• 19/12/2009

    Funasa nega atendimento em Mato Grosso do Sul: absurdos de uma política indigenista nefasta

    O presidente da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), Danilo Forte, manifestando-se em relação aos apelos dos Guarani-Kaiowá para que lhes fosse assegurada assistência em saúde, declarou: “A gente só pode fazer investimentos em aldeias que estão legalizadas” e enfatizou que a Funasa não pode atender indígenas nas áreas "em litígio". Ele se referia aos Guarani-Kaiowá da comunidade Kurusú Ambá, que realizaram uma retomada no dia 25 de novembro, e que estão acampados em uma fazenda, no município de Coronel Sapucaia, Mato Grosso do Sul.

     

    No dia 15 de dezembro os indígenas recorreram ao Ministério Público Federal de Ponta Porã, solicitando que fossem tomadas providências urgentes para que a comunidade recebesse proteção, alimentos e assistência em saúde. Reclamaram a falta de medicamentos para conter o surto de diarréia que acometia a maioria das crianças e outras doenças que atingiam as famílias. Procurado pela imprensa local para prestar esclarecimentos, o coordenador estadual da Funasa, em Mato Grosso do Sul, Flávio Brito, declarou que não estava enviando remédios aos índios porque o local em que eles acamparam era palco de conflitos. Em outras palavras, o representante da Funasa reconheceu que os Guarani-Kaiowá sofrem ameaças em função da retomada e estão à mercê de jagunços de fazendeiros armados. Trata-se, portanto, de uma situação em que o governo é omisso e negligente em relação aos índios.

     

    Quanto ao argumento utilizado por Danilo Forte de que a Funasa não pode atender indígenas nas áreas em litígio, vale lembrar que no estado de Mato Grosso do Sul, praticamente todas as terras indígenas estão nesta situação. Também é importante ressaltar que as áreas reivindicadas pelos Guarani-Kaiowá são aquelas com as quais eles possuem inegáveis vínculos tradicionais. Do contrário, os fazendeiros seriam os primeiros e maiores interessados em permitir que os estudos antropológicos fossem realizados, e com toda a urgência. Sabe-se, no entanto, que os conflitos estão longe de serem solucionados, uma vez que se adotam diferentes estratégias para impedir que os Grupos Técnicos realizem os seus trabalhos, e a isso se soma a falta de interesse do Governo Federal em assegurar a realização desses procedimentos administrativos, que são de sua responsabilidade.

     

    A partir deste posicionamento da Funasa, devemos entender então que o Governo Federal pretende negar assistência em saúde a todas as comunidades indígenas do estado, que já são vítimas da omissão, da violência e do descaso.

     

    É preciso considerar que o princípio constitucional do respeito à dignidade da pessoa humana está acima de qualquer “legalização” e que um dos objetivos fundamentais da República é o de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. A saúde, por sua vez, é considerada direito fundamental de todos, portanto, estende-se aos indígenas acampados, em áreas em litígio, em centros urbanos etc.

     

    Não é a primeira vez que o presidente da Funasa trata com desprezo as comunidades indígenas. No dia 06 de maio, após tomar conhecimento da morte de 68 indígenas, casos denunciados pelo Cimi no Relatório de Violência Contra os Povos Indígenas, o Sr. Danilo Forte declarou: “é um número bom”.

     

    Conseqüências da omissão governamental

     

    No dia 18 de dezembro uma criança de dois anos morreu por falta de assistência, na comunidade Kurusú Ambá. Há 15 dias ela apresentava diarréia e vômito, sem atendimento da Funasa, apesar das insistentes solicitações feitas pela comunidade. Conforme relatam os pais da menina, ela desenvolveu um quadro agudo de diarréia e vômito e a falta de medicamentos levou a desidratação total.

     

    Sua morte aconteceu 48 horas depois que foi denunciado o assassinato de Osmair Fernandes, um jovem de 15 anos que participou da retomada. O corpo do jovem foi encontrado na escola indígena Taquapiry, a oito quilômetros de distância do atual acampamento, com indícios de espancamento e de tortura.

     

    Somente neste ano pelo menos 30 indígenas Guarani-Kaiowá foram assassinados em Mato Grosso do Sul e vários de seus acampamentos atacados e incendiados por milícias armadas. Este povo tem sido vítima de todo tipo de perseguição, discriminação e violência. Enquanto isso, escutamos declarações absurdas como as que foram proferidas pelo presidente da Funasa, a quem compete assistir as comunidades indígenas, independentemente de onde elas estejam localizadas. Cabe ao representante deste órgão informar-se adequadamente sobre os direitos fundamentais, reconhecidos pela Constituição do país onde ele, incrivelmente, exerce uma função pública.

     

    Ao possibilitar esse tipo de discurso, o poder público colabora para criminalizar os povos indígenas, respaldando também as violências praticadas contra eles. As declarações de Danilo Forte tentam isentar a Funasa de suas responsabilidades e, ao mesmo tempo, constituem uma ameaça subliminar aos povos indígenas que se mobilizam nas lutas pelos seus direitos. Por fim, tais argumentos responsabilizam os próprios índios pelas situações de conflito e violência vividas, retirando do foco aqueles que praticam esses crimes e isentando o Poder Público, que deveria proteger e fazer respeitar a vida destes povos.

     

    O tratamento dado aos Guarani-Kaiowá, que sonham em viver em suas terras e lutam para isso, mostra claramente a face genocida da atual política indigenista. Danilo Forte, com suas declarações, se torna uma espécie de porta-voz desta política, cada vez mais escancarada e inegavelmente colocada em curso em Mato Grosso do Sul.

     

    Porto Alegre (RS), 19 de dezembro de 2009.

     

    Roberto Antonio Liebgott

    Vice-Presidente do Cimi

     

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  • 18/12/2009

    894: Guarani Youth is found dead in school in Mato Grosso do Sol

    GUARANI YOUTH IS FOUND DEAD IN SCHOOL IN

    MATO GROSSO DO SUL

     

    One more Guarani Kaiowá died in the context of the struggle for land of the Kurusú Ambá community. A youth of 15 years was found dead yesterday, December 16, in an indigenous school of the village of Taquapiry, in the municipality of Amambai, Mato Grosso do Sul. He presented marks of aggression on his body.

     

    The youth was living in part of his traditional land retaken by his community in the interior of the Fazenda Maria Auxiliadora. According to indigenous information, on the 16th of December, the young man decided to return to the encampment at the side of the highway BR 289, which his community had ceased occupying at the end of November. He was looking for some belongings, as the Federal Police had guaranteed security of circulation of the indigenous peoples between the old encampment and the area retaken. The youth was buried today, without his body having been examined by the Instituto Médico Legal.

     

    Since 2007, three indigenous members of the Kurusá Ambá community – Xurite Lopes, Ortiz Lopes and Osvaldo Lopes – have been assassinated by gunmen. Another five persons were shot and three children have died from malnutrition. All occurrences that involve gunmen and ranchers remain cases of impunity.

     

    Private Property

    On the same day that the body of the youth was found, the leaders of Kurusú Ambá petitioned the Federal Prosecutor (MPF – Ministério Público Federal) of Ponta Porã to activate the National Health Foundation (Funasa) and the National Foundation for Indigenous Affairs (Funai) to send basic food baskets and medical care for the families that retook the traditional land.

     

    According to the leaders, many of the people are ill and families are going hungry in the retaken area. According to the indigenous peoples, the response from the MPF was negative, alleging that these agencies cannot enter the fazenda without judicial authorization.

     

    The MPF had asked that the indigenous peoples remove themselves to the village of Taquapiry, 8km from the retaking, to receive the basic food baskets and medical care. The dislocation in this prerequisite cost the life of the indigenous youth.

