• 23/10/2014

    TRF5 garante posse de terra para comunidade indígena da Paraíba

    A Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) negou, na quinta-feira passada (16/10), provimento à apelação interposta pela Destilaria Miriri S/A, em ação de reintegração de posse de área localizada dentro dos limites da terra indígena Potiguara de Monte-mor, mantendo a sentença de primeiro grau que extinguiu o processo sem resolução do mérito.

    A Destilaria pretendia a proteção possessória da área da propriedade Arrepia. No entanto, no curso da ação de reintegração, sobreveio a Portaria 2.135/2007, do Ministério da Justiça, que tornou sem efeito o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), firmado entre a Destilaria e os representantes do Ministério Público Federal, das comunidades indígenas e Funai.

    “De fato, a Portaria, que reconhece a posse permanente dos indígenas sobre a área da ação de reintegração de posse, constituindo todos os direitos assegurados ao povo indígena pela Constituição Federal (CF), tem natureza declaratória e seus efeitos devem prevalecer enquanto não for invalidada na via própria (ação judicial adequada). A partir de sua publicação, fica sem efeito o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que regulamentou uma situação temporária, enquanto não definida a questão das terras Monte-mor. Publicada Portaria Ministerial que reconheceu a qualidade de terra indígena, incide a vedação (proibição) do art. 231, § 6º da Constituição Federal, segundo o qual são nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e aposse das terras indígenas”, afirmou o relator do caso, desembargador federal Manoel de Oliveira Erhardt.

    AC 500990-PB

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  • 23/10/2014

    CNBB manifesta preocupação com direitos indígenas

    A presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou hoje, dia 23, nota manifestando a preocupação da entidade em relação aos direitos dos povos indígenas, após decisões da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de anular os efeitos de portarias do Ministério da Justiça que reconheciam territórios ocupados por povos indígenas no Maranhão e no Mato Grosso do Sul. O texto foi aprovado pelo Conselho Permanente da Conferência, que esteve reunido em Brasília, de 21 a 23 de outubro. "A CNBB espera que não haja retrocesso na conquista dos diretos indígenas, especialmente quanto à demarcação de seus territórios", afirma a nota.

     

    Leia o texto na íntegra:

     

     

    Os direitos dos povos indígenas

    Nota da CNBB

     

    O Conselho Permanente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, reunido em Brasília nos dias 21 a 23 de outubro de 2014, manifesta sua preocupação com a decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal-STF que anulou os efeitos da Portaria Declaratória nº 3.219/2009, do Ministério da Justiça, que reconhece a Terra Indígena Guyraroká, do Povo Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, como de ocupação tradicional indígena.

    Lamenta, igualmente, a anulação, pela mesma 2ª Turma do STF, da Portaria 3.508/2009 que declara a Terra Indígena Porquinhos, no Maranhão, como de posse permanente do grupo indígena Canela-Apãniekra.

    A garantia dos territórios aos povos indígenas é um direito conquistado e consignado na Constituição Federal, com árdua luta de muitas pessoas da sociedade brasileira. Infelizmente, interesses econômicos têm impedido a demarcação das terras indígenas, que é a concretização do direito constitucional. Por isso, grande parte dos povos indígenas do Brasil continua vivendo exilada de suas terras devido ao esbulho e à violência histórica cometida contra suas comunidades.

    Questionar as demarcações das terras indígenas no poder judiciário tem sido uma estratégia utilizada com vistas a retardar ou paralisar as ações que visam à garantia de acesso dos povos originários aos seus territórios tradicionais. Enquanto aguardam a demarcação de suas terras, várias comunidades indígenas ficam acampadas à beira de rodovias ou nas poucas áreas de mata nos fundos de propriedades rurais, sem direito à saúde, à educação, a água potável, sofrendo ações violentas.

    A CNBB espera que não haja retrocesso na conquista dos direitos indígenas, especialmente quanto à demarcação de seus territórios. Concluir o processo de demarcação das terras indígenas é saldar uma dívida histórica com os primeiros habitantes de nosso país e decretar a paz onde há graves conflitos que vitimam inúmeras pessoas.

    Que Deus nos dê forças para garantir os direitos dos povos indígenas e de todos os brasileiros, superando toda atitude de abandono e descarte das populações originárias. Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, nos ajude a construir a paz que nasce da justiça e do amor.

    Brasília, 23 de outubro de 2014

     

     

    Cardeal Raymundo Damasceno Assis

    Arcebispo de Aparecida

    Presidente da CNBB

     

     

    Dom José Belisário da Silva

    Arcebispo de São Luís

    Vice-presidente da CNBB

     

     

     

    Dom Leonardo Ulrich Steiner

    Bispo Auxiliar de Brasília

    Secretário Geral da CNBB

     

     

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  • 23/10/2014

    No MS, comunidade de Pyelito Kue passa fome e os alimentos são sonegados pelo governo

    Sofrimento, dor, morte. Esta é a realidade da comunidade de Pyelito Kue, povo Kaiowá, em Mato Grosso do Sul. Enquanto se desenrola a disputa eleitoral para saber quem governará o país e que, por conseguinte, também deverá administrar a corrupção há décadas estruturada no sistema político e na governança do Brasil, centenas de famílias indígenas passam fome.

