• 20/05/2015

    Pyelito Kue sofrem novo atentado, mesmo após TAC firmado entre comunidade e fazendeiro

    “Nós, índios Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue estamos sofrendo novamente ataques de pistoleiros privados que cercam dia e noite nosso povo. Além disso jogaram veneno na fonte de nossa água, no riacho, nossas crianças estão vomitando e doentes, estão morrendo novamente. Voltamos a viver exatamente como antes, o mesmo pesadelo, mas agora é pior. Antes podíamos correr em nosso território, agora estamos aprisionados aqui neste quadrado, neste cercado como bichos, de novo, de novo, até quando?”.   

    As linhas transcritas acima, advindas do desabafo emocionado de uma liderança jovem da terra indígena Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue, localizada junto ao município de Japorã, Mato Grosso do Sul, são didáticas e autoexplicativas para que se entenda a dor e o sofrimento destes indígenas ao longo de mais de doze anos. Doze anos aprisionados a um cerco permanente realizado intencionalmente pelos mesmos senhores que cometeram ou se beneficiaram do esbulho da terra ancestral deste povo.

    Desde 2003, quando por motivos de fome e miséria decidiram retomar o que é seu por direito, a sua terra tradicional, estes grupos familiares vem sofrendo ataques diretos de jagunços armados e uma sistemática negação de seus direitos mais básicos, ora pela mão dos fazendeiros e seus jagunços, ora pelas mãos do Estado e dos governos. O detalhe é que este território já é reconhecidamente uma terra indígena, assinalada pelos estudos da Fundação Nacional do Índio (Funai) em seus 41, 5 mil hectares. (Veja mais)

    Nos últimos 11 anos foram várias as tentativas de retomadas pela terra e pela vida de seus filhos, todas elas sobre o mesmo território tradicional e todas elas com desfechos trágicos recheadas de cenas de uma violência desmedida, em especial pelos despejos diretos e truculentos realizados por jagunços. Mais de uma centena de pessoas chegaram a ter de viver por quase três anos, em um espaço diminuto de menos de um hectare de terra junto as margem do rio Hovy, cujo nome em Guarani já evidencia a ligação deste povo com o território em questão. Tiros, assassinatos, estupros, ataques, falta total de alimento, contaminação, desespero e vidas desencaminhadas de baixo de lonas pretas foram cotidianamente tatuados como cicatrizes no coração de cada um destes indígenas ao longo deste árduo tempo.

    Em fevereiro do ano passado, em um grito de basta, cerca de 250 Guarani-Kaiowá retomaram parte de sua terra originária, alocando-se junto à sede de uma fazenda denominada de “Cambará”, uma das tantas que incide sobre o território de Pyelito Kue/Mbarakay. Na mesma tarde, em resposta, fazendeiros se aglomeraram mostrando grande poder de articulação. Era mais uma vez o sinal do reinicio de um quadro ininterrupto de violência. Desde então os indígenas passaram a conviver com o medo iminente da morte em meio a cercos pesados, ataques diretos e armados e o confinamento através da negação do direito de ir e vir. A articulação foi tamanha que até mesmo órgãos oficiais como a Funai e a Secretaria Especial da Saúde Indígena (Sesai) foram impossibilitadas de entregar alimentos e(ou) prestar atendimento à saúde para as famílias de Pyelito. (Veja aqui)  

    Atrelado ao agronegócio, o Governo Federal demonstrou total inércia em relação à garantia da demarcação de Pyelito Kue, negando o direito deste povo à continuidade dos procedimentos demarcatórios. Este foi certamente o gatilho mais feroz contra o povo Guarani-Kaiowá e que mais dinamizou a violência. A partir desta conjuntura visivelmente favorável os fazendeiros sentiram-se a vontade para dar sinal verde a seus pistoleiros e jagunços para atirarem a vontade em uma temporada de “caça aos índios”.

    Só a partir do ano passado, após a retomada foram registrados mais de 10 ataques intencionais. A negligência e a criminalização institucional por parte do Governo em relação à retomada de seu próprio território também foi duramente sentida pelos indígenas. Houve fome e as crianças foram as que mais sofreram, sendo que uma delas foi a óbito, com diagnóstico de desnutrição e ingestão de água contaminada. (Veja aqui)

    Contudo, em seu território retomado, os indígenas sentiam a possibilidade de resistir e esperar com um pouco mais esperança a finalização dos procedimentos demarcatórios (pelo menos mais do que já havia sentido até então). Tinham minimamente acesso ao mato e ao rio, fontes de alimento e saúde. Começavam orgulhosos seus plantios e projetos de sustentabilidade. Porém, o Poder Judiciário se apresentou decido a tomar parte nesta batalha inglória. Apesar da Terra Indígena de Pyelito de ter sido identificada como área tradicional dos Guarani-Kaiowá, a falácia do direito à propriedade bradou mais forte. Consequência: os indígenas sofreram os tão conhecidos procedimentos de reintegração de posse. A Saga de Pyelito se redesenhou e mais uma vez veio a iminência do despejo, se não pela bala, desta vez pelo papel.

    Frente à possibilidade de despejo, houve no dia 13 de novembro do ano passado, uma audiência de tentativa de conciliação entre indígenas e fazendeiros na 1º Vara da Justiça Federal, Sexta Subseção Judiciária do Mato Grosso do Sul.  Na contramão de garantir o direito do povo Guarani-Kaiowá em permanecer sobre seu território já identificado, foi proposto às famílias de Pyelito um Termo de Ajustamento de Conduta – TAC.

    Nos termos do TAC, os indígenas deveriam abandonar a área retomada, correspondente à sede da fazenda Cambará, sendo reservado a eles, dentro do seu próprio território, uma pequena área de 100 hectares, local em que deveriam permanecer até a finalização dos procedimentos de demarcação.

    Oficialmente, ao “proprietário” da Fazenda Cambará, coube no acordo a construção de duas cercas que dessem segurança de divisa da área ocupada pelos indígenas, a não oposição a construções e benfeitorias necessárias ao seu bem estar e ao desenvolvimento de suas práticas culturais como escolas, casa de reza, coleta de materiais e outros que objetivem o suprimento de necessidades básicas como luz e água. No conteúdo do TAC, mesmo que nas entrelinhas, fica evidenciada que a Justiça sabia dos episódios de violências praticadas contra a comunidade indígena, em especial referente ao episódio onde fazendeiros e seus jagunços impediram a Funai e a Sesai de executarem suas atividades de atendimento às famílias de Pyelito.  

    Atormentados pela violência e sem segurança alguma de poder contar com a justiça, a comunidade acabou por aceitar a proposta estabelecida no TAC, onde também estava prevista a garantia de algumas reivindicações como a manutenção de seu cemitério tradicional junto à área delimitada. As famílias desmontaram acampamento e foram se acomodar em seu novo pequeno cercado, sob a promessa de uma suposta segurança.

    “Falamos de muito mais coisas do que ficou escrito, coisas que a justiça não podia admitir e por isso não botou no papel” afirma uma liderança da comunidade que por motivos de segurança não deseja se identificar. “Eu estive na audiência, lá a juíza disse ao fazendeiro que ele não poderia contratar segurança privada, teria que demitir os seus capangas, não poderia ameaçar o índio, teria que respeitar nossa caminhada, nosso ir e vir, e que nossa segurança era o objetivo daquele acordo”, depõe firmemente a liderança.

