• 26/08/2016

    Relatório evidencia situações de confinamento e segregação racial de indígenas na região Sul


    Ato após assassinato de Vitor Kaingang, em Chapecó (SC). foto: Daiane Servo/diocese de Chapecó

    Em uma escola no Rio Grande do Sul, crianças indígenas são incentivadas a escrever redações sobre a origem de sua aldeia e as histórias de suas famílias. Semanas depois, as redações são utilizadas – sem que crianças ou pais soubessem – em uma audiência pública em outro município, como “provas” de que sua terra não seria tradicional. Em outro município, duas gestantes indígenas buscam assistência hospitalar para realizar o parto, não são atendidas e acabam perdendo seus bebês.

    Ambas as situações descritas acima – a primeira, na Terra Indígena Kandoia, do povo Kaingang, no município de Faxinalzinho (RS), e a segunda, na Terra Indígena Re Kuju (Campo do Meio), território Kaingang no município de Gentil (RS) – são apenas dois exemplos das situações de violência e discriminação que foram relatadas pelo Grupo de Trabalho (GT) sobre os direitos dos povos indígenas da região Sul do Brasil, instituído pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH).

    A versão final do relatório, aprovado no último dia 12 de agosto em reunião do CNDH, foi divulgada nesta quarta-feira (24), e contém relatos sobre as diversas violações verificadas e registradas pelo GT nas diligências realizadas entre os meses de março e junho de 2016.

    A vulnerabilidade de comunidades indígenas na região Sul do Brasil obteve visibilidade nacional quando, em 31 de dezembro de 2015, Vitor Pinto, criança Kaingang de apenas dois anos, foi morto em Imbituba (SC), no colo de sua mãe, que vendia artesanato no município – uma prática cultural e de subsistência que é criminalizada em muitas cidades.

    O GT realizou três missões, uma em cada estado da região Sul, onde os integrantes reuniram-se com autoridades e servidores públicos e visitaram comunidades indígenas e lideranças dos povos Kaingang, Guarani Mbya e Laklãnõ (Xokleng).

    No Rio Grande do Sul, o GT visitou as terras Kaingang de Re Kuju (Campo do Meio, município de Gentil), Rio dos Índios (município de Vicente Dutra), Kandoia (em Faxinalzinho) e a Terra Indígena Iraí (município de Iraí).

    Em Santa Catarina, o GT reuniu-se com lideranças Guarani Mbya, Kaingang e Laklãnõ (Xokleng) e visitou as terras indígenas Morro dos Cavalos, território Guarani Mbya localizado em Palhoça, e a Terra Indígena aldeia Kondá, no município de Chapecó.

    E no Paraná, última das três missões do GT, reuniões com lideranças foram realizadas nas aldeias Ocoy, Guaíra e Terra Roxa, terras Guarani Mbya nos municípios de São Miguel do Iguaçu e Guaíra, e na Terra Indígena Boa Vista, do povo Kaingang, no município de Laranjeiras do Sul.

    Leia o relatório completo


    Manifestação dos Kaingang da TI Rio dos Índios (RS), que, confinados, e aguardam regularização territorial há 30 anos

    Confinamento territorial

    O relatório centrou-se em dois aspectos centrais das violações cometidas contra os povos indígenas da região Sul do país: as violações de direitos territoriais e as violação da dignidade da pessoa humana, que incluem casos de segregação étnica, discriminação racial e exclusão social.

    O documento afirma que as similaridades nas violações contra os povos indígenas nos três estados sugere “um caráter padronizado assumido pelas formas de agressão, criminalização, negligência e negação de direitos dos povos indígenas, com a participação direta e indireta de autoridades locais e agentes públicos”.

    A violação do acesso destes povos a seus direitos territoriais é destacada como a causa principal da situação de vulnerabilidade vivenciada pelos indígenas em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná.

    As terras indígenas já regularizadas na região Sul do país, segundo dados da Fundação Nacional do Índio (Funai), correspondem a apenas 0,1% da extensão territorial dos estados de Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Atualmente, dos pelo menos 78,7 mil indígenas que vivem nesses três estados, pouco mais da metade – 39,4 mil – residem em terras indígenas regularizadas, segundo dados do IBGE citados no estudo.