     

    At present, there are only soy fields being cultivated on the Maria Auxiliadora fazenda. A Technical Group from Funai is already engaged in conducting studies to verify if the area claimed by the Kurusu Ambá community is traditional land of the Guarani Kaiowá people.

    (Reports Cimi-MS)

     

                                                            ***

     

    JAILED XUKURU WILL TRANSFERRED TO FUNAI POST IN VILLAGE IN PERNAMBUCO

     

    Edmilson Guimarães (“Besouro”) of the Xukuru people, is going to serve his pretrial detention at the post of the National Foundation for Indigenous Affairs (Funai) in the land of his people, in the municipality of Pesqueira Pernambuco. The Superior Tribunal de Justiça (STJ) determined the transference of the indigenous prisoner, who has been held in the penitentiary of Caruaru for approximately one year. The court decision must be carried out by the end of the week.

     

    Besouro was with Rinaldo Feitoza, of the same people, who is also in pretrial detention at the Funai post in the Xukuru land. The two were accused of a homicide that they did not commit and for which no evidence exists.

     

    The Indigenous Statute determines that the penalty of incarceration applied to indigenous peoples needs to be carried out, if possible, under conditions of semi-liberty at the post of the federal agency of assistance to indigenous peoples nearest the residence of the convicted. The reporter on the habeas corpus of the indigenous men, minister Napoleãn Nunes Maia Filho, and the 5th jurisdiction of the STJ understands that this determination also applies to the serving of pretrial detention. This orientation was already adopted by the STJ in other decisions and reinforces the respect for cultural specificity of indigenous Brazilians and the rights guaranteed by the Statute, by the Federal Constitution and by UN Convention 169 of the International Labor Organization.

     

    The habeas corpus petition for the indigenous men was filed by attorneys Sandra Lobo, Denise da Veiga Alves, Paulo Machado Guimarães – juridical advisors of the Indigenist Missionary Council (CIMI) – and Gilberto Marques.

     

    At present, at least 43 Xukuru are being processed, 31 of whom have been convicted. This process of criminalization was denounced, in March of 2009, to the Organization of American States (OAS). All who accompany the journey of this people for their rights know that – in the name of their own interests – the political elite of the region have attempted, in various ways, to demoralize, destructure and demobilize the Xukuru, impeding them from achieving the planning of their lives. It deals with an unspeakable violence against a people who, with the aid of innumerable partners, has provided compelling examples of courage and determination.

     

    Brasilia, 17 December of 2009

    Indigenist Missionary Council

     

                                                            *

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  • 18/12/2009

    Guarani Retã: Mais uma ferramenta de luta

    A histórica Assuncion, semeada às beiras do rio Paraguai, foi palco de um momento ímpar, na luta do povo Guarani por seus direitos. No início de mais um dia quente do verão tropical, no palácio presidencial do Paraguai, foi se reunindo uma seleta platéia de lideranças Guarani, estudiosos e aliados da causa, representantes de organismos nacionais e internacionais, além da presença de cinco ministros e do presidente Lugo.

     

    O que motivou tão importante ato político, cultural e histórico, foi o lançamento do mapa e caderno Guarani Retã, em espanhol e guarani. No inicio do ano fora lançado em nível internacional durante o Fórum Social Mundial, em Belém do Pará.

     

    As falas, fortes e contundentes, de apoio aos direitos do Povo Guarani hoje, foram se alternando em espanhol e guarani, que são as línguas oficiais do Paraguai. O guarani foi recentemente reconhecido como a língua oficial do Mercosul. Apesar desse reconhecimento todo, infelizmente a situação de vida dos Guarani hoje, está entre as mais difíceis dos povos originários do mundo.

     

    Conforme a fala inicial do embaixador da Espanha, Miguel Angel Cortiço, talvez hoje não se esteja cumprindo minimamente nenhum dos 46 artigos da Declaração dos Direitos Indígenas, da ONU. Declarou que apesar de não se entusiasmar com esse atos formais, desafia os governantes para que se cumpram os direitos dos povos indígenas contidos  na declaração da ONU.

     

    O representante da UNICEF ressaltou a importância do trabalho que estava sendo lançado – Guarani Reta – por significar um espaço e ferramenta de diálogo entre os povos Guarani a sociedade e o governo, para superar a marginalização e opressão a que estão submetidos esses povos hoje.

     

    Na mesa oficial, além do presidente Lugo, dos ministros, representantes de países e organizações da sociedade civil, estava o Guarani Hipólito Acevei, presidente do Conselho pela Autodeterminação dos Povos Indígenas. Em sua manifestação, falou da importância dessa ferramenta para o povo Guarani, que embora tardiamente, estão sendo construídas ferramentas para garantir os direitos dos povos originários. Espera que se caminhe efetivamente para criar políticas públicas, que garantam um Paraguai melhor para todos. Concluiu dizendo que “os povos indígenas antes sonhavam enquanto estavam dormindo, mas agora sonham o futuro de olhos abertos”.

     

    O compromisso do Presidente Lugo com os Guarani

     

    Em sua fala, no encerramento do ato de lançamento do mapa e caderno Guarani Reta, o presidente Lugo reafirmou, como o fizera na por ocasião de sua posse, seu compromisso com os povos indígenas e em especial com o Guarani, com os quais trabalhou durante anos. “O caso que estamos avistando, se trata de uma territorialidade viva, de povos vivos, que puderam sobreviver primeiro ao processo colonial e depois nacional, o que nos demonstra a todos a vigência de sua cultura e espaço territorial, além das fronteiras nacionais”. Após reconhecer as falhas do próprio governo com relação aos povos indígenas, convoca os governos do Cone Sul, onde vive o povo Guarani “a reunir-se e articular políticas coerentes orientadas para salvaguardar a cultura, seu modo e espaço de vida, prestando serviços sociais e atendendo suas legítimas reivindicações”. Após reconhecimento da difícil situação dos Guarani e das omissões e falhas do governo na garantia dos direitos, especialmente no reconhecimento das terras,  agradece “por colocarem em nossas mãos o mapa Guarani Reta, fruto da vossa sabedoria e solidariedade com os povos originários. O conhecimento e a comunicação nos darão forças e abrirá as portas  ao futuro. Todos somos Guarani…”

     

    A sessão de lançamento do Mapa Guarani foi organizada pela Coordenação Nacional de Pastoral Indígena – Conapi, com outras entidades. No decorrer do próximo ano estão previstos vários lançamentos regionais e distribuição nas aldeias e escolas das regiões.

    A presença dos Guarani do Brasil e aliados

     

    No ato do lançamento do Mapa também estiveram os Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul. Eles foram para se unir aos seus irmãos Guarani no Paraguai e levar para esse momento o clamor, dor e esperança dos povos Guarani no Brasil. Apesar de não haver espaço formal para externar seus pedidos para que o governo do Paraguai se empenhe na busca do corpo do professor Guarani Rolindo Vera, assassinado há 47 dias, em Ypo’i, município de Paranhos, externaram esse desejo a muitos dos presentes, para que os fizessem chegar ao presidente.

     

    Para o Guarani Kaiowá, José Barbosa de Almeida, liderança do acampamento indígena Laranjeira Nhanderu, ‘O lançamento do mapa e caderno Guarani Reta significou um grande apoio à luta de todos os Guarani.  Foi mais uma semente lançada que vai se transformar numa grande árvore do nosso povo na América do Sul”

     

    Enquanto os Kaiowá Guarani e seus aliados do Cimi estavam em Assuncion, em Kurusu Ambá, com a comunidade enterrava mais um de seus membros assassinados enquanto estão na luta pela sua terra. Osmair Fernandes, foi encontrado morto na manhã do dia 16, elevando o número dos assassinados ultimamente na luta pelas terras.