    Porém nenhum dos termos do acordo foi cumprido por parte do fazendeiro em especial a parte informal e mais perigosa do acordo judicial, a que diz respeito a contratação de segurança privada e a política de terror praticada contra os indígenas. Nas palavras de “Avá Tupã”, líder da comunidade, o claro recado:

    “É como eu já disse, esta acontecendo tudo igual, na verdade é pior porque agora estamos cercados, é tudo que eles (proprietários) queriam. Eles (pistoleiros) vêm quando querem. A hora que querem, nos rondam e nos ameaçam, nos vigiam como os patrões deles vigiam o gado, ameaçaram meu tio a poucos dias, quando ele voltava do trabalho, no mesmo lugar que furaram a perna de um de nossos jovens com balas de borracha, quando bateram nele. O fazendeiro, o mesmo que fez acordo esta envenenando nosso rio, nem sequer as cercas foram feitas, as estradas que dão no tekoha estão tão destruídas que não podemos ter atendimento a saúde. O que adianta poder plantar aqui um tanto de mandioca se o que mais colhemos é medo, é para isto que serve o acordo com a justiça? Estamos pior, muito pior. (Veja aqui)

    A totalidade das famílias pertencentes à Terra Indígena de Pyelito Kue denuncia que os problemas recomeçaram quando o proprietário da fazenda Cambará passou a pulverizar- lançar veneno – na margem oposta do rio que faz divisa entre a área indígena e as fazendas. Os indígenas denunciam que o veneno atinge diretamente o rio. Com a chuva, o veneno chega a nascente, fonte de água das famílias Guarani-Kaiowá. O efeito é bem conhecido pelos grupos familiares de Pyelito. Voltaram a ocorrer inúmeros casos graves de diarreia e vômito, em especial entre as crianças e os mais velhos.

    Logo após, segundo os indígenas, recomeçaram os casos de violência pela coerção e ataques diretos a comunidade por seguranças privados. Genivaldo, Pajé (Nhanderu) da comunidade lamenta inconformado: “Nem o cemitério eles tem respeitado, pisam por ali, onde estão nossos Nanderu (rezadores tradicionais) enterrados, entram e ficam na espreita, ali no dia ou no escuro da noite, isso eu não quero aceitar, é muita dor para nós.”

    Para “Ava Tupã”, frente a este cenário o acordo esta desfeito:

    “Não existe acordo, para mim pelo próprio TAC está desfeito, foi tudo descumprido. Agora, neste momento, nossa vida está em maior risco do que antes. Nós respeitamos a Justiça, mas não há justiça! A justiça na prática nos deixou a mercê dos pistoleiros, qual a garantia ela nos dá para segurança de nosso povo? A palavra de alguém que roubou nossa terra? A garantia que estão apresentando? Na verdade todos sabem o que eles fazem com a gente, mas por que os fazendeiros têm dinheiro preferem criar outras soluções em troca de nosso direito. Estamos conversando com todos em Pyelito, nos perguntando para quem afinal serve este tal TAC. Estamos quase decididos, para mim já estamos decididos. Se o acordo está desfeito, e pelo fazendeiro está desfeito, não há mais razão para ficar aqui, iremos retornar e lutaremos ainda mais forte que antes, se a justiça não garantir na prática nossas vidas partiremos definitivamente para nossa retomada, nem que isso signifique a morte.”

    A pergunta que ecoa pelas rodas de conversa de Pyelito Kue é a mesma que continua sendo feita por muitos grupos familiares em diversas terras indígenas Guarani e Kaiowa espalhadas pelo Estado do MS. Para quem serve os TAC’s a respeito da ocupação das terras indígena? Para a segurança dos indígenas ou para o controle dos fazendeiros? Em casos similares, como nas terras indígenas de Kurusu Amba e Ypoi, os TAC’s que previram espaços para que os indígenas pudessem viver em paz tampouco conseguiram frear a violência dos fazendeiros. O sentimento dos indígenas é expresso pelas palavras de Ava Jeguaka Rendy Ju, de Kurusu Ambá: “os anos que vivemos com o TAC foram igualmente anos de sofrimento para nós. Enquanto vivemos espremidos, sem poder viver a cultura e o modo de ser do Kaiowá os fazendeiros usufruíram de nossas terras em nossa frente e nos atacaram quando quiseram, é isso que entendo destes TACs que nos dão migalhas de nossos territórios”.

    Tomando como base os relatos dos Guarani-Kaiowá, parece que o ajuste de conduta necessário em relação às ações de violência e a intolerância contra os povos indígenas têm sido confundidas, pelos órgãos de Justiça, com a conciliação entre a manutenção do esbulho em troca de uma relativa paz dos explorados. O problema é que em nenhum dos casos onde estes acordos foram firmados conseguiu-se impedir a violência dos fazendeiros. Todos sabem que a única ação que pode colocar um ponto final na violência física e cultural sofrida cotidianamente pelos povos indígenas é a demarcação de seus territórios originários. Os órgãos de justiça, portanto, ao demonstrarem sua preocupação  com a segurança e os direitos dos povos indígenas poderiam ser menos inventivos e simplesmente honrar com suas atribuições garantindo o cumprimento da lei magna a qual estão submetidos, a constituição federal de 1988.

     

    Para saber mais:

    https://cimi.org.br/site/pt-br/index.php?system=news&action=read&id=7280

    https://cimi.org.br/site/pt-br/index.php?system=news&action=read&id=6792

    https://cimi.org.br/site/pt-br/index.php?system=news&action=read&id=7438

    https://cimi.org.br/site/pt-br/index.php?system=news&action=read&id=7451

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  • 20/05/2015

    Parlamentares e ambientalistas criticam tratamento dado a indígenas pela Câmara

    Parlamentares, indígenas, ambientalistas e representantes do setor jurídico criticaram nesta terça-feira (19) a forma como a Câmara dos Deputados tem lidado com os direitos de indígenas, quilombolas e outros povos tradicionais. Para os participantes de uma reunião que discutiu a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/00, que transfere para o Congresso Nacional a decisão final sobre a demarcação de terras indígenas, o atual Parlamento pode levar a um retrocesso nos direitos garantidos na Constituição de 1988.

    "Há um risco real de a sociedade brasileira em meses assistir a uma derrocada dos seus direitos. A questão dos direitos territoriais indígenas está na ordem do dia", disse o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, deputado Paulo Pimenta (PT-RS). "Esta onda conservadora, que envolve não só o Parlamento, mas empresários e imprensa, hoje tem uma forte presença também no Poder Judiciário.".

    A subprocuradora-geral da República Deborah Duprat classificou como “hostil” o tratamento dado aos indígenas na Câmara e criticou o impedimento de eles participarem de debates. "Os indígenas são recebidos nesta Casa com tropa de choque, com um forte aparato policial, com revista de seus instrumentos ritualísticos. Não se permite o ingresso deles nas comissões onde se discutem projetos de lei ou PECs que dizem respeito diretamente a seus interesses. É uma Casa hostil a esse segmento da sociedade.".

    A líder indígena Sônia Guajajara também testemunhou que, “na hora em que vai entrar índio nesta Casa, já se forma um cordão de polícia ali na frente para barrar a nossa entrada”.

    Manifesto

    Nesta terça-feira, parlamentares, entidades da sociedade civil e órgãos públicos criaram um comitê de defesa dos povos indígenas e lançaram um manifesto contra a PEC 215/00, pedindo seu arquivamento. A promessa é aumentar o cerco à proposta, que tramita em uma comissão especial na Câmara. “Não temos maioria na comissão que analisa a PEC, mas temos a maioria da sociedade”, disse a deputada Erika Kokay (PT-DF), que presidiu reunião com entidades e representantes de povos indígenas.

