• 21/10/2013

    A lesão cerebral dos agrocéfalos

    As causas não são, ao certo, sabidas. Ao menos até hoje. Se chifrado por algum boi durante o abate ou resultado de uma compressão da próstata na tentativa de se cavalgar algum Quarto de Milha. Talvez pelo esforço excessivo de pensar um campo da antropologia para justificar o latifúndio. Não se sabe. Mas o fato é que a lesão cerebral dos agrocéfalos (e, claro, agrocéfalas) atingiu o patriarca progenitor da raça, entre uma grilagem e outra de terras no decorrer do processo histórico. O resultado é a incapacidade genética que impede aos herdeiros sentir qualquer coisa de nobre pela natureza ou ao que a ela se refira. 

     

    Esta é uma teoria, ainda em construção, com base nos estudos apontados pelo neurocientista português Antônio Damásio, autor da obra O erro de Descartes – emoção, razão e o cérebro humano, que mostra como as lesões cerebrais alteram as formas de ação do sujeito, mesmo quando o raciocínio se mostra intacto. 

     

    Na prática, os agrocéfalos mantêm sua capacidade de contar a metragem das cercas, de saber o que é regalia, de compreender como corromper-se e como corromper, de como se chega a Miami. Há, no entanto, uma falha neste raciocínio, pois só sabem contar suas riquezas convertidas em sacas de soja, de milho ou algodão e só conseguem contabilizar área em milhões de hectares. Também, nesta falha, aprendem a fazer dívidas, emprestar de bancos e acessar incentivos governamentais, mas não aprendem a pagar estas dívidas.

     

    Outra deficiência – resultante da possível chifrada ou da compressão prostática paterna – é a de não estabelecer relações de amor com nada que se refira à natureza. O que lembra árvore vira madeira; o que lembra água vira irrigação ou hidrovia; o que lembra fauna vira caça; o que é verde lembra soja, cana, milho, algodão. E, estranhamente, o que lembra soja, milho, algodão vira agrobusiness, Bolsa de Chicago, exportação.  

     

    O raciocínio dos agrocéfalos tem um estranho funcionamento e desenvolve incrível capacidade de elaboração de leis, portarias e propostas de emendas constitucionais que resultam em benefício próprio. Para esta finalidade conseguem – por meios incrivelmente criativos de financiamento de campanhas – eleger-se para cargos legislativos em todas as esferas, da Câmara de Vereadores ao Senado Federal. Com esta “criatividade” conseguiram abocanhar mais de 214 das 513 cadeiras disponíveis no Brasil para os deputados federais e ???? no Senado. Em outros tempos poderíamos pensar ser um golpe de Estado, mas para os agrocéfalos é uma “expressão da democracia”.

     

    Na truncada relação não estabelecida com a natureza ou com tudo que lembre a mesma – resultado da lesão – os afetados também desenvolvem um ódio incontido para com as pessoas e povos que lembram natureza: quilombolas, indígenas, comunidades tradicionais, ambientalistas, indigenistas. Por isso, querem a todo custo acabar com os direitos destes povos, sejam territoriais ou de serem eles mesmos. Negam, por exemplo, em diferentes lugares do país, que existam indígenas, sobretudo quando estão próximos a supostas “propriedades”. Quando não, dizem que são indígenas paraguaios, bolivianos. Os que existem, na catarse agrocéfala, necessitam de “políticas públicas urbanas”, não de terra, território, meio ambiente.

     

    Beneficiados por diferentes governos, dos ditatoriais aos supostamente democráticos – que cederam terras ocupadas antes por indígenas ou posseiros à sanha exploradora dos agrocéfalos de outrora – os acometidos pela agrocefalia, hoje, assemelham-se àquele desenho animado de dois ratinhos que cotidianamente agiam no intuito de realizar o megalomaníaco sonho de dominar o mundo.

     

    Os agrocéfalos que estão no Senado, na Câmara dos Deputados, nos governos estaduais, dirigindo suas confederações ou bancadas, poderiam ser representados nestes dois personagens, conhecidos no Brasil como a dupla Pink e Cérebro. Como eles, poderíamos sugerir que, em cada abertura de seção parlamentar ou de pronunciamentos, os agrocéfalos que ocupam cargos nestas casas poderiam dizer: nós vamos dominar o mundo.

    Claro, não nos esqueçamos que os personagens animados, apesar de todos os esforços, sempre se atrapalhavam e, nem de longe, resvalavam em seu intento. Isso também esperamos que ocorra com aqueles acometidos pela agrocefalia hereditária.

     

    Não obstante, como nos aponta o mesmo Damásio: do ponto de vista da ciência, somos um cérebro individual, mas que se molda socialmente. Assim, na perspectiva de estabelecer a correção à hereditariedade da referida anomalia cerebral e seus efeitos, cabe aos diferentes setores sociais funções específicas nesta verdadeira junta médica: aos movimentos sociais cabe a boa e velha luta, militância. Governos só querem destes movimentos a subserviência, cooptação: deve-se insistir na consciência de que poder só se for popular.