     

    Nesse mesmo dia se iniciou mais uma Aty Guasu, em Guyraroká, município de Juti, com a inauguração de uma grande Oga Pisy (casa de reza). Ali estarão nos próximos dias sendo discutidas as estratégias para o reconhecimento de seus tekoha (terras tradicionais).

     

    Egon Heck

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  • 18/12/2009

    Guarani Retã: Mais uma ferramenta de luta

    A histórica Assuncion, semeada às beiras do rio Paraguai, foi palco de um momento ímpar, na luta do povo Guarani por seus direitos. No início de mais um dia quente do verão tropical, no palácio presidencial do Paraguai, foi se reunindo uma seleta platéia de lideranças Guarani, estudiosos e aliados da causa, representantes de organismos nacionais e internacionais, além da presença de cinco ministros e do presidente Lugo.

     

    O que motivou tão importante ato político, cultural e histórico, foi o lançamento do mapa e caderno Guarani Retã, em espanhol e guarani. No inicio do ano fora lançado em nível internacional durante o Fórum Social Mundial, em Belém do Pará.

     

    As falas, fortes e contundentes, de apoio aos direitos do Povo Guarani hoje, foram se alternando em espanhol e guarani, que são as línguas oficiais do Paraguai. O guarani foi recentemente reconhecido como a língua oficial do Mercosul. Apesar desse reconhecimento todo, infelizmente a situação de vida dos Guarani hoje, está entre as mais difíceis dos povos originários do mundo.

     

    Conforme a fala inicial do embaixador da Espanha, Miguel Angel Cortiço, talvez hoje não se esteja cumprindo minimamente nenhum dos 46 artigos da Declaração dos Direitos Indígenas, da ONU. Declarou que apesar de não se entusiasmar com esse atos formais, desafia os governantes para que se cumpram os direitos dos povos indígenas contidos  na declaração da ONU.

     

    O representante da UNICEF ressaltou a importância do trabalho que estava sendo lançado – Guarani Reta – por significar um espaço e ferramenta de diálogo entre os povos Guarani a sociedade e o governo, para superar a marginalização e opressão a que estão submetidos esses povos hoje.

     

    Na mesa oficial, além do presidente Lugo, dos ministros, representantes de países e organizações da sociedade civil, estava o Guarani Hipólito Acevei, presidente do Conselho pela Autodeterminação dos Povos Indígenas. Em sua manifestação, falou da importância dessa ferramenta para o povo Guarani, que embora tardiamente, estão sendo construídas ferramentas para garantir os direitos dos povos originários. Espera que se caminhe efetivamente para criar políticas públicas, que garantam um Paraguai melhor para todos. Concluiu dizendo que “os povos indígenas antes sonhavam enquanto estavam dormindo, mas agora sonham o futuro de olhos abertos”.

     

    O compromisso do Presidente Lugo com os Guarani

     

    Em sua fala, no encerramento do ato de lançamento do mapa e caderno Guarani Reta, o presidente Lugo reafirmou, como o fizera na por ocasião de sua posse, seu compromisso com os povos indígenas e em especial com o Guarani, com os quais trabalhou durante anos. “O caso que estamos avistando, se trata de uma territorialidade viva, de povos vivos, que puderam sobreviver primeiro ao processo colonial e depois nacional, o que nos demonstra a todos a vigência de sua cultura e espaço territorial, além das fronteiras nacionais”. Após reconhecer as falhas do próprio governo com relação aos povos indígenas, convoca os governos do Cone Sul, onde vive o povo Guarani “a reunir-se e articular políticas coerentes orientadas para salvaguardar a cultura, seu modo e espaço de vida, prestando serviços sociais e atendendo suas legítimas reivindicações”. Após reconhecimento da difícil situação dos Guarani e das omissões e falhas do governo na garantia dos direitos, especialmente no reconhecimento das terras,  agradece “por colocarem em nossas mãos o mapa Guarani Reta, fruto da vossa sabedoria e solidariedade com os povos originários. O conhecimento e a comunicação nos darão forças e abrirá as portas  ao futuro. Todos somos Guarani…”

     

    A sessão de lançamento do Mapa Guarani foi organizada pela Coordenação Nacional de Pastoral Indígena – Conapi, com outras entidades. No decorrer do próximo ano estão previstos vários lançamentos regionais e distribuição nas aldeias e escolas das regiões.

    A presença dos Guarani do Brasil e aliados

     

    No ato do lançamento do Mapa também estiveram os Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul. Eles foram para se unir aos seus irmãos Guarani no Paraguai e levar para esse momento o clamor, dor e esperança dos povos Guarani no Brasil. Apesar de não haver espaço formal para externar seus pedidos para que o governo do Paraguai se empenhe na busca do corpo do professor Guarani Rolindo Vera, assassinado há 47 dias, em Ypo’i, município de Paranhos, externaram esse desejo a muitos dos presentes, para que os fizessem chegar ao presidente.

     

    Para o Guarani Kaiowá, José Barbosa de Almeida, liderança do acampamento indígena Laranjeira Nhanderu, ‘O lançamento do mapa e caderno Guarani Reta significou um grande apoio à luta de todos os Guarani.  Foi mais uma semente lançada que vai se transformar numa grande árvore do nosso povo na América do Sul”

     

    Enquanto os Kaiowá Guarani e seus aliados do Cimi estavam em Assuncion, em Kurusu Ambá, com a comunidade enterrava mais um de seus membros assassinados enquanto estão na luta pela sua terra. Osmair Fernandes, foi encontrado morto na manhã do dia 16, elevando o número dos assassinados ultimamente na luta pelas terras.

     

    Nesse mesmo dia se iniciou mais uma Aty Guasu, em Guyraroká, município de Juti, com a inauguração de uma grande Oga Pisy (casa de reza). Ali estarão nos próximos dias sendo discutidas as estratégias para o reconhecimento de seus tekoha (terras tradicionais).

     

    Egon Heck

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  • 17/12/2009

    Informe nº. 894: Jovem Guarani é encontrado morto em escola no Mato Grosso do Sul

    Informe nº. 894

     

    • Jovem Guarani é encontrado morto em escola no Mato Grosso do Sul
    • Dois Xukuru presos serão transferidos para posto da Funai na aldeia em Pernambuco

     

     

    ***

    Jovem Guarani é encontrado morto em escola no Mato Grosso do Sul

     

    Mais um Guarani Kaiowá morreu no contexto da luta pela terra da comunidade Kurusú Ambá. Um jovem de 15 anos foi encontrado morto ontem, 16 de dezembro, numa escola indígena na aldeia Taquapiry, no município de Amambai, Mato Grosso do Sul. Ele apresentava marcas de agressão no corpo.

     

    O jovem estava vivendo na parte de sua terra tradicional retomada por sua comunidade, no interior da Fazenda Maria Auxiliadora. De acordo com as informações dos indígenas, no dia 16 de dezembro, o rapaz decidiu retornar ao acampamento à beira da BR 289, que sua comunidade havia desocupado no fim de novembro. Ele foi buscar alguns pertences, pois a Polícia Federal teria garantido a segurança na circulação dos indígenas entre o antigo acampamento e a área retomada. O jovem foi enterrado hoje, sem que seu corpo fosse examinado pelo Instituto Médico Legal.

