• 10/04/2014

    Apib recolhe adesões a parecer contra minuta do MJ que altera procedimento demarcatório

    Um parecer analisando a Minuta de Proposta do Ministério da Justiça para promover alterações no procedimento de demarcação de terras indígenas foi tornado público, nesta última terça-feira, 8, pelas bancadas indígena e indigenista da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI).

     

    Leia aqui a íntegra do parecer

     

    A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) convoca toda a sociedade envolvente aos povos indígenas para assinar e divulgar o parecer, contraposição à minuta e formulado durante quatro meses de diálogo entre as organizações indígenas e indigenistas.

     

    Para assiná-lo é necessário enviar uma mensagem de adesão ao endereço eletrônico apib.nacional@gmail.com. As assinaturas serão anexadas ao parecer e enviadas às autoridades.    

     

    O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, com a minuta, tenta reavivar, 50 anos depois, mecanismos da ditadura militar para a demarcação de terras indígenas. Isso significa legalizar o que o governo federal não vem cumprindo: a regularização dos territórios tradicionais.    

     

    O documento, com 16 páginas, tem início com a contextualização histórica da consolidação da legislação indigenista seguindo até a principal jurisprudência a respeito dos procedimentos de demarcação de terras indígenas. Traz à tona a como a proposta do Ministério da Justiça contraria decisões recentes, inclusive tomadas pela Corte Suprema do país, o STF, caso do julgamento da Petição 3388 sobre a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, entre outros.

     

    Em seguida, são comentados os equívocos dos principais artigos apresentados na minuta, que passaria a permitir a interferência de grupos contrários à demarcação desde os primeiros momentos do procedimento de identificação e delimitação das terras indígenas, inviabilizando até mesmo o trabalho de campo dos profissionais e estudiosos. 

      

    Ao final do documento, as organizações indígenas e indigenistas que subscrevem o parecer sintetizam nove principais conclusões, sendo a última delas um recado claro para o governo federal:

     

    “Uma eventual publicação da Portaria em questão reforçará compreensão, por parte dos povos indígenas, organizações de apoio aos povos e da sociedade em geral de que o Governo Dilma é claramente anti-indígena, aliado de primeira hora dos ruralistas, alinhado aos interesses do poder econômico nacional e transnacional, notoriamente do agronegócio, e obstinado por um modelo de desenvolvimento neocolonizador, usurpador de territórios, etnocida e ecocida”.

     

     

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  • 10/04/2014

    Boletim Mundo: Grupo Bandeirantes é processado por incitar ódio contra povo Tupinambá


    Por Carolina Fasolo,

    de Brasília


    O Grupo Bandeirantes de Comunicação vai responder a uma ação judicial por ter veiculado, em rede nacional, duas reportagens com conteúdo discriminatório e informações distorcidas sobre os conflitos fundiários no sul da Bahia, responsabilizando caciques do povo Tupinambá de Olivença por toda a sorte de crimes, inclusive a morte de um agricultor, e acusando os indígenas de invadir fazendas, ameaçar e expulsar moradores.

    O processo, de autoria da comunidade indígena Serra do Padeiro e do cacique Rosivaldo Ferreira da Silva, pede liminarmente o direito de resposta da comunidade Tupinambá às reportagens caluniosas, transmitidas pelo Jornal da Band e pelo sistema de radiodifusão do Grupo Bandeirantes com o intuito de incitar o ódio e a violência da sociedade contra o povo Tupinambá de Olivença, e para deslegitimar a luta dos indígenas pela demarcação de seu território, já reconhecido pela Fundação Nacional do Índio (Funai) como de ocupação tradicional.

    A Funai publicou em 2009 o relatório circunstanciado, que delimitou a Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença em cerca de 47 mil hectares, abrangendo partes dos municípios de Buerarema, Una e Ilhéus, sul da Bahia. Porém, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, desobedecendo aos prazos estabelecidos na legislação, ainda não assinou a portaria declaratória, que encaminha o processo demarcatório da TI para as etapas finais.   

    As reportagens difamatórias foram ao ar nos dias 25 e 26 de fevereiro, logo após a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, de suspender as reintegrações de posse em sete áreas localizadas na terra Tupinambá. Sem tratar do contexto da demarcação da terra, o repórter Valteno de Oliveira declara: “Desde que a Funai resolveu criar a área para os índios a violência impera aqui na região. Um bando de caciques armados, liderados por Babau, o mais temido deles, faz o diabo”. A reportagem, levianamente e com informações inventadas, pinta o cacique Babau, da aldeia Serra do Padeiro, como um criminoso foragido da Justiça.  “O paradeiro de Rosivaldo Ferreira da Silva, o Babau, é desconhecido. Ele responde a oito processos, por estupro, ameaça e destruição do patrimônio público e agora é suspeito, junto com o cacique Cleildo, de ordenar a execução de Juraci (agricultor assassinado)”.

    “O Grupo Bandeirantes parece desconhecer ou evitar conhecer o massacre dos Tupinambá ao longo da história, para difundir histórias inventadas: escondendo o verdadeiro conflito e massacre na região, inclusive os mais recentes. Ademais, sem nenhuma prova associa indígenas e, em especial, os caciques, aos crimes mais esdrúxulos, e até mesmo ao crime de estupro, com vistas a incentivar o ódio social por este povo”, consta na ação contra a emissora.