     

    Aos povos e comunidades tradicionais cabe sua existência e resistência a cada novo projeto saído das cabeças agrocéfalas, a continuidade incômoda dos Outros 500, longe de qualquer projetinho “verde” ou “carguinho assalariado”; ao governo federal cabe a vergonha e mudança de atitude, não mais alimentando com R$ 107,5 bilhões a sanha que mantém e é mantida pela agrocefalia e seus portadores. Também cabe ao mesmo governo parar de pensar e agir como se também fosse acometido da anomalia: atacando indígenas com a Polícia Federal e Força Nacional sob pseudo-argumentos. Deverá também banir de suas concepções ideias agrocefalinas como as já pronunciadas pelos ministros da Justiça, Casa Cvil, Minas e Energia, Advocacia-Geral da União (AGU).

     

    Se os agrocéfalos não se moldam nem se deixam moldar, preponderantemente agindo a partir de seu umbigo-mundo, caberá aos que não são portadores da mesma anomalia construir a real democracia, sem DEMônios, sem PoPulismos, sem Privilégios Só Deles, sem Pomposas eMendas Desviadas dos Brasileiros, sem Pseudo Sócio Democracia e emBustes, sem Possibilidades de eSconder históricos Crimes.

     

    Certamente esta real democracia não será resultado de uma união democrática agrocefalista e muito menos uma construída em uma República dos Ruralistas. Cruz, credo, Deus nos livre.

     

     

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  • 21/10/2013

    Usina despeja vinhoto em rio fonte de subsistência do povo Potiguara

    Capitão e Irembé Potiguara,

    de Baía da Traição (PB) 

     

    Foto: Renato Santana/Cimi  A usina e indústria de açúcar Monte Alegre, sediada no município de Mamanguape, litoral da Paraíba, derramou centenas de litros de vinhoto, subproduto viscoso da cana de açúcar, nas águas do rio que leva o mesmo nome da cidade e corta o território Potiguara. Milhares de peixes, camarões e demais crustáceos acabaram morrendo, sendo tal fauna responsável pela alimentação e subsistência do povo indígena. O fato aconteceu no último mês de setembro. Na foto ao lado, Capitão Potiguara (à esquerda) e o cacique geral Sandro Potiguara.

     

    Potiguara significa, em tupi, comedor de camarão. Desde a colonização o povo nunca saiu de seu território, sendo então a pesca de peixes e camarão uma atividade tradicional e fundamental às aldeias Potiguara. Com o derrame do vinhoto, aproximadamente 500 famílias indígenas das aldeias Jaraguá, município de Rio Tinto, Três Rios, Tramataia e Camurupim, município de Marcação, acabaram prejudicadas e estão impedidas de pescar. 

     

    Os pescadores indígenas encontram-se desolados sem saber como agir diante da presente situação. Os relatos dão conta de que o principal meio de sobrevivência está completamente poluído e agora questionam o que vão fazer depois dessa tragédia ambiental e social. Não é possível determinar quanto tempo o rio levará para se livrar do vinhoto, caso a usina não lance mais o detrito em suas águas.

     

    Em 1987 o povo Potiguara passou por situação semelhante. Na ocasião a usina Agican, de Rio Tinto, também jogou vinhoto, mas no rio Camaratuba, matando milhares de peixes e crustáceos. A poluição prejudicou a vida de diversas famílias nas aldeias Cumaru, São Francisco, Galego, Tracoeira, Santa Rita, Laranjeiras, Lagoa do Mato, entre outras. O caso foi denunciado inúmeras vezes pelas lideranças indígenas à época cobrando providências, mas o caso segue impune 26 anos depois. E a razão está num relatório do próprio Estado.

     

    A Superintendência de Administração de Meio Ambiente (Sudema) da Paraíba emitiu um laudo considerado uma vergonha para os Potiguara. O órgão relatou ao povo que a contaminação nas águas do Camaratuba se deu por conta de um caminhão de sal que virou no rio.

     

    Tristeza repetida

     

    A tristeza que tomou conta do povo naquele momento hoje se repete. Esperamos que as autoridades competentes tomem as devidas providências e que as verdadeiras causas deste crime apareçam. O povo Potiguara não quer nada além de viver do meio ambiente, sempre com respeito e protegendo esse espaço que nos concede o alimento.

     

    Que nosso pai Tupã nos proteja e que a justiça seja feita. A usina e indústria Monte Alegre deve pagar por este crime ambiental e contra o povo. Chega de Impunidade!

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  • 21/10/2013

    STF vota petição que trata de embargos da Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR)

    O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, cravou na pauta da Corte da próxima quarta-feira, 23, o julgamento da Petição 3388 referente aos embargos de declaração apresentados à decisão que reconheceu a constitucionalidade da demarcação – em área contínua – da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, Roraima, em 2009.

     

    Como forma de questionar a decisão da Corte Suprema, os embargos foram impetrados por ruralistas e fazendeiros, então ocupantes de Raposa e contrários à demarcação, mas também pelas comunidades indígenas de Raposa, Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Ministério Público Federal (MPF), que questionam 19 condicionantes impostas às providências executivas de homologação da terra.

     

    Tais condicionantes foram propostas no voto do ex-ministro do STF, Carlos Alberto Menezes Direito, que faleceu ainda em 2009. Quase quatro anos se passaram sem que elas fossem julgadas e as condicionantes se tornaram parte da retórica ruralista para justificar posições contrárias às novas demarcações, todavia uma pedra amarrada aos pés dos direitos indígenas.

     

    A utilização, porém, das condicionantes extravasou a bancada ruralista no Legislativo e mobilizou o Executivo: o ministro Luiz Inácio Adams, da Advocacia-Geral da União (AGU), usou-as para baixar a Portaria 303. Um dos pontos mais controversos da portaria é a possibilidade de intervenções em terras indígenas sem consulta aos povos que nelas habitem, além de estender as condicionantes para as demais terras indígenas brasileiras.  