     

    Desde 2007, três indígenas da comunidade Kurusú Ambá – Xurite Lopes, Ortiz Lopes e Osvaldo Lopes – foram assassinados por pistoleiros. Outras cinco pessoas foram baleadas e três crianças morreram em função de desnutrição. Todos os fatos que envolveram pistoleiros e fazendeiros permaneceram na impunidade.

     

    Propriedade privada

    No mesmo dia que foi encontrado o corpo do jovem, as lideranças de Kurusú Ambá pediram que o Ministério Público Federal (MPF) de Ponta Porã acionasse a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) para que enviem cestas básicas e cuidem da saúde das famílias que retornaram à terra tradicional.

     

    De acordo com as lideranças, há muitas pessoas doentes e as famílias estão passando fome na área retomada.  Segundo os indígenas, a resposta do MPF foi negativa, alegando que esses órgãos não podem entrar na fazenda sem autorização judicial.

     

    O MPF teria pedido que indígenas se deslocassem para a aldeia de Taquapiry, a 8 km de distância da retomada, para receber as cestas básicas e atendimento médico. O deslocamento nesse percurso custou a vida do jovem indígena. 

     

    Atualmente, há apenas lavouras de soja sendo cultivadas na fazenda Maria Auxiliadora. Um Grupo Técnico da Funai está realizando os estudos para verificar se a área reivindicada pela comunidade Kurussu Ambá é terra tradicional do povo Guarani Kaiowá.

    (Informações Cimi-MS)

     

    ***

     

    Indígena Xukuru preso será transferido para posto da Funai na aldeia em Pernambuco

     

    Edmilson Guimarães ("Besouro"), do povo Xukuru, irá cumprir prisão preventiva no posto da Fundação Nacional do Índio (Funai) na terra de seu povo, no município de Pesqueira Pernambuco. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou a transferência do indígena, que está preso na penitenciária de Caruaru há cerca de um ano. Até o fim da semana a decisão deve ser cumprida.

     

    Besouro se juntará a Rinaldo Feitoza, do mesmo povo, que também cumpre prisão preventiva no posto da Funai na terra Xukuru. Os dois foram acusados por um homicídio que não cometeram e que para o qual sequer existem provas

     

    O Estatuto do Índio determina que as penas de reclusão aplicadas aos indígenas devem ser cumpridas, se possível, em regime de semiliberdade no posto do órgão federal de assistência ao índio mais próximo da habitação do condenado. O relator do habeas corpus dos indígenas, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, e a 5ª. Turma do STJ entenderam que esta determinação também se aplica ao cumprimento de prisões preventivas. Esta orientação já foi adotada pelo STJ em outras decisões e reforça o respeito à especificidade cultural dos indígenas brasileiros e os direitos garantidos pelo Estatuto, pela Constituição Federal e pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.

     

    O pedido de habeas corpus dos indígenas foi feito pelos advogados Sandro Lobo, Denise da Veiga Alves, Paulo Machado Guimarães – assessores jurídicos do Cimi – e Gilberto Marques.

     

    Atualmente, pelo menos 43 Xukuru estão sendo processados, dos quais 31 foram condenados. Esse processo de criminalização foi denunciado, em março de 2009, à OEA. Todos que acompanham a caminhada deste povo por seus direitos sabem que – em nome de interesses próprios – as elites políticas e econômicas da região têm tentado, por diversas maneiras, desmoralizar, desestruturar e desmobilizar os Xukuru, impedindo-os de concretizar seu projeto de vida. Trata-se de uma violência inominável contra um povo que, com o auxílio de inúmeros parceiros, tem dado exemplos comoventes de coragem e determinação.

     

     

    Brasília, 17 de dezembro de 2009

    Conselho Indigenista Missionário

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  • 17/12/2009

    Letter to UN rapporteur on indigenous rights about Belo Monte hydrelectric

    3/12/2009

     

    James Anaya

     

    Special Rapporteur on the Situation of Human Rights and of the fundamental freedoms of the indigenous peoples

     

    OHCHR-UNOG Office of the High Commissioner for Human Rights

     

    Palais Wilson 1211

     

    Geneva 10, Switzerland

     

     

    Dear Mr Anaya,

     

    The Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) and the Instituto Socioambiental, in the name of the indigenous peoples of Arara da Volta Grande, Paquiçamba, Trincheira Bacajá, KM17 Juruna, Kararaô, indigenous lands Apyterewa e Kayapó and the Xavante indigenous peoples located in the Xingu hydrographic basins that would be affected by the construction of the mega-project Belo Monte Dam and related constructions respectfully present the following information for your urgent consideration.

     

    The indigenous peoples who would be directly affected by the construction of the Belo Monte dam have not been consulted by the National Congress, the FUNAI, nor the IBAMA.

     

     

    Lack of response from the State to petitions of the indigenous peoples for consultation

     

    In spite of a number of formal solicitations, including a hand delivered request to president Luis Inácio da Silva, the indigenous peoples who would be directly affected by the damming of Belo Monte have not had access to clear and complete information about the impacts that they would suffer, nor about mitigating measures, and they were not consulted during the legislative and administrative processes that led to authorization of the project.

     

    Lack of consultation on the legislative decision

     

    In 2005 the Congress authorized the proposed construction of Belo Monte, without any information regarding the environmental and social impacts that there would be, nor any consultation with indigenous populations. This violation of the right to consultation (article 6, Convention 169 of the ILO, ratified by Brail in 2004) was taken to Federal Court and arrived at the Supreme Court, which decided that the environmental impact studies could take place prior to beginning consultation. This decision alone asserts direct violation to consultation, the consultation would be, in this way, taking place after a legislative decision about a matter that is going to affect, at least, seven indigenous peoples directly.

     

    Lack of consultation as to an administrative decision of IBAMA and of the role of FUNAI

     

    As to the decision of the Federal Government, the authorization of the construction of the damming by the Brazilian Institute of the Environment (Ibama) is about to be granted under political pressure by private economic interests and, again, without consultation with the indigenous peoples affected. The dam of Belo Monte is reported to cost R$17 to R$30 billion, even without taking into consideration the additional environmental and social costs, including those related to the guarantee of the living conditions for those indigenous peoples costs related to the eventual dislocation of the indigenous peoples from their demarcated traditional lands.

     

    The study conducted by the National Foundation of Indigenous Affairs (Funai) identified a series of grave impacts that threaten the indigenous lands, demarcated as well as being demarcated in the region of Altamira and several other indigenous lands that are absent from the IBAMA evaluation of the environmental impact study(EIS). It concluded, nonetheless, that the project is viable, and considered the consultation as done. The decision released in an official letter from the president of the FUNAI, IBAMA, dated October 14 of 2009, is an attempt to close the possibilities for the indigenous peoples affected to participate by means of consultation in the administrative decision of the IBAMA, which authorizes the dam of Belo Monte.

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  • 17/12/2009

    Communique of the Indigenous Peoples


    To Your Excellencies:


     


    Deborah Macedo Duprat


    Assistant Attorney General of the Republic;


    Luis Inácio Lula da Silva


    President of the Federated Republic of Brazil;


    Edson Lobão


    Minister of Mines and Energy;


    Carlos Minc


    Minister of the Environment;


    Marcio Meira


    President of FUNAI;


    Roberto Messias Franco


    President of IBAMA;


    Tarso Genro


    Minister of Justice;


    Gilmar Mendes


    President of the Federal Supreme Court


             We indigenous peoples here represented: Kayapó Peoples of the villages Kokraxmõr, Pykarãrãkre,  Kikretum, Las Casas, Kriny, Moxkàràkô; Kayapó of the Xingu, village of Kararaô; Xipaia, village of Tukamá, Tukaiá; Juruna, village of Paquiçamba, Km 17 Vitória do Xingu; Arara da Volta Grande, Terra indígena Wangã; Arara People, Cachoeira Seca; and peoples of other regions: Yanomam; Guarani, of São Paulo, village of Krukutú, would like to communicate the following:


    Respected representatives of the Brazilian government and Attorney General of the Republic,


     


    We indigenous peoples of Brazil concerned with the actions that Brazil has directed toward the indigenous populations and the disrespect of the government in reference to the referred to populations have to tell you that after the first contact with non-indigenous in this country the indigenous peoples were massacred and decimated in a brutal and ignorant way by its representatives. We have lost significant indigenous populations in this country. Whereas at no time did the society treat these peoples with due respect; that after 500 years of contact with this civilization, the indigenous peoples of Brazil have only lost territories, cultures, lives, the disappearance of entire populations throughout this contact. The peoples who remain struggle for their survival from within their territories with deplorable structures, at high risk, disrespected in their human rights, with lack of moral integrity toward the indigenous peoples who still exist in this Brazil.