    O povo Tupinambá de Olivença tem sofrido com um processo de violência e opressão desde os tempos de colonização. Histórico que as reportagens ignoraram sumariamente. Apenas nos últimos meses, além do agricultor, cinco indígenas foram assassinados dentro de sua terra. Três deles mortos em uma emboscada armada por pistoleiros. Em agosto de 2013, um ônibus que carregava estudantes indígenas foi atacado a tiros quando voltava para a aldeia. De agosto até janeiro de 2014, 28 casas no município de Buerarema – todas de moradores indígenas – foram incendiadas por grupos ligados aos invasores da terra Tupinambá.

    Tropas da Força Nacional de Segurança e da Polícia Federal fixaram em 2013 uma base na área indígena, sendo substituídas pelo Exército Brasileiro em março de 2014. Os policiais perseguem, agridem moradores e ameaçam de morte o cacique Babau e seus familiares. Uma carta denúncia relatando as ações violentas da polícia  foi encaminhada à 6ª Câmara do Ministério Público Federal e ao Ministério da Justiça.

    Nenhum desses fatos foi noticiado. “Após todos esses anos, ao arrepio da história, o mesmo povo, que vem lutando para não ser dizimado, sofre perseguição midiática, sendo taxado de terrorista, criminoso, assassino e estuprador, como se nota das reportagens aqui questionadas. O judiciário não pode quedar-se inerte ante esse atentado aos direitos dos povos indígenas, muito menos ante as falsas informações injuriosas, caluniosas e de má fé do canal de televisão réu, numa tentativa de jogar a sociedade contra aqueles que foram acossados, perseguidos e mortos em função da gana de não-indígenas pela terra naquela região, historicamente habitada pelo Povo Tupinambá”, reitera a ação.

    O Ministério Público Federal também deve intervir nas fases do processo judicial, protocolado na última sexta-feira (4) na Justiça Federal em São Paulo.

    Esta notícia compõe o boletim semanal O Mundo Que Nos Rodeia. Para recebê-lo ou enviar sugestões de pauta escreva para mundo@cimi.org.br

  • 10/04/2014

    Jornalista é condenado por postagens racistas a indígenas na internet

    A Justiça Federal condenou o jornalista amapaense Igor Reale Alves por publicações de conteúdo racista em site de rede social. A sentença é resultado de ação ajuizada pelo Ministério Público Federal no Amapá (MPF/AP) em julho de 2013. De acordo com a decisão, Igor Reale Alves vai prestar serviços comunitários na Casa de Apoio à Saúde Indígena do Amapá (Casai) e pagar seis salários mínimos ao Conselho de Caciques de Oiapoque e à Associação dos Indígenas de Wajãpi.

    No ano passado, o jornalista postou cinco mensagens racistas contra os índios Guarani-Kaiowá. Igor Reale se referiu à etnia com expressões de desprezo e incentivou suicídio coletivo. “O acusado proferiu várias mensagens (e não apenas uma) em rede social, praticando, induzindo e incitando a discriminação ou o preconceito de raça e etnia”, destaca trecho da decisão.

    Para o MPF, a obrigação de prestar serviço na Casai é pedagógica. “Talvez, nesse sentido, o réu possa ter contato com o diferente. E, quem sabe (…) a Justiça nesse caso possa fazer um grande bem à humanidade, um grande bem ao réu, que é ter contato com o diferente, ter contato com o indígena e ver o quanto sofre uma minoria nesse país”, argumentou o procurador da República Camões Boaventura, durante audiência na Justiça Federal.

    Para a Justiça Federal, “qualquer cidadão tem o direito de emitir opinião e formular críticas, desde que não atinja o campo delimitado do direito de outrem. O réu, homem adulto e jornalista formado, não pode alegar desconhecer o alcance que teriam suas palavras”.

    O procurador da República Felipe Moura Palha, que assina a ação, orienta: “É preciso pensar duas vezes antes de publicar alguma mensagem na rede social. Uma boa sugestão é imaginar se você diria aquilo em um palco diante de muitas pessoas. Se a resposta for negativa, desista da postagem”.

    Racismo – Conforme a Constituição Federal, o crime de racismo é inafiançável e imprescritível. Para não propagar as ofensas à dignidade da etnia, as mensagens racistas não serão reproduzidas pelo MPF/AP.

    A sentença se deu com base na Lei nº 7.716/89. Nela consta que serão punidos os crimes de discriminação ou preconceito contra raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Para a decisão, cabe recurso.

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  • 09/04/2014

    Centro de Trabalho Indigenista divulga relatório sobre violências contra os índios Guarani do oeste do Paraná

    Foi divulgado hoje publicação online que contém o relatório “Violações aos direitos humanos e territoriais dos Guarani no oeste do Paraná: subsídios para a Comissão Nacional da Verdade”, produzido pelo Centro de Trabalho Indigenista (CTI).

    A publicação ocorre logo após a visita oficial da Comissão Nacional da Verdade à região. A psicanalista Maria Rita Kehl, coordenadora do GT “Graves violações de Direitos Humanos no campo ou contra indígenas”, esteve por quatro dias na região, período em que pode ouvir, in loco, os testemunhos dos índios Guarani que vivenciaram ou presenciaram diversas formas de violências, atos de tortura e assassinatos impetrados contra seu povo. (Ver matéria sobre a visita publicada na Rede Brasil Atual).

    Sua visita marca um momento importante, dando início a um processo de reparação e de reconhecimento da memória e do sofrimento Guarani que, no entanto, só será plenamente concluído quando seus direitos territoriais forem efetivados e os Guarani puderem, enfim, viver em paz em sua própria terra.

