• 18/08/2016

    Conselho Terena se prepara para a 9ª Grande Assembleia do povo

    O Conselho do Povo Terena, organização tradicional de Mato Grosso do Sul, formado por caciques e lideranças de retomada, se prepara para a 9ª edição da Grande Assembleia Terena, que acontecerá nos dias 15 a 18 de novembro de 2016, na Aldeia Bananal, Terra Indígena Taunay-Ipegue, Mato Grosso do Sul.

    Tendo como objetivo geral congregar os caciques, lideranças de retomadas, rezadores, mulheres e a juventude indígena em torno da luta pelo território tradicional, a assembleia irá pautar temas como a educação escolar indígena, sustentabilidade e meio ambiente, saúde nas comunidades e políticas públicas em geral que são afetas as comunidades indígenas.

    Durante a Assembleia Terena acontecerá o “II Encontro de pesquisadores indígenas com suas lideranças” destinado ao estudante, pesquisador e profissional indígena que deseja apresentar para as lideranças sua pesquisa e trabalhos realizados na universidade. De igual modo, o espaço está aberto a pesquisador não-indígena que desejar apresentar trabalho desenvolvido junto à comunidade indígena.

    O Conselho do Povo Terena é organização tradicional indígena formado por lideranças indígenas que nos últimos anos fizeram o enfrentamento na luta pela demarcação de terras indígenas. Além das grandes assembleias, o Conselho Terena tem atuado na defesa judicial dos direitos dos povos indígenas.

    O Conselho do Povo Terena integra a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB e tem assento na Organização das Nações Unidas – ONU.

    Confira programação:

    Programação

    Dia 15/11 – Terça-feira

    17:00 hs – Chegada das lideranças

    18:00 hs – Janta

    19:00 hs – Abertura com a mesa dos Caciques e Lideranças indígenas
    Apresentação de rezas e danças tradicional Terena, Guarani Kaiowá, Kinikinau e Kadiwéu  

    Dia 16/11 – Quarta-feira

    8:00 – 11:30 Mesa 1: Territórios Tradicionais
    Mesa com as lideranças e representantes da FUNAI, APIB, Ministério Público Federal, Defensoria Pública da União, Advocacia Geral da União, Procuradoria Especializada da Funai, Ministério da Justiça e Conselho Indigenista Missionário).

    13:30 – 17:30 Mesa 2: Sustentabilidade e Meio Ambiente
    Mesa destinada a debater a sustentabilidade nas comunidades indígenas e a proteção ao meio ambiente

    20 hs – II Encontro de pesquisadores indígenas com suas lideranças
    Este encontro destina-se ao estudante, pesquisador e profissional indígena que deseja apresentar para as lideranças sua pesquisa e trabalhos realizados na universidade. De igual modo, o espaço está aberto a pesquisador não indígena que desejar apresentar trabalho desenvolvido junto à comunidade indígena.

    Dia 17/11 – Quinta-feira

    8:00 – 11:30 Mesa 3: Educação escolar indígena
    Mesa das lideranças com os professores, acadêmicos e pesquisadores indígenas

    13:30 – 17:30 Mesa 4: Saúde Indígena em Mato Grosso do Sul
    Mesa das lideranças com representante da SESAI, CONDISI, conselhos locais de saúde e profissionais da área da saúde.

    Dia 18/11 – Sexta-feira

    8:00 – 11:30 Mesa 5: Informes da CNPI e Encaminhamentos 

    Documento Final e encaminhamentos
    Encerramento

    Encontro de Pesquisadores Indígenas com suas Lideranças

    Será realizado no dia 16 de novembro de 2016, dentro da 9º Assembleia do Povo Terena, na Aldeia Bananal – Terra Indígena Taunay-Ipegue, Mato Grosso do Sul.

    O espaço está aberto a todo estudante, pesquisador e profissional indígena que deseja apresentar para as lideranças sua pesquisa e trabalhos realizados na universidade. O espaço está aberto também para pesquisador não indígena que desejar apresentar trabalho desenvolvido junto a comunidade indígena.

    A apresentação oral terá duração de 10 minutos e poderá ser feita em formato de banner ou slides. Os trabalhos recebidos serão avaliados por uma comissão de pesquisadores indígenas e organizados por temáticas, a saber: Movimento Indígena e Território; Educação e Antropologia; Saúde e Alimentos; Sustentabilidade e Meio Ambiente. Aqueles que desejarem poderão ainda apresentar relatos de experiência.

    Os trabalhos deverão ser enviados em documento Word e poderão ser em forma de texto completo ou resumo expandidos.

    Prazo de envio: dia 11 de novembro de 2016. 

    Endereço para envio: conselhoterena@gmail.com

    Obs.: Para as lideranças que não tem acesso a internet, bastará apenas a manifestação oral e a qualquer tempo para ter direito de apresentar seu trabalho ou relato de experiência.

    Informações:
    Email: conselhoterena@gmail.com

    Realização:
    Conselho do Povo Terena

    Apoio:
    Aty Guasu Guarani Kaiowá
    Fundação Nacional do Índio – FUNAI
    Ministério Público Federal – MPF
    Conselho Indigenista Missionário – CIMI

    Read More
  • 18/08/2016

    “Com lei, sem a lei, apesar da lei e contra a lei, os povos indígenas sempre estarão na luta”

    “O encontro reforçou aquilo que demais precioso os povos indígenas possuem: seus jovens, que continuarão a luta dos mais velhos pela Terra Sem Males. Também foi um momento de intercâmbio: se nas décadas de 70 e 80 ocorriam as Assembleias Indígenas, onde os povos se conheciam e trocavam experiências, hoje a juventude faz algo semelhante”.

    As palavras de Ângelo Bueno, missionário do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), resumem o Encontro da Juventude Indígena do Acre, Amazonas, Rondônia, Roraima, Pará e Amapá ocorrido entre os dias 11 e 14 de agosto, em Manaus (AM). Às voltas com problemas dos mais variados na Amazônia, os jovens se debruçaram sobre discussões envolvendo “grandes projetos de morte”, caso do REDD, mega empreendimentos, grilagem de terras, invasão madeireira nos territórios, agronegócio e a exploração petrolífera.

    "Projetos estes que afetam diretamente o modo de vida de nossos povos, violando nossos direitos, através das criações das PEC 215/00, PEC 409/01, PEC 2540/06, PL 1610/96, PL 4059/12, PL 490/07, PL 2057/91, PL 4750/12 e o Marco Temporal que vem nos atacando nesses últimos tempos”, diz trecho da Carta Aberta do encontro. Outra ponto discutidos pelos jovens é a afirmação dos costumes e crenças diante do Estado e da sociedade que a todo momento os interpela negando a eles tais direitos. 