     


    Respected representatives of the government, we are denouncing the disrespect of the Federal Government toward the indigenous populations as deals specifically with a project being executed in the region of Altamira, Volta Grande do Xingu; a project designed for hydric utilization, as it would affect the indigenous populations of this region and of the entire Rio Xingu hydrographic basin.


     


    Twenty years ago the indigenous peoples of this region spoke in a meeting and made clear that this project is unviable for implantation on the Rio Xingu. In 2008 the indigenous peoples, in another General Meeting, returned to talk and debate opposition to this project that would be implanted in this region and one more time the government disrespected Convention 169 of the ILO to which the Brazilian government is a signatory.


     


    Once again, we are here, indigenous peoples in Brasilia, to talk about Belo Monte. Throughout these 20 years of struggle by the indigenous peoples against the project of this UHE (hydro plant) Belo Monte the government had sufficient time to present alternative proposals to the indigenous populations of this region and did nothing. The indigenous peoples are tired of this struggle wherein the government hears only those of interest to it, we are asking for an end to this macabre history for the indigenous peoples.


     


    Respected representatives of the Brazilian government, we indigenous peoples represented in this communication are soliciting of your cognizance for preventing negative positions that can occur in this region if the government continues to disrespect us as Brazilian people, as indigenous peoples and as first inhabitants of this country.


     


    Throughout these 500 years we have been at the mercy of the government, serving as a massive labor force, as soldiers in protection of nature. We indigenous peoples, as defenders of nature are tired of seeing non-indigenous destruction of our forests with the collusion of governmental authorities and judiciary of this country. Given this situation, we are taking the following measure:


     


    We Indigenous peoples, will no longer sit with any government representative to talk about the UHE Belo Monte: because we have already spoken for too long and this cost us 20 years of our history. If the Brazilian government wishes to build Belo Monte in an arbitrary manner as is being proposed, which being of total responsibility of this government and of its representatives as also of the court what would occur with the executors of this work; with the workers; with the indigenous peoples. The Xingu river will become a river of blood. This is our message. That Brazil and the world have to know that what could happen in the future if the Brazilian governors do not respect our rights as indigenous peoples of Brazil.


     


    Brasilia, Federal District


    December 1 of 2009

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  • 17/12/2009

    Belo Monte and Global Warming: Indigenous Peoples and Traditional Communities at COP 15

    On December 11, at the Climate Conference in Copenhagen (COP 15), indigenous leaders and traditional communities spoke to the public regarding their impressions about the climate, current model of development and politics of contention on warming of the climate.

     

    It was in a conference room, packed and tense that a group of five persons from the Amazon spoke to the public. They are leaders of their communities, participate actively in the capacitation of their communities and are spokespersons for them.

     

    Ianukulá Kaiabi Suiá, of the Terra Indigena Xingu Association opened the press conference by saying, “for us the end could be much closer”. Ianu, as he is called, raised a practical and very immediate example: the Belo Monte. Regarding the implementation of the hydroelectric station he was emphatic: “We are not consulted, we have our rights ignored, we are, in practice, trampled.” Stating that implementation would cause “sacred territory to disappear”, Ianu summarized the message of the peoples of the Xingu “no to Belo Monte”.

     

    The basic foundation of the messages is the same: The model of development at present does not function – attacks the environment and does not result in benefits for those who historically protect the forests of the world: the traditional communities and indigenous peoples.

     

    The REDD mechanism was cited by all participants as something which could function, attending to international politics as well as local necessities. Sonia Guajajara – vice-coordinator of the COIAB (Coordination of Indigenous Organizations of the Brazilian Amazon), added that REDD, [if] planned from the ‘bottom – up’, would be able to guarantee their territories, the continuation of their cultures and valorization of their historical roles.

     

     Manuel Cunha, president of the National Council of Seringueiros (CNS), brought a clear message that the climate is no longer the same. That his father, an elderly illiterate seringueiro (rubber-tapper), could in the past predict the rains and thus his work days, and today, this being so remote, saddens the family. That the trees and their fruits are decompensated, out of season. This according to him hiders the work and even causes disagreements: birds and animals go to neighboring properties to feed.

     

    Manuel then emphasizes: “We are not those who are removing the vegetal cover of the Planet, it is unjust that we pay this price”.

     

    The event was organized by IPAM and can be seen online http://bit.ly/8aJrce.

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  • 17/12/2009

    Belo Monte.

    “Eu sei quanto suor esse povo derramou e quanto tempo gastou para construir suas casas. Digo mais uma vez: são casas de alvenaria e não barracos ou palafitas! Agora esse povo será compulsoriamente arrancado de seus lares e transferido para onde?”, pergunta Dom Erwin Kräutler, na entrevista que concedeu à IHU On-Line, realizada via e-mail. O bispo de Altamira, município situado em plena selva amazônica do Pará, descreve o apoio que a Igreja tem dado ao povo que luta contra a hidrelétrica de Belo Monte e também o que ocorreu depois do encontro que teve com Lula em setembro deste ano. “Não faltam opções e não faltam cientistas de renome que apresentam alternativas. Mas são silenciados imediatamente e até ridicularizados quando falam em energia solar ou eólica”, apontou ele.

    Dom Erwin também analisou o apagão que ocorreu em novembro. “Até hoje, não foram reveladas as verdadeiras causas que provocaram o apagão. Mas a ocorrência de uma falha no sistema ou até de uma irresponsabilidade na manutenção não justifica nunca uma construção gigantesca de consequências imprevisíveis, nocivas para os povos da região do Xingu e para o meio ambiente”. Quando questionado sobre como Marina Silva e Lula têm agido em relação à Belo Monte, Dom Erwin é veemente: “Marina Silva me decepcionou. Jamais pensei que ela se submetesse tão tranquilamente aos ditames de sua candidatura à presidência da República”.

    Confira a entrevista.

    IHU On-Line – Qual o apoio que o senhor tem recebido da Igreja nessa luta contra a hidrelétrica de Belo Monte?

    Dom Erwin – Sou bispo da Igreja que está no Xingu. A "minha" Igreja (não no sentido possessivo, mas de pertença!) é esta, que se encontra aqui e agora, na Amazônia. Ela não é apenas parte da Igreja espalhada pelo mundo, mas nela também subsiste a Igreja com todas as suas características: una, santa, católica e apostólica. E esta Igreja local encontra-se hoje diante de tremendos desafios. Não tenho a menor dúvida: estou recebendo o apoio desta Igreja no Xingu, Povo de Deus que aqui vive e caminha, luta e reza, se reune e celebra, se engaja por uma sociedade justa e fraterna, acredita que "outro mundo é possível", que coincide para nós com o sonho de Jesus: o Reino de Deus. Sim, sinto que essa Igreja que está no Xingu apoia o seu bispo quando assume a defesa dos povos que aqui vivem contra um projeto faraônico e megalomaníaco que promete gerar energia, mas, na realidade, vai gerar morte.