    Há 21 terras indígenas em processo de regularização na região, que perfazem 88.712 hectares – somam, assim, outros 0,15% do território dos três estados. O relatório também aponta a existência de pelo menos outras 21 retomadas ou acampamentos no Rio Grande do Sul e 14 no Paraná, terras reivindicadas como tradicionais pelos indígenas mas ainda sem providências por parte do poder público.

    Apesar da baixa demanda territorial, os processos de regularização fundiária na região encontram-se, assim como no resto do país, estagnados: desde 2003, nenhuma demarcação de terra indígena é concluída no Sul do Brasil.

    Muitas das comunidades indígenas da região encontram-se impedidas de produzir alimentos para sua subsistência, em função da pouca disposição de terras. Na aldeia Ocoy, em Santa Catarina, por exemplo, cerca de 800 indígenas sobrevivem em apenas 230 hectares, espremidos entre fazendas de monocultura e um lago formado pelo barramento da Hidrelétrica de Itaipu. Na Terra Indígena (TI) Iraí, no Rio Grande do Sul, 350 pessoas vivem em 279 hectares; na TI Rio dos Índios, no mesmo estado, 46 famílias indígenas vivem em apenas 2 dos 715 hectares já declarados pelo Ministério da Justiça como de ocupação tradicional do povo Kaingang.

    Estas situações fazem com que os indígenas dependam de outras formas de subsistência, como a venda de artesanato nos centros urbanos próximos.


    foto: Daiane Servo/diocese de Chapecó

    Segregação e racismo

    Em 2013, obteve grande repercussão o discurso proferido pelos deputados federais Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Alceu Moreira (PMDB-RS) numa audiência com produtores rurais no município de Vicente Dutra (RS), no qual o primeiro desqualificava indígenas, quilombolas, gays e lésbicas como aquilo que “não presta” e o segundo incitava os agricultores a agirem de forma violenta contra os povos e comunidades indígenas.

    O relatório evidenciou que situações e discurso como estes são mais do que comuns na região e que, inclusive, diligências da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra a Funai e o Incra – em visitas que foram feitas sem aviso prévio às comunidades indígenas – serviram de plataforma para criminalizar e intimidar comunidades indígenas na região. O relatório destaca o “envolvimento indevido e irregular” de “agentes da Polícia Federal, do procurador do estado e de parlamentares membros da CPI Funai/Incra na questão fundiária envolvendo povos indígenas no RS”.

    Tais discursos e incitações, aliados à situação de confinamento e estagnação das demarcações de terras, favorecem os conflitos com colonos, agricultores e fazendeiros, acentuam as práticas de discriminação e segregação e geram consequências drásticas.

    Em muitos municípios, o GT identificou que, em decorrência desta situação, indígenas são discriminados e até expulsos das cidades, inviabilizando a venda de artesanato e fomentando situações de fome e miséria.

    São múltiplos também os casos de segregação em escolas, perseguição e grave desassistência à saúde. Em uma situação extrema de preconceito, crianças e adolescentes de Re Kuju (Campo do Meio, em Gentil/RS) relataram ao GT sofrer discriminação até na hora de se alimentar e escolher seus assentos na escola.

    Em Guaíra (PR), outra situação emblemática: entre 2012 e 2014, 150 indígenas foram demitidos de seus trabalhos, o que, segundo o relatório “prejudica ainda mais a segurança alimentar das comunidades, dada a situação de confinamento territorial”. Neste período, o GT aponta que o Ministério Público do Trabalho (MPT) identificou 200 paraguaios trazidos irregularmente para trabalhar nos postos de trabalho dos quais os indígenas foram demitidos.


    Primeira missão do GT, no estado do Rio Grande do Sul. foto: Plataforma Dhesca

    Criminalização de lideranças e comunidades

    Outro padrão verificado pelo GT entre as comunidades indígenas da região Sul é a constante criminalização de lideranças e comunidades indígenas inteiras e uma atuação parcial da Polícia Federal, inclusive interferindo na organização das comunidades indígenas e respaldando ações ilegais, como o arrendamento de terras.

    Na TI Boa Vista, por exemplo, em Laranjeiras do Sul (PR), a liderança da comunidade permaneceu mais de três meses preso em circunstâncias pouco claras, e as autoridades locais negam constantemente o registro de boletins de ocorrência com denúncias feitas pela comunidade, que vive ameaçada por fazendeiros. Na aldeia Kandoia (RS), após conflito que resultou na morte de dois não-indígenas, a comunidade inteira foi cerceada, todas as pessoas da comunidade tiveram sua saliva coletava e suas lideranças, sem nenhum evidência de participação nos crimes, foram presas por mais de um mês.