    "Atualmente estamos sofrendo violências e violações de nossos direitos constitucionais.  Buscamos justiça pela vida, fortalecendo nossos costumes, crenças e tradições protegendo nossas terras e territórios”, diz outro trecho da Carta, que pode ser lida na íntegra abaixo:

      

    CARTA ABERTA DOS JOVENS INDÍGENAS DA AMAZÔNIA

    “Com lei, sem a lei, apesar da lei e contra a lei, os povos indígenas sempre estarão na luta” (Povos Indígenas do Norte).

    Nós juventude indígena Macuxi, Puruborá, Tembé, Karajá, Kayapó, Jaminawá, Mayoruna, Mura, Dessana, Galibi Marworno, Deni, Kaxinawa, Arapiun, Munduruku, Wapichana, Arara e Maraguá, dos estados do Acre, Amazonas, Rondônia, Roraima, Pará e Amapá, nos reunimos entre os dias 11 a 14 de agosto de 2016, no Centro de Formação Xare, Manaus – AM, no Encontro da Juventude Indígena com a presença dos parceiros do Conselho Indigenista Missionário – CIMI, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB e da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira – UMIAB, com objetivo de compartilhar experiências, vivências nas nossas aldeias e socializar nossas lutas.

    Nós juventude indígenas trouxemos nossas realidades e desafios vivenciados em nossos territórios que não são poucos, que às vezes nos desanimam, mas que pelo contrario nos fortalece para defender os nossos Direitos originários  garantidos pela Constituição Federal de 1988.

    A Amazônia, atualmente é palco de grandes projetos de morte como: REDD, Mineração, Hidrelétricas, Agronegócio, Madeireiros, Petroleiros, Grileiros, projetos estes que afetam diretamente o modo de vida de nossos povos, violando nossos direitos, através das criações das PEC 215/00, PEC 409/01, PEC 2540/06, PL 1610/96, PL 4059/12, PL 490/07, PL 2057/91, PL 4750/12 e o Marco Temporal que vem nos atacando nesses últimos tempos.

    Nós jovens indígenas de diferentes povos da Amazônia Brasileira, fortalecidos pela nossa união, por meio do intercâmbio de saberes tradicionais  entre os diferentes povos, principalmente com os mais velhos, estamos aqui reafirmando nosso compromisso e responsabilidade de dar continuidade as nossas lutas no que se refere a questão Territorial, Educação e Saúde, já iniciadas por nossos antepassados.

    Atualmente estamos sofrendo violências e violações de nossos direitos constitucionais.  Buscamos justiça pela vida, fortalecendo nossos costumes, crenças e tradições protegendo nossas terras e territórios. Não queremos a criminalização das nossas Lideranças, a exploração de nossas terras, rios, florestas e lagos, denunciamos o massacre dos nossos povos, e a postura colonialista do governo e do Estado.

    Assim gritamos juntos: “Estamos aqui, estamos vivos, nós somos, vivemos nossas culturas, somos povos , nossa  existência está aqui ainda, temos nossa  força, não são vocês que vão nos derrubar, viemos para somar, pois juntos somos mais” (Romário Puruborá).

    Fotos: Cimi Regional Norte I

    Read More
  • 17/08/2016

    Povo Mura mobiliza-se por direitos no Amazonas


    “Temos sido tratados como um povo do passado, mas hoje estamos aqui como sujeitos do presente e com uma visão do futuro”. Assim o professor Everton Marques Mura definiu o ato realizado no dia 10 de agosto na altura do quilômetro 92 da rodovia AM-240, que liga a sede do município de Autazes a Manaus, a capital do Amazonas.

    Durante sete horas, mais de 400 Mura de seis aldeias bloquearam a estrada para cobrar dos governos municipal e estadual o cumprimento de compromissos assumidos há vários anos, além de defender a demarcação e desintrusão das terras.

    Em 2009, o Governo do Estado do Amazonas anunciou a construção de uma escola de nível médio na aldeia São Feliz. A construção foi iniciada, mas há dois anos está parada. O mato vai tomando conta da área construída. Situação idêntica vivida pelos moradores da aldeia Cuia, onde também a vegetação adentra nos compartimentos que deveriam ser salas de aula.

    Outra promessa não cumprida pelas autoridades estaduais foi o asfaltamento de uma estrada na comunidade São Felix, com pouco mais de um quilômetro de extensão, construída para dar acesso às balsas que fazem a travessia de veículos até a sede de Autazes no período de enchente, normalmente entre janeiro e julho. No local existem sítios arqueológicos, alguns dos quais teriam sido destruídos durante a construção da via. Sem o asfalto, a estrada torna-se de difícil acesso para veículos e pedestres durante a época das chuvas.

    Fim da discriminação

    A manifestação é continuidade de um ato realizado no dia 1º de agosto, onde os indígenas reivindicavam também o fim da discriminação e a regularização dos serviços de moto-taxi feitos pelos indígenas. “Eu vi muitas vezes indígenas serem humilhados pelos funcionários das balsas. Eles impediam os indígenas que atravessar”, relata Everton Mura. A estrada que leva à cidade de Autazes tem 96 quilômetros e é interrompida pelo rio Autazes. A travessia é feita em pequenos barcos e por um serviço de balsas. Em acordo com a Prefeitura local, os indígenas passam a ter acesso pelas embarcações sem nenhuma restrição.

    O acordo põe um ponto final na discriminação, diz o Tuxaua Ilair Mura, da aldeia São Félix.


    Governo do estado ausente

    Na primeira manifestação, ocorrida no dia 1º, o presidente da Fundação Estadual do Índio – FEI, Raimundo Atroari, prometeu levar resposta do Governo do Estado em vista das reivindicações dos indígenas. No entanto, o presidente da FEI se limitou a dizer por mensagem de celular que o governador não poderia atender, pois encontrava-se doente.
    A resposta irritou os indígenas. A partir daquele momento, sem qualquer diálogo por parte das autoridades estaduais, a estrava foi interditada por tempo indeterminado. À tarde, o comandante da Polícia Militar de Autazes informou que acionaria a Polícia de Choque para desbloquear a via em vista da decisão firme dos indígenas.

    O bloqueio foi suspenso por volta das 16 horas depois que o prefeito de Autazes, Tomé Filho, assumiu o compromisso de pessoalmente levar o pleito dos indígenas ao Governador do Estado, com garantia de audiência com os representantes indígenas para tratar das reivindicações.


    Os Mura hoje

    A população Mura é de aproximadamente 12 mil pessoas. Eles vivem nos municípios de Autazes, Careiro da Várzea, Careiro Castanho, Manaquiri, Borba e Nova Olinda do Norte.