    A Igreja no Pará e Amapá (Regional Norte II da CNBB) manifestou-se de maneira inequívoca por ocasião de sua 32ª Assembleia Pastoral Regional (26 – 28 de agosto de 2009) em uma "Carta Aberta" onde afirma textualmente: "Neste momento, assistimos com muita preocupação aos trâmites em torno da projetada construção da Hidrelétrica de Belo Monte. Mais um grande empreendimento que não leva em conta os verdadeiros anseios da população e atiça apenas a ambição daqueles que apregoam um desenvolvimento que certamente será passageiro e destruidor. (…). Que desenvolvimento é esse que destrói inescrupulosamente o hábitat de povos e famílias, a flora e a fauna ? Esse megaprojeto, se concretizado, deixará milhares de ”projetos de vida” atropelados pelo deslocamento compulsório de inúmeras famílias de suas casas e de suas terras. (…) Os povos indígenas e comunidades tradicionais, secularmente perseguidos e dizimados, receberão o golpe fatal perdendo seus territórios e recursos naturais – e sobretudo a terra querida de seus ritos e mitos, onde sepultaram os seus ancestrais. Ressoa aos nossos ouvidos o grito de um índio Kayapó: ‘O que será de nossas crianças!’"

    Já o Documento do IX Encontro de Bispos da Amazônia (Manaus, 11 a 13 de setembro de 2007) "Discípulos Missionários na Amazônia" reclama: "Os grandes projetos são decididos fora da Amazônia, visando interesses que não beneficiam os amazônidas. Há projetos do Governo e de empresas com capital transnacional. Faz-se necessário analisar as consequências desses projetos: o desequilíbrio ecológico e social, o desmatamento, as mudanças climáticas etc." (n. 24)

    Sei também que a CNBB, sua presidência e o Conselho Permanente, sempre apoiou o meu e nosso empenho em favor dos povos indígenas no Xingu, dos ribeirinhos e do povo em geral que habita a cidade de Altamira e outras cidades vizinhas que fatalmente serão atingidos por esse projeto.

    IHU On-Line – Que reações o senhor teve depois do encontro com Lula que, na época, falou que nada seria feito "goela abaixo"?

    Dom Erwin – O presidente Lula me convidou para mais uma audiência que deveria ter acontecido entre 25 e 27 de novembro passado. Eu aguardava diariamente ser chamado, mas, no dia 26, por volta das 21 horas, fui informado de que o Presidente estava em viagem para a Venezuela e lamentavelmente não fora possível achar uma janelinha na agenda para receber-me. A promessa de "não empurrar o projeto goela abaixo de quem quer que seja" do Presidente não contou com a anuência de seu setor energético que não alterou em nada suas estratégias.

    Depois do encontro com o presidente Lula, em 22 de julho de 2009, tive outra oportunidade de conversar com representantes do Governo, desta vez, em Altamira, por ocasião das já famigeradas audiências públicas policiadas. Mais uma vez, achei imprescindível convidar representantes dos movimentos sociais de Altamira, mas os doutores voltaram a desfilar a mesma ladainha de vantagens e benefícios que já não convence ninguém. Explicaram que defendiam a viabilidade de Belo Monte do ponto de vista meramente técnico e, já um tanto acuados, admitiram que os problemas se situam na dimensão social e ambiental. Quem de nós não sabia disso? Mesmo assim, foi bom ouvir que eles concordam que existem tais problemas. Aí começaram a jorrar perguntas, nenhuma delas obtendo resposta convincente. Os doutores vêm com promessas vagas ou se calam quando se entra em detalhes, ou então, afirmam que tudo terá solução, mas não revelam que tipo de solução haverá.

    Pior, de repente, perdem as estribeiras e reagem com uma arrogância e prepotência que nunca esperávamos de membros do atual Governo e nos fazem recordar os idos da Ditadura Militar. Falam abertamente que nós podemos fazer o que bem entendemos: "O projeto vai sair!". O cinismo de afirmações como estas parece insuperável. Os senhores Walter Cardeal e Adhemar Palocci estão convictos de seu protagonismo em relação a esse nefasto projeto e querem passar, qual rolo compressor, por cima de todos nós. Não sei se o Presidente da República realmente se dá conta dessa investida ditatorial de seu primeiro escalão. Peço a Deus que o nosso presidente caia na real e desista da execução deste projeto. Caso contrário, entrará na história como o grande depredador da Amazônia e o coveiro dos povos indígenas e ribeirinhos do Xingu.

    Percebemos com grande angústia que, para esses setores do Governo, a ministra da Casa Civil e o ministro de Minas e Energia, o projeto está decidido. Por isso, toda essa pressão em cima do Ibama que é considerado "chato" por não chegar à conclusão de seus estudos para emitir a esperada licença prévia para a construção da Hidrelétrica Belo Monte. Tem-se a nítida impressão de que a esses ministérios e setores do Governo não interessa uma avaliação pormenorizada, criteriosa e responsável pelo órgão competente. Pressão em cima do Ibama é a ordem do dia. Chega de "entraves e penduricalhos"! Tempos atrás, num banquete oferecido pelo Governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, maior plantador individual de soja do país e ganhador do troféu "motosserra de ouro", por sua contribuição ao desmatamento do país, o próprio presidente Lula se deixou levar a uma declaração comprometedora.

    Identificou os índios, os quilombolas, os ambientalistas e até o Ministério Público como "entraves" para o progresso. Considerou ainda "penduricalhos" os artigos da legislação ambiental, pois, estes parâmetros legais estariam travando o desenvolvimento do país. Por isso, a ordem é de desconsiderar ou, pelo menos, não dar tanta importância a impactos sociais e ambientais. Caso contrário, o país estaria condenado à estagnação. Pode até ser que o presidente posteriormente se arrependeu do que falou de improviso, mas a mídia já havia divulgado a gafe e setores do Governo se apoderaram desse enunciado presidencial fazendo coro ao que declarou a máxima autoridade no País.

    Contudo, nós não paramos e continuamos a chamar a atenção da sociedade para os efeitos sociais e ambientais irreversíveis que o projeto, se for executado, vai causar. Dou-me conta de que, em Altamira e nos municípios circunvizinhos, apenas uma parte de empresários e comerciantes defendem o projeto por pensarem em rios de dinheiro que vão inundar a praça, esquecendo-se, no entanto, que um terço de Altamira vai para o fundo, e Vitória do Xingu tornar-se-á cidade fantasma porque perderá o porto que abastece Altamira e toda a região da Transamazônica. Os afluentes do Xingu nos municípios Senador José Porfírio e Porto de Moz secarão ou serão reduzidos a meros fios d’água, impossibilitando a navegação e a pesca que sustenta aquele povo e a agricultura familiar à beira daqueles rios.

    Altamira está hoje beirando os 100 mil habitantes. Mais de trinta mil pessoas vão ser compulsoriamente retiradas de seus lares que ficarão debaixo d’água, em troca de promessas de uma vida melhor. Os técnicos da Eletrobrás, no entanto, não sabem onde irão alojar todas essas famílias. E as experiências de outros empreendimentos menores que Belo Monte nos ensinam que as promessas não se concretizam. O próprio presidente Lula falou-me, na audiência que tive com ele, no dia 22 de julho de 2009, "da grande dívida do Brasil em relação aos atingidos por barragens, até hoje não saldada". Será que, daqui para a frente, tudo vai mudar? Será que, de repente, todas as promessas serão honradas, e as famílias arrancadas de suas moradias serão transferidas para mansões construídas para elas em lugar aprazível. O Governo até hoje nem sabe para onde será removido todo esse povo. Além do mais, subestima tremendamente a população que será diretamente atingida por essa desgraça.