    Relatório foi aclamado em reunião do CNDH. foto: Tiago Miotto/assessoria de comunicação do Cimi

    Recomendações

    Diante das denúncias constatadas, o relatório enfatiza a urgência de que os dispositivos constitucionais e infraconstitucionais, nacionais e internacionais de proteção à vida dos povos indígenas sejam observados e acionados para conter a iminente escalada de violência na região.

    O documento apresenta como recomendação geral que o Estado brasileiro, representado pelo Governo Federal, reafirme seu compromisso com os procedimentos administrativos vigentes para a regularização fundiária de terras indígenas.

    Com relação à CPI da Funai e do INCRA, uma das recomendações é de que a Secretaria de Direitos Humanos (SDH), a Funai e as Comissões de Direitos Humanos da Câmara e do Senado atuem ativamente para monitorar, investigar e propor medidas para coibir e punir a atuação racista e discriminatória de parlamentares contra os povos indígenas e seus direitos no âmbito da CPI.

    Ainda a respeito das declarações racistas, de ódio e de incitação à violência promovidas por parlamentares e autoridades públicas, o relatório recomenda que a Câmara dos Deputados analise a possibilidade de quebra de decoro parlamentar dos deputados Alceu Moreira (PMDB/RS) e Luís Carlos Heinze (PP/RS), em razão de pronunciamentos públicos de incitação ao crime e incitação à violência contra indígenas.

    O relatório também faz uma série de recomendações relacionadas aos conflitos fundiários, criminalização, atentados à vida de lideranças indígenas, operações da Polícia Federal e atuação irregular de agentes federais; ao atendimento especial à Saúde Indígena; à educação específica diferenciada e bilíngue; aos direitos humanos das crianças e adolescentes indígenas; ao direito à moradia; à manutenção e fortalecimento da assistência e políticas indigenistas; e ao racismo, confinamento territorial e segregação dos povos indígenas.

    Na tarde de quarta-feira (24), o relatório foi entregue ao Ministro interino da Justiça, Alexandre de Moraes, em audiência que contou com a presença de lideranças indígenas da região.

    O documento foi enviado à relatora especial da ONU sobre Direitos dos Povos Indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, e deve ser incluído no relatório sobre sua visita ao Brasil, ocorrida em março de 2016. O relatório final de Tauli-Corpuz será apresentado em setembro em Genebra.

    Clique aqui para ler o relatório na íntegra.

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  • 26/08/2016

    Requerimento para nova CPI da Funai e Incra mira demarcações que somam mais de 52 mil indígenas

    Parlamentares ruralistas protocolaram um requerimento na Mesa Diretora da Câmara Federal solicitando a criação de uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para “investigar fatos relativos” à Fundação Nacional do Índio (Funai) e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A iniciativa era esperada pelo movimento indígena e entidades indigenistas.


    No requerimento, os ruralistas apontam fraudes na demarcação de 20 terras indígenas nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Bahia e Pará. No entanto, não apresentam sequer um fato determinado ou prova para tais fraudes – se restringiu a matérias jornalísticas do Canal Rural, imprensa associada e artigos de indivíduos que coadunam com as teses da CPI.

    São 52.268 indígenas, em números aproximados, diretamente na mira deste pedido de nova CPI, que compõem os povos Parakanã (PA), Kaingang, Guarani (Mbyá, Ñandeva, Kaiowá e Xeripá) – RS e MS -, Terena (MS), Xavante (MT), Pataxó (BA) e Tupinambá (BA). Os ruralistas pretendem acabar com 1.207.122 hectares em alguma fase do procedimento de demarcação – identificação, declaração, homologação e registro.

    A primeira versão da CPI da Funai e do Incra teve o tempo regimental encerrado no último dia 18 sem ao menos um relatório apresentado sobre o trabalho transcorrido durante oito meses, com três prorrogações aprovadas pela Mesa Diretora da Câmara Federal: duas com o então presidente Eduardo Cunha (PMDB/RJ) e uma pelo novo presidente, Rodrigo Maia (DEM/RJ). Todas as decisões foram monocráticas.