    Ao longo dos anos foram divididos pelo latifúndio, pela política e pela religião. Atualmente, não falam mais a língua, estão lutando para recuperar suas tradições e pela demarcação de suas terras. Em todas, praticamente, enfrentam a invasão de búfalos, que destroem suas roças, avançam nas comunidades e causam danos de toda sorte. Na aldeia São Félix, há dois anos, uma criança ficou bastante ferida por causa de choque elétrico. Um fazendeiro da localidade colocou uma cerca elétrica no interior da aldeia.

    Mulheres não recuam

    Na batalha pela garantia dos direitos e contra a discriminação, as mulheres tiveram uma atuação firme, que garantiu um desfecho digno para um povo cuja história é marcada por bravura na resistência contra a colonização. Enquanto alguns líderes relutavam em bloquear a rodovia, impedindo acesso de veículos, as mulheres não recuaram e fizeram o bloqueio acontecer. Sob calor intenso, com pouca água e sem alimentação, elas permaneceram e incentivavam os homens a seguir com a manifestação

    Texto e fotos: J. Rosha/Cimi Norte I

    Read More
  • 17/08/2016

    Relatório revela alto grau de insegurança alimentar e nutricional entre Guarani e Kaiowá


    Na tarde desta terça (16), foi lançado o relatório “O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do povo Guarani e Kaiowá – um enfoque holístico”, produzido pela Fian Brasil em parceria com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O documento, divulgado em evento na Faculdade de Ciências da Saúde, da UnB, em Brasília, analisa as violações de direitos e as causas da extrema situação de insegurança alimentar e nutricional entre os Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul.

    O relatório apresenta dados avassaladores: entre as três comunidades indígenas pesquisadas – os tekoha Ypo’i, Kurusu Amba e Guaiviry – a situação de insegurança alimentar é de 100%. Ou seja, todas as famílias Guarani e Kaiowá das três comunidades indígenas pesquisadas sofrem com algum grau de insegurança alimentar, índice que analisa o acesso a alimentos em quantidade e qualidade adequadas por comunidades e grupos sociais. Para entender a particularidade e a gravidade da situação, cabe a comparação com o mesmo índice no Brasil: na totalidade do território brasileiro, a insegurança alimentar é de 22,6%.

    Clique aqui para acessar o relatório “O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do povo Guarani e Kaiowá – um enfoque holístico”

    Outros índices apontados pelo levantamento dão conta da situação de extrema vulnerabilidade e violações de direitos básicos que os Guarani e Kaiowá vivenciam no Mato Grosso do Sul.

    O estudo verificou que 42% das crianças menores de cinco anos sofriam de desnutrição crônica, apresentando baixa estatura para a idade. O mesmo índice, se consideradas as crianças indígenas de todo o Brasil, é de 26%; e, se consideradas as crianças não indígenas, o índice, ainda grave, cai para 6,8% – um número seis vezes menor do que entre as comunidades Guarani e Kaiowá pesquisadas.

    A desnutrição aguda em crianças menores de cinco anos, que apresentam baixo peso para sua idade, é também alarmante entre os Guarani e Kaiowá. Ela atinge 9,1% das crianças pesquisadas e chega a ser cinco vezes maior do que entre as crianças não indígenas, entre as quais este índice é de 1,8%.


    Os Guarani Kaiowá Eliseu Lopes, liderança de Kurusu Amba, e Genito Gomes, de Guaiviry, participaram do lançamento do relatório, na UnB, em Brasília.

    Sem terra, a fome

    As três comunidades abrangidas pela pesquisa são retomadas – terras recuperadas recentemente no processo de luta dos Guarani e Kaiowá pela demarcação de seus territórios tradicionais. Confinados entre muitas pessoas em pequenas reservas, impossibilitados de vivenciar seu modo de vida tradicional e cansados da demora do Estado brasileiro para demarcar seus territórios, os indígenas partem para a retomada de partes de suas terras tradicionais, dominadas por grandes fazendas produtoras de soja, cana de açúcar ou gado para exportação.

    Nas retomadas, muitas vezes em áreas que o próprio Estado já reconheceu, os indígenas sofrem com a dificuldade de acesso à água, praticamente nenhum espaço para produzir, cercados pelo veneno das monoculturas e pressionados pela constante violência e pressão de fazendeiros e pistoleiros.

    “O direito humano à alimentação e à nutrição adequadas se realiza quando se consegue superar todos os obstáculos que existem para você conseguir o alimento, e isso é um processo bem longo. Identificamos duas causas estruturantes que acabam impactando no direito humano à alimentação adequada. Uma é o direito ao território e tudo que decorre da falta de acesso a ele, e uma outra é a questão da identidade cultural dos povos indígenas. Se estes povos estivessem em seus territórios plantando soja, eles não sofreriam as violações que sofrem, porque eles querem o seu território para utilizar de acordo com sua identidade. Ser índio hoje, e ser índio no Mato Grosso do Sul, é um fator determinante para as violações de direitos”, afirma a secretária geral da FIAN Brasil, Valéria Burity.

    O relatório destaca que “os povos indígenas seguem com péssimos indicadores em relação a direitos humanos fundamentais como alimentação e nutrição, saúde, água, renda, entre outros. Essas violações decorrem diretamente da negação do seu direito ao território tradicional, do direito à sua identidade cultural e da inadequação ou omissão de políticas públicas articuladas e específicas”.

    Tal percepção é reiterada pelas falas de Eliseu Lopes, liderança Guarani Kaiowá do tekoha Kurusu Ambá, e Genito Gomes, liderança de Guaiviry, que participaram do evento de lançamento do relatório.

    “O nosso principal problema, entre os Guarani e Kaiowá, é a questão do acesso aos nossos territórios. Por isso que muitos passam fome e dificuldades. Estamos sendo massacrados por todos os lados. Nas retomadas, as famílias não tem acesso a água potável, e os fazendeiros jogam veneno nos rios, o que não deixa de ser uma forma de nos despejar”, afirmou Eliseu Lopes durante o evento na UnB.

    “Temos um conjunto de violências e violações que se retroalimentam e agravam ainda mais essa situação, e a desnutrição entre os indígenas se dá nesse contexto”, aponta o secretário executivo do Cimi, Cleber Buzatto. “Esses dados apresentados têm relação com a violência vigente que se dá pela falta de espaço, de território para a produção de alimentos e para a sobrevivência física e cultural deste povo, e se dá num processo de luta também deste povo para reaver ao menos parte de seu território esbulhado. Num contexto de agravamento, especialmente no Mato Grosso do Sul, dos ataques violentos às comunidades”.


    Genocídio e violência contínua

    Entre agosto de 2015 e julho de 2016, foram mais de 30 ataques paramilitares registrados contra comunidades Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul, inclusive contra Kurusu Amba e Guaiviry. Estes números incluem também ataques químicos, com despejo de veneno em acampamentos indígenas, e o recente Massacre de Caarapó, que resultou na morte do indígena Clodiodi de Souza e deixou outros seis gravemente feridos.