     

    Alguns artigos da Portaria 303 são cópias de pontos das condicionantes. Depois de protestos, exaurindo e desidratando os argumentos do ministro, o movimento indígena conseguiu a suspensão da medida. Adams insistia na validade das condicionantes, mesmo sem a votação dos embargos pela corte do STF. O fato é que parte das condicionantes vem servindo de base para projetos de leis, portarias e propostas nocivos aos direitos indígenas. 

     

    “Este momento é especial porque é exatamente o momento onde os direitos indígenas são questionados. O Supremo tem a prerrogativa de analisar se as condicionantes vão de encontro com os direitos conquistados. No contexto histórico, esse julgamento então tem uma importância considerável. Temos convicção de que os ministros do STF fazem tal leitura”, destaca um dos advogados das comunidades indígenas de Raposa Serra do Sol, Adelar Cupsinski.

     

    Condições ao direito?

     

    Das 19 condições à demarcação propostas pelo ex-ministro Menezes Direito, ao menos 90% delas já estão referendadas na Constituição Federal e Decreto 1775/96. Ou seja, são contempladas em seus fins e como parte dos ritos de demarcação de terras indígenas. No entanto, algumas destas condicionantes preocupam os povos indígenas porque criam complementações às leis existentes e, ao mesmo tempo, vão de encontro a elas.

     

    A exceção ao usufruto exclusivo dos povos indígenas sobre as terras tradicionais, sem a necessidade de consulta às comunidades, aparece em duas condicionantes. Entre as exceções estão as intervenções militares, exploração de alternativas energéticas, logísticas e equipamentos públicos. O artigo 231 da Constituição – “Dos Índios” – pede uma lei complementar para regulamentar tais exceções.

     

    No Legislativo existem ao menos três propostas em tramitação (PLP 227/12, PLP 260/91, votado no Senado, e outro ainda sem número do senador Romero Jucá) que visam regulamentar o artigo 231. Em todos os casos as duas condicionantes estão contempladas, ampliando apenas para o setor que o deputado ou senador que fez a proposição responde ao interesse, no caso o agronegócio, mineração e projetos do Executivo no tocante aos grandes empreendimentos.

     

    Diante destas condicionantes, uma dúvida é ventilada pelos povos indígenas: a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo governo brasileiro em 2004 e com poder de lei nacional, cujo conteúdo garante aos povos o direito a consulta quando intervenções ocorrerem em suas terras, não é desrespeitada diante de tais condições?

     

    “A convenção trouxe algo muito importante para nós: nada nesse país que nos afete pode ser decidido sem nossa participação. O branco diz que o Estado brasileiro é democrático, cria instrumentos, mas fica só na aparência. Não nos opomos ao crescimento do país, mas isso não pode significar destruição e sofrimento aos povos indígenas”, declara Sônia Bone Guajajara, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).     

     

    Já em outra condicionante, o ministro determina que o Instituto Chico Mendes de Conservação (ICMbio) passe a se responsabilizar pelo usufruto dos índios em áreas afetadas por unidades de conservação. A Funai prestaria consultoria ao instituto. As comunidades indígenas teriam participação nessa gestão, em caráter apenas opinativo. Porém, se o direito à terra pelos indígenas é originário, ele não vem antes da delimitação das unidades de conservação? A posse permanente e o usufruto exclusivo são constrangidos, conforme os advogados das comunidades indígenas de Raposa.

     

    Nas demais condicionantes que suscitam dúvidas entre os indígenas estão: a admissão e trânsito de não-indígenas nas terras tradicionais conforme orientação da Funai, quando deveria ser dos povos que nelas vivam, além de ficar vedada às comunidades afetadas por empreendimentos a cobrança de indenização pelos impactos gerados no meio ambiente físico e cosmológico. Por fim, outra condicionante é alvo de muitas dúvidas entre as lideranças indígenas: a proibição de ampliação de terras indígenas já demarcadas.

     

    Os argumentos dos indígenas e alguns juristas, caso de Dalmo Abreu Dallari, dão conta de que quando uma terra tradicionalmente ocupada não é corretamente demarcada, as comunidades ficam alienadas da posse determinada pela Constituição Federal, acarretando prejuízos também para a União, e o usufruto exclusivo das riquezas naturais é ferido, gerando lesão ao patrimônio público.

     

    “Então não se trata de ampliação, mas de reparação de um erro. Muitas terras, inclusive, foram demarcadas em períodos históricos de desmandos estatais, de exceção, deixando de fora da demarcação, de forma proposital para benefício de terceiros, áreas tradicionais vitais à sobrevivência dos povos”, aponta o cacique Marcos Xukuru, membro da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI).

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  • 18/10/2013

    Justiça Federal determina demarcação imediata da TI Xukuru Kariri

    Patrícia Bonilha,

    de Brasília

    Após 34 anos lutando pelo direito à terra que tradicionalmente lhes pertence, o povo Xukuru Kariri conseguiu uma importante vitória na tarde desta quarta-feira (16). O juiz federal Antônio José de Carvalho Araújo, da 8ª Vara Federal em Arapiraca, atendeu aos pedidos do Ministério Público Federal (MPF) e condenou a União e a Fundação Nacional do Índio (Funai) a concluírem imediatamente, em um prazo de 30 dias, a demarcação física da Terra Indígena (TI) Xukuru Kariri, localizada no município de Palmeira dos Índios, nos termos da Portaria no 4.033, de 15 de dezembro de 2010.