    Então presidida pelo ruralista Alceu Moreira (PMDB/RS), o mesmo que em 2013 incitou pequenos produtores a atos de violência contra indígenas, a CPI da Funai e do Incra esbarrou no Supremo Tribunal Federal (STF): o presidente da Corte Suprema, ministro Ricardo Lewandowski, não autorizou a quebra de sigilo fiscal de entidades que apoiam a causa indígena por entender que o ato fugia dos objetivos da CPI.

    "A CPI da Funai/Incra não ofereceu qualquer tipo de benefício à sociedade brasileira, mas serviu perfeitamente aos interesses dos ruralistas. Estes aproveitaram-se dos recursos públicos para visitar suas bases eleitorais, para amplificar o discurso do ódio e da violência contra os povos por meio de veículos de comunicação comerciais e estatais, obtendo visibilidade e promoção política e econômica a si próprios, a seus partidos, às corporações empresariais que os financiam e a seus candidatos a prefeito e vereadores na presente corrida eleitoral”, diz trecho de nota pública divulgada pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi).


    No lugar de fatos determinados, teses

    Em um juntado de notícias veiculadas pela imprensa sobre o desmantelamento do órgão indigenista estatal, os ruralistas buscam induzir duas teses como fatos determinados: a Funai foi desestruturada, e assim o trabalho do órgão incorre em erros; por outro lado, quando as organizações indigenistas buscam criticar a desestruturação do órgão, desejam na verdade influenciar num sentido fraudulento as demarcações.
     

    Se hoje os ruralistas atacam a senadora Gleisi Hoffman (PT/PR) na disputa envolvendo o golpe contra Dilma Rousseff, no requerimento a citam enquanto ministra da Casa Civil na ocasião em que Gleisi pediu ao Ministério da Justiça que suspendesse as demarcações em seu reduto político, o Paraná, com base em slides da Embrapa, onde se questionava inclusive se os Guarani eram brasileiros.

    O requerimento segue tratando como fato determinado para a posse da nova CPI desentendimentos entre o próprio governo. Um deles envolve a Terra Indígena Barra Velha/Monte Pascual, do povo Pataxó. Os ruralistas citam a oposição do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) à permanência dos Pataxó no território alegando que no local funciona um Parque Nacional de proteção ambiental.

    Já no caso da Terra Indígena Apyterewa, no Pará, do povo Parakanã, os ruralistas citam a morosidade do Incra em reassentar 412 famílias de pequenos agricultores que vivem dentro dos domínios Parakanã. As famílias estão em processo de reassentamento numa fazenda de 26 mil hectares, nas cercanias da terra indígena, confiscada pela Justiça Federal de Goiás por ter sido comprada com dinheiro do tráfico de drogas. 

    "Com a nova CPI, os ruralistas pretendem continuar queimando dinheiro público em tentativas requentadas e bizarras de criminalização de lideranças indígenas e de organizações da sociedade civil que apoiam a luta dos povos em defesa e pela implementação de seus direitos no Brasil”, pontua outro trecho da nota do Cimi.


    Criar o problema e vender a solução

    Um caso emblemático é citado como ‘fato determinado’ pelo requerimento da nova CPI: a Terra Indígena Marãiwatsédé, do povo Xavante, no Mato Grosso. Foram mais de 20 anos para a homologação da terra ser assinada Pela presidência da República. Depois disso, uma verdadeira operação de guerra foi articulada pelo governo federal para desintrusar posseiros e grileiros, que ano após ano foram trazidos de todo canto do país para ocupar pequenas porções do território.

    O relator da finada CPI da Funai e do Incra, o deputado ruralista Nilson Leitão (PSDB/MT), e um dos mentores do requerimento da nova CPI, é investigado pelo Ministério Público Federal (MPF) de ser o suporte para recentes invasões à Marãiwatsédé. em escutas telefônicas realizadas pela Polícia Federal, Leitão pede “30 escrituras para ele”, registradas irregularmente por posseiros em cartórios da região.

    Um dos líderes dos fazendeiros envolvidos preso pela PF, Sebastião Prado, afirmou nas mesmas escutas que seu contato em Brasília era Leitão, por sua vez amigo de juízes capazes de reverter decisões a favor dos posseiros, grileiros e fazendeiros. O trabalho da PF ocorreu depois que agentes foram mandados de volta à Marãiwatsédé para investigar invasões que vinham ocorrendo desde a desintrusão, concluída em 2013.