     

    A comunidade Kaiowá de Pyelito Kue denunciou a missionários e missionárias do Cimi que está passando fome e não recebe há meses nenhum tipo de assistência da Funai e da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Com isso, mais de 50 famílias passam a maioria de seus dias sem realizar nenhuma refeição. Na melhor das hipóteses acabam escolhendo apenas um período do dia para se alimentar, geralmente a partir de soluções compostas apenas por água, farinha e sal.

     

    Há uma determinação do governo federal, segundo a denúncia da comunidade, para que a Funai não distribua os alimentos contidos no programa das cestas básicas. De acordo com os indígenas, como já ocorreu outras vezes, os alimentos estão armazenados, mas há ordem superior para que não sejam entregues na comunidade indígena. Denunciam ainda que este fato é de plena ciência dos funcionários da Funai. Esta é a segunda vez que o mesmo fato ocorre neste último semestre.    

     

    As lideranças indígenas informaram que uma criança, chamada Mikaela Flores, de pouco mais de um ano, morreu e que o diagnóstico do médico foi de que a criança veio a óbito em decorrência da fome. Assim como Mikaela, mais duas crianças foram recentemente hospitalizadas apresentando quadros graves de raquitismo e desnutrição.

     

    Entre os Kaiowá de Pyelito, crianças de mais de um ano de idade apresentam peso menor do que sete quilos. No caso de crianças de até 5 meses o peso diminui preocupantemente para menos de quatro quilos. Marcas de uma política de genocídio.    

     

    Além da falta de comida, a água que está sendo utilizada para o consumo é imprópria e tem causado uma sistemática onda de doenças, em especial nas crianças. O gosto de metal e a aparência da água, coletada pelos indígenas nos empoçamentos e vertentes existentes, indicam que a mesma possui elevadíssimos teores de ferro. Sendo a única fonte de água, acaba sendo utilizada também para tomar banho.

     

    Gerônimo Nunes da Silva, rezador e ancião da comunidade, com lágrimas nos olhos desabafou: “O guerreiro já está acostumado. Quando acha um pedacinho d’agua estende um paninho e depois chupa, assim a gente vai se virando, mas e estas crianças, o que a gente faz com elas?”. Sobre a fome ele complementa: “A gente passa fome, mas o que mais dói é o olhar das crianças olhando para gente, elas choram sem ter o que comer e não compreendem que não é nossa culpa”. Gerônimo cala no meio do depoimento engasgado pela emoção.  

     

    O mais revoltante é que existem condições plenas e fáceis para a resolução do problema da água em Pyelito Kue. Há na aldeia uma estrutura de poço artesiano que até a poucos meses atrás era utilizada pelos indígenas através do auxílio de um pequeno motor que foi doado à comunidade. Porém o Fazendeiro local tombou o poste de energia que abastecia a aldeia. Há meses a Sesai sabe do acontecido, mas não tomou nenhuma providência.

     

    Os Kaiowá denunciam que após inicio das tentativas do governo federal em aprovar de maneira arbitrária a terceirização do sistema de saúde indígena através da implementação do Instituto Nacional de Saúde Indígena (INSI), os atendimentos da Sesai pioraram a ponto do órgão simplesmente não aparecer mais na aldeia. Quando os servidores aparecem, não realizam nem os exames de rotina com a comunidade, tanto que estas crianças, mesmo com alto índice de desnutrição, não foram sequer pesadas pelos agentes do órgão.           

     

    A comunidade de Pyelito Kue há décadas luta pela demarcação e garantia de suas terras e ao longo dos últimos anos vem sofrendo as mais variadas formas de violações aos seus direitos humanos e territoriais. Lideranças foram mortas, pessoas espancadas, tiveram seus barracos queimados por diversas vezes e os ataques de pistoleiros contratados por fazendeiros da região de Iguatemi ocorrem cotidianamente.

     

    No ano de 2012 a comunidade elaborou uma carta onde relatam que não abandonarão a terra tradicional, mesmo que para isso tenham que entregar as suas vidas.

     

    A terra de Pyelito Kue está em demarcação e a primeira etapa do procedimento demarcatório foi concluído no ano de 2012, sendo que a Funai publicou o estudo circunstanciado da terra  em janeiro de 2013, o qual comprova a tradicionalidade da ocupação indígena. No entanto, o procedimento foi paralisado por determinação da presidência da República. O governo pretende, com isso, obter apoio dos setores vinculados ao agronegócio e da bancada ruralista no Congresso Nacional, que são contrários aos direitos indígenas, especialmente à demarcação das terras.

     

    Talvez seja por conta da campanha eleitoral e da aliança do governo com a bancada ruralista que se sonegou aos indígenas Kaiowá de Pyelito Kue os alimentos, condenando-os a fome e a morte.

     

    Porto Alegre, 23 de outubro de 2014. 

    Roberto Antonio Liebgott
    Missionário do Cimi Sul

     

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  • 22/10/2014

    MPF pede anulação da licença de instalação da usina São Manoel

     O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou mais uma ação apontando irregularidades no licenciamento da usina São Manoel, obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal, no rio Teles Pires, na divisa do Pará com o Mato Grosso. É a sétima ação do MPF contra a usina e pede a anulação da licença de instalação concedida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) porque o órgão não exigiu o cumprimento das condicionantes – medidas obrigatórias para mitigar e compensar os impactos da obra sobre a população e o meio ambiente.