     

    Além disso, a justiça também determina que as avaliações de benfeitorias existentes em todos os imóveis incidentes na TI sejam concluídas em um prazo de 60 dias e define o prazo de seis meses para que seja concedida a posse definitiva da área de 7.033 hectares ao povo Xukuru Kariri, inclusive com a desintrusão dos atuais posseiros da área.

     

    “Esta liminar realimenta nossos sonhos e nos deixa mais confiantes de que a Funai vai finalmente concluir o seu trabalho, que por submissão aos conchavos políticos foi interrompido em agosto”, afirmou José Carlos Araújo Ferreira, do povo Xukuru Kariri. Ele também ressalta a importância desta decisão pelo fato de que quatro pequenas áreas retomadas, que estão dentro da terra indígena, têm atualmente liminares para a reintegração de posse. “Esta decisão do juiz evidencia que a terra é tradicionalmente nossa e que os não indígenas é que precisam ser retirados dela”, enfatiza Ferreira.

     

    Um grupo técnico da Funai estava realizando o levantamento fundiário das benfeitorias existentes em todos os imóveis dentro da terra indígena em agosto, quando teve seus trabalhos suspensos por um memorando que alegava falta de recursos para a continuação do mesmo. No entanto, um total de R$ 250 mil já estava empenhado, ou seja garantido, para a execução do trabalho. Os indígenas avaliam que a suspensão foi resultado da pressão feita pelo presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB-AL), do senador Fernando Collor (PTB-AL), do deputado federal Renan Filho, e do estadual Edval Gaia, além do prefeito James Ribeiro, de Palmeira dos Índios.

     

    A suspensão do levantamento das benfeitorias aconteceu pouco mais de uma semana de um encontro entre Calheiros, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann e o prefeito James. Ferreira afirma que a Funai e a União devem recorrer e é possível que o processo vá para a 5ª Região, de Recife, e posteriormente vá para o Supremo Tribunal Federal.

     

    Morosidade causa violência

     

    Ferreira afirma que a morosidade da Funai e do governo em concluir o processo demarcatório traz prejuízos incalculáveis para as comunidades indígenas, já que lideranças são ameaçadas e os indígenas passam por inúmeros constrangimentos. “Se a Constituição tivesse sido cumprida e o processo já concluído, nossas terras teriam sido demarcadas de forma pacífica e não teríamos que correr o risco de perder nossas próprias vidas para garantir a efetivação de nossos direitos”, conclui ele.

     

    Os autos reforçam a fala de Ferreira quando o juiz observa que “Outro grande prejuízo enfrentado pelos Xucurus Kariris é o histórico conflito com a comunidade não indígena de Palmeira dos Índios, conflito este que tem cada vez mais se acirrado, em decorrência da insegurança jurídica gerada pela mora das demandadas em cumprir dispositivos constitucionais. Prova desse histórico é a gama de ações possessórias em trâmite na 8ª Vara Federal de Arapiraca, todas almejando a evasão dos índios de propriedades rurais localizadas no Município de Palmeira dos Índios/AL”.

     

    No caso de eventual descumprimento dos prazos estabelecidos pela liminar, o juiz fixou multa diária de R$ 5 mil, a ser revertida em favor do povo Xukuru Kariri.

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  • 18/10/2013

    Nota Pública do Cimi contra as declarações do deputado estadual do Acre Denilson Segóvia

    O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), órgão vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), por meio de seu Regional Amazônia Ocidental, vem a público repudiar as declarações do deputado estadual Denilson Segóvia (PEN/AC), que nesta última quinta-feira, 17 de outubro, fez um pronunciamento na Assembleia Legislativa do Estado do Acre em que acusa os povos indígenas, de forma preconceituosa e visando criminalizar e demonizar as culturas e os próprios indígenas, entre outras coisas, de infanticidas e pedófilos.

    Ao associar as culturas indígenas ao infanticídio e a pedofilia, o deputado mostra que desconhece por completo a realidade destes povos. Não há no Acre um único caso de infanticídio, como quer fazer crer o deputado. De outro lado, se há casos de pedofilia, cabe a quem souber denunciar às autoridades e, a estas, apurar e aplicar a legislação prevista para o caso. O que não pode é acusar sem nenhum fundamento e sem apresentar qualquer indício, conforme o fez o deputado Denilson Segóvia.

    Quanto a associação das culturas indígenas à indolência e à preguiça, revela apenas um gigantesco preconceito e um etnocentrismo exacerbado e fundamentalista apresentado como se fosse um dado da “evangelização”, o que não é. Os povos indígenas do Acre, ao contrário do que afirma o deputado, ajudaram decisivamente na construção deste Estado trabalhando incansavelmente nas estradas de seringa e outras lidas rurais.

    O que o deputado chama de “cultura civilizada” nada mais é do que o fruto do mesmo etnocentrismo e fundamentalismo religioso que escravizou milhares de povos pelo mundo. Longe de incentivar este tipo de “civilização” ou “cristianização”, as igrejas deveriam se desculpar e reparar o grande mal que fizeram a estes povos. Vários povos foram dizimados em nome desta “civilização”. Não nos é mais possível, em pleno século XXI, admitirmos métodos e argumentos medievais, genocidas, para impor certa cultura, religião e cosmovisão, tida como superior.