    Segundo os participantes, a proposta fere direitos garantidos na Constituição e significa uma ameaça à sobrevivência de povos tradicionais e também ao equilíbrio do meio ambiente.

    "Esta Casa não tem competência técnica para a homologação. Esse assunto não deve estar sujeito à política", disse Erika Kokay. "Nós precisamos nos contrapor a esse fundamentalismo patrimonialista de que as terras têm que ter donos, rasgando a Constituição", completou.

    A secretária-geral da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Noemia Porto, explicou que deslocamentos de competência na Constituição só podem ocorrer quando visam a intensificar a defesa dos direitos fundamentais. “O que se observa em relação à PEC é que ela não congrega uma preocupação com a defesa efetiva dos povos indígenas. Há um discurso único, o discurso do mercado.”.

    "O nosso patrimônio histórico, social, cultural e ambiental não pode ter seu futuro decidido pela bancada ruralista", afirmou o representante da organização ambiental WWF Aldem Bourscheit.

    Também para Deborah Duprat, a configuração de direitos não pode ficar sujeita às "maiorias ocasionais do Parlamento". Daí a necessidade de garantir ao Executivo a demarcação de terras indígenas, unidades de conservação, áreas quilombolas e para a reforma agrária.

    Foto: Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados

     

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  • 20/05/2015

    O sangue dos agricultores do Xingu escorre das engrenagens do governo

    O atropelamento de três agricultores nessa segunda feira, 18, na Transamazônica, às portas das obras de Belo Monte, não foi uma fatalidade; foi uma tragédia anunciada. Denunciamos que a morte de Leidiane Drosdoski Machado, de 27 anos, e Daniel da Silva Vila Nova, 41 anos, moradores do Travessão do 27, mais do que culpa do assassino sobre rodas é responsabilidade do governo federal. As rodas da máquina desenvolvimentista do governo se impregnaram de sangue, literalmente.

    Desde o início das obras da hidrelétrica de Belo Monte, centenas de famílias de agricultores foram deixadas à margem de tudo. Das negociações, das certezas, das indenizações e do futuro. Também os moradores do Travessão do 27 e de Paquiçamba foram informados que não seriam considerados atingidos por Belo Monte. De repente, porém, são notificadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que terão de deixar as terras onde vivem e trabalham. Sem destinação. Sem reassentamento. Porque, segundo o Incra, “não há terras para colocar vocês”.

    O Xingu Vivo se solidariza e compartilha da profunda dor dos companheiros e familiares de Leidiane e Daniel, assassinados na Transamazônica, e do garoto de 13 anos que continua no hospital entre a vida e a morte. Não fosse o governo, não fosse a Norte Energia, não fosse Belo Monte, não fosse a total e profunda ausência de garantias de direitos, não fosse o desprezo tão absurdo pela vida humana, agricultores e agricultoras não teriam que tomar as estradas e gritar seus desesperos e demandas, para nunca mais voltarem para casa.

    Exigimos que o crime seja apurado e esclarecido, e o assassino ao volante do automóvel, levado à Justiça. Quanto aos demais responsáveis pelas mortes, nossos votos são que não sigam indefinidamente impunes.

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  • 19/05/2015

    Impactos negativos da PEC 215 são discutidos em Audiência Pública

    A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215 e os impactos negativos que ela vai representar na redução dos direitos indígenas foi o tema principal da Plenária que aconteceu na Câmara dos Deputados, na manhã de hoje (19). Organizada pelas Frentes Parlamentares em Apoio aos Povos Indígenas, em Defesa dos Direitos Humanos, e Ambientalista, a proposta foi debater as “Ameaças aos Direitos Fundamentais e PEC 215: Democracia, Povos Indígenas e Meio Ambiente”.

    Além da delegação de 53 indígenas representando mais de 20 áreas do Mato Grosso do Sul dos povos Terena, Guarani Kaiowá e kinikinao, que estão em Brasília para uma série de agendas com os Três Poderes, em luta pela defesa de seus direitos fundamentais, participaram audiência vários parlamentares aliados e organizações indígenas, indigenistas, ambientalistas, quilombolas, além de representação da OAB, AJD, ABA, MPF, dentre outras.

    A deputada Erika Kokay (PT/DF)) propôs o lançamento de um movimento a partir da criação de um documento transformado em petição pública e ampliar a discussão com a sociedade civil. Márcio Santilli, representando o Instituto Socioambiental (ISA), apresentou dados sobre a atual situação dos processos demarcatórios e ponderou que, com a PEC 215, abre-se uma porta para que o Legislativo passe por cima do Judiciário na questão das demarcações de terra.

    A deputada Janete Capibaribe (PSB/AP) enfatizou que a PEC 215 vai trazer a redução dos direitos indígenas. Ela citou o Relatório Figueiredo, que faz parte da Comissão da Verdade. O Relatório mostra o verdadeiro extermínio que foi realizado no período da ditadura militar em relação aos povos indígenas e a apropriação das terras ocupadas pelos mesmos, expulsando-os de suas terras originárias.

    Janete também citou os diversos mecanismos, além da PEC 215, como Projetos de Lei, que estão acontecendo simultaneamente e afirmou que essa ofensiva resulta da representação distorcida da sociedade no Congresso Nacional, determinada pelo poder econômico que financia as campanhas de quem se compromete em aprovar propostas que tornam a sociedade brasileira mais injusta e desigual. Ainda de acordo com ela, estudos apontam que os setores ligados ao agronegócio e grandes empresários ocupam a maioria das vagas, apesar de serem minoria populacional.

    Já o deputado Alessandro Molon (PT/RJ) reafirmou que a frente tem que servir não só para impedir o retrocesso, mas também para fazer uma articulação com a sociedade civil.

    Para o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, a PEC 215 é um dos mecanismos de ataque em curso no país contra o direito e a vida dos povos indígenas no Brasil. Ele enfatizou as decisões recentes da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) que anulam os efeitos do Artigo 231 da Constituição Federal através de uma reinterpretação fundamentalista e radicalmente restritiva relativamente ao conceito de terra tradicionalmente ocupada pelos povos. Essas decisões desfazem atos administrativos de demarcação de terras Guiraroká, do Povo Guarani Kaiowá, Limão Verde, do Povo Terena, ambos do Mato Grosso do Sul, e Porquinhos, do povo Canela-Apãniekra, do Maranhão.

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  • 19/05/2015

    Guarani-Kaiowá e Terena: lutar vale a pena

    Deixaram seus tekohá, aldeias e acampamentos no Mato Grosso do Sul e vieram a Brasília cobrar dos responsáveis pelos Três Poderes o respeito às suas vidas, seus territórios e todos os seus direitos. Assim como estiveram na Organização das Nações Unidas (ONU), há poucos dias, cobrando do Estado brasileiro a efetivação dos direitos constitucionais e internacionais, estão agora em Brasília, de cabeça erguida e com a força de seus guerreiros e líderes espirituais para reafirmar que jamais abdicarão de seus tekohá (territórios tradicionais), onde possam viver conforme sua cultura e seu teko (jeito de ser e viver).

    Estarão denunciando as violências e os crimes que estão sofrendo pelas mãos de pistoleiros, fazendeiros, usineiros usurpadores e invasores de suas terras. Estarão demonstrando sua indignação pelas balas que os pistoleiros os feriram no corpo e na alma, na total impunidade, omissão e conivência do Estado brasileiro.  Mais uma reintegração de posse ameaça e decreta a morte dos Guarani- Kaiowá do Apika’y.