    No requerimento, os ruralistas citam Marãiwatsédé alegando que os conflitos entre indígenas e ‘produtores rurais’ segue mesmo após o Executivo homologar a terra. Ou seja, o próprio relator da CPI encerrada é acusado no STF, acumulando o oitavo processo na Corte Suprema, por gerar os conflitos na terra Xavante. O documento, por sinal, é costurado por situações variáveis, mas com essa mesma ordem.


    Condicionantes de Raposa Serra do Sol e Marco Temporal

    Outra manipulação flagrante do relatório envolve as 19 condicionantes à homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Em 2013, o STF as votou. Todas foram aprovadas pelos ministros, mas com uma determinação objetiva: nenhuma delas se vinculam às demais terras indígenas do país. Todavia, os ruralistas as usam como fatos determinados como desrespeitos observados no procedimento demarcatório das terras citadas. 

    O Marco Temporal, incluído nas condicionantes, é transmutado pelo requerimento nas revisões de demarcações – chamadas no documento de ampliações. Além de também restrita à Raposa Serra do Sol, terras indígenas demarcadas antes de 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, podem ser revistas para reparar erros anteriores inerentes aos momentos políticos, sobretudo o regime militar (1964-1985).

    Citam ainda reportagens envolvendo a venda de certidões indígenas, sem nenhuma relação com as demandas territoriais, e o recebimento em milhões de recursos públicos por parte de ONG’s, caso da Missão Evangélica Caioá, que em nada tem a ver com a demarcação de terras indígenas ou em ativismo político em defesa dela. Nesse sentido, o MPF acompanha e aciona judicialmente os envolvidos em ilícitos, como o próprio requerimento pontua.

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  • 26/08/2016

    Encontro PanAmazônico discute impactos de grandes projetos e economia verde na vida dos povos

    Reunidos de 23 a 25 de agosto deste ano de 2016, cerca de 120 pessoas, representantes de diversos movimentos, organizações da sociedade civil, pastorais, líderes de comunidades tradicionais e povos indígenas e líderes religiosos, se reuniram para análise da conjuntura e estudos sobre os grandes projetos desenvolvimentistas e seus impactos negativos na vida dessas comunidades, povos e ao meio ambiente.

    Ao final, um documento foi encaminhado às autoridades do Peru, Bolívia e Brasil, bem como para as sociedades destes países. Leia na íntegra:

    “Das margens do rio Mamoré nossas vozes ecoam em defesa da mãe Terra e das filhas e filhos da Terra!”


    Vindas e vindos do Amazonas, do Acre, da Bolívia, de Brasília, do Peru, do Mato Grosso e de Rondônia; das comunidades indígenas, das comunidades extrativistas (seringueiros, castanheiros e açaizeiros), das comunidades ribeirinhas, da agricultura familiar, das cidades, das comunidades de matriz africana, das comunidades campesinas, das veias dos rios: Madeira, Mamoré, Guaporé, Acre, Juruá, Purus, Madre de Dios, Abunã, Cabixi, Beni, Jamari, Machado, Juruena, Marmelo, São Miguel, Moa, Yata, Branco e Pimenta, todos violentados por projetos de infraestruturas (hidrelétricas, pequenas centrais hidrelétricas, termoelétricas, rodovias, hidrovias, mineração, pecuária, exploração madeireira, petrolífera, expansão da monocultura da soja, eucalipto, cana de açúcar, projetos de REDD, invasões de áreas protegidas, que culminam com ameaças e mortes de lideranças). Nos encontramos no II Encontro Sem Fronteiras – Bolivia, Brasil e Peru, na cidade de Guajará Mirim/RO, com o objetivo de trocar experiências de vida, fortalecer a luta e refletir os impactos desses grandes empreendimentos e as mudanças climáticas decorrentes da ação do sistema capitalista, por meio de empresas e governos, que não levam em conta a vida da Mãe Terra e de suas Filhas e Filhos.

    Motivadas e motivados pela espiritualidade dos povos da floresta, das águas, do campo e das cidades, em uma só voz denunciamos as várias faces desse desenvolvimento perverso, que produz o Ecocídio, o Etnocídio e o Genocídio da mãe terra e alimenta o capitalismo selvagem, mercantilizando os rios, as florestas, o ar e a terra mãe, expulsando as filhas e os filhos da terra em favor dos projetos, que produzem morte cultural, econômica, social e organizacional dos povos indígenas, comunidades tradicionais, campesinos, comunidades de matriz africana e comunidades urbanas.