    O contexto de divulgação do relatório é bastante oportuno, uma vez que o Governo Federal, através do Ministério da Justiça, se esforça neste momento, para aprovar uma minuta de Portaria de “Regulamentação [sic] do Decreto nº1775” que, segundo parecer das principais organizações indígenas e indigenistas do país, trata-se de uma proposta velada de paralisar todos os procedimentos de demarcação de terra, por meio de subterfúgios formais. Segundo a proposta do Ministério a Justiça, cujo conteúdo foi tornado público no ano passado, passariam a participar dos estudos de identificação e delimitação de terras vários órgãos do Governo ligados aos setores da sociedade que se opõem às demarcações, como o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), órgão historicamente vinculado ao agronegócio.

    O relatório ora apresentado pelo CTI revela por meio da análise do estudo deste caso específico que a proposta do Governo nada mais faz do que ressuscitar o formato de demarcação instaurado durante o Regime Militar, modelo que foi justamente o responsável por consolidar o esbulho de diversos territórios tradicionalmente ocupados pelos povos indígenas no país, inclusive no Oeste do Paraná. A esse respeito, é nítido como a proposta do Governo Federal ecoa a declaração do Coronel Nobre da Veiga, que esteve à frente da FUNAI (1979 -1981):

    “toda vez que é eleita uma área indígena, antes de ela ser decretada, de ser oficializada, procuramos encaminhar, como temos feito, aos Governos dos Estados, aos órgãos federais e estaduais que se interessam pela terra, tais como IBDF, CEMA, INCRA, o DNER, o DNPM, todos os institutos de terra do Estado, de maneira que não passamos à eleição da área sem que esses órgãos nos digam quais serão os problemas criados por essa eleição, para evitar os conflitos que hoje existem em quase todas as 250 reservas indígenas…” (Coronel Nobre da Veiga, Comissão da Câmara, 17/9/1980).

    O interesse atual do documento se reforça ainda pelo fato de que a gênese do processo político que culminou na apresentação da proposta de minuta de Portaria pelo MJ foi uma audiência no Senado na qual a então Ministra da Casa Civil apresentou laudo da Embrapa, que justamente tratava da presença indígena no Oeste do Paraná. Por esse meio, justificava a inclusão de diversos outros órgãos no processo de regularização fundiária supostamente “comprovando”, com fotos aéreas que a ocupação guarani no oeste do Paraná seria recente. Essa posição foi reforçada por factoide veiculado também pela Rede Globo, em matéria no Jornal Nacional.

    O relatório “Violações aos direitos humanos e territoriais dos Guarani no oeste do Paraná: subsídios para a Comissão Nacional da Verdade (1946-1988)” refuta por meio de vasta análise documental as alegações preconceituosas da ex-Ministra Gleisi sobre o Oeste do Paraná, demonstrando o claro processo histórico de esbulho sofrido pelos Guarani na região, acirrado durante a Ditadura Militar.

    Mais informações: comunicacao@trabalhoindigenista.org.br

     

    Baixe aqui o Relatório!

     

    VEJA O RESUMO DO RELATÓRIO:

    Violações dos direitos humanos e territoriais dos Guarani no oeste do Paraná (1946-1988): subsídios para a Comissão Nacional da Verdade. CTI, 2013.

    Violências cometidas contra os índios Guarani do oeste do Paraná se perpetuam

    O relatório “Violações dos direitos humanos e territoriais dos Guarani no oeste do Paraná: subsídios para a Comissão Nacional da Verdade (1946-1988)”, produzido pelo Centro de Trabalho Indigenista já está online. Ao longo de mais de cem páginas, o relatório traz uma série de depoimentos dos xamoĩ kuery (anciãos) e xaryi kuery (anciãs) que vivem ainda hoje no oeste do Paraná (municípios de Foz do Iguaçu, Diamante d’Oeste, Santa Helena, Guaíra e Terra Roxa). As tristes histórias de vida dos Guarani na região são cotejadas com uma vasta base documental, reunida em 13 anexos, que comprova com clareza a forma como eles e suas famílias foram ilegal e violentamente expulsos de seus locais tradicionais de ocupação, perdendo suas terras, matas e meios de subsistência e sendo relegados à situação de extrema penúria em que se encontram até os dias de hoje.

    Abordando um período que engloba o investigado pela Comissão Nacional da Verdade (1946-1988), o relatório mostra como, desde a criação do Parque Nacional do Iguaçu (1939) até a construção da usina hidroelétrica de Itaipu (1975-1982), passando pela avassaladora expansão da frente agropecuária no oeste do Paraná à partir dos anos 40, ocorreu um gradativo tensionamento da estrutura fundiária da região. O Estado brasileiro, ao patrocinar a ocupação da região por ervateiros, colonos, madeireiras e os grandes empreendimentos, promoveu a expulsão, a escravização e assassinatos dos Guarani, ao mesmo tempo que os privou dos meios legais de fazer valer seus direitos civis e territoriais. A partir desse estudo, constata-se assim que o Estado brasileiro, ao instalar um sério conflito social e se furtando a resolvê-lo, relegou os índios ao esquecimento deixando-os à sua própria sorte. Com a força de seus rezadores, homens, mulheres e crianças, eles continuam a resistir.

    Ao contextualizar a situação em que vivem as comunidades guarani na região, o relatório deixa claro que os mecanismos de violação dos direitos humanos, intensificados durante o governo militar, continuam vigentes ainda hoje com a não demarcação das terras e a negação do acesso aos direitos sociais mais elementares. Ao final, o relatório propõe medidas de reparação para reverter a condição de precariedade e insegurança, com o reconhecimento dos legítimos direitos das comunidades Guarani na região oeste do Paraná, que lhes foram seguidamente usurpados, de modo a restituir a sua merecida dignidade.

