre a Amazônia e o Sul – por Terezinha Weber

    A dor da partida do Gunter é muito grande… As lembranças estão presentes em nossa casa, nas fotos, nos seus diários, na Comunidade onde celebrava quando vinha nos visitar. Éramos (e somos) sua família, porto para abastecer energias, como ele dizia, partilhar a alegria das viagens, dos levantamentos e alimentar conosco o sonho de um mundo melhor possível. Mas a dor não é só nossa… Gunter não nos pertencia, não vivia com amarras. Era o amigo e companheiro de tantos missionários do Cimi; era o irmão e tio missionário, tão querido e admirado além mar; era uma luz de esperança para os povos indígenas, principalmente os mais ameaçados. O choro é de todos nós…


     


    Porém as lembranças devem nos trazer a certeza e a vontade de sermos melhores a cada dia, de não nos acomodarmos nunca. Gunter viveu com intensidade e alegria a sua Missão. Nos últimos meses realizou duas viagens, mais demoradas que nas outras vezes Parecia que tinha que aproveitar ao máximo o tempo que lhe restava para o trabalho do levantamento. Dizia para mim: “Tenho que aproveitar que temos água no Ituxi para subir bem ao alto dos igarapés…”. Quando chegou estava feliz e me falava com saudades dos tempos que trabalhávamos juntos nos Suruahá (ele, Chico e eu). “Como era bom viajar de canoa, acampar à noite, pescar um peixe, cozinhar e comer.. De certa forma revivi tudo isso na viagem pelo Ituxi. Como era bom chegar nas aldeias, aprender a língua, conviver com os índios…”. Olhando as fotos que trazia dessa última viagem dizia: “Como é linda e exuberante a natureza na Amazônia!” Quando vinha aqui em Lajeado sempre dava um jeito de visitar os Kaingang que moram aqui perto.


     


    Nestes mais de 30 anos de caminhada com os povos indígenas, Gunter sempre escrevia o seu diário. Quando foi para a UTI pediu permissão para as enfermeiras para  levar a sua agenda para que pudesse escrever. Só que não pode mais. Dizia também no quarto, em meio aos acessos de tosse: “Quando eu sair daqui quero fazer uma reflexão (e escrever) sobre o mundo de doença, hospital… Será que há um mundo melhor, possível, para quem está aqui, doente?”.


     


    Sabemos que agora ele está mais perto da gente, nos cuidando, protegendo e estimulando a nós todos para o compromisso com os povos indígenas ameaçados. Gunter lutou tanto por um mundo melhor para todos, principalmente para os povos indígenas. Nos trazia tanto carinho e alegria nas suas visitas, mas também fazia a sua itinerância pela Amazônia, nos igarapés, superando cachoeiras, nas estradas abrindo porteiras, com determinação, coragem e Fé, levando-nos no seu coração.


     


    Teresinha Weber


    Lajeado, 20 de julho de 2009

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  • 20/07/2009

    A Caminho – artigo de Egon Heck (Cimi MS)


    Enquanto se realizavam os rituais da despedida derradeira de Günter, companheiro missionário, no entardecer frio e chuvoso de mais um dia de inverno, em Lajeado, no Rio Grande do Sul, busquei entrar em sintonia com a partida e chegada, em mais uma caminhada nas dimensões da vida.


     


    A melhor maneira de fazê-lo foi percorrer, sofregamente, as pegadas registradas magistralmente, “A caminho das malocas Zuruahá”[1]. Ali, Günter revela sua profunda perspicácia e sabedoria ao retratar a vida da gente e da natureza exuberante do rio Purus,com sensibilidade de artista e alma de poeta. 


     


    Coincidentemente, o prefácio do livro é de Dom Erwin Krautler, então presidente do Cimi, em 1988, e atualmente exercendo esse mesmo serviço na entidade. Na Apresentação destaca que “Desde sua fundação, as duas entidades (Cimi e Opan) escolheram como objetivo de ação o apoio aos povos indígenas na recuperação, demarcação e garantia de suas terras, na defesa de seu direito de viverem segundo suas culturas e na reconquista do seu direito de serem eles mesmos os sujeitos de sua história, sem tutela ou paternalismo.”


     


    A obstinação em conhecer e o compromisso com a vida


     


    Günter veio ao Brasil por inspiração do Pe. João Dorstauder, missionário jesuíta, que durante décadas dedicou sua vida aos povos indígenas na diocese de Diamantino, Missão Anchieta, no Mato Grosso. Fez contatos com povos isolados e viveu até sua velhice entre os Kayabi e Apiaká, no rio dos Peixes.