    Estarão cobrando do governo a imediata retomada da regularização de todas as terras Guarani-Kaiowá, conforme o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado em 2007. Sete anos já se passaram e o ministro da Justiça ainda não assinou as portarias declaratórias das mais de 40 terras indígenas previstas no TAC.  Diante desse quadro desastroso, perguntam: quantas vidas e sangue derramado ainda serão necessários para cumprir a Constituição? Será que, na prática, os governantes e autoridades são adeptos da política de “índio bom é índio morto”?

    Do Ypo’y dirão, em alto e bom tom, que jamais sairão de seu tekohá. Perguntarão aos ministros do Supremo Tribunal Federal, as razões das decisões contra as terras indígenas de Guyraroká, Arroio Korá e Limão Verde, dentre outras.

    Estarão dando continuidade às lutas e mobilizações dos povos indígenas de todo o país, que avaliam estarem sendo submetidos às maiores injustiças e violências da história desse país. Estarão se unindo aos Tupinambá, da Bahia, aos Kaapor, do Maranhão, aos Munduruku, do Pará, aos povos atingidos pela hidrelétrica de Belo Monte, pela transposição do rio São Francisco e invadidas e impactadas por centenas de grandes projetos do modelo de desenvolvimento brasileiro.

    Estarão cobrando do Congresso Nacional o fim de todos os projetos que tentam suprimir os direitos indígenas, em especial a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 2015, os Projetos de Lei 1216 e 1016, e tantos outros decretos de morte aos povos nativos.

    Dirão à presidente Dilma que a total paralisação da regularização das terras indígenas é uma atitude que depõe frontalmente contra as propaladas afirmações de que somos um país que respeita os direitos humanos e étnicos de seus habitantes.  O Mato Grosso do Sul é o estado em que o número de suicídios entre o Guarani- Kaiowá é superior a 50 por ano. O mesmo acontece com os assassinatos. Mais da metade dos índios assassinados, por violências externas e internas, é de Guarani- Kaiowá. É o momento de união e solidariedade com esses povos.

    Será uma semana de muita reza, muita conversa e pressão, para cobrar seus direitos e não deixar rasgar a Constituição Federal.

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  • 18/05/2015

    Amazônia: velhos e novos instrumentos de saque

    No inicio da invasão europeia, os índios eram tolerados porque os portugueses e espanhóis necessitavam deles para localizar as riquezas de seu interesse e como mão-de-obra para explorá-las. Mas, na medida em que o invasor foi criando os seus próprios instrumentos para localização e exploração das mesmas, foi dispensando os donos da casa e ficou agressivo, criando leis e instrumentos de dominação. Dentre as leis, a injusta lei da propriedade privada da terra é simplesmente arrasadora para os povos indígenas. A brutalidade contra os povos indígenas vem crescendo desde o início da colonização até hoje. No início atingia as comunidades enquanto retirava principalmente os homens das aldeias para escravizá-los aos interesses de exploração das riquezas descobertas e nas fazendas. No período moderno, uma classe desses descendentes europeus procura simplesmente despojar os povos indígenas de seus territórios tirando-lhes todas as condições de sobrevivência cultural e física.

     

    Em meados do século XX, todos os rios já haviam sido explorados e foi preciso ir território adentro para descobrir e espoliar os últimos depósitos das riquezas amazônicas. Agora, os espoliadores já dispõe de todos os instrumentos, leis favoráveis, mapeamento das riquezas e maquinário para explorar o território, dispensando qualquer colaboração autóctone para transpor os obstáculos que se apresentam. Assim, todos os governos, ditatoriais e democráticos, começam a romper as florestas e o alto dos rios e igarapés como se fossem “vazios demográficos”. A entrega dos empreendimentos novos na Amazônia à empresas, ficções criadas pelo homem, e por isso sem consciência e sem responsabilidade, alivia, aparentemente, a ciência congênita ou consciência dos mandantes dos crimes atuais. E o almoxarifado da Amazônia começa a ser conhecido e saqueado em todas as suas dimensões: terra, rios, peixes, seixo, minerais, madeira, plantas medicinais, fontes energéticas. A gente que está aí “não existe mais”, e se existe não deveria existir, porque é apenas “estorvo do desenvolvimento”!

     

    A Zona Franca de Manaus, “vaca sagrada” dos governantes de hoje, foi um dos instrumentos modernos mais eficazes criados para desapropriar o povo amazônico. Em 1976 acompanhei o drama das populações indígena e seringueira do Acre quando a Ditadura Militar entregou os seringais à empresários sulistas, dispensando a mão-de-obra das famílias e comunidades ali existentes e pressionando-as a saírem sem rumo. Em longa caminhada entre o alto rio Purus e o Envira e na margem dos mesmos, encontrei famílias perplexas e sem destino. Tentei convencê-las sobre os seus direitos. No dia seguinte, o barquinho do “marreteiro” em que viajava foi cercado por jagunços dos novos donos do Seringal Califórnia, já transformado em fazenda. Armados ameaçavam com xingamentos e apelavam para as novas leis criadas através da SUDAM para o (des)envolvimento da Amazônia. Dias depois, quando numa favela de Feijó formada por famílias seringueiras já expulsas, contava das frutas que havia comido na minha passagem por seringais abandonados por eles, todos caíram em pranto. Um ano depois, subindo outro rio, o Juruá, me defrontei com dezenas de canoas com tolda improvisada, descendo o rio rumo Manaus. O refúgio final de toda esta gente foi a Zona Franca de Manaus.  Ali, já despejados de seus direitos, ficaram meros ”invasores”. 90% dos bairros de Manaus foram criados por famílias despejadas do território da Amazônia. Vi as barracas desses “invasores” formando bairros como Compensa, Alvorada, Flores, até os mais recentes.

     

    Muitos manauaras, descendentes dessas vítimas, que vivem hoje sobre o asfalto e o cimento e da “nova” educação imposta pelas autoridades, ainda não se deram conta a que serviu a Zona Franca, projeto espoliador dos direitos de seus pais e cremadora do seu futuro, achando que a sua expulsão do interior foi um benefício que as ditaduras lhes prestaram. Simultaneamente, com a Zona Franca, instalou-se por todo o território amazônico o agronegócio devastador da biodiversidade pela monocultura eurocêntrica e contaminadora do território mediante o uso de agrotóxicos.

     

    As hidrelétricas começaram a barrar os rios. A população remanescente, já exígua, se tornou impotente para resistir à esses “monumentos da insanidade humana”: Balbina, Belo Monte, Girau, Santo Antonio. E hoje já são poucas as comunidades que dão respaldo aos Munduruku em sua resistência contra os projetos hidrelétricos ameaçadores do mais belo sistema fluvial do mundo: o Tapajós.

     

    Mineradoras e garimpos ferem por toda a parte o ecossistema e agridem as leis do país, invadindo territórios indígenas e saqueando sem controle as riquezas minerais e ameaçando a gente que resiste em seus domínios. A propósito leia-se: “Mineração E Violações De Direitos: O Projeto Ferro Carajás S11D, DA VALE S.A. Relatório da Missão de Investigação e Incidência de Cristiane Faustino e Fabrina Furtado.” Nos apontem pelo menos um posto ou centro sério de controle mineral em toda a região amazônica?