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  • 09/04/2014

    Justiça condena Dnit e Fatma a pagamento de indenização a indígenas do Morro dos Cavalos-SC

    Ação promovida pela Procuradoria da República em Santa Catarina (MPF/SC), a Justiça Federal condenou o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e a Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (Fatma) ao pagamento de R$ 100 mil por danos morais à comunidade da Terra Indígena Morro dos Cavalos, localizada no município de Palhoça.

    É uma importante vitória do ponto de vista judicial, muito expressiva. Não pelo valor da multa, mas o fato da condenação ter sido aplicada, fundamental neste momento que a Terra Indígena Morro dos Cavalos está sendo questionada. A ação representa a garantia de que esse território é de uso exclusivo da comunidade e importante para a própria preservação do meio ambiente”, garante Clovis Antonio Brighenti, membro do Cimi Regional Sul.

    A Fatma foi responsabilizada por ter expedido a licença, assim permitindo a intervenção ilegal. Já o Dnit foi condenado por permitir que a empresa retirasse minério da área sabidamente de usufruto exclusivo dos Indígenas.

    A Terra Indígena Morro dos Cavalos é reconhecida legalmente como bem da União de posse e usufruto exclusivos e permanentes da comunidade Indígena Guarani. Em 2002, foi assinado um convênio entre a Funai e o Dnit para implementar o programa de apoio às comunidades Indígenas Guarani residentes na área de influência da BR-101. O acordo foi uma forma de mitigação e compensação pelos impactos socioambientais decorrentes das obras de duplicação da rodovia.

    Fatma vai recorrer e Dnit aguarda notificação

    A Fatma recorrerá a decisão. Em nota, a entidade alegou que não expediu licença em área indígena, pois quando o documento foi despachado, ainda não havia sido demarcada a área. "A licença emitida está datada do ano de 2007, já a área indígena só veio a ser demarcada em 2008", informa o texto.

    “Isso é uma falácia da Fatma, ela sabia que havia sim área indígena na região, pois a comunidade foi reconhecida como ocupação tradicional em 1993”, critica Clovis.

    Uma audiência foi solicitada com a presidenta Dilma Rousseff para que a mesma assine portaria regularizando a área indígena, mas a comunidade até o momento não obteve resposta. No ano passado os indígenas da comunidade se reuniram com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo para debater os impasses nas demarcações das terras indígenas do estado. “À época da reunião, o ministro alegou que os astros não estavam facilitando o reconhecimento das terras e que era para comunidade ter mais paciência”, aponta Clovis Antonio Brighenti.

    Histórico

    A TI Morro dos Cavalos tem 1.988 hectares e foi reconhecida como de ocupação tradicional da Comunidade Indígena Guarani em 1993. Submetida ao Decreto 1775/96 passou por novos estudos e em 2008 o Ministro da Justiça assinou a Portaria Declaratória.  Em 2011 a Fundação Nacional do Índio (Funai) procedeu a demarcação física e desde então aguarda a assinatura da Presidenta Dilma, que tem se recusado a assinar a portaria por conta da relação política com empresários e políticos catarinenses contrários aos direitos indígenas.

    Sobre a TI foi criado o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, ainda na década de 1970, porém não é o Parque o principal empecilho ao processo demarcatório. Opõe-se a ele empresários do ramo de turismo e exploração de água que estão de olho no rico manancial que nasce no interior da TI.

    Atualmente a comunidade conta com 138 pessoas e vive em menos de dois hectares, confiada entre o morro e a rodovia BR-101, que corta a TI.

    A Homologação é o último passo para que Funai proceda o pagamento das benfeitorias das 74 famílias de posseiros que vivem sobre a área e para que a comunidade possa ocupar toda a terra.

  • 08/04/2014

    Organizações divulgam parecer rechaçando proposta do MJ de alterar demarcações de terras

    As principais organizações indígenas e indigenistas do país tornaram público nesta terça-feira, 08, durante sessão da 9º reunião extraordinária da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), em Brasília (DF), um parecer jurídico a respeito de Minuta de Portaria para a “regulamentação” do Decreto nº1775/96, apresentada pelo Ministério da Justiça, José Eduardo Cardozo.

    Leia na íntegra o parecer aqui.

    No final de novembro do ano passado, a minuta com as intenções do governo para o futuro do procedimento demarcatório foi encaminhado a Bancada Indígena da CNPI e revoltou as organizações e povos indígenas. “Contrariamente às alegações do governo, a dita portaria eterniza a não demarcação de terras indígenas, fragiliza a Funai, e desenha um quadro assustador de acirramento de conflitos”, disse em nota a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) à época.

    Diante da minuta, 1.700 indígenas realizaram uma manifestação, no dia 4 de dezembro, que culminou com a ocupação da parte externa do Palácio do Planalto. No conflito com seguranças, quatro indígenas acabaram feridos. Com a pressão, o ministro da Justiça recuou e sinalizou o engavetamento da minuta. Na manhã desta terça, porém, durante a abertura da reunião da CNPI, Cardozo a impôs à pauta sem encaminhar nada quanto às decisões do último encontro do plenário da comissão.  