     


    Günter aprendeu muito sobre a Amazônia em três décadas de andanças atentas, de olhares curiosos, de mente aberta, de perspicácia, com as ferramentas que a antropologia, a filosofia e a teologia lhe propiciaram. Ao falar dos ribeirinhos da região diz que “mesmo tendo seu curso afogado em uma única massa de violência e exploração, costuma bater o remo como homem livre, independente, sempre em busca de um convívio social alegre e festivo. Domina a dependência econômica que o leva a praticar o extrativismo suicida por mecanismos de controle contraditórios. Resistência e resignação tornam-se sinônimos” (pg.24). Em seguida afirma que “o próprio Deus não escapa incólume desse imenso Oasis alagado. Um Deus entronizado em mil reflexos de raios solares, emergindo em movimentos vacilantes, e tão amigo daquele mundo a flutuar”.  Em outra passagem afirma que “o homem interiorano é risonho e alegre, e sabe das coisas. Suas práticas de vida independem de formas socioeconômicas. Produzindo o homem constrói sua própria armadilha e, cativo, libera forças para sua existência estranha”(pg.54)


     


    Poderíamos desfilar inúmeras passagens que demonstram o olhar crítico para entender a vida que desliza nos rios e barrancas da Amazônia. Günter foi compreendendo sempre mais essa realidade e se comprometeu com ela até os últimos instantes. E foi esse ímpeto de paixão que o motivou a um permanente andar nas veredas escondidas nas imensidões da floresta e rios.


     


    Gunter amou os Suruha talvez como ninguém. Identificou-se com seu modo alegre e livre de ser, procurou entender sua história, cultura e sociedade, cheia de desafios. Lembro que a cada compreensão mais profunda de realidades constitutivas e desafiadoras, como o suicídio, ele se sentia profundamente gratificado e mais disposto a contribuir com o presente e futuro daquele povo. Longe de sentir-se ”dono” procurou também se distanciar do mesmo, dando oportunidade para que outros assumissem o compromisso com a vida e futuro dos Zuruaha.


     


    Protetor dos “povos livres”


     


    Tua ousadia em conhecer os desconhecidos, transformou tua ação e compromisso com a vida, em conseqüências contraditórias: quiseste contatar os Zuruahá para exigir respeito a seu território e vida livre, conforme os ditames de sua cultura, organização social e decisões. Lá foi a Fundação Nacional do Índio (Funai), com seus “amancios” abrindo caminhos da invasão e integração. Lutaste para que a cultura e religião Zuruaha continuassem sendo os pilares da identidade e base de projetos de vida e futuro do povo.  Pelas trilhas da invasão seguiram os missionários proselitistas do Jocum, com o propósito de converter esse povo e extirpar os hábitos que não se enquadram na visão ocidental cristã. Propuseste-te a estabelecer limites à ganância das frentes econômicas do saque dos recursos naturais, especialmente madeira, sorva, animais… Mas a marcha dos projetos de “desenvolvimento” continuam acelerados pelo Programa de Aceleração do Crescimento e seus pacotes capitalistas.


     


    Tua última luta contra ações e caminhos predatórios na Amazônia aconteceu dias antes de entrares em estado de sedação. Na Procuradoria Geral da República, em Brasília, foste deixar o grito das graves conseqüências que poderá trazer o asfaltamento da BR 193 para vários povos e comunidades indígenas em situação de isolamento voluntário. Com profundo conhecimento, como talvez nenhum outro neste momento, enumerastes dezenas de povos que sofrerão impactos destrutivos de mais um “caminho de invasão e morte”.


     


    Partiste em meio a uma enorme controvérsia carregada de preconceitos, que, generalizando a questão do infanticídio, acaba reforçando a discriminação e etnocídio contra os povos indígenas.


     


    A luta continua. Mais do que nunca, será importante o testemunho e conhecimento que deixaste e agora como intercessor e protetor da vida dos povos ameaçados.


     


    Teologia do carinho, o jeito carinhoso de ser


     


    Não era afeito a grandes debates teológicos. Tinha muito bem fundamentada teologicamente sua atitude missionária de respeito e diálogo com as religiões dos povos indígenas. Procurou entender a religião Zuruahá e outros povos do Purus, como os Apurinã, Deni, Paumari, Jarawara, Jamamadi, Juma, dentre outros. Seu primeiro trabalho foi com os Pakaa Nova, transferidos para o Xingu. A atitude de inculturação o levava a partilhar ao máximo possível a vida em diálogo respeitoso com a alteridade e valorização da cultura dos diversos povos. Fazia-o com total dedicação, com disposição impressionante.


     


    Essa atitude de respeito e diálogo também era o princípio que norteava sua convivência com os companheiros(as) de trabalho. Não era de seu feitio falar mal de ninguém. Seu jeito alegre de conviver prevalecia aos raros momentos de teimosia e mau humor.


     


    Desenvolveu e cultivou a “teologia do carinho”. Quem conviveu e partilhou mais intensamente todos esses anos de caminhada com ele pode testemunhar Mas isso o instigava e motivava na defesa de suas convicções e princípios de vida. Tinha um jeito alegre, livre e carinhoso de ser.


     


    Enfrentaste as intempéries tropicais, como as inúmeras malárias, os bandos de pium, carapanã, mutuca, mucuin e outros insetos, por alguns considerados os maiores defensores da Amazônia, pois se eles não existissem talvez ela estivesse mais devastada. Venceste picadas de cobra, arraia, mordida de escorpião e acidente de carro. Venceste a hepatite, o tifo. Porém a morte veio tão inesperada e enigmaticamente a teu encontro. Agora, protege a causa pela qual deste a vida e a nós que estaremos honrando tua memória continuando a causa.