    Reafirmamos nosso compromisso em Defesa da Vida, porque “nós somos guerreiras e guerreiros e não vamos deixar que matem a mãe Terra” e nos unimos em Aliança para impulsionar os processos de informação, de conscientização, de mobilização e de fortalecimento das práticas milenares, que defendem o Bem Viver como alternativa e solução para enfrentar as mudanças climáticas decorrentes deste modelo econômico excludente.

    A PanAmazônia precisa Viver para que a Mãe Terra – a Pacha Mama – possa garantir a vida sadia das atuais e futuras gerações.

    Guajará Mirim, 25 de Agosto de 2016.

    Fotos: Cimi Regional Rondônia

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  • 26/08/2016

    Homens armados invadem retomada em carro de empresa de segurança, atiram e ameaçam indígenas Gamela


    Três homens armados e trajando coletes à prova de bala invadiram a retomada realizada pelo povo Gamela no último dia 15, na região do município de Viana (MA). Conforme os Gamela, os homens chegaram numa caminhonete branca, se identificaram como policiais e chamaram pelas lideranças do povo.

    O veículo usado pelos invasores pertence a uma empresa chamada Ostensiva Segurança Privada LTDA., com sede em São José do Ribamar (MA). A apuração foi realizada pela assessoria jurídica da Comissão Pastoral da Terra (CPT) na Secretaria de Segurança Pública do Estado. Os homens não estavam uniformizados e não apresentaram qualquer identificação. 

    Desconfiados, os indígenas pediram para  que os três se retirassem da área. Houve discussão. Um dos indivíduos sacou uma pistola e atirou para o alto. O tumulto aumentou. Se o objetivo era dispersar os Gamela, não houve efeito. Os indígenas bloquearam a rodovia MA-014 em três pontos, nas proximidades da retomada, cercando os homens armados.

    Dois pneus da caminhonete terminaram furados, o que não impediu a fuga. A placa do veículo foi fotografada pelos Gamela, bem como os homens que se passavam por policiais. “Vendo que a situação ia ficar ruim para eles, foram embora avisando que não ficaria assim e que haveria derramamento de sangue”, conta um indígena Gamela.

    Antes do atentado, ocorrido no último domingo, 21, homens armados em duas motos passaram pela retomada e atiraram contra os Gamela. Durante essa semana, depois do ataque, o fato se repetiu. Os disparos, em mais de uma ocasião, partiram de uma cerâmica vizinha à retomada e que pertence ao prefeito de Matinha, Beto de Pixuta.

    Organizações visitam os Gamela
     

    Preocupados com a situação, um grupo formado por integrantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a Central Sindical Popular (CSP) Conlutas passaram os dias 23 e 24 junto aos Gamela na área retomada. Durante o dia, veículos passam pela retomada e os ocupantes xingavam os indígenas de bandidos.

    “Durante a madrugada, ouvimos disparos de arma de fogo. Os Gamela passam a noite sem dormir e podemos constatar o que estão passando durante esses dias”, diz a missionária indigenista do Cimi, Rosimeire Diniz. Na cidade, fazendeiros e políticos incitam a população contra os Gamela e as redes sociais têm sido um dos mecanismos.

    No facebook, moradores de Matinha e Viana compartilham a informação de que os Gamela pretendem invadir as casas nas cidades e incentivam ações violentas contra os indígenas – inclusive propondo uma união entre a polícia, os ditos proprietários e seguranças privados. Há mensagens racistas e pedindo “chumbo nesses vagabundos”.

    A comissão que visitou os Gamela constatou ainda que uma outra fazenda próximo ao local onde os indígenas estão serve de base para um bando que vem ameaçando os Gamela de invasão à retomada e expulsão forçada da aldeia. Nas duas últimas madrugadas os disparos de arma de fogo seguiram “como se fosse um aviso”.

    “O clima é tenso e os que se dizem proprietários das fazendas retomadas pelos Gamela articulam outros proprietários, inclusive de fazendas que não incidem sobre o território indígena, para incitar a população contra os indígenas. Em pesquisas, é fácil perceber que essa campanha ganha força”, explica a missionária do Cimi.