    A obra afeta diretamente as terras dos povos indígenas Kayabi, Munduruku, Apiaká e povos em isolamento voluntário, que recusam a aproximação da sociedade não-indígena. Pela legislação ambiental em vigor no Brasil, o Ibama só poderia conceder a licença de instalação depois que a Empresa de Energia São Manoel, responsável pela obra, comprovasse o cumprimento das condicionantes da licença prévia, fase inicial do licenciamento. Mas apenas quatro meses depois da licença prévia, a Empresa pediu e obteve do Ibama a licença posterior, sem cumprir todas as condicionantes.

    De acordo com relatório do próprio Ibama, analisado pelo MPF, foram cumpridas 47,37% das obrigações impostas ao empreendedor, restando não atendidas, em atendimento ou atendidas parcialmente 52,63% das condicionantes. Algumas são condições fundamentais, na visão do MPF, para que a obra tenha os impactos realmente compensados, como a apresentação de um programa de monitoramento da ictiofauna, de alternativas para o sistema de transposição de peixes, o estudo dos corpos hídricos a jusante da usina (que podem perder vazão).

    “O cumprimento integral das condicionantes da Licença Prévia é condição para emissão de Licença de Instalação válida. É o que está previsto na legislação ambiental brasileira e assentado jurisprudencialmente. Por essa razão, a Licença de Instalação nº 1017/2014 é nula”, diz a ação do MPF. No mesmo rio Teles Pires, a Justiça Federal suspendeu as obras de outra usina, Sinop, por descumprimento de condicionantes.

    A cartilha de licenciamento ambiental do Tribunal de Contas da União determina que para conceder a licença de instalação, o Ibama tem que verificar o atendimento das condicionantes determinadas na licença prévia. “Quando da solicitação da licença de instalação, o empreendedor deve comprovar o cumprimento das condicionantes estabelecidas na licença prévia”, diz o texto do TCU que serve como regra, ao lado de outras normas legais, para o licenciamento.

    Para o MPF, a concessão de licença sem o cumprimento das condicionantes da fase anterior viola o princípio geral que rege a legislação ambiental, o da precaução, configurando danos potenciais à vida e ao meio ambiente na região impactada pela usina São Manoel. A ação cita como exemplo as consequências, para a população do Xingu, da falta de rigor do Ibama na concessão das licenças para a usina de Belo Monte. “No caso de Belo Monte, onde as condicionantes da licença prévia não foram cumpridas e mesmo assim o Ibama concedeu licença de instalação, as consequências foram desastrosas e definitivas.

    A ação pede que seja declarada nula a licença de instalação da usina São Manoel e a imposição de obrigação à Empresa de Energia São Manoel SA para que cumpra todas as condicionantes da licença prévia antes de solicitar a licença posterior. O Ibama também deve ser proibido de emitir nova licença de instalação antes do cumprimento de todas as condições.

    É a sétima ação judicial apontando irregularidades na usina de São Manoel, uma das 8 que o governo federal está tocando na bacia Tapajós-Teles Pires. No total, contra 6 das 8 usinas do complexo, o MPF já ajuizou 17 ações judiciais.

    Veja tabela com todas as ações judiciais sobre irregularidades nas usinas do complexo Tapajós-Teles Pires

    Íntegra da ação contra a usina São Manoel por descumprimento das condicionantes

    Processo nº 0031442-65.2014.4.01.3900

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  • 22/10/2014

    Fazendeiro ameaça remoção dos Guarani-Kaiowá da aldeia Santiago Kue/Kurupi, mas indígenas prometem resistir

    Nas imediações da cidade de Naviraí, estado de Mato Grosso do Sul, há quase um mês a paz foi recuperada a duras penas pelo grupo Kaiowá e Guarani que retomou parte de seu território sagrado de Santiago Kue/Kurupi, mas a comunidade vem sendo ameaçada diariamente por jagunços e pistoleiros. Frente aos ataques, os indígenas prometem resistir a qualquer custo e afirmam que retomaram seu território definitivamente. Os Guarani-Kaiowá se negam a sofrer novamente o peso e o sofrimento dos acampamentos à margem das rodovias. Enquanto seguem paralisados os procedimentos demarcatórios das terras indígenas, ordens de despejo e práticas de violência por parte dos fazendeiros estão sendo exercidas como via de regra contra os povos originários ao longo de todo o estado.  

    Após 21 anos vivendo esmagados entre cercas, rodovias e às margens da BR-163, em acampamentos tão improvisados como as suas próprias vidas, cerca de 13 famílias, aproximadamente 130 pessoas, em sua maioria idosos e mulheres,  cansaram de esperar os estudos de identificação e delimitação de seu território e ocuparam, no último dia 21 de setembro seu tekoha (a terra tradicional, o lugar onde se é). O fazendeiro da região ameaça frequentemente os indígenas e reitera que o grupo vai “sair por bem ou por mal” da sua dita propriedade. Os Kaiowá enfrentam como podem tanto os tiros e investidas dos jagunços, quanto às precárias condições de vida que levam em decorrência dos mesmos ataques. Sem segurança, a vida dos indígenas segue diariamente sendo ameaçada. 