     


    Cuxiuara, adeus


     


    O barco singra lentamente as centenas de voltas e estirões do Purus, Tapauá, Cuniuá, Pretão e outros tantos rios da bacia do rio Purus. A viagem continua. A bordo, a saudade e a lembrança. Desde a juventude e disposição inquebrantável daquela primeira viagem em 1978, até a derradeira viagem em maio de 2009, transcorreram três décadas de incontáveis viagens de barco – em especial com o Cuxiuara – de canoa, a pé, nos varadouros e picadas, enfrentando banzeiros e calmarias, furos e paranás. Tere, Chico, Astor, Cacilda…a viagem continua…Os Zuruhá precisam continuar recebendo o respeito, carinho e proteção contra as fúrias invasoras. Outros tantos povos e comunidades em situação de isolamento voluntário continuam precisando de políticas que lhes permitam viver e sobreviver em seus territórios respeitados.


     


    O melhor jeito de dizer adeus é continuar a missão de lutar pela vida e direitos dos povos indígenas. É o que certamente faremos, enquanto Prelazia de Lábrea, Cimi, Opan e outros tantos que partilhamos com Günter esse seu caminhar pela vida dos povos indígenas, em especial da Amazônia, do Purus, dos Suruaha…Contamos agora com a proteção de Günter, com quem continuaremos , com obstinação e teimosia, a exigir respeito e direitos dos povos, não do passado, mas do presente e futuro.


     


    Essa pequena homenagem ao companheiro Gunter, quero oferecer com muito carinho àqueles que partilharam mais diretamente muitos momentos da vida com ele, e de maneira muito especial a família querida, com quem dividia as alegrias, esperanças e dores – Tere, Aninha e Mateus.  Quando encontrei com ele em fevereiro, em Manaus, ele me disse com muito orgulho e brilho no olhar: “Como é bom, a gente, quanto volta cansado dessas inúmeras viagens nos rios e florestas, ter uma família para ancorar e refazer as energias…”


     


    “Novos horizontes”. Com os companheiros e companheiras Doroti, Marlene e outros membros da Opan aprendeste desde cedo as tensões e contradições de uma Amazônia que começava a ser “desbravada” e sua população e natureza profundamente agredidos. Assumiste o lado dos mais fracos, dos invadidos, dos desprezados e discriminados, especialmente os povos indígenas. A “teologia da enxada” fundamentou tuas convicções, quando terminaste a Teologia, na terra e inspiração de D. Helder Câmara. Pelo porto vieram os gaúchos, dando até o nome ao município, porém tu vieste pelo chão, com a clara intenção de colocar-se ao lado da vida e não da destruição.


     


    Ao prestar nossa homenagem a Günter, sua vida obstinadamente entregue à causa dos povos indígenas, queremos lembrar também de maneira muito especial e com muito carinho da sua família na Europa, que o acompanhou de longe, e talvez nem sempre conseguindo entender a radicalidade da dedicação de Günter aos povos indígenas e à Amazônia, ao Reino de Deus, à justiça e aos prediletos de Deus: os pobres.


     


    Em sua trajetória de solidariedade, profundo diálogo e respeito, como antropólogo e como missionário, fez inúmeros amigos por esse Brasil afora e na Europa. Colocou toda sua sensibilidade, sabedoria e conhecimentos a serviço de um mundo melhor, a partir dos mais ameaçados, os povos em situação de isolamento voluntário e de risco. O único conhecimento que não precisou usar na Amazônia foi se “brevê” de piloto de avião. Passou a maior parte de sua vida nos rios, barcos e canoas, quando não nos varadouros e picadas da floresta amazônica. Günter segue seu caminho, conosco ficará para sempre a bela lembrança de  seu testemunho .


     


    Egon Heck


    Cimi MS


    Brasília, 17 de julho de 2009


     


    Com contribuição de Terezinha Weber.








    [1] Um dos três livros escritos por Gunter sobre a vida dos Suruahá.

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  • 20/07/2009

    Protesto contra o fechamento do curso de Direito para assentados rurais na UFG

    TURMA DE DIREITO PARA ASSENTADOS E ASSENTADAS DA REFORMA AGRÁRIA E AGRICULTORES FAMILIARES –  


    TURMA EVANDRO LINS E SILVA


     


    UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS – CAMPUS GOIÁS-GO


     


    NOTA DE PROTESTO


     


    É com profundo sentimento de indignação e revolta, que vimos nos pronunciar. Por motivo da preconceituosa e frustrante decisão da Justiça Federal de Goiás, proferida no dia 15 de junho deste ano, que por meio de ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal de Goiás, movida em face do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA e da Universidade Federal de Goiás – UFG, determinou a extinção da Turma de Direito para Assentados da Reforma Agrária e Agricultores Familiares Tradicionais.


     


    Sob a alegação de desvio de finalidade no emprego dos recursos do PRONERA, e afirmando que tal fato lesa o patrimônio social, e ainda que, não existe previsão legal de tratamento diferenciado aos beneficiários da Reforma Agrária, a aludida decisão pondera de forma extremamente agressiva que, a existência de nossa turma desrespeita os princípios constitucionais da igualdade, isonomia e razoabilidade.