    Além de divulgar uma carta (leia aqui) rechaçando a postura de Cardozo de transformar a pauta da CNPI em cabide de discussões de interesse exclusivo do governo, as organizações indígenas e indigenistas apresentaram, ainda na manhã desta terça, o parecer jurídico sobre a minuta do ministro da Justiça.

    O parecer

    O documento, com 16 páginas, tem início com a contextualização histórica da consolidação da legislação indigenista seguindo até a principal jurisprudência a respeito dos procedimentos de demarcação de terras indígenas. Traz à tona a como a proposta do Ministério da Justiça contraria decisões recentes, inclusive tomadas pela Corte Suprema do país, o STF, caso do julgamento da Petição 3388 sobre a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, entre outros.

    Em seguida, são comentados, à luz da legislação e da jurisprudência, os equívocos dos principais artigos apresentados na minuta, que passaria a permitir a interferência de grupos contrários à demarcação desde os primeiros momentos do procedimento de identificação e delimitação das terras indígenas, inviabilizando até mesmo o trabalho de campo dos profissionais e estudiosos.   

    Ao final do documento, as organizações indígenas e indigenistas que subscrevem o parecer sintetizam nove principais conclusões, sendo a última delas um recado claro para o governo federal:

    “9.       Uma eventual publicação da Portaria em questão reforçará compreensão, por parte dos povos indígenas, organizações de apoio aos povos e da sociedade em geral de que o Governo Dilma é claramente anti-indígena, aliado de primeira hora dos ruralistas, alinhado aos interesses do poder econômico nacional e transnacional, notoriamente do agronegócio, e obstinado por um modelo de desenvolvimento neocolonizador, usurpador de territórios, etnocida e ecocida.”

    Ministro reage a parecer

    As lideranças da bancada da CNPI entregaram o documento diretamente ao ministro da Justiça, juntamente com uma carta manifesto. Cardozo e seus assessores ficaram desconcertados e tentaram se justificar a todo custo. O ministro, porém, foi ao ataque e acusou os indígenas de se negarem ouvi-lo sobre a minuta. “Não podemos nunca nos furtar ao diálogo”, defendeu.

    Sem ter lido o parecer, Cardozo pinçou de improviso alguns pontos isolados do documento e sustentou que já conseguia ver que os pontos de crítica não teriam procedência. Desconsiderou que o parecer foi elaborado de forma minuciosa pelas organizações indígenas e indigenistas, depois de mais de quatro meses da divulgação da minuta.

    “Por exemplo, no comentário ao Artigo 18, vocês estão criticando algo que já é prática da Funai. A presidente da Funai hoje já tem o poder de devolver os relatórios e prescrever diligências”. O que o ministro não diz, entretanto, é que se aprovada a minuta, o procedimento de demarcação de terras passaria a conter não apenas uma possibilidade de pedido reavaliação das conclusões do Grupo Técnico, de poder da Presidência da Funai, mas abre a possibilidade de que o processo volte a estaca zero três vezes: duas delas a critério da Funai e outra a critério do próprio Ministério da Justiça.

    Sobre a crítica a respeito da abertura dos trabalhos de identificação de terras a diversos órgãos vinculados aos setores tradicionalmente anti-indígenas, ele tirou da manga de seu paletó uma resposta pronta: “A Lei de Acesso à Informação já garante que todos interessados possam participar do processo”. Entretanto, de acordo com a minuta do governo, não apenas esses setores não indígenas poderiam ter acesso aos processos, como poderiam indicar membros para o trabalho de campo, e, pior ainda, tais membros poderiam apresentar relatórios em separado, contrariando as conclusões do próprio coordenador do Grupo Técnico.

    O desconforto do ministro Cardozo com a resposta das lideranças, porém, deve-se ao fato de que a posição do Ministério da Justiça a respeito das intenções da minuta não se sustenta diante da mínima análise jurídica, como demonstra claramente o parecer. Alegando construir um mecanismo que permitiria afastar a judicialização dos processos de demarcação de terras, o Ministério da Justiça, na verdade, propõe uma Portaria que dá instrumentos necessários para que os setores contrários às demarcações derrubem na Justiça as conclusões dos grupos técnicos, ao fomentar o dissenso no seio desses grupos.

    Leia na íntegra o parecer aqui.

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  • 08/04/2014

    Assembleias Indígenas: 40 anos depois segue a luta e articulação

    Egon Heck

    Cimi – Secretariado

    Em abril de 1974, em pleno "milagre brasileiro", anos de chumbo da ditadura militar, duas dezenas de indígenas se reuniram embaixo de algumas mangueiras, em Diamantino (MT).

    Era abril. Uma comemoração diferente. Fato que viria marcar profundamente a luta dos povos indígenas no Brasil. Se lançavam as sementes de um novo movimento indígena no país. Nos dez anos seguintes, foram mais 50 Assembleias Indígenas em todo o país. A segunda foi em Cururu, território Munduruku, e a terceira se realizou em Meruri, território Bororo. Foi no bojo desses momentos de encontros regionais e nacionais que em 1980 surge a União das Nações Indígenas (UNI). Apesar das dificuldades e fragilidade de uma organização indígena de abrangência nacional, foi um passo importante na consolidação das lutas dos povos indígenas por seus direitos.