    A história recente dos grupos indígenas que buscam regressar ao território de Santiago Kue/Kurupi é marcada por uma sequência de despejos e reocupações ininterruptas, onde a violência acometida contra os Kaiowá, que gerou inclusive a morte de seus antigos rezadores e lideranças, passa a ser superada a cada nova vez pela coragem e perseverança daqueles que vivem para regressar à sua terra. Entre meados da década de 1990 e 2000 esta já é a quarta retomada do povo Kaiowa ao seu território tradicional.

    Segundo os indígenas, parte dos grupos e famílias que habitam o território da qual faz parte Santiago Kue/Kurupi foram expulsos em diferentes momentos da história, enquanto outros grupos jamais deixaram o solo da terra tradicional.  Trata-se de uma terra onde muitos indígenas foram divididos e açoitados, em diferentes épocas, devido a ataques de homens armados passaram a constituir acampamentos palmilhando rodovias que circundam o seu grande território ancestral, sem jamais ter esquecido ou se desligado dele.

    Levi Marques Pereira, antropólogo responsável pelos estudos de identificação e delimitação de Santiago Kue/Kurupi junto à Funai, define em documento encaminhado para o Ministério Público Federal de Dourados, ainda em meados de 2012, que na verdade existe um grande território indígena em questão que pode ser definido como “Tekoha Guasu”. Em linhas gerais, trata-se de muitos grupos e aldeias de um mesmo povo que vive e coexiste coletivamente ou separadamente, em um único território ancestral maior.

    Segundo os estudos, fazem parte deste extenso território maior que tem sua extensão dividida entre o que hoje são os municípios de Juti e Naviraí, as aldeias de: Lechucha, Matula, São Lucas, Bonito, Santiago Kue/Kurupi, Kurupa’i, Mboka e Aldeinha. A comunidade de Aldeinha jamais saiu dos limites do Tekoha Guasu e ainda hoje resiste aos fazendeiros no interior de seu território. Os estudos da Funai acabaram por constatar de forma sólida o caráter de tradicionalidade da Tekoha Guasu, porém mesmo existindo inúmeras  evidências de caráter histórico e etnográfico que comprovam a presença destes grupos junto a este território, os procedimentos demarcatórios seguem paralisados causando a estas comunidades o esbulho nos acampamentos ao longo das estradas.      

    Segundo Termo de Ajuste de Conduta (TAC) firmado entre Ministério Publico Federal e a Funai em Brasília no ano de 2007, foi determinado ao órgão indigenista que até o prazo máximo de abril de 2010 fosse publicado no Diário Oficial da União, os resumos dos relatórios de identificação. Porém, até agora, quatro anos depois, os indígenas só receberam de reposta concreta a violência dos fazendeiros.

    Violência esta, antiga conhecida do povo de Santiago Kue/Kurupi, que hoje é reforçada pelas políticas anti-indígenas levadas a cabo pelo governo federal e bancada ruralista. Em 2011, o Cimi já denunciava casos de tortura e agressões sofridas por estas comunidades indígenas. Leia aqui:

    https://cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&conteudo_id=5947&action=read&page=101

    As constatações de Levi a respeito da Tekoha Guasu são confirmadas pelas vozes dos anciãos dos acampamentos existentes ao longo das rodovias, frutos doloridos das expulsões forçosas sofridas pelo povo Guarani-Kaiowá. Detentores de memória e guardiões da história de seu povo, os rezadores e rezadoras Kaiowá-Guarani quando perguntados pelo seu território ancestral passam a abrir com seus movimentos e palavras, lacunas no tempo e no espaço, redelimitando limites por eles a muito conhecidos. Com gestos precisos e firmes de seus braços já cansados, passam a desenhar no ar um mapa de um mundo de outrora que em suas profundas certezas e esperanças retornarão em breve a ser a “grande cidade dos Guarani”.


    “O campo e o mato não são vazios, são nossas cidades, o branco apenas não vê assim”


    Clarita Ramires, importante anciã de 72 anos, lembra que: “Santiago Kue sempre foi uma grande aldeia do povo Kaiowá, terra tradicional, com muita gente, mato e bicho. Lugares cheios de histórias”, a anciã ainda recorda a presença de seus ancestrais no território, “Todos os meus avós morreram lá. Quando ainda pequena percebi as primeiras movimentação dos fazendeiros. As cidades cresceram sobre os locais que para nós já existiam. Pouco antes de eu nascer meus pais contaram que a cidades dos não-indígenas ainda nem estava lá. Para nós, todo campo e cantinho de mato tem sua importância, conhecemos todos os cantos e eles têm seus motivos de existir. São nossos cemitérios, nossas igrejas, ruas e praças. O campo e o mato não são vazios, são nossas cidades, o branco apenas não vê assim.”

    Partilhando as memórias sobre suas antigas moradas, outros indígenas, velhos e jovens lembram que até o nome dos locais indígenas foram “herdados” pelas cidades dos “brancos”. Naviraí, por exemplo, significa em Guarani algo próximo a um “lugar onde árvores roxas se estendiam junto a pequeno rio”.