     


    A parceria entre UFG e INCRA, firmada oficialmente no ano de 2007, a qual deu origem a nossa turma, surgiu a partir da luta dos movimentos sociais e diversos parceiros que buscam, historicamente, a efetivação dos direitos fundamentais da classe trabalhadora – do campo e da cidade – em todo o Brasil. Baseados na necessidade, mais que urgente, de se levar educação superior em diversas áreas do conhecimento, aos trabalhadores rurais, por meio de políticas públicas que visam a superação das, históricas e tão presentes, desigualdades sociais de nosso país.


     


    No dia 17 de agosto de 2007, o Exmo. Ministro do STF, Dr. Eros Roberto Grau, proferiu a aula inaugural do nosso curso, composto por 60 alunos advindos do meio rural e, originários de 19 estados da federação brasileira. Ocorrendo nesta solenidade de abertura, em meio a Cidade de Goiás-GO, o estabelecimento de um marco na história do ensino jurídico no Brasil.


     


    Desde o momento em que iniciamos o curso, somos alvo de ataques promovidos por sujeitos contrários à presença de trabalhadores e trabalhadoras rurais na universidade pública. Fazendo tudo isso de forma não menos violenta do que a utilizada para defender a grilagem e a concentração da terra. Tais sujeitos externam sua reação agressiva sempre fazendo uso da grande mídia e de agentes de instituições estatais, como o Ministério Público Federal e o próprio Judiciário. 


     


     Atualmente, apesar da sentença extintiva, encerramos o 4º semestre letivo do curso de direito na compreensão de que nada do que está sendo feito contra nossa turma terá sustentação duradoura, vez que, fere ao mesmo tempo, a razão de Estado Democrático Social de Direito. 


     


    Mesmo na situação de política pública de educação, o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA, apesar de tantos resultados importantes desde sua criação, vem sofrendo desde 1998, absurdas reduções orçamentárias. Passando a representar um grave retrocesso, naquilo que deveria ser um meio de potencializar tanto o acesso, quanto a qualidade de ensino ao público da Reforma Agrária.


     


    O sucateamento do PRONERA, assim como a supressão da nossa turma, representa sério prejuízo a tudo o que a sociedade, sobretudo a classe trabalhadora do campo, conquistou até hoje. Devendo ser urgentemente observado com mais responsabilidade pelo poder público.


     


    O acesso de trabalhadoras e trabalhadores assentados à educação formal em cursos superiores de graduação em direito coaduna claramente com os objetivos gerais e específicos do PRONERA, visto que, este se propõe a garantir aos assentados (as) escolaridade/formação profissional, técnico profissional de nível médio e curso superior em diversas áreas do conhecimento.


     


    Na presente perspectiva torna-se mais relevante, do que discutir se o ofício de um bacharel em direito é ou não desenvolvido no campo, observar com mais sensibilidade o quanto todo seguimento segregado pela estrutura social vigente, respectivamente, o trabalhador e a trabalhadora rural, necessita de forma concreta do profissional da área jurídica. Seja na demanda fundiária, previdenciária, administrativa, cooperativista ou outras. Pois o assentado e a assentada não se fixam na terra por mera distribuição desta, mas no intuito de que seus direitos e interesses fundamentais sejam alcançados da mesma forma que qualquer outro cidadão objetiva. Nesse contexto a existência da turma não se desvincula da finalidade do PRONERA, menos ainda, da Reforma Agrária que busca alcançar, dentre inúmeras metas, o pleno desenvolvimento do homem do campo, atendendo diretamente ao que sugere o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.


     


    Ademais, nossa turma de direito se resume em muito mais que uma política de Ação Afirmativa de simples reserva de vagas na universidade. Seguramente representa um simbólico impulso rumo à universalização do acesso ao ensino público superior. 


     


    A igualdade, no que diz respeito, ao acesso e permanência na escola (art. 206, I, CF e art. 3º, I da lei n.º 9.394/96), significa uma igualdade moral, de sorte que, partindo da idéia de que a educação é direito de todos e dever do Estado, constitui incumbência moral do Estado reconhecer que as classes marginalizadas social e economicamente, são, de forma jurídica, portadoras dos mesmos direitos que provêem do Poder Público e que definem sua dignidade como pessoa humana. Não devendo, nesse caso, em hipótese alguma, haver razão para confundir a iniciativa da turma de direito como um privilégio ou meio de exclusão, mas basicamente o contrário.


     


    Prova disso, o fato de ter se configurado há muito mais tempo do que se imagina,  a carência de maior atenção do Estado para com os trabalhadores e trabalhadoras rurais. Sendo mais verdadeira ainda tal afirmação, quando verificamos todos os anos, os índices gerais e regionais de escolaridade do povo brasileiro, já que se constata através daí, que sem as políticas públicas de criação de oportunidades de acesso a educação em todos os níveis e áreas do conhecimento, houve nada mais que um agravamento expressivo da situação. E que por isso, também, devemos tratar como medida de imposição e violência institucionalizada todos os atos que, dessa maneira, como está sendo a sentença em debate, visam extinguir as poucas medidas existentes com o papel de realizar a inclusão e a abrangência cada vez maior de outros excluídos que se encontram em situação idêntica ou inferior. 