    Há 40 anos se dava um passo decisivo para conquistas fundamentais, particularmente na questão da posse dos territórios tradicionais, na perspectiva da autonomia, como consta do registro do encontro: "Os índios redescobriram que eles devem ser os sujeitos de seus destinos, não é a Funai e nem as missões os que resolverão os problemas deles, mas nós mesmos", como afirmaram insistentemente. Apesar do apoio inicial do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), em muitos momentos eles ficaram sem a presença de brancos, para traçar suas estratégias de luta. Essa primeira Assembleia Indígena teve o registro silencioso do padre Iasi, conforme consta no Boletim do Cimi nº10, de maio de 1974. Iasi se encontra em Belo Horizonte, tendo completado 95 anos no último dia 5 deste mês de abril.

    “Quarenta anos depois, uma delegação dos povos indígenas do Mato Grosso está em Brasília para dizer: "Nós existimos!”. Apesar do genocídio continuar, também se fortalece nossa luta, principalmente pelo reconhecimento e garantia de nossos territórios", afirma Faustinho Tucumã Kayabi.

    Lembram que nessas quatro décadas muita luta aconteceu, muitos morreram lutando pelos direitos, mas mais guerreiros nasceram, povos se ergueram e línguas se reconheceram. "Estamos sofrendo com a expansão do agronegócio, com a construção de hidrelétricas e hidrovias. Muitas das nossas terras estão invadidas e outras não demarcadas, como a dos Chiquitanos", declara Faustino.

    Terão uma semana de encontros em diversos ministérios, na Câmara e Senado, além de órgãos ligados a questão indígena. A comitiva irá entregar documentos exigindo a demarcação das terras, o direito dos povos isolados. Também manifestaram preocupação com o sofrimento e agressões de diversos povos indígenas em todo o Brasil, especialmente os Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul, os Tupinambá do sul da Bahia, os Kaingang no Rio Grande do Sul, dentre outros.

    Para o Cimi, tais lutas têm um significado todo especial, pois na região destes povos do Mato Grosso que se concretizaram atitudes corajosas de ruptura, como no caso dos jesuítas em Utiairiti e os salesianos em seu compromisso de vida com os Bororo e Xavante. Foi em consequência dessa nova e radical atitude de defesa da vida e cultura desses povos que foram assassinados Simão Bororo e padre Rodolfo, em meados de 1976, e o padre João Bosco, no mesmo ano. Dez anos depois era assassinado Irmão Vicente Cañas, que trabalhava com os Enawenê-Nawê. Sementes de sonhos e de martírio, acreditando que um mundo novo será possível.

    Os direitos ameaçados

    Em contato com os diversos espaços de poder, os indígenas pretendem dar visibilidade na demonstração de preocupações com relação à paralisação da demarcação dos territórios tradicionais. Também vão dizer não à intenção do Ministro da Justiça em mudar, a toque de caixa, a dinâmica do procedimento demarcatório das terras indígenas, a imposição do decreto de morte, a Portaria 303 da Advocacia Geral da União (AGU), além de várias portarias, como as 215 e 227, que pretendem suprimir direitos constitucionais.

    A delegação de indígenas do Mato Grosso vem dar continuidade às lutas históricas destes povos para ampliar e consolidar alianças, exigindo seus direitos e denunciando todas as formas de violações. “No Mato Grosso, o agronegócio se impõe sem nos respeitar. Onde tem cerrado querem soja. Onde tem mata querem tirar madeira, onde tem rio querem fazer usina e nosso ar e água estão sendo envenenados por agrotóxicos", afirmam os representantes Kayabi, Xavante, Bororo, Myky, Chiquitanos, Munduruku e Manoki.

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  • 08/04/2014

    Bancada indígena da CNPI denuncia que governo tenta impor mudança na demarcação de terras

    Brasília, 08 de abril – No final da manhã desta terça, a Bancada Indígena da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) e integrantes da Mesa de Diálogo, criada no ano passado, divulgaram carta ao plenário da comissão, durante a abertura da 22ª reunião ordinária, manifestando “frustração” diante da pauta apresentada pelo governo.

    Conforme as lideranças indígenas, os governistas não cumpriram as decisões tomadas pelo coletivo na 21ª reunião e trouxeram pautas de interesse antagônico ao dos povos indígenas, caso da minuta que pretende alterar o procedimento de demarcação de terras indígenas.

    “Ficou agendada para o mês de janeiro uma reunião preparatória do grupo responsável por elaborar uma proposta metodológica para Conferência Nacional de Política Indigenista, a qual deveria ser submetida à plenária na próxima reunião ordinária, que deveria ter ocorrido no mês de março de 2014. Nenhuma das duas ocorreu”, afirmam as lideranças na carta. 

    Mais uma reunião ordinária da CNPI teve início com o governo federal desconstruindo e não cumprindo deliberações tomadas nos encontros anteriores. Uma delas diz respeito ao objetivo da criação da Mesa de Diálogo, uma vez que ela deveria fazer avançar a demarcação de terras indígenas e nada avançou.  

    “O governo desrespeita as decisões tomadas coletivamente em plenária, e propõe uma pauta para esta reunião focada apenas nos seus interesses políticos, impondo de forma autoritária, a apreciação da Minuta de Portaria, substituindo o processo de discussão com as bases por um único Seminário Nacional”, diz trecho na carta que pode ser lida na íntegra abaixo.    

     

    Carta Aberta das lideranças Bancada Indígena da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) e da Mesa de Diálogo

     

    Prezado Sr. Ministro da Justiça – José Eduardo Cardozo;

     

    Prezados Srs e Sras. Membros da Bancada Governamental da CNPI;

    Por meio desta carta pública, viemos manifestar nosso sentimento de frustração e indignação a respeito da proposta de pauta apresentada pelo governo para a 9ª Reunião Extraordinária da CNPI.