    Recentemente, junto com a expansão das fronteiras agrícolas e o desenvolvimento dos agrupamentos urbanos locais é que alguns grupos indígenas foram forçados a deixar suas aldeias. Sobre este processo, Clarita recorda que: “Apesar de alguns lugares e cemitérios terem sido destruídos e revirados pelos fazendeiros, nós nunca os esquecemos. Nós andávamos por todo este território. Antigamente os Guarani-Kaiowá não paravam em um só lugar, andávamos aqui, na cabeceira do rio São Lucas, em Kurupi e plantávamos muito. Por onde o Kaiowá passa, ele deixa seu roçado. A polícia e os pistoleiros expulsaram apenas alguns de nós. E quando éramos expulsos, as nossas casas eram queimadas e até os cachorros e pessoas eram mortas. Quando os Karaí vieram colonizar, construir a cidade, só tinha duas casas, mas eles expulsaram todos. Domiros e outros fazendeiros quase mataram a gente. Quando vieram nos escondemos, ficamos no mato observando os fazendeiros, mas sempre que era preciso correr deixávamos tudo para traz, nossas coisinhas, pertences, mas na verdade deixávamos mais que isso, cada vez que corríamos deixamos para traz nosso mundo. Mas deixávamos para buscar mais tarde.”

    Solidônio Martinez hoje com 56 anos, expulso da terra ainda criança complementa: “Naquele tempo não tinha fazendeiros como hoje. Os indígenas trabalhavam nas roças das fazendas mais distantes, porém tinham seu tekoha. Mas isso era antigamente, na época de chegada dos fazendeiros recentes, a expulsão começou a ser na força, na marra. Fomos expulsos da cabeceira do São Lucas, mas não todos nós. Muitos de nós tínhamos roça e uma pequena criação de animais. Os fazendeiros tomaram tudo, marcavam nosso gado e nos expulsavam. Nós partíamos com as panelas velhas amarradas na cintura, indo trabalhar nas lavouras ao redor para sustentar os filhos. Os pais iam morrendo e a gente ia ficando por aí. Mas o lugar deles morrer não era para ser na estrada. Na cabeceira do São Lucas é que fica o nosso cemitério. Lembro que jogávamos o que podíamos em cima dos cavalos e saíamos sem destino, que nem cigano, fazendo comida onde dava quando dava, antes do escurecer”.

    Para os indígenas, a Grande Tekoha Guasu, onde se encontra Santiago Kue/Kurupi se configura como algo muito maior do que apenas uma porção de terra. Nos cemitérios internos ao território estão, sobretudo, os restos dos rezadores e rezadoras que dão nome as localidades. Ressaltam os mais velhos que Santiago era um antigo rezador que faleceu no território conhecido como Kurupi, que é nome de outra rezadora já falecida.

    Outro grave problema que terá de ser enfrentado pelos indígenas, certamente agravado pela não demarcação de seu território é a duplicação da BR-163 que esta ocorrendo em outros trechos da mesma rodovia. Existem direitos de compensação específicos e garantidos por convenções e diretrizes nacionais internacionais em relação ao impacto que obras possam vir a causar aos territórios tradicionais dos povos originários. Porém, em muitos casos, políticas de desenvolvimento têm se mostrado como um grande empecilho a demarcação das terras indígenas.         

    Os indígenas, cansados de esperar pela continuidade dos procedimentos demarcatórios e castigados pelas duras vidas à beira das rodovias, anunciam que não deixarão mais sua terra tradicional e denunciam que após a retomada passaram a sofrer muito com abandono das políticas de amparo básico, como acesso à saúde, educação e eliminação por conta dos órgãos responsáveis. No acampamento improvisado pelo povo Kaiowá e Guarani, existe um grande número de crianças e gestantes que a respeito do que esta ocorrendo em outras Terras Indígenas no estado encontram-se desamparadas de atendimentos referentes a condições mínimas de vida.

    O Conselho Indigenista Missionário denuncia a situação de vulnerabilidade vivida pelo povo Guarani no tekoha de Santiago Kue/Kurupi, causada tanto pelo abandono de políticas de amparo à comunidade bem por conta dos covardes ataques realizados por jagunços e pistoleiros. Reforçamos que a única solução capaz de garantir ao povo Kaiowá e Guarani os seus direitos constitucionais e o mínimo acesso a uma vida digna é a imediata demarcação de seus territórios tradicionais.  

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  • 22/10/2014

    MPF obtém efeito suspensivo e comunidade Terena pode permanecer em terras na região de Buriti (MS)

    O Ministério Público Federal (MPF) obteve efeito suspensivo de decisão liminar que determinava a reintegração de posse de imóveis situados na região de Buriti, Mato Grosso do Sul, ocupados por indígenas da comunidade Terena. A nova decisão, da 1ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF3), também suspendeu multa diária de R$ 500 contra a comunidade indígena e de R$ 1 mil contra a Funai em caso de descumprimento. Apesar de o próprio Ministério da Justiça ter declarado a área como de posse permanente dos índios, a liminar atendia pedido de Afrânio Pereira Martins, autor de uma das ações de interdito possessório movidas contra os Terena, que ocupam terras nos municípios de Sidrolândia e Dois Irmãos do Buriti (MS).

    Martins sustentava que a comunidade indígena estava praticando atos para perturbar ou privar a posse dos imóveis, posse esta que fora determinada pela 1ª Seção do Tribunal Regional Federal (TRF3) declarando válido o domínio particular sobre a área administrativamente demarcada baseando-se somente nos títulos de domínio.