    O Cimi, Regional Amazônia Ocidental, reafirma o respeito às diversidades culturais e religiosas desses povos e exige retratação pública por parte do deputado Denílson Sagóvia e que se cumpra a Constituição Federal em seu artigo 231 “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.”

    Rio Branco, 18 de outubro de 2013.

    Conselho Indigenista Missionário

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  • 17/10/2013

    Encontro Continental de Teologia Índia acontece no Equador e discute o Sumak Kawsay dos povos indígenas

    Representantes de povos indígenas e agentes pastorais de 15 países estão reunidos, até esta sexta-feira, 18, no 8º Encontro Continental de Teologia Índia, que nesta edição acontece na Província de Cotopaxi, no Equador. Os mais de 100 participantes do encontro discutem o Sumak Kawsay, o Bem Viver ou Vida Plena, perspectiva presente no horizonte dos povos indígenas andinos.

     

    Todavia, a temática envolve, nas discussões do encontro, as perspectivas das populações indígenas que habitam regiões diversas: Mesoamérica, Cone Sul, Andina, do Caribe e da Amazônia. Desta forma, as diversas línguas, envolvimentos sociais, cosmologias e culturas possibilitam um mosaico plural das compreensões sobre esta antiga sabedoria indígena, o Sumak Kawsay.

     

    O encontro, embalado por danças e apresentações tradicionais, está dividido em três momentos: o Shuk Shunkulla (um mesmo sentir), o Shuk Yuyaylla (um mesmo pensar) e o Shuk Makilla (um mesmo atuar). Entre as discussões e apresentações culturais, indígenas e agentes pastorais têm momentos de reflexão e religiosidade.

     

    No Shuk Shunkulla, os representantes indígenas compartilharam realidades vividas nas regiões onde habitam. As conversas giraram entorno dos atentados contra a Mãe Natureza e de relatos sobre o sofrimento de comunidades acossadas por violências diversas, além de suas lutas e esperanças.

     

    Já no Shuk Yuyalla, o segundo momento do encontro, os depoimentos serviram para aprofundar os participantes na sabedoria dos povos indígenas, seus mitos, ritos e relatos. Sobretudo, nas propostas de harmonia e comunicação com Deus, bem como com a Mãe Natureza e com as humanidades incrustadas na vivência de cada povo. Momento de confrontação com as propostas cristãs de Bem Viver e Vida Plena.

     

    Por fim, o encontro discute, num último momento, o Shuk Makilla. O objetivo é renovar e formular compromissos que favoreçam projetos concretos de um futuro diferente e possível para que faça crescer a esperança entre os povos originários de todo o mundo.

     

        

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  • 17/10/2013

    Apib denuncia modificações no procedimento de demarcação de terras indígenas

    MOBILIZAÇÃO NACIONAL EM DEFESA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DOS DIREITOS TERRITORIAIS INDÍGENAS, QUILOMBOLAS E DE OUTRAS POPULAÇÕES DO CAMPO E DOS DIREITOS DA MÃE NATUREZA

     

    CARTA PÚBLICA

     

    AO EXCELENTÍSSIMO SENHOR

    JOSÉ EDUARDO MARTINS CARDOZO

    MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA

     

    A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, diante das repetidas informações atribuídas a vossa excelência nos últimos dois anos, sendo as últimas divulgadas pela imprensa no último dia 10 de outubro, segundo as quais o governo pretende modificar os procedimentos de demarcação das terras indígenas, vem de público manifestar a sua indignação e repúdio contra esses propósitos que constituem uma afronta aos direitos originários dos nossos povos, consagrados na Constituição Federal de 1988.

     

    É lamentável, senhor Martins Cardozo, que o governo do qual vossa excelência faz parte tenha optado por se submeter aos interesses do capital, do agronegócio, representado principalmente pela bancada ruralista no Congresso Nacional, rifando, contrariamente ao seu discurso demagógico, o Estado de Direito. É vergonhoso para um país, com uma das constituições mais avançadas na América Latina, ter um ministro que desconhece totalmente na questão indígena o sentido profundo do texto constitucional, que garante direitos aos nossos povos, mesmo o senhor sendo um jurista. Daí a sua atitude subserviente aos interesses dos ruralistas. Um governo que alega ter origem democrática e popular, não poderia se preocupar com supostos direitos adquiridos por invasores de terras tradicionais em detrimento do direito originário dos povos indígenas. Deveria, ao contrário, agir contra os atropelos cometidos sucessivamente por esses invasores contra os nossos povos e territórios, há mais de 500 anos. Não estamos mais no século 19, mas é para lá que desejam recuar a questão do direito a terra.

     A “radicalização exacerbada”, senhor ministro, marcadas no momento “por questões eleitorais”, como o senhor mesmo reconhece, certamente não é por parte dos nossos povos, pois a nós cabe defender apenas o que é nosso. A radicalização vem daqueles a qual o governo se submete: os ruralistas, súbditos, subservientes do agronegócio, do capital nacional e internacional. Guiados pelo capital especulativo, tais setores visam apenas lucro para uns poucos, à custa da soberania nacional do nosso país.