    Desrespeitando todas as deliberações acordadas em plenária durante a 22ª Reunião Ordinária, realizada entre os dias 10 a 12 de dezembro de 2013, quando se decidiu pelo processo de construção coletiva de uma Conferência Nacional de Política Indigenista, a convocatória desta reunião inverte completamente a lógica construída na reunião de dezembro. Na ocasião, ficou agendada para o mês de janeiro uma reunião preparatória do grupo responsável por elaborar uma proposta metodológica para Conferência Nacional, a qual deveria ser submetida à plenária na próxima reunião ordinária, que deveria ter ocorrido no mês de março de 2014. Nenhuma das duas ocorreu.

    Havia sido acordado também em plenária que a discussão da mudança no processo de demarcação de terras indígenas, na qual se insere a proposta de Minuta de Portaria elaborada pelo Ministério da Justiça, deveria ser realizada dentro dos seminários regionais que culminariam na Conferência Nacional de Política Indigenista.

    Mais uma vez, porém, o governo desrespeita as decisões tomadas coletivamente em plenária, e propõe uma pauta para esta reunião focada apenas nos seus interesses políticos, impondo de forma autoritária, a apreciação da Minuta de Portaria, substituindo o processo de discussão com as bases por um único Seminário Nacional. Trata-se de uma demonstração clara que concebe a CNPI como um mero espaço para referendar as posições e interesses do governo.

     

    Diante desta postura intransigente, a bancada indígena e as organizações indígenas que compõem a mesa de diálogo decidiram conjuntamente com organizações indigenistas, realizar uma análise própria da referida Minuta de Portaria. De acordo com a fundamentação expressa no parecer, que acompanha essa manifestação, concluímos que a Minuta de Portaria representa mais uma tentativa de ataque aos direitos indígenas, contrariando a legislação vigente, e cedendo aos interesses do agronegócio, e da base aliada do Governo.

    Por essa razão, não vemos nenhum sentido em realizar o Seminário Nacional proposto, e apelamos para o bom senso, reivindicando que o Governo desista definitivamente desta medida desnecessária e descabida, e concentre seus esforços na retomada da demarcação das terras tradicionais, conforme prescreve a Carta Magna brasileira.

    A instauração da Mesa de Diálogo com o movimento indígena no âmbito da CNPI, que sucedeu às manifestações de junho de 2013, tinha como objetivo avançar nas demarcações de terra, que já estavam paralisadas. Em um curto espaço de tempo, o Governo abandonou completamente a pauta, desconsiderando todas as reivindicações apresentadas, e tenta agora converter este espaço num conselho de sentença contra os povos indígenas, enterrando qualquer possibilidade de demarcação de seus territórios tradicionais.

    Nós, lideranças indígenas, povos e organizações reiteramos a disposição de lutar contra este tipo de manobra que tenta nos usar para fins políticos, em detrimento dos nossos direitos fundamentais e coletivos.

     

    Bancada Indígena da CNPI e representantes da Mesa de Diálogo

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  • 07/04/2014

    Francisco convida Erwin Kräutler, bispo do Xingu, como colaborador na elaboração da encíclica sobre ecologia

    Erwin Kräutler, bispo de origem austríaca, missionário no Brasil, foi chamado pelo Papa Francisco para ajudá-lo na redação da próxima encíclica sobre os pobres e o cuidado do ambiente, como ele mesmo informou na entrevista concedida ao Orff Journal. A notícia foi divulgada pela agência KathPress.

    A informação é de Maria Teresa Pontara Pederiva, publicada por Vatican Insider, 06-04-2014. A tradução é da IHU On-Line.

    Kräutler, nascido em Koblach, em 1939, primogênito de seis irmãos, pertence à Congregação dos Missionários do Preciosíssimo Sangue. Depois dos estudos de filosofia e teologia em Salzburg, em 1965 partiu como missionário na Amazônia e em 1980 foi nomeado bispo na maior diocese, em extensão geográfica, do Brasil: a diocese de Altamira-Xingu, tornando-se bispo auxiliar do seu tio Eurico, e, um ano depois, o seu sucessor.

    De 1983 a 1991, Kräutler foi presidente do Conselho Indigenista Missionário – CIMI, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB. Em 2006, quando D. Gianfranco Masserdotti, presidente em exercício morreu num acidente, Kräutler foi reconduzido à presidência do Cimi.

    Em 1997 foi um dos quinze delegados eleitos para participar do Sínodo para a América e naquela ocasião foi o porta-voz do povo brasileiro cujo território estava sendo brutalmente saqueado.

    Sempre na primeira linha na defesa das populações locais ameaçadas pelo desmatamento ao longo dos rios da Amazônia, o bispo austríaco recebeu, em 2010, o Prêmio Nobel alternativo “pelo seu compromisso a favor dos direitos humanos das populações indígenas e pela sua luta pela conservação da floresta pluvial na Amazônia”.

    Muitas vezes ameaçado de morte (em 1987 sobreviveu a um atentado onde foi morto o seu motorista), continuou a se posicionar ao lado das populações na defesa da dignidade humana e do ambiente da Amazônia.

    A relação pobres-ambiente, muito cara a Papa Francisco desde o início do seu pontificado, para o bispo Kräutler é algo que está presente na sua ação cotidiana com a mais genuína Teologia da Libertação: a sua luta é contra a pobreza para que seja garantido a cada pessoa um trabalho e um salário justo acompanhado da promoção do reconhecimento dos direitos fundamentais, como a saúde e a defesa do território.