    A procuradora regional da República Maria Cristiana Amorim Ziouva se manifestou contra a liminar concedida pela Justiça Federal e asseverou que mesmo que os autores da ação aleguem ter direito à posse das terras, eles são  mero detentores das terras em litígio, sendo certo que a Constituição torna nulos e extintos quaisquer atos relativos à posse e domínio em terras indígenas. Além disso, a procuradora ressaltou que todas provas constantes nos autos de origem já apontam para a existência da ocupação tradicional pelos indígenas, inclusive a Portaria 3.079/2010 do Ministério da Justiça, que declarou como de posse permanente dos índios Terena aproximadamente 17.000 (dezessete mil) hectares, incluindo as terras apontadas na ação. “Assim, havendo nos autos direito plenamente comprovado e presumido, qual seja, o direito indígena à demarcação das terras e a sua permanência no local, o que culminou com a edição da Portaria n.º 3.079, é esse que deve prevalecer, não havendo verossimilhança do direito alegado pela parte autora da ação possessória originária”, asseverou Maria Cristiana em seu parecer.

    A procuradora destacou que quem de fato tem direito à proteção são as famílias indígenas, levando em conta que nem sequer houve perturbação da ordem por parte da comunidade. Ela apontou que grupo indígena é o grupo social mais vulnerável e que deve ser protegido em relações às pretensões privadas defendidas. Maria Cristiana enfatizou ainda em seu parecer que ”a concessão liminar de medidas proibitórias e reintegratória, tomando-se por base uma decisão que ainda encontra passível de ser reformada, deve ser tida com cautela, ainda mais quando prestigia o direito à propriedade em detrimento dos direitos à vida, à segurança e à saúde”.

    A reintegração de posse acarretaria uma proteção do interesse particular em detrimento aos interesses e direitos indígenas, podendo assolar a sobrevivência étnica e cultural dos integrantes da comunidade, ocasionando lesão de grave ou de difícil reparação. “Portanto, não há que se falar em periculum in mora favorável à agravada que motive a concessão de medida liminar de reintegração de posse, havendo, em verdade, a presença do periculum in mora inverso, a favor da pretensão dos índios à permanência na posse de suas terras tradicionais.” concluiu a procuradora.

    A 1ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF3), por unanimidade, atendeu à manifestação do MPF e suspendeu a liminar que impunha a reintegração de posse em desfavor da comunidade indígena Buriti, bem como concedeu o efeito suspensivo em relação à multa diária de aplicada à  FUNAI e à Comunidade de R$ 500 em caso de descumprimento.

     

    Processo nº 0012067-21.2013.4.03.0000/MS

    Acórdão.

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  • 21/10/2014

    Teste caci

    Teste de embed da plataforma Caci.

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  • 21/10/2014

    Povo Gamela, da comunidade de Taquaritiua, resiste para manter o seu território livre

    Na manhã de sábado (18), homens, mulheres e crianças do povo indígena Gamela, da comunidade Taquaritiua, localizada há 12 km de cidade de Viana (MA), retiraram a cerca de arame que avançou sobre a área de reserva do território indígena. A cerca foi colocada por um fazendeiro da cidade de Viana, que se diz comprador da terra e mandou desmatar a área, destruindo aproximadamente um hectare.

    O senhor Epitácio dos Santos, de 84 anos, se emociona ao lembrar a sua vida inteira de luta e não consegue segurar as lágrimas.  “Sou um velho lutador, sempre me conheci nessa luta aqui, muitos dos que lutavam comigo já morreram, mas dou graças a Deus por continuar resistindo”.

    No começo da semana passada, os indígenas perceberam tratores destruindo a área de uso coletivo do povo, onde todos os grupos familiares usam para caçar, buscar palha e madeira para construção de casas, entre outros. “Todo mundo tira seu sustento dessa terra, é aqui que plantamos, é aqui que pescamos e não queremos mais ser um sem título, terra a gente tem, o que não temos é o título”, afirma dona Ivone dos Santos.

    Na sexta (17), os indígenas registraram queixa na delegacia de Viana pedindo providências sobre a destruição do seu território.  Preocupados a comunidade tomou a decisão de retirar o arame e retomar o seu território para evitar que o desmatamento continue.

    “Desde que entendi o que os nossos pais diziam: a gente vive é do sacrifício e é assim que vivemos aqui. Para garantir o que a gente tem, só com muita luta”, diz seu Cipriano Nonato dos Santos.

    Em assembleia no local desmatado e agora retomado, os indígenas decidiram dar uma destinação para a área desmatada, colocando ali uma roça de usufruto comum. Na semana que vem tentarão dialogar com o responsável pela destruição da mata e continuarão vigiando para que seu maior patrimônio, a terra, não continue sendo destruída.

    O povo Gamela, considerado extinto, vem desde 2013 lutando pelo reconhecimento étnico e territorial. Em agosto deste ano, na Assembleia de Autodeclaração, o povo indígena deliberou a luta pela conquista desse território e revitalização da identidade étnica.

    Cabe lembrar que o território do povo Gamela, doado pelo Império Português, compreendia mais de 10 mil hectares, mas atualmente, o povo vive em 552 hectares, parcela que restou de um violento processo de grilagem ocorrido nos anos 70. Esse pedaço de chão, onde esse povo vive e tira dele seu sustento está novamente sendo objeto de disputa e de fraude.

    O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Jornal Vias de Fato, o Núcleo de Extensão e Pesquisa com Populações e Comunidades Rurais Negras Quilombolas e Indígenas (Nuruni), da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), estiveram presentes na comunidade, visitando a área desmatada e prestando apoio e solidariedade ao povo e continuarão acompanhando os desdobramentos dessa situação para que seja respeitado o direito dos Gamela de viver livre no seu território.