    A própria história pessoal das lideranças duas comunidades pesquisadas é marcada pela violência do agronegócio e aponta a relação que existe entre a insegurança alimentar e as outras violações de direitos dos povos indígenas: em 2007, a rezadora Xurite Lopes, com 70 anos, foi morta por pistoleiros em Kurusu Amba; em 2011, Nísio Gomes foi morto a tiros no tekoha Guaiviry.

    “Entre os Guarani e Kaiowá, das 390 vítimas desse processo de violência e confinamento nos últimos dez anos no Mato Grosso do Sul, 16 foram lideranças sumariamente executadas na luta pela terra”, afirma Matias Rempel, missionário do Cimi – regional Mato Grosso do Sul.


    Violações articuladas

    Os dados da pesquisa foram colhidos em 2013, com base em visitas a 96 domicílios nas comunidades indígenas de Ypo’i, Guaiviry e nos dois núcleos de Kurusu Ambá, onde residiam, à época, 360 pessoas, com grande predomínio de jovens – 46% dos indígenas com idade inferior a 15 anos.

    O estudo considerou o direito humano à alimentação e nutrição adequadas em duas dimensões, dando atenção tanto ao direito de estar livre da fome quanto ao direito a uma alimentação e nutrição adequadas.

    Em 86,7% dos domicílios pesquisados, a insegurança alimentar, conforme os critérios da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar e Nutricional (EBIA), era moderada (58,7%), quando há falta de alimentos entre os adultos, que deixam de comer para priorizar a alimentação das crianças, ou grave (28%), quando adultos e crianças sofrem com a restrição de alimentos.

    Em 76% dos domicílios a pessoa entrevistada afirmou que, no mês anterior a setembro de 2013, houve ocasião em que crianças e jovens da casa passaram um dia todo sem comer e foram dormir com fome, porque não havia comida na casa.

    Além da falta de espaço nas retomadas – em 2013, por exemplo, 80 famílias do tekoha Guaiviry viviam em aproximadamente 79 hectares – a produção de alimentos é prejudicada pela falta de condições, com ausência de acesso a sementes e assistência técnica.

    O estudo identificou que, nas três comunidades, a situação precária da vida sem a efetiva demarcação do território tradicional complementa e determina a realidade de insegurança alimentar, com muitas das famílias vivendo sob barracos de lona e com severa dificuldade de acesso a água potável, em função da contaminação dos rios próximos por agrotóxicos utilizados pelas fazendas que estão sobrepostas às terras indígenas.

    A falta de ação do Estado

    Além da questão da demarcação dos territórios tradicionais, o estudo apontou outras violações do Estado brasileiro em suas atribuições de respeitar, proteger e promover os direitos humanos entre os Guarani e Kaiowá, diretamente relacionadas à situação de insegurança alimentar e nutricional.

    Entre elas, estão a falta de proteção contra os ataques paramilitares, contra o desmatamento e o uso de agrotóxicos nas terras indígenas já identificadas ou em processo de identificação e contra a discriminação que os indígenas sofrem. Além disso, o relatório aponta também a não concretização do direito à educação, à saúde, o sucateamento de órgãos públicos e a falta de políticas públicas que atendam à comunidade.

    A manutenção dos indígenas sob uma situação de dependência de programas emergenciais, como cestas básicas, segundo o relatório, também viola a promoção do direito à alimentação e nutrição adequadas – é necessário criar condições para que os povos “possam recuperar a capacidade de se alimentar e ter acesso a outros direitos por conta própria, quando forem capazes de fazê-lo”.

    Nesse sentido, outra grave violação identificada pela pesquisa são as restrições impostas aos indígenas para o acesso ao programa Bolsa Família. Apesar de todas as famílias pesquisadas atenderem aos critérios para integrar o programa social, menos de 40% tinham acesso efetivo à transferência de renda à época da pesquisa.

    Outro dado alarmante: 22% das famílias estavam com o acesso ao Bolsa Família suspenso, sendo que, em 41,5% dos domicílios onde o programa foi suspenso, a situação era de fome – ou, em termos técnicos, insegurança alimentar grave. Em muitos dos casos, a bolsa foi suspensa por falta de documentos ou porque as crianças das famílias em questão não estavam frequentando a escola.

    O problema, entretanto, é que o acesso à educação nas retomadas também é dificultada. No caso de Kurusu Amba, por exemplo, não há escola, e as crianças precisam buscar outras aldeias ou o município de Coronel Sapucaia, onde os indígenas são bastante discriminados.

    A pesquisa identificou, ainda, que 31% das famílias não tinha renda própria e nem recebia recurso de programas sociais.

    “Em sua maioria, [os Guarani e Kaiowá] estão ilhados em pequenos espaços de terra, acuados por monoculturas que demandam uso intensivo de agrotóxicos, sem condições de plantar, caçar, pescar ou realizar outros atos de sua cultura”, afirma o documento em suas considerações finais.

    O relatório conclui que este quadro grave de violação ao direito humano à alimentação e nutrição adequadas só será revertido “se houver, em primeiro lugar, a garantia do seu território e, além disso, a adequação de políticas públicas, elaboradas, geridas e executadas de maneira participativa, que lhes permitam viver de acordo com sua cultura e tradição, o que, a propósito, é mandamento constitucional”.

    “De 2000 a 2016 morreram 28 pessoas no Guaiviry, todas no tekoha. Eu não quero mais ver meu povo morrendo, nem minha comunidade sofrendo. Não teria acontecido isso, se a gente estivesse todo mundo unido, teria mais força. Se todos pensarem mais no futuro, na vida do outro, vai ser melhor para nós, a vida de todos vai ser melhor”, afirmou Genito Gomes, ao fim do evento. “O que nos resta hoje é nossa resistência”, concluiu Eliseu Lopes.

    Texto e fotos: Tiago Miotto/assessoria de comunicação – Cimi

  • 16/08/2016

    1 mil fecha Seduc de PE por criação da categoria de professor indígena e contra municipalização da educação  

    A Secretaria Estadual de Educação de Pernambuco amanheceu nesta terça-feira, 16, fechada aos servidores públicos pela ocupação de 11 povos indígenas do estado iniciada na manhã de ontem; está completamente paralisada. “A sede da Seduc permanecerá trancada até que a nossa pauta de reivindicações seja respondida em reunião com o secretário (Fred Amanço) e o governador (Paulo Câmara)”, informa Pretinha Truká, liderança da Comissão de Professores e Professoras Indígenas de Pernambuco (Copipe).  O estado concentra uma das cinco maiores populações indígenas do país, com pouco mais de 45 mil indivíduos compondo 12 povos distintos (IBGE, 2010). 

