17/08/2016

Povo Mura mobiliza-se por direitos no Amazonas


“Temos sido tratados como um povo do passado, mas hoje estamos aqui como sujeitos do presente e com uma visão do futuro”. Assim o professor Everton Marques Mura definiu o ato realizado no dia 10 de agosto na altura do quilômetro 92 da rodovia AM-240, que liga a sede do município de Autazes a Manaus, a capital do Amazonas.

Durante sete horas, mais de 400 Mura de seis aldeias bloquearam a estrada para cobrar dos governos municipal e estadual o cumprimento de compromissos assumidos há vários anos, além de defender a demarcação e desintrusão das terras.

Em 2009, o Governo do Estado do Amazonas anunciou a construção de uma escola de nível médio na aldeia São Feliz. A construção foi iniciada, mas há dois anos está parada. O mato vai tomando conta da área construída. Situação idêntica vivida pelos moradores da aldeia Cuia, onde também a vegetação adentra nos compartimentos que deveriam ser salas de aula.

Outra promessa não cumprida pelas autoridades estaduais foi o asfaltamento de uma estrada na comunidade São Felix, com pouco mais de um quilômetro de extensão, construída para dar acesso às balsas que fazem a travessia de veículos até a sede de Autazes no período de enchente, normalmente entre janeiro e julho. No local existem sítios arqueológicos, alguns dos quais teriam sido destruídos durante a construção da via. Sem o asfalto, a estrada torna-se de difícil acesso para veículos e pedestres durante a época das chuvas.

Fim da discriminação

A manifestação é continuidade de um ato realizado no dia 1º de agosto, onde os indígenas reivindicavam também o fim da discriminação e a regularização dos serviços de moto-taxi feitos pelos indígenas. “Eu vi muitas vezes indígenas serem humilhados pelos funcionários das balsas. Eles impediam os indígenas que atravessar”, relata Everton Mura. A estrada que leva à cidade de Autazes tem 96 quilômetros e é interrompida pelo rio Autazes. A travessia é feita em pequenos barcos e por um serviço de balsas. Em acordo com a Prefeitura local, os indígenas passam a ter acesso pelas embarcações sem nenhuma restrição.

O acordo põe um ponto final na discriminação, diz o Tuxaua Ilair Mura, da aldeia São Félix.


Governo do estado ausente

Na primeira manifestação, ocorrida no dia 1º, o presidente da Fundação Estadual do Índio – FEI, Raimundo Atroari, prometeu levar resposta do Governo do Estado em vista das reivindicações dos indígenas. No entanto, o presidente da FEI se limitou a dizer por mensagem de celular que o governador não poderia atender, pois encontrava-se doente.
A resposta irritou os indígenas. A partir daquele momento, sem qualquer diálogo por parte das autoridades estaduais, a estrava foi interditada por tempo indeterminado. À tarde, o comandante da Polícia Militar de Autazes informou que acionaria a Polícia de Choque para desbloquear a via em vista da decisão firme dos indígenas.

O bloqueio foi suspenso por volta das 16 horas depois que o prefeito de Autazes, Tomé Filho, assumiu o compromisso de pessoalmente levar o pleito dos indígenas ao Governador do Estado, com garantia de audiência com os representantes indígenas para tratar das reivindicações.


Os Mura hoje

A população Mura é de aproximadamente 12 mil pessoas. Eles vivem nos municípios de Autazes, Careiro da Várzea, Careiro Castanho, Manaquiri, Borba e Nova Olinda do Norte.

Ao longo dos anos foram divididos pelo latifúndio, pela política e pela religião. Atualmente, não falam mais a língua, estão lutando para recuperar suas tradições e pela demarcação de suas terras. Em todas, praticamente, enfrentam a invasão de búfalos, que destroem suas roças, avançam nas comunidades e causam danos de toda sorte. Na aldeia São Félix, há dois anos, uma criança ficou bastante ferida por causa de choque elétrico. Um fazendeiro da localidade colocou uma cerca elétrica no interior da aldeia.

Mulheres não recuam

Na batalha pela garantia dos direitos e contra a discriminação, as mulheres tiveram uma atuação firme, que garantiu um desfecho digno para um povo cuja história é marcada por bravura na resistência contra a colonização. Enquanto alguns líderes relutavam em bloquear a rodovia, impedindo acesso de veículos, as mulheres não recuaram e fizeram o bloqueio acontecer. Sob calor intenso, com pouca água e sem alimentação, elas permaneceram e incentivavam os homens a seguir com a manifestação

Texto e fotos: J. Rosha/Cimi Norte I

Fonte: J. Rosha/Cimi Norte I
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