     


    A igualdade de todos perante a lei, reconhece, dentre outras coisas, que as desigualdades existem. Pressupondo claramente, que deverão ser tratados de forma desigual aqueles que encontram-se em situação de desigualdade, como meio de superação dos desníveis sociais. Simplesmente por tudo que revela esse último ponto, já mostra-se absurdamente insustentável, tanto moral quanto juridicamente, toda e qualquer atitude de reação que venha contra o direito de estudar direito dos trabalhadores e trabalhadoras rurais.   


     


    Convém citar o interessante questionamento do presidente do INCRA Rolf Hackbart:


     


    “A quem interessa inviabilizar o acesso à educação? A quem interessa fechar salas de aula? Por que em vez de decidir pela extinção desses cursos não se sugere resolver eventuais problemas legais que existam? Há um preconceito raivoso contra movimentos sociais e contra setores da sociedade. As oligarquias do País se perpetuam e uma das formas é não permitir o acesso à educação”.


     


    Diante disso, nós como membros da turma em questão, e principais afetados por esse meio de violência – tal qual foi a decisão – nos sentimos com o total dever de repudiar não somente o ato jurisdicional, como também o sucateamento do PRONERA e da própria universidade pública.


     


     


    Turma Evandro Lins e Silva

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  • 20/07/2009

    14:22 – Newsletter 870 – Indigenous Peoples mobilize for health care, education and demarcation of lands in the state of Amazonas


    Indigenous Peoples mobilize for health care, education and demarcation of lands in the state of Amazonas


    and


    Indigenous Peoples in Roraima protest agreement between Funasa and the state government


     


    More than 350 indigenous representatives have been meeting in Barcelos, in the state of Amazonas, since July 1. The city, 360km from Manaus, is the site for the General Mobilization of Indigenous Peoples of Médio and Baixo Rio Negro. The manifestation is promoted by the Associação Indígena de Barcelos (Asiba). The objective of the participants is to seek joint recognition by the public powers to resolve various problems in the areas of health, education, in addition to seeking demarcation of the indigenous lands.


     


    According to Maria Aparecida Duque, a Tukano leader and one of the coordinators of the Mobilization, the first step is for the authorities to recognize them as indigenous peoples. “It is necessary that they comprehend the indigenous peoples here, create some law of valorization of our culture or something like this, because to them, we do not exist”.


     


    Paralysis – land


    In relation to demarcation of the lands, Maria emphasizes that everything has been halted. “We are not able to demarcate our land here. When there was a study for identification it was not done correctly and here we are today still waiting for this”. The indigenous of Médio and Baixo Rio Negro protest the disturbances caused by the presence of commercial fishermen, hunters, fishing and sport tourism in their lands, in addition to the considerable increase of lumber sawyers.


     


    Paralysis – health


    Health, another point of discussion weighing heavily in the meetings, is a serious problem. “Nothing is functioning here. There is no specific place that deals with indigenous health here. There are no remedies and there have been no provisions that reach us from the accounts for monies designated for health”, the leader reveals. Maria states that they cannot blame the health agents because they are not provided conditions to work here. As for education, the communities are demonstrating for construction of a school with differentiated education for indigenous students. According to most recent information from the Ministry of Education, it has signed off on a school project in Rio Negro. Now the indigenous peoples await the work.


     


    Resilience


    The participants of the mobilization, meeting in the São Francisco school, will close the mobilization with march through the streets of the city culminating at City Hall to deliver a letter with their demands.


     


    Present are representatives of 25 peoples and 26 communities, among them the Tukano, Tariano and Tuyuca. “Our goal is to strengthen the indigenous organizations and in this way, assure the rights of our communities”, concludes theTukano leader.


     


     ***


     


    Indigenous Peoples in Roraima protest agreement between Funasa and the state government


     


    Indigenous leaders in Roraima protested in front of the headquarters of the Fundação Nacional de Saúde (Funasa) on Thursday July 2 against the partnership that the Funasa seeks to sign with the state government. According to Júlio Makuxi, coordinator of the Conselho Indigena de Roraima (CIR), indigenous health throughout the country is in chaos and Roraima is no different. “We do not want this agreement to be signed, because the state of Roraima already has a history of discrimination and works hard in opposition to indigenous peoples, which became very clear during our struggle for Raposa Serra do Sol”.


     


    Autonomy


    According to the leader, the government of the state is unable to cope with the indigenous peoples and that this is a political accord. “What we want is autonomy for the health districts. We do not want work outsourced [to third parties]. There has been no conversation with the indigenous peoples as mandated by Convention 169 of the UN ILO, regarding whether or not we want this type of covenant”. Júlio emphasizes that indigenous health concerns have become increasingly serious with many malaria cases and people dying due to the lack of care. “It is our good fortune that we still have voluntary health agents to help us, and this is what still saves some people”.


     


    Ultimatum


    The indigenous leaders have already represented to Federal Public Ministry their opposition the signing of the compact, and warn: “This is the ultimatum. If the health problems continue, we are going to denounce president Lula in the ILO, in the United Nations and in the Organization of American States (OAS). This disastrous situation cannot continue”.


     


    Wednesday afternoon meetings were scheduled with the local Funasa administrator to resolve the situation.