    O tradicional Encontrão da Copipe ocorre este ano na ocupação das instalações da Seduc, na capital Recife. No final da noite de ontem, já com todas delegações vindas do Sertão e Agreste na Seduc e com a Assembleia de Abertura do Encontrão, a contabilização de indígenas presentes chegou a 1 mil – a ampla maioria composta por professores e professoras. A decisão pela ocupação, com tempo indeterminado, ocorre pelo o que o cacique Marcos Xukuru do Ororubá chama de “pauta reprimida” e a professora Elisa Pankararu complementa como “tentativa de retrocessos” pelo governo estadual. Motivos que levaram os indígenas a decidirem sair da Seduc apenas com o atendimento integral da pauta apresentada. 

    No documento entregue ao governo, os indígenas exigem a criação da categoria de professor e professora indígena para que assim o concurso público para a categoria possa ser feito. “O Legislativo precisa aprovar a criação da categoria, então o governo do estado elaborou um Projeto de Lei para enviar aos deputados estaduais. Ninguém sabe onde está o PL, e um poder empurra a responsabilidade para o outro”, ressalta Marcos Xukuru. Por essa razão os indígenas querem uma reunião com Amanço, Câmara e o presidente da Assembleia Legislativa, Guilherme Uchoa (PDT). 

    Pretinha Truká explica que a criação da categoria de professor indígena é uma reivindicação antiga da Copipe. “Estamos há 16 anos trabalhando com mini-contratos. A criação da categoria daria regularização e estabilidade para os profissionais, além de afirmar nossa identidade enquanto povos indígenas”, afirma. A indígena Truká explica que anualmente os professores e professoras vivem assombrados pelas demissões e a falta de pagamentos. Este ano, diz Pretinha, há centenas de professores e professoras que não receberam os salários por falta de recontratação – um decreto não permite que um professor seja contratado mais depois de seis anos, o que prejudica diretamente a qualidade do ensino ofertado nas aldeias. 

    Em Pernambuco, mais de 1 mil professores e professoras atuam em escolas indígenas que atendem mais de 10 mil alunos. “Os atrasos dos salários perpassam a questão dos mini-contratos. Todo ano isso acontece”, ressalta. Elisa Pankararu lembra ainda que profissionais indígenas cedidos pelos municípios passam pela mesma situação. A Seduc não só sabe dos problemas, como evita resolvê-los na opinião das lideranças. O presidente do Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena, o cacique Zuka Kambiwá, lembra que em seu povo a Seduc afirma que em uma escola atuam 20 professores quando apenas 11 trabalham; por outro lado, a secretaria tem em seus registros que em outra escola existem apenas 190 alunos quando 400 assistem regularmente a aulas. 

    “É muita inoperância. Temos como comprovar nossos dados, levantados mensalmente e com critérios definidos por especialistas, mas eles se negam a ouvir. Então a merenda chega errada, o transporte não é pago… enfim, uma cadeia de problemas surge”, diz Zuka. Quanto ao Conselho Estadual, o cacique denunciar que o governo "tem esvaziado e não conseguimos encaminhar. Os representantes não comparecem. Chegamos em Recife e discutimos apenas com alguns representantes da sociedade, habituais aliados. Chamamos de ‘sala das lamentações’ o local dessas reuniões. Temos mais de cinco reuniões que o governo não comparece”. 

    A Coordenadoria da Educação Escolar Indígena, pasta da Seduc, tem sido mais habitual nos encontros. Todavia, sem nenhum poder de decisão ou encaminhamento das demandas. “E aí temos outra questão a tratar com o governo: a Coordenadoria e o Conselho Estadual precisam ser fortalecidos. Nós defendemos e reivindicamos ambos, mas para ter poder de influência real na política pública. O que não acontece”, analisa o cacique Marcos Xukuru do Ororubá. Para a liderança, é preciso que o governo estadual garanta o controle social das políticas para o direito ser efetivado.  

                 

    O retrocesso da municipalização 

    Em 2012, o Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica, órgão do Ministério da Educação, baixou a Resolução 05, atualizando a Resolução 03 de 1999. Em síntese, a normativa confere a responsabilidade pela oferta da Educação Escolar Indígena aos estados, podendo ser oferecida pelos municípios por regime de colaboração e com a anuência dos povos indígenas. A Resolução se tornou um marco na luta dos povos indígenas pela Educação Escolar Indígena Diferenciada. Depois de ser responsabilidade da Funai, sendo transferida na década de 1990 para os municípios, os indígenas passaram a discutir a educação apenas com uma representação governamental e livre do coronelismo regional que entendia as escolas indígenas apenas como rurais, e não diferenciadas. 

    “Acontece que o estado de Pernambuco nunca se organizou e não criou ordenamentos jurídicos próprios. Agora o estado afirma que a demanda da Educação Escolar Indígena é muito grande e quer devolver aos municípios: se é grande demais para o estado, imagina para os municípios que não possuem estrutura técnica e financeira. Os povos indígenas não querem voltar para eles”, afirma Pretinha Truká. “Imagina você negociar direitos de educação diferenciada com grileiros, fazendeiros e coronéis que dominam as prefeituras e nos ameaçam, nos matam e criminalizam por conta da luta pela terra? O estado pode dar conta, mas não dá porque não quer”, questiona Elisa Pankararu. 

    A liderança da Copipe explica que os povos indígenas do Brasil defendem um sistema próprio de educação para os povos indígenas. Durante a Conferência Nacional de Educação, em 2009, foi aprovada a construção desse sistema. Porém, o Ministério da Educação não deu sequência às consultas, encontros e audiências. “Só aceitamos sair do estado se for para entrar nesse sistema próprio. Do contrário, não queremos andar para trás, não aceitamos retrocessos e isso é inegociável”, avisa Pretinha Truká.

    “Queremos políticas públicas"

    Salsicha, sanduíches e sucos industrializados. “Isso é o que nossas crianças recebem como merenda nas escolas quando nas aldeias há centenas de famílias agricultoras. Não pedimos merenda, mas uma política pública para a merenda”, ataca o cacique Neguinho Truká. Para a liderança o governo do estado deveria pensar em políticas públicas, não apenas em atender demandas – o que também não acontece.

    “Se o governo decide comprar os alimentos da agricultura familiar, os alunos teriam macaxeira, todo tipo de banana, hortaliças, legumes, frutas, arroz, feijão, carnes de galinha de capoeira e bode. A alimentação seria saudável, tradicional e geraria renda para as famílias. Nós indígenas somos agricultores por natureza. Crescemos aprendendo a plantar e ensinamos isso aos nossos filhos. Pensar nessa cadeia é política pública e incentiva a prática tradicional. Estamos aqui reivindicando isso”, salienta cacique Neguinho. Hoje apenas 20% da merenda escolar é fornecida pelos próprios indígenas ao estado. Percentual baixo e que o movimento indígena pretende levar à totalidade. 