     

    Hoje, a grande preocupação dos mandantes da Amazônia é a construção de mais e mais portos para acelerar o saque. Estive há poucas semanas em Santarém, hoje um dos alvos principais, e constatei in loco, a virulência dos saqueadores para acelerar a construção de portos para a exportação de commodities: madeira, soja, minérios. E eles vêm do mundo inteiro. A Cargill já controla o principal porto da cidade. Mas, o mais ousado projeto é dos chineses que pretendem construir em Santarém, além de um porto, uma estrada de ferro Santarém-São Paulo. Desde o Império praticamente não se construiu mais nenhuma estrada de ferro de interesse do povo brasileiro: para sua locomoção e para transporte de seus produtos. Mas quando se trata de saquear a Amazônia, há dinheiro para tudo. Está aí a estrada de ferro Carajás-São Luiz de propriedade da Vale do Rio Doce, ex-estatal, praticamente doada pelo Governo FHC a donos privados.

     

    Para incentivar este modelo de exportação de commodities, modernizam-se portos, constroem-se hidrelétricas e linhões que conduzem a energia rumo aos centros onde se articula a entrega da região ao poder multinacional. E toda essa modernização, apoiada pelas autoridades locais e distantes, só tem uma finalidade: agilizar o saque do almoxarifado Amazônia. Os interesses das grandes empresas vão prevalecendo com muito custo econômico para o país e sem os consequentes benefícios sociais. Todos estes empreendimentos são construídos sem consulta séria à população afetada, no caso, comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas e sem atender a proteção ambiental. Aos pobres atingidos por estes projetos, como ao povo do Antigo Testamento, em sua impotência, resta apenas pedir a maldição de Deus para as pessoas que comandam empresas iniquas e constroem obras da maldade.

     

    Segundo a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), responsável pela autorização da atividade portuária, “70% da movimentação de embarcações na Amazônia hoje é para o transporte de minério de ferro, seguido dos produtos metalúrgicos e da soja”.

     

    Em todo esse processo, de 1540 até hoje, uma coisa permanece constante: o perfil espoliador de todos os mandantes, dos colonos portugueses aos dirigentes atuais. Nada construíram realmente visando o povo local e regional. Suas cabeças continuam poluídas com o mesmo sentimento da Família Real Portuguesa: saquear, saquear, exportar e exportar. Veja a mais recente descoberta. O Governador do Amazonas José Melo descobriu que a água da Amazônia também pode servir como mercadoria de exportação. Enquanto isto, o seixo dos rios, necessário para a sobrevivência da vida subaquática foi espoliado para a construção dos arranha-céus da Zona Franca de Manaus. E a alimentação, fácil e sadia, das comunidades amazônicas vai desaparecendo. Nos últimos 40 anos o peixe diminuiu em tamanho e quantidade. Da mesma forma as florestas. As deliciosas frutas restantes na floresta devastada que antes alegravam grandes e pequenos e eram acessíveis, sem dinheiro, agora viraram mercadoria, sumindo paulatinamente da mesa do povo empobrecido da Amazônia. 

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  • 15/05/2015

    Plenária discute ameaças ao meio ambiente e aos direitos de povos indígenas e tradicionais

    Na próxima terça-feira (19), acontece na Câmara dos Deputados, em Brasília, a plenária Ameaças aos direitos fundamentais e PEC 215: democracia, povos indígenas e meio ambiente. O objetivo é discutir os ataques promovidos pelo Congresso contra os direitos fundamentais e humanos, em especial os direitos territoriais de povos indígenas e comunidades tradicionais e o direito de toda a sociedade brasileira ao meio ambiente. O evento ocorrerá no Plenário 14 do anexo II da Câmara, entre as 9h e 12h.

    A plenária será transmitida pelo Mídia Ninja e também conta com um evento no Facebook, onde está disponível sua carta-convite.

    Entre outros projetos, deve ser debatida a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/2000, de autoria da bancada ruralista, que pretende transferir do governo federal para o Congresso a atribuição de oficializar Terras Indígenas, Unidades de Conservação e territórios quilombolas. Na prática, se aprovada, a PEC paralisará de vez o processo de regularização dessas áreas protegidas fundamentais ao equilíbrio ecológico e climático, além de abri-las à implantação de grandes empreendimentos, como hidrelétricas, rodovias, mineração e agropecuária extensiva.

    A plenária é promovida pelas Frentes Parlamentares em Apoio aos Povos Indígenas, em Defesa dos Direitos Humanos e Minorias e Ambientalista. Também conta com o apoio de vários movimentos sociais e organizações da sociedade civil, entre outros, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a Coalisão Pró Unidades de Conservação, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o Instituto Socioambiental (ISA), e o WWF.

    Também participam da plenária a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Via Campesina, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (Fetraf), a Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas (Conaq), a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), entre outros.

    Leia aqui a carta-convite do evento

    Assessoria de imprensa

    Oswaldo Braga (ISA) – (61) 3035-5104 / oswaldo@socioambiental.org

    Mariane Andrade (Lid. PSOL) – (61) 8157-9979 / andrade.mariane@gmail.com

    Eliana Lucena (Frente Parl. Ambientalista) – (61) 9978-9815 / elianalucena_sf@hotmail.com

    Ana Paixão – (Frente Parl. Direitos Humanos) – (61) 3215-5203 / 9212-7593 / anapaixao09@gmail.com   

     

     

     

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  • 15/05/2015

    Mais um decreto de morte aos povos indígenas

    Mais um dia amanhece. Sobre a cabeça de quase um milhão de habitantes primeiros, nativos deste país Brasil, um novo decreto de morte.  Ou melhor, covardemente se formula um novo e desavergonhado projeto de lei – PL 1216/2015 para garantir uma cova única para todos os indígenas do país. É o equivalente ao que os Guarani-Kaiowá e outros povos disseram ao serem ameaçados de expulsão de seus territórios “ordenem a morte de todos. Cavem valas comuns e enterrem a todos nós”.

    Tudo de pior que já se formulou contra os povos indígenas está contido nestes 28 artigos e parágrafos deste PL. Infâmia, diriam os menos exaltados. Blasfêmia contra Deus e contra a vida, diriam os mais religiosos. Absurdo inominável, diriam os mais sensíveis às causas sociais. Decreto de morte, Y Juca Pirama, o índio, aquele que deve morrer, clamariam as hostes anti-indígenas em suas trincheiras de covardia.

    A simples formulação e apresentação deste projeto de lei envergonha o país e o parlamento, cujos membros deveriam representar os direitos do povo brasileiro, desde seus primeiros habitantes até o cidadão dos mais recônditos espaços do país.

    Como brasileiro nascido no Rio Grande do Sul, sinto-me vilipendiado por uma proposta dessa natureza. Jamais poderia imaginar que da terra de Sepé Tiaraju e milhares de mortos na resistência, pudessem surgir bombas tão mortíferas.

    Os decretos de morte não passarão, não irão se sobrepor às forças da vida de mais de 300 povos indígenas deste país. Que Tupã e todas as forças guerreiras, dos nhanderu, dos encantados e todos os que acreditam e lutam pela justiça, possam impedir mais essa investida contra os povos indígenas.

     

    Dourados, 15 de maio de 2015

    Egon Heck

    Cimi, Secretariado Nacional

    Foto: Laila Menezes / Criança Guarani-Kaiowá – Aldeia Cerro’í.