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  • 20/07/2009

    Memória de vida de Gunter Kroemer (1939 – 2009)

     


                Gunter Kroemer, de nacionalidade alemã, filho de Leo e Marie Kroemer, nasceu na Silésia, hoje pertencente à Polônia, no dia 10 de dezembro de 1939. Teve uma infância difícil no contexto da 2ª Guerra Mundial. Fez seus estudos de filosofia em Viena na Áustria onde iniciou também a Teologia, que continuou em Roma e concluiu no nordeste do Brasil, na época de Dom Helder Câmara. Sua vocação missionária o trouxe para o Brasil no final da década de 1960 sendo ordenado padre diocesano por Dom Alonso da então Prelazia de Diamantino no Mato Grosso, onde exerceu os primeiros anos de seu ministério junto a migrantes e indígenas.


     


    Em 1978, foi convocado pelo Conselho Indigenista Missionário – CIMI para localizar um povo indígena em situação de isolamento ameaçado de extermínio pelas forças econômicas locais, na região do médio Rio Purus, na Prelazia de Lábrea, estado do Amazonas. Integrando uma equipe do Cimi e da OPAN (Operação Anchieta) participou do primeiro contato com o povo indígena Suruwaha em 1980, assegurando a integridade física e cultural desse povo e conquistando a demarcação de suas terras.


     


    Com a convivência diária aprendeu a língua do povo Suruwaha e mediante a prática do diálogo intercultural e inter-religioso compartilhou sua experiência de fé cristã com a vivência religiosa daquele povo indígena. Como assessor teológico e antropológico do Regional Norte I colocou essa experiência a serviço da formação inicial e permanente dos missionários do CIMI e acompanhou por vários anos os cursos anuais de formação básica dos missionários em nível nacional.


     


                Assessorou o GIPRAB – Grupo Indígena de Padres e Religiosos da Amazônia Brasileira – na busca por uma igreja sempre mais inculturada.


     


                Com a perspectiva do fortalecimento do protagonismo indígena em todas as suas dimensões contribuiu com o processo de organização dos povos indígenas Jarawara, Apurinã, Paumari, Deni e Jamamadi do médio rio Purus/AM. Apoiou suas lutas para a garantia de direitos e para a conquista de políticas públicas específicas e diferenciadas em respeito as suas culturas.


     


                Sua missão recente pelo CIMI, a qual dedicou seu tempo com abnegação, foi a de fazer levantamentos sobre a existência dos mais de 60 grupos indígenas isolados de que se têm notícias na Amazônia. Iniciou essa tarefa pelo sul do Estado do Amazonas, Rondônia e norte do Mato Grosso onde esses grupos estão mais ameaçados pelo desmatamento, grilagem de terras e ação de pistoleiros. Trilhou estradas e subiu rios e igarapés até os lugares mais distantes, colhendo informações e testemunhos das populações locais para que com base nelas pudessem ser exigidos das autoridades a proteção dos territórios desses povos e denunciada a destruição e morte provocada pelos grandes projetos que irresponsavelmente estão sendo retomados na Amazônia.


     


                A Igreja Povo de Deus também pode contar com a contribuição de Gunter no apoio às Comunidades Eclesiais de Base – CEBs. Sua assessoria, inclusive era esperada pelo 12º Intereclesial em Porto Velho, ajudando na partilha das vivências religiosas das CEBs e das comunidades indígenas.


     


                Parte de sua experiência de vida junto aos povos indígenas foi sistematizada por ele e encontra-se publicada em três livros: Cuxiuara – o Purus dos Indígenas; A Caminho das Malocas Zuruahá; e Kunahã Made – O povo do veneno.


     


                Gunter fica assim na memória de todos nós que o conhecemos, pelos momentos intensos vividos com ele, por seu compromisso com a justiça e com o Evangelho da vida para a transformação da sociedade com a contribuição dos projetos de “bem viver” dos povos indígenas


     


    Lajeado, RS, 16 de julho de 2009.


    Guenter Francisco Loebens

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  • 20/07/2009

    Estudantes indígenas discutem Campanha Guarani no Mato Grosso do Sul


     


    No dia 17 de julho, cerca de 80 Kaiowa-Guarani, do Mato Grosso do Sul, estudantes dos cursos Ara Vera (segundo grau) e Teko Arandu (licenciatura indígena) assistiram o documentário de 18 minutos “Semente de Sonhos”, realizado pelo Movimento Guarani e pelo Conselho Indigenista Missionário.


     


    Os estudantes – a maioria deles jovens – não conseguiram evitar a emoção e, ao mesmo tempo, o sentimento de impotência durante a exibição do filme, que foi produzido dentro da campanha “Povo Guarani, Grande Povo” (Tetã Guarani, Tetã Tuichava). O momento foi uma oportunidade para socializar os fatos que acontecem nas comunidades onde eles mesmos ou seus parentes moram. Após a exibição, os estudantes discutiram os principais temas apresentados no documentário: a luta pela terra e a violência contra os povos indígenas no Brasil e no Mato Grosso do Sul.