    Para o cacique o caso se repete com o transporte escolar. Os povos foram obrigados a renovar a frota de veículos utilizados para tal fim e “a gente cumpriu, mas o governo estadual não deu sua contrapartida de arrumar as estradas e nem os motoristas estão sendo pagos. Fomos chamados a cumprir o nosso dever. E os direitos? O governo segue sem respeitar nosso cronograma diferenciado, que tem um ano letivo diferente nas aldeias, e não olha de forma cuidadosa pra gente”, encerra cacique Neguinho Truká. 


    Read More
  • 16/08/2016

    “A nossa dor é uma só. Por isso devemos nos juntar para defender a nossa Mãe Terra!”


    A nossa dor é uma só. Por isso devemos nos juntar para defender a nossa Mãe Terra!
    Joanita Apinajé

    Diante das ameaças aos direitos indígenas e aos seus territórios, pelas inúmeras ofensivas dos donos do capital e do latifúndio, que continuam fazendo vitimas para roubar as terras e devastá-las em nome de um falso desenvolvimento econômico, que só trás dor, sofrimento e morte para os povos da terra.

    Frente ao avanço destes projetos de morte, que tem como centro e pivô o PDA-MATOPIBA, que avança aceleradamente com sua destruição, acabando com o Cerrado, seus rios e riquezas naturais.

    O CIMI Goiás/Tocantins na sua XXII Assembleia Regional celebrada de 10 a 12 de agosto, na chácara Dona Olinda, na cidade de Araguaína-To, reafirma seu compromisso em defesa da vida dos povos indígenas e dos seus territórios, nesta atual conjuntura, que é, mais do que nunca, contrária aos direitos constitucionais dos povos originários. Principalmente pelas proposições legislativas que tramitam no Congresso nacional, assim como também de leis estaduais que ameaçam o Cerrado, isentando de licenciamento ambiental os projetos implementados no estado do Tocantins, como a Lei 2.713/2013.

    Manifestamos nosso incondicional apoio às lutas pela demarcação de seus territórios, na preservação de suas culturas e espiritualidades como fontes de sabedoria, resistência e teimosia na construção do Bem Viver.

    Questionamos a precariedade das políticas públicas que são implementadas nos povos indígenas, que não respeitam á diversidade cultural e organização social de cada povo, e  com sua omissão e falta de profissionalismo, provoca sofrimento e dor nas comunidades indígenas.

    Expressamos nosso repúdio à implementação do PDA-MATOPIBA, que é a morte para o Cerrado e seus povos. Este plano será o acirramento dos conflitos fundiários no estado do Tocantins, trazendo o aumento de violências e morte no campo.

    Como sinal de que o MATOPIBA já está semeando o conflito e a morte no campo, denunciamos a morte do Luis Jorge de Araujo, da Comunidade Boqueirão, no município de Wanderlândia, que foi assassinado no dia 05 de agosto.

    Solidarizamos-nos à família do nosso irmão e pedimos justiça e punição aos assassinos.

    A resistência, teimosia e sabedoria dos povos indígenas nos fortalecem para continuar firmes no nosso compromisso com a causa indígena e com todas as causas do Reino, na defesa da nossa casa Comum.

    Acreditamos que somando as nossas lutas e sonhos dos nossos irmãos do campo e da cidade, faremos brotar o direito e a justiça para todos os povos. E inspiradas no Magistério da Igreja, continuaremos a reafirmar na nossa missão de sermos “Igreja advogada da justiça e defensora dos pobres, acreditando que se não há esperança para os pobres, não haverá para ninguém.” (cfr. DA 395).

    Read More
  • 15/08/2016

    “Nós, mulheres, somos mães e cuidamos dos nossos filhos; a terra é nossa mãe, por isso que cuidamos dela”


    Reunidas em Araguaína nos dias 10 e 11 de agosto, as mulheres indígenas dos povos Apinajé, Krahô, Xerente, Kanela do Tocantins, Karajá de Xambioá, junto com representantes das Quilombolas do Quilombo Dona Jucelina, do município de Muricilândia, divulgaram um documento após o encontro em que debateram sobre os ataques e ameaças que vêm sofrendo seus territórios.

    As mulheres denunciam as danosas consequências da expansão do agronegócio no estado do Tocantins e exigem, como garantia mínima para a sobrevivência de seus povos e comunidades, a mudança do modelo de desenvolvimento agressivo contra a natureza e os povos e comunidades tradicionais, a reforma agrária e a demarcação e titulação de seus territórios tradicionais.

    “Estamos muito preocupadas, pois os nossos territórios estão sendo destruídos e ameaçados pelos projetos de desenvolvimento do Estado do Tocantins”, afirmam as mulheres indígenas e quilombolas. “Nós mulheres estamos sofrendo todos os efeitos negativos do agronegócio. Nossas crianças estão ficando doentes e não estamos sabendo como cuidar delas”.


    Leia abaixo, na íntegra, o documento do encontro:

    Nós, mulheres, somos mães e cuidamos dos nossos filhos; a terra é nossa mãe, por isso que cuidamos dela

    Nós, mulheres indígenas dos povos Apinajé, Krahô, Xerente, Kanela do Tocantins, Karajá de Xambioá, e nós, Maria Bartolomeu e Sara, representantes das Quilombolas do Quilombo Dona Jucelina – município de Muricilândia -, reunidas na Chácara Dona Olinda, em Araguaína, nos dias 10 e 11 de agosto para discutir e debater sobre os  ataques e ameaças que vêm sofrendo nossos territórios.

    Estamos muito preocupadas, pois os nossos territórios estão sendo destruídos e ameaçados pelos projetos de desenvolvimento do Estado do Tocantins. Os projetos de plantio de soja, cana-de-açúcar, eucalipto e de outras monoculturas, que destroem a natureza e matam as nascentes, diminuem as águas em nossas aldeias, acabam com os nossos peixes, e matam as nossas caças.

    Esses projetos matam os passarinhos, os insetos, as borboletas, as abelhas, e tudo isso está acabando.  Jogam veneno em nossos rios, em nossas casas, e até o mel tem veneno. O desmatamento seca as nascentes, o brejo está secando, e, com isso, está morrendo o capim dourado, a tiririca e as diversas sementes que usamos para fazer e costurar os artesanatos, que depois vendemos para comprar remédios e outras necessidades. Nós mulheres estamos sofrendo todos os efeitos negativos do agronegócio. Nossas crianças estão ficando doentes e não estamos sabendo como cuidar delas.

    Hoje, tem doença que não conhecemos e nem sabemos como curar e cuidar. A floresta não conhece estas doenças, por isso, não sabe curá-las. Hoje o vento não é mais sadio como antigamente; ele está trazendo muita doença, pois está envenenado pelo agrotóxico – jogado nas grandes lavouras de soja e cana-de-açúcar, que estão ao redor de nossos territórios.