    Há poucos dias, em entrevista concedida ao Jornal do Brasil (13.12.09), o presidente do Ibama, Roberto Messias Franco, cita meu nome e concorda comigo: "ele tem uma preocupação legítima: e se vier mais gente, peões, com a construção? Tem razão em querer um plano de assistência social para essas pessoas". Em seguida, afirma: "as cerca de 12 mil pessoas que moram lá, em palafitas, beiras de igarapés, sem saneamento básico, devem ser reassentadas em condições melhores que as de hoje. O presidente Lula faz questão de dizer que as pessoas não podem ser arrancadas do lugar, mas recolocadas onde a vida pode ser melhor. Vai exigir novos bairros, novas cidades, com assistência, casas, estrutura". Ora, o presidente do Ibama está terrivelmente equivocado quando fala em "palafitas". Existem "algumas" moradias deste tipo à beira do Igarapé Altamira e ao longo da Estrada Ernesto Acioly, mas as ruas (só se fala em ruas, não em moradias!) na área que será inundada, segundo os estudos feitos pelo próprio Governo (EIA/RIMA), são margeadas por casas, em sua imensa maioria, de alvenaria, casas até de dois andares. Senti um aperto no coração durante a procissão da Imaculada Conceição realizada no último dia 8 de dezembro. Passamos exatamente pelas ruas cujos dias serão contados se o projeto tornar-se realidade.

    Não são apenas 12 mil pessoas. Peço ao presidente do Ibama que envie seu pessoal para atualizar o censo dos diretamente atingidos. Eu sei quanto suor esse povo derramou e quanto tempo gastou para construir suas casas. Digo mais uma vez: são casas de alvenaria e não barracos ou palafitas! Agora esse povo será compulsoriamente arrancado de seus lares e transferido para onde? O presidente Lula não explica "onde a vida pode ser melhor", só promete "novos bairros, novas cidades, com assistência, casas, estrutura". Será que Lula sonha com um Shangri-La tropical para esse povo que será atingido pela desgraça de Belo Monte, será que ele quer recuperar o paraíso perdido ou fazer emergir das águas represadas do Xingu uma Atlântida submersa. Déjà vu! Esse filme já conhecemos desde Itaipu, e ainda mais desde Tucuruí e a desastrosa Balbina! Quem dá a garantia para as promessas presidenciais se concretizarem? Quando o lago submergir um terço da cidade de Altamira, o presidente Lula e seu staff já obterão suas polpudas aposentadorias e irão lavar suas mãos, pois não terão que prestar homenagem ou satisfação a quem, naquela altura, governará o Brasil. E será que um futuro Governo vai honrar o compromisso assumido por Lula de recolocar esse povo "onde a vida pode ser melhor"? A futura geração amazônica irá condenar ao inferno a quem causou toda essa desgraça e arrasou irreversivelmente essa região magnífica. Mas, o arrogante setor energético do Governo não se dispõe a ouvir o brado do povo. Dane-se quem for contra a hidrelétrica! Bem de acordo com aquele antigo provérbio árabe: Os cães ladram e a caravana passa!  

    IHU On-Line – Algumas críticas têm sido feito no sentido de que os ambientalistas apenas são contra, mas não apresentam alternativas para produção de energia no país. Que opções temos para gerar energia, sem ser a partir da construção de hidrelétricas na Amazônia?

    Dom Erwin – Não faltam opções e não faltam cientistas de renome que apresentam alternativas. Mas são silenciados imediatamente e até ridicularizados quando falam em energia solar ou eólica. Há poucos dias, o Fantástico, da Rede Globo, apresentou novas técnicas que os japoneses inventaram de transformar, em grande escala, os raios solares em energia elétrica. O problema é que quaisquer alternativas não interessam às firmas construtoras que estão ávidas de aplicar seu know-how e fazer funcionar todo o seu maquinário exatamente na construção de hidrelétricas, modelo tradicional, com barramentos, imensos paredões de cimento, diques e canais de derivação. É só isso que sabem fazer e traz lucros astronômicos. Nada se importam com as consequências para os povos da região e o meio ambiente. É por isso que pressionam desavergonhadamente o Ibama para liberar logo a licitação. Têm muita pressa de faturar.

    IHU On-Line – Houve repercussões do apagão, ocorrido na semana passada, nas argumentações favoráveis à construção da Usina de Belo Monte? O apagão reforça as motivações do governo?

    Dom Erwin – Naturalmente, para os defensores do projeto, o apagão era bem-vindo. Eles se deleitaram quando a mídia veiculou a notícia de que alguns Estados do sul e sudeste ficaram por horas sem energia. Até hoje não foram reveladas as verdadeiras causas que provocaram o apagão. Mas a ocorrência de uma falha no sistema ou até de uma irresponsabilidade na manutenção não justifica nunca uma construção gigantesca de consequências imprevisíveis, nocivas para os povos da região do Xingu e para o meio ambiente.

    IHU On-Line – Marina Silva afirmou que "não há como fugir do aproveitamento energético do rio Xingu". Analisando também a posição de Lula sobre o empreendimento, como o senhor percebe essas formas de olhar os rios da Amazônia?

    Dom Erwin – Marina Silva me decepcionou. Jamais pensei que ela se submetesse tão tranquilamente aos ditames de sua candidatura à presidência da República. Nunca pensei que ela abrisse mão de sua convicção de defender o meio ambiente contra projetos insanos e imperdoavelmente omissos nos seus estudos de viabilidade. Marina fala como candidata do Partido Verde e, como tal, deveria exatamente assumir a defesa do "Verde das Florestas"! A afirmação "não há como fugir do aproveitamento energético do rio Xingu" é a mesma cantilena que estamos cansados de ouvir da boca dos intransigentes tecnocratas do Governo. Pior, ao repetir esse refrão, Marina capitula diante dos ideais que fizeram dela uma voz respeitada e uma referência em nível nacional e internacional em se tratar da defesa da Amazônia. Não é mais a Marina que eu conheci e hospedei em Altamira no dia em que mataram a Irmã Dorothy! Marina traiu sua missão de vanguarda dos povos da floresta. O que ela espera alcançar com essa mudança de seu visual? Alguns votos dos que até agora fizeram oposição à ela?

    IHU On-Line – Qual a força e os limites da pressão social contra Belo Monte? A decisão, em sua opinião, sobre a construção ainda pode ser revertida?

    Dom Erwin – Claro que pode ser revertida! E é isso que esperamos! Que finalmente todo esse discurso sedutor do Governo e das empresas barrageiras e mineradoras seja desmistificado. A espada de Damocles paira sobre o Xingu e seus povos, pendurado por um fio muito delgado. Mas, como a lenda contada pelo escritor romano Horácio não termina em tragédia, pois, o fio tênue resistiu, assim esperamos que a sensatez vença a insanidade, e o Xingu continue "vivo para sempre".

    IHU On-Line – Qual é o protagonismo dos povos indígenas na luta contra Belo Monte?

    Dom Erwin – De uma coisa tenho certeza: os índios não vão desistir. Podem até ser derrotados para a vergonha do atual Governo, mas não desistirão nunca. Eles têm outros parâmetros para avaliar os projetos. Para eles, o rio é sagrado, e o sujeito da história é o povo, e não um projeto inventado por "brancos" que consideram a terra, a selva e o rio matéria-prima para fazer negócios. A palavra de ordem deste sistema capitalista neo-liberal é "nenhuma terra, nenhuma floresta, nenhum rio fora do mercado!" enquanto os índios, da altura se sua sabedoria milenar, gritam: "Toda a terra, a selva e o rio a favor da Vida e da Paz". São dois projetos em confronto: um a favor da Vida, outro a favor do negócio a qualquer preço.