     


    No debate, os indígenas resgataram a necessidade da unidade para continuar a luta pela terra. Também ressaltaram a importância de se compreender que a demarcação é parte importante da luta dos indígenas, porém ela não pode acabar com a reconquista do território. Falaram da importância de se defender a cultura e modo de ser indígena (avá reko). Destacaram que se deve ter consciência de que setores econômicos e políticos poderosos da sociedade ocidental não só querem ficar com a terra do índio senão “com o coração do índio”. Com isto, os estudantes assinalaram que, além da terra, “os brancos” buscam induzir os indígenas para a assimilação, para que os indígenas percam não só a terra senão também sua existência como sociedade originária de um espaço sagrado onde hoje são olhados como estrangeiros.


     


    Os jovens também disseram que os cursos Ara Vera e Teko Arandu não só devem ajudá-los a adquirir novos conhecimentos, mas também deve comprometê-los no interior de suas comunidades a favor da educação, da saúde, da terra e preservação cultural. Tocados pela lembrança do filme, vários indígenas ressaltaram que documentário não é um filme de ficção, mas sim, que as cenas apresentadas acontecem no cotidiano das comunidades. Os estudantes indígenas disseram que estão comprometidos a seguir acompanhando e lutando junto suas comunidades pela demarcação definitiva de seus territórios tradicionais.


     


    Manifesto de apoio


    Durante o encontro com indígenas também foi lido o manifesto de apoio dos trabalhadores/as, educandos/as da Escola Latinoamericana de Agroecologia (ELAA) do MST. O documento afirma que “manifestamos nosso mais elevado e sincero sentimento de irmandade com o Povo Guarani, e sofremos suas dores e compartilhamos de sua altivez, resistência, capacidade de enfrentamento e luta contra os inimigos que tantos males já patrocinaram sobre o Povo Guarani e tantos outros povos, sendo que alguns já foram completamente vitimados pelo genocídio”.


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  • 17/07/2009

    Estado de Roraima extingue 10 escolas Yanomami

    Entre as escolas extintas, uma localiza-se em Roraima e as outras nove no Amazonas, mas todas elas mantêm vínculos formais com o Estado de Roraima desde 2003, quando foram cadastradas pela primeira vez no censo escolar realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Desde então, os alunos informados no censo escolar e suas escolas são mantidas por Roraima. Além das escolas extintas, existem no estado outras vinte e três Escolas Estaduais Yanomami que atendem a mais de setecentos alunos.


    O fechamento das escolas Yanomami, pelo Decreto nº10.236, de 30/06/2009, vai na contramão da proposta atual do governo federal que, através de outro decreto, o de nº 6.861, define a organização da educação escolar indígena em territórios etnoeducacionais, buscando, com isso, respeitar as necessidades e especificidades de cada povo. Os territórios etnoeducacionais se sobrepõem à estrutura federativa do sistema político-administrativo brasileiro, ou seja, não se limita à lógica dos estados e municípios. Segundo este decreto, os elementos básicos para organização, estrutura e funcionamento das escolas indígenas são: a sua localização em terras habitadas por comunidades indígenas, exclusividade de atendimento às comunidades indígenas, ensino ministrado nas línguas indígenas e organização escolar própria, além de ser criada por iniciativa ou reivindicação das comunidades interessadas. As escolas Yanomami extintas pelo Estado de Roraima seguem todos os requisitos mencionados, portanto não se justifica o seu fechamento.


    Um fato que chamou a atenção da Hutukara Associação Yanomami (HAY) e das organizações de apoio ao Yanomami foi a ausência de qualquer aviso prévio sobre a extinção das escolas. O governo estadual agiu em silêncio, não consultou as comunidades envolvidas nem os demais órgãos competentes e contrariou orientações específicas do Ministério da Educação (MEC), de a Secretaria manter o atendimento das escolas localizadas no Amazonas.


    Durante a Conferência Regional de Educação Escolar Indígena, que aconteceu em Boa Vista no inicio do mês de julho, os Yanomami e Ye’kuana solicitaram a criação de um território etnoeducacional próprio para garantir que todos os povos que habitam a terra Yanomami possam ter acesso a uma educação de qualidade e que respeite os projetos comunitários.


    Opinião dos Yanomami


    Desde a criação, entre os anos de 1995 e 1997, as lideranças e professores yanomami das escolas extintas sempre alertaram a Secretaria de Educação do Estado de Roraima (SECD/RR) sobre a necessidade de estas estarem ligadas a Roraima. Isso porque o acesso deles à Manaus é praticamente impossível e tendo em conta o desejo de que as escolas fossem estaduais. A notícia sobre a extinção causou grande preocupação em toda a comunidade, afinal as escolas estão em pleno ano letivo e atendem a mais de 280 alunos.


    Histórico das Escolas Yanomami


    As reivindicações dos professores Yanomami, que envolvem o Decreto de Criação e o processo de reconhecimento das escolas, pelo Poder Executivo, tiveram início em 2001. No ano de 2002, quando a Secretaria Estadual de Educação estava sob a gestão da então secretária Ana Maria Freitas, os professores Yanomami apresentaram a primeira versão da Proposta Pedagógica.