    O vento, também, tem chegado a nossas aldeias de forma violenta, arrancando o telhado de nossas casas e as árvores.  O tempo mudou muito e este ano não estamos entendendo o céu e a terra. Nas aldeias tem havido pouca comida; cuidamos das roças, porém secou e morreu quase tudo o que plantamos, pois as chuvas foram poucas e fora do tempo normal. Antes plantávamos e tudo dava certo; hoje não estamos entendo a natureza: o verão e o inverno não se comunicam mais.

    Nós, povos indígenas, respeitamos a terra, a água, os animais; respeitamos toda a natureza. Mas, o MATOBIBA não respeita nada. Vai arrancando as árvores com os correntões puxados por tratores, destruindo tudo, acabando com tudo, deixando a terra nua e sofrendo. Outros países, como o Japão, vêm aqui e destroem a nossa terra, envenenam as nossas águas, matam as nascentes e acabam com a floresta, com os nossos insetos, e roubam as nossas riquezas; só deixam pobreza e sofrimento para nosso povo. Fazem isso porque já destruíram sua terra e acabou com sua água, e agora querem produzir alimentos aqui para matar a fome do seu povo.

    Nós, mulheres, não vamos permitir que roubem os filhotes de nossas araras, que  matem nossas nascentes, poluindo nossos rios, nem mesmo que joguem agrotóxico em nossos filhos; que derrubem o nosso cerrado, invadindo nossos territórios. Não vamos deixar, não.

    Enquanto houver vida, nós, mulheres indígenas e quilombolas, não vamos permitir que acabem com a nossa Mãe Terra. Vamos continuar denunciando todas essas leis que o branco faz para retirar nossos direitos – como a PEC 215, a PEC 237 o PL 1610, e tantas outras leis. Exigimos que o Congresso Nacional acabe, de vez, com todos esses projetos de lei que só querem tomar as nossas terras e acabar com os nossos direitos.

    E exigimos a Demarcação de todas as terras indígenas; que seja feita a reforma agrária e regularize-se a terra dos camponeses e quilombolas.

    Exigimos que os Deputados do Tocantins acabem com essa lei 2.713/2013, que é inconstitucional, permitindo o desmatamento sem limites do Cerrado ao isentar do licenciamento ambiental os projetos agrossilvipastoris. Exigimos, também, que o STF julgue a ADI 5.312/TO e acabe com essa lei 2.713/13, que é inconstitucional, pois ela está incentivando o desmatamento do Cerrado e acabando com os rios e nascentes que nos dão água para beber.

    Fazemos o convite à sociedade brasileira para se unir a nós, mulheres indígenas e quilombolas, na defesa da vida do Cerrado e na proteção dos rios, para garantir a vida de nossos filhos, netos, bisnetos e futuras gerações.

    Nós, mulheres indígenas e quilombolas, estamos unidas à dor e sofrimento da família do senhor Luís Jorge de Araújo, membro da comunidade Boqueirão no município de Wanderlândia, que foi morto pela cobiça e ambição do agronegócio. Repudiamos a morte dessa liderança e de todas as lideranças assassinadas que morreram na luta pela terra. Exigimos justiça e proteção da comunidade e que sejam punidos todos os culpados. Não vamos aceitar essas violências! Vamos continuar resistindo na defesa de nossos direitos e territórios.

    MATOPIBA É MORTE, QUEREMOS A VIDA E GARANTIA DOS NOSSOS TERRITÓRIOS!


    Read More
  • 15/08/2016

    Relatório sobre violações de direitos da população indígena no Sul é apresentado no CNDH


    Cristian Teófilo, da Associação Brasileira de Antropologia (ABA), apresentou o relatório. foto: Tiago Miotto

    Na manhã de sexta-feira (12), em reunião do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), foi apresentado e aprovado o relatório do Grupo de Trabalho (GT) sobre os Direitos dos Povos Indígenas e das Comunidades Quilombolas da Região Sul, produzido a partir da missão que investigou violações de direitos sofridas pelos povos indígenas desta região.

    O documento foi feito após as diligências do GT estabelecido em dezembro de 2015, coordenado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e relatado pela Associação Brasileira de Antropologia (ABA), pelo Coletivo Nacional da Juventude Negra (Enegrecer) e pela Plataforma Brasileira de Direitos Humanos (Dhesca).

    “Esse GT visa acolher a solicitação das comunidades e organizações indígenas da região sul do Brasil, em decorrência das graves violações de direitos humanos que estão acontecendo nos três estados. O objetivo é fazer um diagnóstico de toda essa realidade e, a partir dele, ter um mecanismo para cobrar das autoridades do poder público a resolução dessas violações de direitos humanos”, explicou Adelar Cupsinski, assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e coordenador do GT.

    Entre os meses de março e maio de 2016, foram realizadas visitas de trabalho nos três estados – Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina –, que acabaram por confirmar muitas das denúncias encaminhadas ao GT, com a localização de boletins de ocorrência, inquéritos, pedidos de habeas corpus para lideranças indígenas, registros audiovisuais pelas comunidades agredidas, matérias da imprensa, registros e relatórios de servidores públicos, dossiês elaborados por ativistas dos direitos humanos, dentre outras formas que contribuíram com o levantamento das informações.


    Adelar Cupsinski, assessor jurídico do Cimi, introduziu o trabalho do GT. foto: Tiago Miotto

    O conjunto das denúncias e constatações apresentadas expressa um quadro adverso de conflitos fundiários, violência policial e aprisionamento de lideranças, agressões e declarações públicas de conteúdo racista pronunciado por autoridades, desatenção e negligência dos órgãos públicos quanto ao atendimento à saúde, direito à convivência familiar, à educação escolar diferenciada e bilíngue, moradia, segurança alimentar, regularização fundiária, dentre outras violações.

    Além da descrição do estado de conflito na região, o relatório contém uma série de recomendações a vários órgãos públicos para que o Estado reconheça e repare as violações de direitos humanos desses povos indígenas.

    Um dos casos mais emblemáticos alcançou visibilidade e comoção nacional, quando no dia 30 de dezembro do ano passado Vitor Pinto, criança do povo indígena Kaingang de 2 anos de idade, foi morto no colo de sua mãe na rodoviária de Imbituba (SC).

    Adelar avalia que outro papel importante do relatório é tirar da invisibilidade a situação dos povos indígenas da região sul. “O que verificamos em campo é que mesmo conquistas mínimas que foram obtidas por outros segmentos da sociedade inexistem no caso das comunidades indígenas. Este quadro é agravado pela falta de acesso a seus territórios, que é onde eles conseguem garantir sua sobrevivência física e cultural”.

    Após a leitura, o relatório foi aclamado pelos integrantes do Conselho. O texto final será disponibilizado na íntegra e entregue ao Ministro da Justiça e Cidadania no dia 24 de agosto.