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  • 14/05/2015

    “Tudo o que os Tupinambá conseguiram foi pela ação direta”, conta a diretora do filme O Retorno da Terra Tupinambá

    Glicéria Jesus da Silva saiu da aldeia Serra do Padeiro, na Terra Indígena Tupinambá de Olivença, para ir ao Rio de Janeiro falar da luta de seu povo. Percorreu, de um canto ao outro, dezenas de quilômetros. Toda essa extensão era de domínio ou circulação Tupinambá quando a colonização teve início, há 515 anos. Desde então o povo passou a travar uma das mais emblemáticas lutas populares da Ameríndia contra o Estado colonial. Lá se vão cinco séculos. Glicéria falou aos cariocas sobre essa trajetória dos Tupinambá na reivindicação por um pedaço desse território tradicional, localizado nas serras e litoral do sul baiano, onde durante o século XX esses indígenas resistiram ao decreto de extinção do povo. 

    A Tupinambá falou, em essência, da vida de sua comunidade, talvez o tema central do documentário O Retorno da Terra Tupinambá (2015), realizado pela antropóloga Daniela Alarcon e pela cinegrafista e documentarista Fernanda Ligabue, que contou com o apoio da ONG Repórter Brasil e com recursos voluntários de mais de 500 doadores. As exibições do filme no Rio de Janeiro levaram Glicéria a debates e diálogos com grupos e organizações sociais e de classe. Daniela estuda os Tupinambá desde 2010. Ou melhor, aprende com os Tupinambá, que há 11 anos aguardam a demarcação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença. Não de braços cruzados.

    Assista e baixe o filme: O Retorno da Terra Tupinambá

    Daniela concluiu sua dissertação de mestrado trabalhando as retomadas de terras tradicionais desse povo. O foco espraiou-se na aldeia Serra do Padeiro, comunidade de Glicéria e de seu irmão, cacique Babau Tupinambá. A pesquisa investigou o passado, revelando violências estatais e de fazendeiros – sofridas pelo povo até os dias de hoje. Há pouco mais de um ano, em 2014, o Exército chegou a ocupar militarmente a terra indígena. No dia 1º de maio deste ano, Adenilson da Silva Nascimento, Agente Indígena de Saúde, foi assassinado depois de sofrer uma emboscada ao lado da esposa, baleada na perna. Dias depois, casas de uma aldeia foram queimadas, indígenas atacados e plantações destruídas. “Passei a acompanhar o contexto dramático e conflituoso dos Tupinambá e como isso repercute na sociedade. Temos uma imprensa que presta um desserviço com a cobertura preconceituosa, baseada na difamação, que costuma fazer. Então o documentário buscar difundir o que de fato acontece por lá”, conta Daniela.

    O documentário busca protagonizar os próprios Tupinambá, e são eles que contam a história. Porém, a produção reflete uma angústia de Daniela: todo o material levantado em seu estudo para o mestrado, absolutamente revelador, poderia ficar com o acesso restrito ao ambiente acadêmico. O filme seria uma forma de atingir mais públicos, colaborando com os movimentos de pressão dos Tupinambá pela garantia de direitos territoriais. “O que impede o reconhecimento dos direitos territoriais aos Tupinambá é a omissão do Estado brasileiro, que não cumpre suas atribuições constitucionais. Cabe ao ministro da Justiça (José Eduardo Cardozo) assinar a Portaria Declaratória e ele, sem justificativa nenhuma, não assina”, diz.  

    A negação desses direitos causa insegurança jurídica e os Tupinambá sentem na pele a violência que preenche os espaços vazios deixados pelo Estado. Conforme defende a pesquisadora, bem como os movimentos indígena e indigenista, demarcar o território garantiria o pagamento das benfeitorias de ocupantes não indígenas, o reassentamento dos pequenos e o arrefecimento de um conflito alimentado pelas incertezas de um procedimento exaustivamente detalhado pela Constituição, legislações e decretos.   

    Por outro lado, o racismo é bastante acentuado nos municípios em que incide a TI Tupinambá de Olivença. A campanha contrária a presença dos indígenas, que os taxam de “bandidos”, “enganadores”, “caboclos fantasiados de índios”, tem como principal vetor a mídia regional e nacional hegemônicas.  O Jornal da Band, por exemplo, veiculou em rede nacional reportagens sobre o caso Tupinambá, durante o ano passado, com “imagens estereotipadas, erros factuais e declarações racistas, ao que os indígenas responderam propondo uma ação na Justiça e que segue em trâmite”, declarou Daniela em entrevista ao Le Monde Diplomatique durante a captação de recursos para o documentário.

    O filme já teve sessões no Rio de Janeiro, Brasília, Altamira (PA), São Paulo e na Bahia. Será exibido na França e na Inglaterra. Exibições por todo o Brasil estão em fase de organização. “Quem quiser pode usar o filme. Quem tiver o interesse de fazer um debate, chamar os Tupinambá, Fernanda e eu, é muito bom, mas a ideia é que o filme circule livremente. Nos sindicatos, nas universidades, demais povos indígenas. A utilização para sessões é livre e é isso que queremos”, alerta Daniela, que falou com o Cimi por telefone, a caminho da França.

    Leia os principais trechos da entrevista:

    Como os Tupinambá seguem adiante sem o governo federal cumprir com suas responsabilidades de demarcação do território?

    Tudo o que os Tupinambá conseguiram de direitos foi pela ação direta. Não apenas o território, mas educação, saúde, alimentação. Tudo por conta deles. Retomam as terras tradicionais reivindicadas para isso. Na escola da Serra do Padeiro, estudam mais de 600 crianças e uma boa parte são os filhos de pequenos agricultores não-indígenas. A relação conflituosa existe porque o Estado se omite, não cumpre seu dever.

    Mas essas conquistas autônomas só acontecem quando os Tupinambá se colocam enfaticamente como movimento político, que reivindica direitos constitucionais, os garantidos nos tratados internacionais os quais o Brasil é signatário. O importante de ressaltar, contrariando quem acha que os Tupinambá são bandidos, as retomadas garantem que os Tupinambá saiam da pobreza extrema, da fome, da exploração pelo trabalho, inclusive com situações análogas à escravidão. Tudo isso se deu por conta dessa decisão.

    E essa decisão, que está no âmbito do direito de resistência, trouxe que tipo de consequência?

    A decisão de retomar é uma decisão de embate e trouxe respostas criminosas contra os Tupinambá. São 40 casos de casas indígenas incendiadas. Não existem dados sistematizados, mas são dezenas de indígenas assassinados. A violência da pistolagem, das agressões covardes, dos atentados parte de sujeitos contrários às demarcações. E além disso tem a violência do Estado, com ações repressivas, base do Exército montada dentro da terra indígena, torturas por parte de agentes do Estado, encarceramentos. Os Tupinambá estão hoje sujeitos a violências de todos os lados. Estão de peito aberto no processo de retomada. Na verdade, eles se sentem bem resguardados pela força dos Encantados.

    Mesmo com essa violência, os Tupinambá estão sempre cheios de energia, sorridentes, empolgados. Como você entende essa reação?

    O processo de retomada da terra enche eles de esperança, porque eles enxergam mudanças positivas na vida da comunidade, e que também podem mudar a vida. A gente se entusiasma também. Cinco mil pessoas engajadas num processo de retomada não é pouca coisa. Recolhi narrativas de parentes que estão podendo viver juntos na mesma terra. Isso é muito comovente. Sofreram uma separação forçada e se reuniram novamente. Então os Tupinambá veem o resultado da luta. Várias nascentes que estavam secando e estão novamente brotando água, animais reaparecendo e, acima de tudo, o retorno dos Encantados ao território. Para eles isso é essencial e alimenta a luta, esse espírito guerreiro.  

    Teu filme pode cumprir que papel em interface com a luta Tupinambá?