    Em 2003, a Secretaria de Educação, por meio da Divisão de Educação Escolar Indígena DEEI/SECD/RR, juntamente com a Comissão Pró-Yanomami (CCPY) e professores Yanomami, elaboraram o “Projeto Piloto de Implantação, Criação, Autorização e Reconhecimento das Escolas Yanomami”. Esse documento estabelece metas a serem atingidas no que concerne ao reconhecimento, organização das escolas Yanomami e formação dos professores indígenas. No mesmo ano, a então secretária de Educação, Lenir Veras, de comum acordo com a Coordenação Geral de Apoio às Escolas Indígenas do MEC, cadastrou as escolas yanomami no Censo Escolar na categoria “escola indígena estadual”. Essa mesma secretária visitou a comunidade e a escola Yanomami da aldeia Watoriki, região do Demini – uma das regiões atingidas pelo novo decreto.


    Em 2004, o Conselho Estadual de Educação expediu um parecer, apreciando o Projeto Político Pedagógico das escolas Yanomami localizadas no Amazonas e em Roraima. Neste mesmo ano, a Secretaria Estadual de Educação realizou um processo seletivo específico e diferenciado para professores Indígenas. A prova foi aplicada em três pontos da Terra Indígena Yanomami: Papiu, Toototopi e Missão Catrimani (as duas primeiras regiões tiveram suas escolas extintas). Na época, 14 professores Yanomami foram inscritos e aprovados, integrando, assim, o quadro de profissionais temporários do Estado de Roraima. Ao final de 2004, Ilma Xaud assumiu e Secretaria Estadual de Educação e determinou um número mínimo de vinte alunos para manter as escolas indígenas em funcionamento. Essa portaria gerou grande problemas para todos os povos indígenas de Roraima, que passaram pela ameaça de ter suas escolas – que atendem comunidades pequenas e isoladas – fechadas. O decreto foi revogado posteriormente, pois feria o direito de todo brasileiro ter acesso a educação.


    O contrato temporário dos 14 professores Yanomami foi renovado por mais um ano, como previa o edital do processo seletivo realizado em 2004. A CCPY assinou um termo de compromisso como dirigente escolar para preencher os formulários do censo. Em outubro, as organizações indígenas de Roraima (Organização dos Professores Indígenas de Roraima – OPIRR, Conselho Indígena de Roraima – CIR, Associação dos Povos Indígenas do Estado de Roraima – APIRR, Organização de Mulheres Indígenas de Roraima – OMIRR e Hutukara Associação Ynaomami – HAY) encaminharam para o recém-empossado secretário, Adjamo Moreira Abadi, um documento solicitando a melhoria no atendimento da educação escolar indígena no estado.


    Mais um processo seletivo simplificado indígena foi realizado em 2007, no qual 37 professores Yanomami foram contratados temporariamente. O governo do estado assinou o Decreto nº 7.974, criando vinte e quatro escolas Estaduais Yanomami. Em função da criação das escolas, o contato entre os Yanomami e a Secretaria Estadual de educação foi intensificado. Organizações de apoio realizaram uma série de novos estudos para subsidiar o governo no atendimento das escolas Yanomami. O então secretário Luciano Moreira visitou a Terra Yanomami durante o VIII Curso de formação de professores Yanomami e, no mesmo ano, a CCPY promoveu um seminário de 40 horas envolvendo os vários setores da Secretaria Estadual e os professores Yanomami em formação, com o intuito de aproximar o estado dos beneficiários diretos para, juntos, organizarem o atendimento das escolas. Também foi desenvolvido um curso inicial de processamento dos dados do censo escolar na internet para os professores Yanomami, afim de que eles gerenciem as informações de duas escolas, como prevê o Inep. Nessa ocasião a CCPY e os professores Yanomami informaram os dados para o censo escolar.


    Em 2008, foi realizado mais um processo seletivo simplificado indígena, em que 38 professores Yanomami e Sanoma foram contratados temporariamente. A CCPY viabilizou a visita de cinco coordenadores pedagógicos itinerantes da Secretaria Estadual nas regiões Demini, Toototopi, Papiu, Alto Catrimami e Kayanau e, mais uma vez, realizou o levantamento dos dados do censo escolar das escolas Yanomami.


    No primeiro semestre deste ano, foi realizado mais um processo seletivo simplificado indígena, do qual ainda não se obteve informações sobre os professores contratados temporariamente. A SECD/RR, por meio da Divisão de Educação Escolar Indígena, disse que assumiria a responsabilidade pelas escolas Yanomami mas, até o momento, não foi enviado nenhum material escolar, assim como não houve o levantamento dos dados dos alunos para o cadastro no censo escolar.


    Na busca de reverter a situação, a HAY entrou com uma representação junto aos Ministérios Públicos Federal e Estadual tentando impedir que o decreto produza quaisquer efeitos sobre as escolas yanomami. (Veja aqui o documento na íntegra).


    O MEC também foi comunicado e atua para reverter a extinção das escolas pelo governo de Roraima. Segundo informações do próprio ministério, o secretário de educação continuada, alfabetização e diversidade, André Lázaro, encaminhou ofício ao secretário da SECD/RR, Dirceu Medeiros de Morais, solicitando informações e pedindo providências para que as escolas yanomami não sejam abandonadas.


     


    ISA, Lidia Montanha de Castro.

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