    Ministro José Eduardo Martins Cardozo, o seu propósito de editar novas regras para a demarcação das terras indígenas implica na sua ignorância a respeito das questões indígenas, bem como na sua submissão aos interesses dos ruralistas e comparsas, além de seu absurdo desrespeito à Constituição Federal e instrumentos internacionais que garantem os direitos dos povos indígenas às terras que tradicionalmente ocupam. O pior, as suas manifestações, em favor dos ruralistas, acontecem no momento em que uma mesa de diálogo, entre governo e os povos indígenas, está estabelecida, no âmbito da Comissão Nacional de Política Indígena (CNPI), e cujos trabalhos, focando exatamente a questão das terras, não foram concluídos. Que incoerência – mais uma vez – senhor ministro!

    As concessões da sua parte aos inimigos históricos dos povos indígenas demonstram a falta de compromisso do governo federal com a defesa da Constituição Cidadã e o seu total atrelamento aos poderes econômicos que lhe dão sustentação, inclusive por interesses eleitoreiros. Por favor, não sacrifique os direitos dos nossos povos pela simples vontade de se perpetuar no poder. Nisso consiste o radicalismo efetivo, posto que em troca de votos o senhor suspendeu demarcações para instalar mesas de diálogo. Direito não se negocia, ministro.

    Os povos indígenas estão cansados de serem utilizados como moedas de troca – prática rotineira de governos declaradamente conservadores. Jamais admitiremos esse ultraje protagonizado por um governo que traiu as nossas esperanças. Ou o governo Dilma se declara aliado nosso, demarcando todas as terras indígenas, cujo passivo ultrapassa os 6O%, e não 3% como o senhor divulga enganosamente; ou talvez reflexo do posicionado declarado do senhor para o lado de nossos inimigos.

    Diante de tudo isso, reiteramos a declaração do acampamento da Mobilização Nacional Indígena, realizada entre 30 de setembro e 05 de outubro deste ano, segundo a qual:

    Declaramos que se os ruralistas conseguirem mudar a Constituição ou se o Poder Executivo modificar os procedimentos de demarcação das nossas terras e continuar com a paralisia na demarcação dos nossos territórios, para nós, essas medidas serão nulas, porque seguiremos resistindo e pautando as nossas vidas somente pelo que reza a Carta magna de 1988 e os tratados internacionais assinados pelo Brasil referentes aos nossos direitos”.

    Brasília, 15 de outubro de 2013.

    ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL – APIB

     

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  • 15/10/2013

    Carta da V Assembleia do Povo Xukuru Kariri: Terra é mãe, fonte de vida e bem viver!

     

    “Hoje sabemos o lugar que queremos

    ocupar na história do país”.

    Maninha Xukuru Kariri

     

    Nós Povo Xukuru Kariri, reunidos em nossa V Assembleia com o tema “Terra é Mãe, Fonte de Vida e do Bem Viver”, durante os dias 09, 10 e 11 de Outubro de 2013, reafirmamos nosso compromisso em defesa da nossa mãe Terra, fonte geradora da vida e guardiã da memória dos nossos antepassados, capaz de assegurar a manutenção das presentes e futuras gerações.

     

    Aos nos reunirmos em assembleia tivemos a oportunidade de realimentar nosso grande sonho: a volta à terra que sempre foi nossa, mas que fora roubada dos mais velhos.

     

    Relembramos os vinte e cinco anos da conquista da Constituição Federal, fruto das lutas dos povos indígenas e da classe trabalhadora, que reconheceu a diversidade de povos, línguas, culturas e religiões que compõem a sociedade brasileira, determinando ao Estado o respeito à organização social dos povos indígenas e a regularização de todas as terras indígenas.

     

    Repudiamos os ataques dos setores mais atrasados do Brasil, representada pela bancada ruralista no Congresso Nacional, que tentam a todo custo destruir os direitos indígenas assegurados na Constituição Federal, para abrir as terras indígenas à exploração do agro/hidro negócio e ameaçar a natureza sagrada.

     

    Nosso povo também vive um momento de ataques ao seu território tradicional com a articulação de políticos e fazendeiros do Estado para impedir que a FUNAI cumpra com o seu dever legal: realizar o levantamento fundiário para identificar os ocupantes não-índios de nosso território, concluindo o processo de demarcação, e por fim a violência contra os índios que permanece na região de Palmeira dos Índios. Denunciamos também os ataques aos nossos parentes que vivem na cidade de Taquarana em um pequeno pedaço de terra, que têm sido ameaçados em seus direitos por fazendeiros da região. Exigimos o apoio da FUNAI e do Ministério Público Federal na defesa dos nossos parentes.

     

    Exigimos ainda do governo do Estado de Alagoas o respeito ao nosso direito à educação específica, diferenciada e intercultural. Denunciamos o abandono no qual se encontram nossas escolas, bem como a reforma não concluída das Escolas de Fazenda Canto e Mata da Cafurna, fato que ameaça o início do ano letivo de 2014. Essa situação de abandono da educação escolar indígena está permitindo a ingerência da Prefeitura de Palmeira dos Índios, desrespeitando nossa organização social e estimulando o conflito interno.

     

    Reafirmamos nossa unidade e disposição para resistir a todos esses atos e, animados pelas forças dos nossos guerreiros e guerreiras que já tombaram nessa luta, especialmente de Quitéria, Luzanel, Miguel Celestino e Maninha, exigimos o cumprimento da Constituição Federal pelo governo brasileiro e convocamos todos os nossos aliados e a população em geral a somar forças para a conquista definitiva do nosso território tradicional.