    Kräutler, que no próximo mês de julho completa 75 anos, provavelmente apresentou ao papa Francisco, na audiência da última sexta-feira, 5-04-2014, a sua demissão. Os temas da audiência foram, segundo Orf, os direitos dos povos indígenas, as ameaças a que são submetidos os povos indígenas com a construção das grandes barragens, os impactos e as consequências da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte e algumas propostas para enfrentar a falta de padres numa diocese que tem a extensão geográfica equivalente à Alemanha. Kräutler informou que o Papa esperava dele “propostas corajosas e audazes”.

    Sobre a encíclica, se de um lado a nomeação de Kräutler (em alemão se fala de “Mitautor”, isto é, co-autor, mas na realidade tratar-se-á de uma colaboração estreita) faz pensar na articulação que o Papa Bergoglio  reconhece entre o cuidado da criação e a promoção da justiça (são os pobres que sofrem as mais dramáticas consequências), como o Papa lembrou na recente entrevista aos jovens flamengos, por outro lado, trata-se de um sinal que a redação da encíclica está em curso, ou, pelo menos, em fase de estudos.

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  • 06/04/2014

    Milagres dispensados

    Fatos marcantes na memória brasileira. O golpe militar, após meio século, ainda deixa rastros e entulhos autoritários nas estruturas e no modelo desenvolvimentista. Sem milagres, mas com a mesma mão de ferro, continua impondo projetos que agridem e desrespeitam as populações indígenas e tradicionais, especialmente na Amazônia. Se atualizam as Balbinas, Tucuruis, Itaipus, com Belo Monte, Jirau Santo Antônio, Tapajós… e  dezenas de hidrelétricas no cronograma oficial.

    As maiores vítimas do “milagre brasileiro” no período do general Garrastazu Médici (1969-1974) foram os povos indígenas. As grandes rodovias, hidrelétricas, mineração, rasgaram os territórios de dezenas de povos indígenas, desencadeando um processo de destruição e violência que deixou um rastro de milhares de mortos, comunidades inteiras destruídas pelo impacto dos projetos, das bombas, armas de fogo, epidemias, calados e condenados pela repressão e invisibilidade.

    O mais grave é ter acontecido como se estivesse sendo feito um dever de casa, realizando uma ação patriótica. Prova disso é que até hoje não se viu esboçar nenhum gesto de reconhecimento das atrocidades e pedido de perdão aos povos indígenas, por parte do Estado brasileiro e seus mandantes. O mínimo que deveria estar acontecendo seria um reconhecimento dos crimes através de um gesto concreto de reparação, demarcando e protegendo os territórios indígenas.

    Papa Francisco e o encontro com representantes do Cimi

    Manhã do dia 4 de abril. Na agenda do Papa um singelo encontro com o presidente do Cimi, Dom Erwin Kräutler e o assessor teológico do Cimi, Paulo Suess. Na pauta do encontro, a questão indígena no Brasil. Na conversa é apresentada a situação candente de povos violentados em seus direitos, suas vidas, e suas almas. Realidades que o Cimi vem denunciando há mais de quatro décadas, mas que infelizmente persistem. Durante a audiência, os representantes do Cimi levaram a Francisco casos de violências a que estão submetidos os povos indígenas e seus aliados. Destacaram a questão Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul, onde o confinamento (45 mil indígenas) em área tão pequena traz consigo mortes, suicídios e sofrimento atroz e permanente… A truculência do governo brasileiro contra os Tupinambá, no sul da Bahia, que hoje têm em suas terras uma base do Exército, incêndio de casas, como a de um agricultor aliado dos Kaingang, no Rio Grande do Sul, e os ataques do agronegócio contra o Cimi e demais organizações. Um rosário de citações de um calvário e martírio sem fim.  Os dados e números mostram que as veias abertas da América Latina, com os decretos de morte dos povos originários, continuam abertas. No Brasil não é diferente . O capital voraz, com apoio do governo e políticos, avança inexoravelmente sobre os territórios, riquezas e vidas dos povos indígenas. “Sobre os grandes empreendimentos, o bispo lembrou que hoje 519 obras causam impactos em 437 terras pertencentes a 204 povos indígenas, conforme relatório produzido pelo Cimi com base também em outros estudos”.

    De acordo com Dom Erwin Kräutler, o Papa Francisco demonstrou atenção, preocupação e sensibilidade para com as questões levadas até ele pelo Cimi, organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

    Que a canonização de José de Anchieta seja um momento de lembrar também os santos e mártires da resistência, enfatizando o compromisso dos jesuítas na construção de um projeto de autonomia dos povos indígenas na “República comunista cristã dos Guarani”, conforme expressou Lugon. Quem sabe se tivesse algumas dúzias de Bartolomeu de Las Casas, a realidade no continente seria bem outra. Se Sepé Tiaraju e seus guerreiros Guarani, tivessem vencido os exércitos de Espanha Portugal, em Caeboaté, bem diferente seria a América do Sul.

    É de desconstruir mitos, dispensar milagres, reconhecer os santos e mártires, da construção de uma outra América e um outro Brasil. O Guerreiro Guarani Sepé Tiaraju, é venerado como santo, no Rio Grande do Sul. Resta reconhecer as terras e o direito dos Guarani e Kaingang para que vivam em paz, com dignidade e sabedoria milenar.

    Que os gestos singelos do Papa Francisco, de dispensar milagres e receber os representantes do Cimi, sejam sinais de novos tempos de compromisso com a vida dos povos indígenas em nosso país.

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