     

    Cimi Regional Maranhão

     

     

     

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  • 21/10/2014

    Se eleito for




    Enquanto as urnas vão acariciando silenciosamente voto por voto, ponho-me a dialogar com meus botões já envelhecidos e cansados da mesmice política a cada eleição.  A primeira constatação é óbvia: tudo farinha do mesmo saco. Ou melhor, os que têm alguma chance de chegar ou permanecer no Palácio do Planalto rigorosamente propõem ou seguem a cartilha neoliberal, colonialista, ditatorial e elitista. Diante de tal cenário, a reação primeira seria de rejeição em bloco e não votar na falta de democracia.

    Mas tem quase um milhão de brasileiros originários cuja situação é infinitamente pior. Além de sentir-se no direito do exercício da indignação terão que amargar mais quatro anos de vilipêndio sobre seus direitos constitucionais. O agronegócio cresce e se expande mais que erva daninha. São os povos indígenas que primeiro e mais intensamente terão que arcar com as consequências nefastas, destruidoras e criminosas, pois o agronegócio nada poupa.  Rasga o ventre da mãe terra e o enche de venenos, impunemente. Os filhos originários da terra são agraciados com uma silenciosa guerra. Tudo acontece com a benção do sistema que covardemente insiste de chamar isso de progresso.

    E se eleito for algum indígena, seja para Assembleia Legislativa Estadual ou seja para o Congresso Nacional, cenário pouco provável, mesmo assim terá sido o passo mais fácil, diante do hercúleo esforço que terão que fazer, em meio a um ambiente de cobras criadas, de cartas marcadas e de interesses consolidados.

    Tenhamos a coragem e honestidade de pensar por uns instantes, no gigantesco desafio que terá pela frente esse eventual eleito. Por mais que o movimento indígena tenha avançado e amadurecido, dificilmente não sucumbirá diante das presas sanguinolentas do monstro.

    Apesar dos apesares “se eleito for” ninguém poderá fugir do páreo: que os céus conclamem todos os heróis e combatentes para cerrar fileira na defesa da vida e direitos dos povos indígenas.

    O que será das nossas crianças?  Qual será o nosso futuro a partir de amanhã?


     

     

    Egon Heck- Secretariado Nacional Cimi

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  • 21/10/2014

    Campanha de solidariedade à Terra Indígena de Kurusu Ambá

    A todos os companheiros e companheiras,

    Aos lutadores e lutadoras do povo,

    Aos defensores e defensoras da vida e dos direitos humanos.

     

    Frente a mais uma tragédia anunciada, prestes a ocorrer contra cerca de 250 indígenas Kaiowá no Mato Grosso do Sul, as entidades de defesa dos direitos humanos, movimentos sociais e sindicais, também organizações dos povos indígenas de MS, solidárias à luta dos povos indígenas do Brasil e do Mato Grosso do Sul, entre elas o Conselho Indigenista Missionário(Cimi), Centro da Defesa e Direitos Humanos- Marçal de Souza Tupã i (CDDH), Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Coletivo Terra Vermelho (CTV), Rede Nacional dos Advogados Populares (Renap/MS), Centro de Documentação e Apoio aos Movimentos Populares (CEdampo), Centro de Estudos Bíblicos (Cebi), Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), Assembleia Guarani e Kaiowá (Aty Guasu), Conselho do Povo Terena e outros que podem ainda vir a somar – estendem a todos e a todas o apelo de ajuda e solidariedade para com a comunidade da terra indígena de Kurusu Ambá, localizada em Coronel Sapucaia (MS), que há muito luta pelo seu direito constitucional e sobretudo fundamental de ter uma vida digna e pelo mínimo acesso a seu território tradicional, medida essencial para sua sobrevivência física e cultural.


    O histórico tanto das condições de “vida” as quais as famílias indígenas estão submetidas em Kurusu Ambá, bem como da luta e resistência dos Kaiowá pela demarcação de sua Terra Indígena, são por si só alarmantes e guardam traços de uma profunda desumanidade, situações que infelizmente hoje, frente a atual conjuntura, só pode ser revertida com o apoio de entidades e grupos sociais que vêm se postando como aliados na garantia dos direitos do povo e no fortalecimento do princípio da luta pela vida.


    Há muitos anos, entidades nacionais e internacionais vêm sistematicamente denunciando a situação de pura miséria vivida e sentida no dia a dia pela comunidade. Em casos mais agudos, cerca de 250 pessoas atravessam meses sem ter nenhuma alimentação ou fazendo uma refeição por dia à base de uma solução composta apenas por água e farinha. Esta condição somada à contaminação do córrego d’água que corta a pequena faixa onde os indígenas se encontravam desde 2009, por agrotóxico proveniente da monocultura já causou o falecimento de um grande numero de crianças. A situação tem se agravado com os constantes atrasos na entrega de apoio alimentar que deveria ser realizado pela Funai.


    Ao mesmo tempo, vivendo desprovidos de suas terras, não conseguem exercer o direito de viver de acordo com seus costumes, tradições, crenças e modo de vida. Esta vivência de seus costumes e tradicionalidade é tão importante para os indígenas que o fato de não poder exercê-los chega a causar muitas vezes em diversos povos o abandono da vontade de viver. O direito em deter terras que permitam o desenvolvimento do modo de ser originário é assegurado pela Constituição Federal e sua garantia é postada na mesma como dever do Estado Brasileiro.  