     

    A terra para nós NÃO é objeto de negócio, de trocas, mas um lugar sagrado que alimenta nosso sonho, nossa vida, nossa cultura para a construção do Bem Viver do Povo Xukuru-Kariri.

     

    Ao reafirmamos a necessidade de construção do bem viver, desejamos que a esperança que nos anima a caminhar em meio às adversidades possa iluminar as mentes e os corações da sociedade palmeirense e alagoana com a finalidade de construir a justiça social para todos/as.

     

    Aldeia Fazenda Canto, Palmeira dos Índios, Alagoas 11 de outubro de 2013.

     

    Povo Xukuru Kariri, Povo Xukuru de Ororubá, MST, CPT, MCP, MTC, RECID, Coletivo Macambira, PCR, CIMI, UNEAL, FACESTA, UFAL – Campus Sertão, Coletivos Amigos e Amigas Xukuru-Kariri, MPDC, COJIPE, Cáritas Diocesana de Palmeira dos Índios, Cáritas Regional Nordeste II

     

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  • 14/10/2013

    Yvy Katu: famílias Guarani retomam área declarada em 2005

    Ruy Sposati,
    de Campo Grande (MS)

    Cerca de 30 famílias Guarani Ñandeva retomaram, na manhã desta quarta-feira, 14, parte da Terra Indígena Yvy Katu, no município de Japorã (MS), fronteira com o Paraguai. No mesmo local, no último dia 2, cerca de 30 famílias ocuparam outra área de 600 hectares, abandonada pelos proprietários há ao menos quatro anos, mas fora da posse dos indígenas. Com processo de demarcação praticamente finalizado, onde até os marcos físicos que limitam a área já foram colocados, eles aguardam há 10 anos que a presidência da República assine o decreto de homologação da terra.

    Segundo lideranças das duas ocupações, a situação permanece tranquila. Os proprietários já estão retirando o gado do local. "Nós não aguentamos mais esperar. Já são 10 anos que estamos aqui, está tudo parado", explicam os Guarani. Expulsos de seus territórios pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) na primeira metade do século vinte, os indígenas da região foram confinados na reserva Porto Lindo, onde hoje vivem mais de 4 mil indígenas em 1,6 mil hectares.

    Iniciada há 29 anos, a demarcação da Terra Indígena Yvy Katu, na qual Porto Lindo está incorporada, foi interrompida diversas vezes por recursos judiciais. Em 2003, para pressionar o governo e o judiciário, os indígenas realizaram a primeira retomada de seu território tradicional, expulsando não-indígenas de 14 diferentes fazendas na área reivindicada.

    Em junho de 2005, o Ministério da Justiça editou uma portaria declarando a terra como de posse permanente do grupo, com área de 9,4 mil hectares. A demarcação física já foi realizada, faltando apenas a homologação pela Presidência da República, ato final da demarcação. Os 309 indígenas ocupam, atualmente, 10% do total da área demarcada, por força de decisão judicial.

    Em março deste ano, a Justiça considerou nulos os títulos de propriedade incidentes sobre a Terra Indígena Yvy Katu, atestando a validade do processo demarcatório da área.

    Uma das novas áreas retomadas pelos indígenas é um trecho de reflorestamento, também abandonado pelo proprietário. "Aqui tem lenha, água, tatu, formiga, coró, minhocão, pindó", contam. As outras áreas, utilizada por fazendeiros para a criação de gado, estão desmatadas. "Mas aqui é nosso, nós vamos ficar".

    Indenização

    Em novembro de 2011, o Ministério Público Federal ajuizou ação contra a União e a Funai, pedindo indenização de R$ 86 milhões. O valor é uma medida compensatória por danos morais e materiais sofridos pela comunidade, expulsa de seu território tradicional no processo de colonização do estado. O MPF baseou-se no valor anual do arrendamento da área, desde 1928 – quando iniciou-se a expulsão dos índios – até 2012. Com os juros, o valor chega a R$ 43.029.884,84. O MPF pede o mesmo valor pelos danos morais impostos aos indígenas, após a expulsão da área. A quantia deverá ser revertida em políticas públicas destinadas à comunidade indígena de Yvy Katu.

    História

    A expulsão dos indígenas de suas áreas originalmente ocupadas começou com a criação do Serviço de Proteção ao Índio (SPI) em 1911. O esbulho de terras indígenas era permitido em um dos artigos que determinava as funções do novo órgão indigenista: “promover a mudança de certas tribus (sic), quando fôr conveniente e de conformidade com os respectivos chefes”. Esses chefes, conforme apontado em levantamento histórico realizado pelo Ministério Público Federal, “jamais emitiram qualquer aprovação para serem retirados de suas terras tradicionais, ao contrário, recusavam-se a sair, sendo assim tidos por selvagens”.
     
    Criadas as normas legais, o governo federal passou a retirar os indígenas de suas terras, confinando-os em pequenas reservas escolhidas pelo SPI. A União, então, trouxe imigrantes para a região, conferindo-lhes títulos de propriedade. Este modelo adotado para a colonização de Mato Grosso do Sul é a gênese do conflito fundiário atual.

    A ação do MPF desvenda a sistemática utilizada: “Quando alguém adquiria uma terra e descobria que ela era habitada por índios, simplesmente reunia alguns homens armados e os expulsava, ou (…) comunicava o chefe do posto do SPI, que ele mesmo trataria da transferência dos índios para a reserva”.
     