    Dou-me conta que, no contexto desse Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), os povos indígenas estão sofrendo mais uma fase de anti-indigenismo, partindo, desta vez, dos mais altos escalões do Governo. Lembro apenas dois episódios altamente vergonhosos. O ministro de Minas e Energia Edison Lobão se refere aos índios com um termo tão discriminatório que causa inveja ao regime nazista em relação ao povo judeu. O ministro sujou internacionalmente a imagem do Brasil. Chama os índios e seus aliados de "forças demoníacas"! Quando no "escândalo da parabólica" o respeitado jurista e diplomata Rubens Ricupero, Ministro da Fazenda em 1994, inadvertidamente  revelou "em off" alguns detalhes nada comprometedores do Plano Real, teve que renunciar ao cargo. O ministro Lobão não falou "em off", mas em bom e alto som para o Brasil e todo mundo ouvir e saber o que pensa dos povos indígenas. Mesmo assim continua incólume em sua função. Entendo que, segundo a Constituição Cidadã de 1988, esse ministro deveria ser processado por discriminação racial.

    O outro caso foi perpetrado pela Funai, que deveria defender os interesses e anseios indígenas. Preferiu assumir o papel de Judas na questão de Belo Monte. Entrará na história como traidora dos povos indígenas do Xingu! A Funai é sucessora do SPI (Serviço de Proteção ao Índio), idealizado e criado, em 1910, pelo grande defensor dos povos indígenas, Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon. Foi extinto, em 1967, devido a veementes protestos internacionais por causa das carnificinas promovidas em aldeias indígenas às barbas do SPI e sob seus benévolos olhares. A Funai, atual órgão indigenista do Governo, sucessora do SPI, também fecha os olhos ante um desastre projetado. Como o SPI tapou os ouvidos aos gritos dos índios torturados do século passado e, por isso, foi extinto, a Funai do século XXI também não quer importunar-se com o clamor destes povos. Antes atende aos interesses de empresas barrageiras e mineradoras que jamais se importarão nem com indígenas, nem com ribeirinhos, nem com as famílias das baixadas de Altamira que serão compulsoriamente expulsas de seus lares, nem com a flora ou fauna do Xingu. Sem o menor escrúpulo repetem com o rei Louis XV da França (1710-1774): “Aprés moi le deluge” (Depois de mim o dilúvio).

    Mais um capítulo da resistência ao projeto Belo Monte foi escrito no dia 1º de dezembro passado. A Procuradoria Geral da República convidou para um debate entre o Governo Federal e as populações que serão mais atingidas, caso o projeto se torne realidade. Dezenas de indígenas, ribeirinhos e representantes dos movimentos sociais de Altamira enfrentaram uma longa e cansativa viagem até a capital federal no intuito de participar dos debates, coordenados pela Dra. Débora Duprat, Vice-Procuradora Geral da República. E qual não foi a surpresa dos que vieram de tão longe: os representantes de importantes órgãos do Governo Federal simplesmente não compareceram à audiência pública. Nem a Fundação Nacional do Índio (Funai), nem a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), e, pior ainda, nem a própria Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobrás) acharam necessário fazerem-se presente. Antônia Melo, recém-condecorada pela OAB-Pará com o prêmio José Carlos Castro, em reconhecimento de sua defesa da dignidade humana e do meio ambiente na Amazônia, lamentou em nome de todos: "Hoje, mais uma vez, eles não quiseram ouvir o povo. Não quiseram debater com o povo. É uma vergonha a arbitrariedade com que estão tratando nossa gente!" Mesmo assim, as lideranças entregaram documentos em que, mais uma vez, repudiam a construção da barragem e da hidrelétrica de Belo Monte e afirmam que não vão desistir da luta, acenando – Deus queira que não aconteça! – até com a possibilidade de haver derramamento de sangue na defesa do rio. O que me assusta neste episódio todo é a brutal determinação dos órgãos governamentais de simplesmente ignorar essa gente que não foi a passeio para Brasília e pôr "no gelo" os representantes dos povos indígenas, dos ribeirinhos, do povo de Altamira. Através de uma atitude antidemocrática como esta, torna-se patente que estão querendo matar-nos pelo cansaço. Mas não conseguirão!

    E os índios se manifestaram numa carta, datada de 1º de dezembro de 2009 que impressiona por causa de sua mensagem contundente. É um derradeiro brado indígena a um governo aparentemente insensível. Quem lê o último parágrafo desta carta fica triste por causa da irritante frieza do Governo, mas a tristeza se transforma e indignação e revolta contra os responsáveis por um projeto insano que querem tocar sem dó e piedade, custe o que custar: "Nós, povos Indígenas, não vamos sentar mais com nenhum representante do governo para falar sobre UHE Belo Monte; pois já falamos tempo demais, e isso custou 20 anos de nossa história. Se o governo brasileiro quiser construir Belo Monte da forma arbitrária de como está sendo proposto, que seja de total responsabilidade deste governo e de seus representantes como também da justiça o que virá a acontecer com os executores dessa obra; com os trabalhadores; com os povos indígenas. O rio Xingu pode virar um rio de sangue. É esta a nossa mensagem. Que o Brasil e o mundo tenham conhecimento do que pode acontecer no futuro se os governantes brasileiros não respeitarem os nossos direitos como povos indígenas do Brasil".

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  • 17/12/2009

    Mais uma vitória contra a criminalização Xukuru

    Neste fim de ano, os indígenas Rinaldo Feitosa e Edmilson Guimarães ("Besouro"), do povo Xukuru, passarão o natal relativamente mais "tranqüilos". Os advogados Sandro Lobo, Denise da Veiga Alves, Paulo Machado Guimarães – assessores jurídicos do Cimi – e Gilberto Marques, conseguiram pedido de extensão em habeas corpus junto à 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), para que para que Edmilson também seja transferido da penitenciária em Caruaru para o posto da Funai, próximo a terra indígena onde vivem.

     

    Os indígenas cumprem prisão preventiva há cerca de um ano, acusados por um homicídio que não cometeram e que para o qual sequer existem provas.O cumprimento do acórdão deve ser feito até o final desta semana.

     

    Tanto o relator do habeas corpus, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, como a 5ª. Turma do STJ entenderam que o parágrafo único do artigo 56, da Lei 6001, de 1973, aplica-se ao cumprimento destas preventivas pelos indígenas Xukuru, em regime de semi liberdade no posto de órgão indígena mais próximo, no caso em Pesqueira PE. Esta orientação já vem sendo adotada pelo STJ, e vem de encontro ao respeito à especificidade cultural dos indígenas brasileiros e aos direitos garantidos pelo Estatuto do Índio, pela Constituição Federal e pela Convenção 169 da OIT.

     

    Atualmente, pelo menos 43 Xukuru estão sendo processados, dos quais 31 foram condenados. Esse processo de criminalização foi denunciado, em março de 2009, à OEA. Todos que acompanham a caminhada deste povo por seus direitos sabem que – em nome de interesses próprios – as elites políticas e econômicas da região têm tentado, por diversas maneiras, desmoralizar, desestruturar e desmobilizar os Xukuru, impedindo-os de concretizar seu projeto de vida. Trata-se de uma violência inominável contra um povo que, com o auxílio de inúmeros parceiros, tem dado exemplos comoventes de coragem e determinação.

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