    A única solução sabidamente possível para por fim a este estado de hiper-vulnerabilidade sofrida pela comunidade Kaiowá é a demarcação de Kurusu Ambá, que garantiria sua soberania cultural e alimentar, esperada pelos indígenas desde de quando foram expulsos de seu território originário pelo plano do Governo em colonizar a região.


    Ainda em 2007, por força do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre MPF e Funai deu-se início aos estudos antropológicos, porém os mesmos encontram-se atualmente paralisados.


    Com a medida de paralisação das demarcações adotada pelo governo federal os procedimentos foram interrompidos e a comunidade entrou novamente em estágio de intenso sofrimento. Restou aos indígenas a busca direta pelo seu espaço e pela sua sobrevivência, porém medidas pacíficas que tão somente visam a sobrevivência da comunidade, em especial de seus filhos e filhas causaram aos Kaiowá um drástico e constante cenário de ataques realizados por pistoleiros e jagunços junto ao total descaso e “fechar de olhos” do governo federal.     

                      

    A comunidade de Kurusu Ambá é uma das que mais teve lideranças assassinadas por estarem em luta pela demarcação de suas terras no estado Mato Grosso do Sul. Desde 2007, já foram mais de dez assassinatos durante processos anteriores de tentativa de retomada desta mesma terra tradicional. Nos mais repercutidos, se destacam o assassinato de duas lideranças executadas deliberadamente por grupos armados, sendo, Xurite Lopes, importante rezadora com mais de 70 anos, e o líder Ortiz Lopes.


    Frente a todo este contexto e buscando uma oportunidade de viver, no dia 24 de setembro de 2014, a comunidade indígena de Kurusu Ambá decidiu por retomar uma pequeníssima parcela de seu território tradicional, em específico, um espaço de terra para poder plantar e, após sofrerem represarias de um arrendatário, uma pequena sede da Fazenda Barra Bonita de propriedade de CERCY SILVEIRA DA SILVA, MARILENE NUNES DA SILVA, JOÃO ANTONIO FARIAS, mas atualmente arrendada para ROBERTO RAMOS e MARIA HELENA VANZELA RAMOS.


    Nesta mesma data, retratando mais um quadro na galeria das violências acometidas contra os povos indígenas no estado celeiro do agronegócio, eram ouvidas junto a Justiça Federal de Ponta Porã (MS), as testemunhas arroladas pelo Ministério Público Federal em face de 19 acusados pela pratica de diversos crimes, entre estes, o assassinato e a ocultação do cadáver do cacique Nísio Gomes[1] da Terra Indígena de Guaiviry.


    Tão logo os indígenas começaram sua ação, buscaram eles mesmos notificar os órgãos responsáveis e garantir a tranquilidade do processo de retomada do pequeno espaço de terra. Os indígenas vêm denunciando todos os dias a movimentação de grupos armados que rondam o pequeno acampamento de suas famílias.


    No dia 03[2] de outubro aconteceram os primeiros ataques concretos contra os Kaiowá, onde barracas foram destruídas e a comunidade passou por intenso momento de terror.


    Como já era de se esperar, enquanto os indígenas seguem sem a demarcação de seu território e jagunços avançam diretamente contra as famílias indígenas, os proprietários buscaram na justiça o despejo do povo Kaiowá. No dia 29 de setembro de 2014, na sala de audiência da Justiça Federal de Ponta Porã (MS) foi tentado um acordo que em termos rasos se resumia em reagrupar a comunidade em aproximadamente 10 hectares para que esperassem a conclusão do processo demarcação em melhores condições que a atual.


    O resultado foi o pior possível. Mesmo que na audiência em si, o julgador não tenha proferido sua decisão de imediato, o fez três dias depois, no dia 06 de outubro onde foi determinado o prazo de 20 dias para que a comunidade desocupe a sede da fazenda e retorne, voluntariamente, aos quatro hectares que ocupavam às margens de uma pequena mata – área de proteção ambiental – mesmo local em que os indígenas tem vivido como indigentes por todos estes anos. Não bastasse isso, ainda foi utilizado no julgado a tese do “Marco Temporal” que veio a tona novamente nos últimos julgados do STF, tese esta que despreza todo o processo de expulsão sofrida pelos Guarani e Kaiowá nas décadas de 10 a 30 do século passado.


    Nesta conjuntura, o momento é de grande preocupação e tensão e necessita da atenção de todos os cidadãos e entidades de defesa dos direitos humanos, pois está se caminhando para mais uma tragédia em Mato Grosso do Sul.

    Temerosos pelo cumprimento da ordem de reintegração de posse no Kurusu Ambá, pela possível e provável onda de ataques de jagunços uma vez que a comunidade encontra-se desassistida e, pelo alto teor de fome, sede, e todo o tipo de necessidades básicas que atacam diretamente os direitos humanos, a comunidade indígena de Kurusu Ambá necessita do apoio e solidariedade dos aliados e pede:


     

    O início de campanha de doação de alimentos, água e vestes para a comunidade

     

    Local de Coleta: MST-rua Juruena, 309, bairro Taquarussu, Campo Grande (MS)

     

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