    A reserva de Porto Lindo, em Japorã, para onde foram transferidos os indígenas de YvY Katu em 1928, foi definida em 3,6 mil hectares mas sofreu seguidas reduções em função de arranjos entre agentes do governo e interesses de colonos e empresas regionais, sendo demarcada com 2 mil hectares. Atualmente, mede 1,6 mil hectares. A reserva deveria ser às margens do Rio Iguatemi, tradicionalmente ocupada pelos índios, mas com a existência de reservas de erva-mate na região, que era escoada pelo rio, os índios foram deslocados para outra área distante.

    Com informações do MPF-MS e Neppi/UCDB

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  • 10/10/2013

    “Eles estão anunciando que vão tirar a gente à bala hoje à noite”

    Por Ruy Sposati,

    de Campo Grande (MS)

    Cápsulas de 9mm encontradas na retomadaCerca de 300 indígenas Terena foram atacados por homens armados em caminhonetes, no município de Miranda (MS), na noite de quarta-feira, 9, depois de terem ocupado 3,2 mil hectares de fazendas que incidem sobre a Terra Indígena Pillad Rebuá, em processo de demarcação. Ninguém ficou ferido. Cápsulas de 9mm foram encontradas no local e entregues à Polícia Federal. Indígenas temem outro ataque na noite desta quinta, 10. Os Terena exigem que seja instituído o Grupo de Trabalho (GT) para finalizar o processo de identificação e demarcação de Pillad Rebuá.

    Segundo os indígenas, depois de terem passado o dia inteiro sendo intimidados pelo vai-e-vem de caminhonetes e carros na porteira da fazenda – com homens armados nas caçambas -, a comunidade sofreu três ataques a tiros durante a noite.

    "Nós estamos acampados no entorno da sede da fazenda. As caminhonetes circulam toda hora pela entrada, na porteira", explica um guerreiro Terena. "Entre às 8 e 10 da noite, eles atacaram o acampamento três vezes. Tava tudo escuro, não dava para ver. Os tiros vinham da porteira".

    "No primeiro ataque, nós estávamos cantando e dançando, para fortalecer a nossa retomada", conta. Foi quando eles ouviram cerca de quatro disparos, e começaram a correr. "A gente gritava ‘abaixa! abaixa!’, ficou todo mundo assustado. Aí as mulheres, crianças e idosos se esconderam e nós organizamos um grupo de homens pra ficar acordado a madrugada toda". Durante a madrugada, os carros continuaram rondando a entrada da propriedade.

    "Atiraram para acertar"

    Para os indígenas, não resta dúvida de que os tiros não eram apenas intimidatórios. "Eles atiraram apra acertar a gente sim. Teve uma senhora que sentiu a quentura da bala. Atiraram contra a gente, acertaram a casa e o telhado, perfuraram um bebedouro", relata.

    Os indígenas fotografaram as marcas de bala e recolheram nove cápsulas de calibre 9mm, munição de pistola de uso restrito das forças armadas. Dois agentes da Polícia Federal estiveram no local, segundo relataram os indígenas. "Eles explicaram que não vieram ontem porque não tinham combustível. E hoje [quinta], só vieram para fazer um relato, eles ainda não tem como dar segurança".

    Desde quarta, os Terena aguardam a chegada de uma equipe da Força Nacional de Segurança Pública, que estaria a caminho da fazenda ocupada. No entanto, a informação, segundo os indígenas, foi negada pelos agentes da PF que estiveram na área. "Falaram que por enquanto nós temos que usar nossa estratégia, tirando foto. E se eu morrer, para que vai servir essa foto?", questiona o guerreiro.

    "Nosso maior medo é um ataque deles [fazendeiros]. Na cidade, estão comentando a mesma coisa. Eles estão anunciando que vão tirar a gente à bala hoje à noite. Precisa vir segurança [Força Nacional e Polícia Federal] para cá". Os Terena afirmam que pistoleiros ligados aos proprietários e arrendatários da área ocupada estariam reunidos na fazenda Jambeira, na outra margem da rodovia BR-262, que corta a terra indígena.

    Em declarações para a imprensa, os ruralistas dizem que se as autoridades não resolverem a questão, eles mesmos vão resolver.

    "Nós realmente precisamos de apoio. Nós temos medo também da Polícia Militar de Miranda. Depois do tiro, pedimos que eles passassem aqui. Eles passaram com o giroflex desligado. Quem vem com luz desligada, nós sabemos que é fazendeiro. E os policiais vieram da mesma forma. Encontraram com a caminhonete que atirou em nós e não fizeram nada. A gente acha que a polícia está do lado dos produtores rurais. Nós estamos abandonados. Não temos nenhum amparo, nenhuma segurança. Até agora ficou tudo bem, mas e hoje à noite? E depois?", conclui.

    Contexto

    Até as retomadas de ontem, eram 2,2 mil indígenas em 94 hectares, divididos em duas aldeias, Moreira e Passarinho. A terra indígena teve o primeiro registro de reconhecimento pelo Estado em 1904. Um processo de demarcação teve início em 1950, mas não seguiu.

    Na semana passada, como parte da Mobilização Nacional Indígena, convocada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), os Terena realizaram outra retomada na região de Miranda. A fazenda, com 600 hectares, tem como proprietário Pedro Paulo Pedrossian, filho do ex-governador biônico da ditadura militar, Pedro Pedrossian. A área é parte da Terra Indígena Cachoeirinha, que faz divisa com a Pillad Rebuá.




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