    Eu acho que o filme pode fazer com que mais pessoas cheguem na temática indígena, da temática indígena no Nordeste, possam começar a olhar com outros olhos não só para os Tupinambá, mas sobre a questão indígena como um todo. Pode fazer com que a problemática desses povos ganhe visibilidade maior e que a sociedade civil faça mais pressão, não só os indígenas. O Estado se alinhou ao agronegócio e se a gente não conseguir outros setores de apoio, acho que é bastante desigual a correlação de forças. O filme pode trazer mais elementos para se sensibilizar em prol esse processo. As pessoas não podem ser facilmente convencidas pela manipulação da mídia hegemônica. É preciso mostrar que os problemas enfrentados pelos povos indígenas têm impacto direto na vida do país, tem relação com as pessoas que não são indígenas.  

    Quanto a isso tem uma dimensão de que a luta Tupinambá, e de vários povos indígenas dialoga com as lutas de diversas comunidades e populações urbanas. Os problemas se relacionam. No RJ vemos isso bem. Quais são os pontos de intersecção? 

    Se a gente pega o RJ, temos uma série de conflitos territoriais. Morros, favelas, periferias, baixadas. A presença do Estado é ineficiente e repressora. Os Tupinambá passaram por várias ocupações militares, do Exército, da Polícia Federal. As unidades de Polícia Pacificadora (UPP) são os militares instalados dentro de territórios de resistência. Aconteceu na Serra do Padeiro, acontece nas favelas do RJ. Por outro lado, há ainda uma série de conflitos ambientais. Tivemos assassinatos de pescadores na Baía de Guanabara. Toda a visão do território como recurso econômico, como fonte de usurpação.

    Eu acredito que os Tupinambá, com a força da luta, enfrentando grandes adversidades, podem passar uma mensagem de que só com o enfrentamento, a ação direta, é possível de se garantir direitos. A partir de movimentos organizados num cenário adverso.

    No RJ a Glicéria (Tupinambá, da aldeia Serra do Padeiro) fez algo incrível. Lideranças comunitárias e sociais que chegaram sem perspectiva ao debate, saíram renovadas, com uma nova centelha em chamas. O que Glicéria contou é forte e ela estar viva para contar, os Tupinambá conseguindo avançar, mesmo com toda a violência, é muito estimulante. Impressionante como um grupo que não se deixou cooptar, não se vendeu, não recuou pode servir de exemplo, de estímulo, de esperança. As pessoas se conectaram.

     

    Cronologia atualizada das violências sofridas pelo povo Tupinambá

    A seguir, uma lista cronológica e atualizada das violências sofridas pelos Tupinambá nos últimos sete anos – tanto por parte do Estado quanto por agentes privados:

    17 de abril de 2008

    Primeira prisão do cacique Babau, acusado de liderar manifestação da comunidade contra o desvio de verbas federais destinadas a saúde. O cacique estava em Salvador no momento dos fatos.

    23 de outubro de 2008

    Ataque da PF na aldeia da Serra do Padeiro, com mais de 130 agentes, 2 helicópteros e 30 viaturas – para cumprimento de mandados judiciais suspensos no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região e contra orientação do Ministério da Justiça, resultando em 22 indígenas feridos a bala de borracha e intoxicação por bombas a gás, destruição de casas, veículos comunitários, alimentos e equipamento escolar.

    27 de maio de 2009

    Prisão preventiva do irmão do cacique Babau, por dirigir carro da Funasa carregando mantimentos. O Desembargador Cândido Ribeiro, do TRF da 1ª Região, não encontrou justificativa na ordem de prisão, da Justiça Federal de Ilhéus.

    2 de junho de 2009

    Cinco pessoas foram capturados e torturadas por agentes da PF – spray de pimenta, socos, chutes, tapas, xingamentos e choque elétrico. Os laudos do IML/DF comprovaram a tortura, mas o inquérito concluiu o contrário.

    10 de março de 2010

    Cacique Babau é preso, durante a madrugada, em invasão da PF em sua casa, embora a versão dos agentes – comprovadamente falsa – informe que a prisão teria acontecido no horário permitido pela lei.

    20 de março de 2010

    Prisão do irmão do cacique Babau, por agentes da PF em plena via pública, enquanto levava um veículo de uso comunitário da aldeia para reparo.

    16 de abril de 2010

    Babau e seu irmão são transferidos para a penitenciária de segurança máxima em Mossoró (RN), por receio da PF de ver manifestações diante de sua carceragem em Salvador pela passagem do “Dia do Índio”, em desrespeito ao Estatuto do Índio.

    3 de junho de 2010

    A irmã de Babau e seu bebê de dois meses são presos na pista do aeroporto de Ilhéus pela PF, ao voltar de audiência com o presidente Lula, na Comissão Nacional de Política Indigenista, por decisão do juiz da comarca de Buerarema. Permanecem presos em Jequié por dois meses, até o próprio juiz resolver revogar a ordem de prisão.

    5 de abril de 2011

    Estanislau Luiz Cunha e Nerivaldo Nascimento Silva foram presos numa situação de “flagrante preparado” – prática considerada ilegal– num areal explorado por empresas, de dentro da Terra Indígena Tupinambá. Acusados baseados em meros indícios dos crimes de “extorsão” pela PF, Estanislau – que toma remédios controlados – e Nerivaldo – que teve a perna direita amputada, após baleado por agente da PF – respondem ainda por “tentativa de homicídio” contra policiais federais. Coincidentemente, a ação foi feita na véspera da chegada do secretário de Justiça do estado da Bahia, à região. Após dois meses e meio presos, o TRF da 1ª Região lhes concedeu a liberdade por 3 x 0 em julgamento de habeas corpus, em 20 de junho.

    3 de fevereiro de 2011

    Prisão da Cacique Maria Valdelice, após depor na Delegacia da Polícia Federal em Ilhéus, em cumprimento ao Mandado de Prisão expedido pelo Juiz Federal Pedro Alberto Calmon Holliday, acusada de “esbulho possessório”, “formação de quadrilha ou bando” e “exercício arbitrário das próprias razões”. A cacique foi libertada no final do mês de junho, após cumprir quatro meses em prisão domiciliar.

    14 de abril de 2011

    Por volta das 5h da manhã, fortemente armados e com mandado de busca e apreensão, vários agentes da PF vasculham a residência da cacique Valdelice, assustando toda a família – principalmente os muitos netos da cacique. Em Salvador, chegava para reuniões com autoridades locais a “Comissão Tupinambá” do CDDPH.

    15 de abril de 2011

    Fortemente armada, a PF acompanha oficiais de justiça em cumprimento de mandado de reintegração de posse. Indígenas e Funai não haviam sido previamente intimados do ato, que foi presenciado pelos membros do CDDPH, que testemunharam o despreparo de agentes e a presença de supostos fazendeiros que incitavam as autoridades contra os indígenas.

    28 de abril de 2011

    A Polícia Federal instaura o inquérito, intimando o procurador federal da AGU e os servidores da Funai a prestar depoimento sobre denúncia de “coação” contra a empresária Linda Souza, responsável pela exploração de um areal, situado na terra Tupinambá.

    29 de abril de 2011

    Prisão do cacique Gildo Amaral, Mauricio Souza Borges e Rubenildo Santos Souza, três dias antes da delegação composta por deputados federais da CDHM e membros do CDDPH/SDH visitarem novamente os povos indígenas da região por causa das violências que continuam a ser denunciadas.

    5 de julho de 2011

    Cinco Tupinambá são presos pela PF sob as acusações de “obstrução da justiça” e “exercício arbitrário das próprias razões”, “formação de quadrilha” e “esbulho possessório”.