    Em reunião cheia, relatório foi aplaudido pelos conselheiros e conselheiras. foto: Tiago Miotto

    Read More
  • 15/08/2016

    Gamela retomam fazenda usada para retirar barro do rio Piraí (MA), sagrado para o povo



    O povo Gamela retomou na manhã desta segunda-feira, 15, uma fazenda incidente no território tradicional reivindicado pelos indígenas no município de Viana, Maranhão. A área fica às margens do rio Piraí, sagrado para o povo; nele vive João Piraí, Encantado protetor dos Gamela e das águas onde se reproduzem os peixes fonte de alimentação aos indígenas.


    “Estamos bem, mas o fazendeiro já está rondando nosso acampamento com capangas. A gente teme por um ataque porque eles são perigosos. A retomada é uma forma de proteger a Mãe Terra, que vinha sendo maltratada pelos fazendeiros, e de reiterar à Funai para que seja criado o Grupo de Trabalho para a identificação e demarcação de nosso território”, explica Kaw Gamela.


    Nas últimas semanas os Gamela estiveram em Brasília para agenda envolvendo a demanda territorial do povo. "Ao longo dos anos o rio foi sendo destruído pelos fazendeiros que devastaram  suas margens, assorearam seu leito, retiraram dele milhares de toneladas de barro para cerâmica – tijolos e telhas. São consequências extremamente prejudiciais ao povo”, diz trecho do comunicado da retomada divulgado pelos Gamela logo cedo.


    Conforme Kum’tum Gamela a família que estava na casa grande da fazenda está retirando os pertences com segurança. A área é usada para a criação de gado e a retirada do barro do rio Piraí para abastecer uma cerâmica também do fazendeiro. “Já mandamos mensagens para o coordenador da Funai, que não respondeu. Desde janeiro a Funai não aparece aqui”, diz o Gamela.


    O território Gamela teve a primeira ‘demarcação’ em 1759, quando 14 mil hectares foram destinados ao povo por doação da Sesmaria. Kum’tum explica que esta é a primeira referência do povo para a atual reivindicação. No entanto, durante o século 19 um outro aldeamento Gamela foi erguido fora da área doada pela Sesmaria, e esta é a segunda referência do povo. Durante o século 20, no entanto, as expulsões dos Gamela destas áreas se intensificaram.


    “Atualmente o nosso processo de demarcação está paralisado na qualificação de demanda, que já foi feita”, afirma Kum’Tum. O povo Gamela, composto por cerca de 1.500 indígenas, ocupam hoje sete áreas. A retomada de hoje de manhã fica perto da aldeia Cajueiro; entre agosto e dezembro do ano passado os Gamela retomaram outras três porções do território reivindicado.


    Em represália, os Gamela passaram a sofrer ameaças de morte e uma rede de boatos se instalou nos municípios vizinhos na tentativa de colocar a população contra os indígenas. Das sete áreas ocupadas pelos Gamela, quatro estão com ações de reintegração de posse em tramitação na Justiça Federal e uma, na margem oposta do rio Piraí à retomada de hoje, com interdito proibitório solicitado pela fazendeira contra os indígenas.

    Read More
  • 12/08/2016

    Depois de prisão arbitrária no Pará, indígena Poró Borari responde a processo em liberdade


    No Dia Internacional dos Povos Indígenas (9), após assembleia geral do Movimento Indígena do Baixo Tapajós, convocada pelo Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (CITA), os povos representados decidiram ocupar o polo base do Distrito Sanitário Especial Guamá Tocantins (DSEI-GUATOC) em Santarém-PA. A ocupação ocorreu devido à falta de atendimento a saúde indígena na região, sob responsabilidade da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) – mesmo após decisão judicial estipulando que, a partir de março, haveria multa estipulada em 10 mil reais por dia para a entidade no caso de não atendimento aos 13 povos indígenas do Baixo Tapajós.

    Desde então, a Sesai não realizou sequer uma programação ou um planejamento para o atendimento destes povos, não existem postos de saúde indígenas vinculados à SESAI nas aldeias mesmo já sendo parte dos territórios da região demarcados a tempos, nem existe uma casa do índio (CASAI) para acolhimento destes povos quando necessitam de atendimento de saúde na cidade, apesar de já existirem duas CASAIs no município destinadas para etnias de outras regiões; a reinvindicação das populações indígenas da região para atendimento a saúde é antiga, é uma luta de mais de 15 anos segundo as lideranças.

    Durante a ocupação da CASAI não houve nenhuma violação de direitos aos servidores e nem danos aos patrimônios públicos e, por se tratar do prédio de um polo base tipo II da SESAI, no local não havia pacientes, pois ali só são prestados serviços administrativos e não há atendimento ao público.

    No entanto, ao chegar ao local e mesmo constatando o portão aberto, a Polícia Federal (PF) localizou especificamente o indígena Poró Borari, um bravo guerreiro do Movimento Indígena do Baixo Tapajós, e o prendeu individualmente – mesmo tendo diversos outros indígenas no local ao qual a policia federal encontrou anteriormente ao adentrar.

    Detido sob a acusação de cárcere privado, mesmo com a entrada da PF livremente pelos portões que estavam abertos e sem nenhuma obstrução à saída dos servidores que se encontravam em horário de expediente, o delegado da PF impôs uma fiança impagável de cerca de 20 salários mínimos ao indígena, que trabalha como coordenador do ensino modular indígena e recebe aproximadamente dois salários mínimos por mês, tendo dois filhos pequenos para sustentar.

    Isto mostra uma clara insatisfação e desejo dos poderes legais de reprimirem o movimento indígena do baixo Tapajós por terem imposto consecutivas derrotas a setores econômicos como os dos madeireiros, da construção civil, do agronegócio, realizando um forte enfrentamento aos grandes empreendimentos e ao capital na região, que deseja se apropriar dos territórios indígenas originários para ampliar seus lucros em detrimento da condição de vida destes povos. E também ao poder público e à justiça federal, já que ambos têm lhe negado direitos, agindo com preconceitos e fazendo com que os povos indígenas os denunciem e os cobrem sistematicamente por uma atuação mais justa. 

    Depois de passar uma noite detido, o indígena Poró Borari foi solto após a audiência de custódia. O juiz entendeu que a prisão foi realizada de forma ilegal, sem elementos para tal efeito, conforme o entendimento do Ministério Público Federal (MPF) e de representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), dos advogados da ONG Terra de Direitos e da Defensoria Pública da União (DPU), que o acompanharam.

    Poró ainda deve responder a processo em liberdade. Ao prendê-lo, a Polícia Federal tenta intimidar o movimento indígena que luta pela garantia de seus direitos territoriais e sociais previstos em lei, deixando claro o posicionamento da PF como órgão repressor aos que fazem enfrentamento às estruturas de poder e as instituições de governo.

    Read More
Page 376 of 1202