     

    18 de outubro de 2012

    No Fórum de Itabuna (BA), cinco Tupinambá, vítimas de tortura cometidas por policias federais, prestaram depoimento ao juiz Federal em parte do procedimento da Ação Civil Pública por Dano Moral Coletivo e Individual movida pelo Ministério Público Federal (MPF) da Bahia contra a União. Os procuradores abriram inquérito também para apurar os responsáveis pela tortura, atestada e comprovada por laudos do Instituto Médico Legal (IML). 

    14 de agosto de 2013

    Estudantes da Escola Estadual Indígena Tupinambá da Serra do Padeiro foram vítimas de emboscada na estrada que liga Buerarema a Vila Brasil. O atentado ocorreu quando o caminhão (foto acima) que transportava os alunos do turno da noite para as suas localidades foi surpreendido por diversos tiros oriundos de um homem que se encontrava em cima de um barranco. Os tiros foram direcionados para a cabine do veículo, numa clara tentativa de atingir o motorista, que com certeza o atirador achava ser Gil, irmão do cacique Babau, pois o carro é de sua propriedade. Quem conduzia o carro era Luciano Tupinambá.

    26 de agosto de 2013

    No município de Buerarema, contíguo ao território tradicional Tupinambá, atos violentos promovidos por grupos ligados aos invasores da terra indígena. Indígenas foram roubados enquanto se dirigiam à feira e 28 casas foram queimadas até o início de 2014. O atendimento à saúde indígena foi suspenso e um carro da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) foi queimado.

    8 de novembro de 2013

    Aurino Santos Calazans, 31 anos, Agenor de Souza Júnior, 30 anos, e Ademilson Vieira dos Santos, 36 anos, foram executados em emboscada quando regressavam da comunidade Cajueiro, por volta das 18 horas, na porção sul do território Tupinambá, quando foram emboscados por seis homens. Disparos de arma de fogo foram feitos contra os indígenas. Na sequência os assassinos praticaram torturas, dilaceraram os corpos com facões e com o que é chamado na região de “chicote de rabo de arraia”. Procuradores federais apontam assassinatos como parte do conflito pela terra.

    28 de janeiro de 2014

    Após realizar a reintegração de posse de duas fazendas localizadas na Serra do Padeiro, no município de Ilhéus, na Bahia, policiais federais e da Força Nacional montaram uma base policial na sede da fazenda Sempre Viva. Ataques com granadas contra os Tupinambá refugiados na mata.

    2 de fevereiro de 2014

    Durante invasão da Polícia Federal em aldeia Tupinambá da Serra do Padeiro, M.S.M, de 2 anos, em fuga para a mata, se desgarrou dos pais e acabou nas mãos dos policiais. O delegado Severino Moreira da Silva, depois da criança ter sido levada para Ilhéus pelos federais, a encaminhou para o Conselho Tutelar que, por sua vez, transferiu o menor para uma creche, onde ele segue longe dos pais e isolado por determinação da Vara da Infância e Juventude.

    24 de abril de 2014

    O cacique Babau Tupinambá é preso em Brasília pela Polícia Federal, logo após participar de sessão na Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal. Depois de tentar viajar ao Vaticano para encontro com o papa Francisco, convidado pela CNBB, o passaporte de Babau foi suspenso pela Polícia Federal, menos de 24 horas depois de emitido, por quatro mandados de prisão: três arquivados em 2010 e outro da Justiça Estadual de Una acusando-o de participação no assassinato de um pequeno agricultor. Esta última acusação foi desmontada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).   

    Entre o assassinato do pequeno agricultor, no dia 10 de fevereiro de 2014, e o mandado de prisão, no dia 20 do mesmo mês, se passaram dez dias. O inquérito policial que baseou a decisão da Justiça foi realizado em tempo recorde e sem efetivo policial suficiente, conforme declarou, de forma estranha, o próprio juiz de Una em sua decisão pela prisão. Também, foram ouvidas testemunhas denunciadas pelo próprio cacique e investigadas pela Funai como não-indígenas, que se passaram por Tupinambá para acessar benefícios. As próprias testemunhas confessam no inquérito que efetuaram a prática ilegal.

    1º de maio de 2015

    Adenilson da Silva Nascimento voltava de uma pescaria com a esposa, o filho de um ano e outra filha de 15, quando foram emboscados por três pistoleiros armados, encapuzados. Ele morreu na hora e sua esposa, Zenaildes, foi gravemente ferida, baleada na perna e nas costas.

    7 de maio de 2015

    Casas e plantações da aldeia Patiburi foram incendiadas, Terra Indígena Belmonte. Conforme a cacique Kátia Tupinambá, os ataques se intensificaram no final de 2013, quando foi publicado os Estudos de Identificação e Delimitação Territorial (RCID) realizados pela Funai e publicado no Diário Oficial da União e Estado, o qual comprovou a presença dos indígenas Tupinambá na região.

     

    Tupinambá de Belmonte tem uma área de 9.521 hectares, composta por 41 famílias e população superior a 200 indígenas. Em 2006, as famílias foram expulsas da área pela Policia Federal, no cumprimento de um mandado de reintegração de posse. Eles tiveram que abandonar as criações e as roças, e suas casas foram todas destruídas. Pouco tempo depois voltaram à área com Mandado Liminar de Manutenção de Posse em favor da comunidade Tupinambá.

  • 14/05/2015

    Demissão de indígena desarticula controle social da saúde no sudoeste do Amazonas

    Funcionária da Casa de Saúde Indígena (Casai) do município de Eirunepé, localizado no sudoeste do Amazonas, a cerca de 1,1 mil quilômetros de Manaus, a indígena Kanamari, Erondina Araújo da Silva, encaminhou denúncia ao Ministério Público Federal (MPF) de uma possível manobra fraudulenta da gestão local da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), para demiti-la.

    Ela enviou documento relatando os fatos ocorridos na Casai – onde exerce a função de intérprete desde 2004, a vários órgãos e registrou boletim de ocorrência na delegacia de Eirunepé no dia 28 de abril alertando sobre possível fraude para afastá-la da função e prejudicar sua atuação como Conselheira Distrital de Saúde, portanto, integrante do controle social das ações de saúde.

    De acordo com Erondina, em março deste ano, o chefe da Casai, Deuzimar Belarmino dos Reis, decidiu demiti-la e, sem nenhuma justificativa plausível, teria forjado documento com assinatura de indígenas das aldeias do rio Eiru. As assinaturas teriam sido coletadas, ainda de acordo com a denunciante, por Mário Oma Kulina, coordenador da educação indígena da Secretaria Municipal de Educação de Eirunepé e também presidente do Conselho Local de Saúde Indígena.

    Mário teria obtido as assinaturas e impressões digitais junto a indígenas que não falam português, informando-os que se tratava de um abaixo-assinado pela construção de escolas nas aldeias.  

    Para o coordenador da União dos Povos Indígenas do Médio Solimões e Afluentes (Unip/MAS), Mariano Cruz Kambeba, o ato do coordenador da Casai de Eirunepé pode ter sido orientado pela direção do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) daquela região. Mariano afirma que todos os servidores que representam obstáculo para a ação dos gestores da saúde indígena têm sido demitidos.

    “A Dona Erondina foi indicada pelos indígenas para ser conselheira Distrital de Saúde e tem atuado com firmeza em favor das comunidades”, disse Mariano Kambeba. Ele informou que a organização indígena apoiará as denúncias de Erondina junto ao MPF.

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