    Histórico  

    O território Gamela teve a primeira ‘demarcação’ em 1759, quando 14 mil hectares foram destinados ao povo por doação da Sesmaria, conforme Kum’tum Gamela. Durante o século 19, um outro aldeamento Gamela foi erguido fora da área doada pela Sesmaria. Estas são as duas referências do povo, além do relato dos mais velhos.

    “Atualmente o nosso processo de demarcação está paralisado na qualificação de demanda, que já foi feita”, afirma Kum’Tum. Por conta disso, os Gamela passaram a realizar retomadas, a última delas no dia 15 de agosto – semana passada. Entre agosto e dezembro de 2015, os Gamela retomaram outras três porções do território reivindicado.

    No total, sete áreas tradicionais foram retomadas pelos Gamela; povo composto por 1.500  indígenas. A área retomada dia 15 pelos Gamela, sob ataque, fica às margens do rio Piraí, sagrado para o povo. No rio vive João Piraí, Encantado protetor dos Gamela e das águas onde se reproduzem os peixes fonte de alimentação aos indígenas.

    Fotos: Povo Gamela

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  • 25/08/2016

    “Em luta pela Amazônia Viva”: no Acre, povos da Floresta reúnem-se para discutir ameaças da economia verde


    Enquanto grande parte do planeta presta atenção à discussão sobre mudanças climáticas e busca soluções para barrar o aquecimento global, diversos representantes de movimentos sociais e de comunidades ribeirinhas, extrativistas e indígenas dos povos Nukini, Jaminawa Arara, Jamamadi, Huni Kui, Ashaninka, Nawa, Madija (Kulina) e Jaminawa reuniram-se em Plácido de Castro, no Acre, para discutir esta mesma questão a partir de uma outra perspectiva, quase nunca abordada: as consequências que as políticas e o discurso da chamada “economia verde” trazem para os Povos da Floresta.

    Entre os dias 19 e 21 de agosto, dezenas de representantes dos povos da floresta do Acre debateram as implicações do discurso e das práticas do “mercado verde”, adotada como princípio pelo governo do estado do Acre e financiado por grandes empresas e governos do norte industrializado.

    Sob a justificativa de compensar suas emissões de carbono e com a finalidade prática de manter intocado o atual modelo de “desenvolvimento”, empresas e governos que são responsáveis por grande parte do carbono lançado à atmosfera financiam projetos REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), os quais incidem sobre os territórios dos povos indígenas, ribeirinhos e extrativistas.

    Em meio à confusão de nomes sustentáveis e enfrentando ainda problemas básicos – falta de assistência à saúde, não regularização territorial, morosidade na demarcação de terras indígenas, invasão por fazendeiros e sobreposição de assentamentos do Programa Terra Legal em terras indígenasm, entre outros – os povos da Amazônia denunciam as interferências dos projetos da economia verde em suas vidas e, especialmente, a perda de sua autonomia territorial.

    Também participaram e apoiaram o encontro representantes da Amigos da Terra Brasil, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), do Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais, da Fundação Rosa de Luxemburgo, da Plataforma Dhesca, dos Sindicatos dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Xapuri/AC e de Santarém/PA, além de pesquisadores e professores universitários.

    As violações de direitos humanos e territoriais dos projetos já implementados no estado – muitas delas registradas em relatório publicado em 2015 pela Plataforma Dhesca – também foram compartilhadas e discutidas. “Não querem reduzir a poluição, e sim, querem pagar para continuar contaminando”, afirma o documento produzido ao final do encontro.

    “Frente à ameaça do aquecimento global, estes projetos não somente significam falsas soluções, como aceleram o processo da destruição da vida na Terra, provocado pela premissa do capitalismo, baseado no crescimento ilimitado”, sintetiza o documento final do encontro de Plácido de Castro, que pode ser lido, abaixo, na íntegra:


    Nossa terra, nossa vida –  Povos das Florestas lutando pela Amazônia Viva

    Entre os dias 19 a 21 de agosto, dezenas de representantes de comunidades ribeirinhas, extrativistas e indígenas, dos povos Nukini, Jaminawa Arara, Jamamadi, Huni Kui, Ashaninka, Nawa, Madija (Kulina) e Jaminawa, se reuniram na Chácara Hapi Ran, em Plácido de Castro-AC, para discutir e refletir sobre as ameaças representadas pelos mega projetos inseridos na política da chamada “economia verde”, em especial, os projetos REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal).

    Durante três dias, após debates, exposições e atividades em grupo, os participantes tiraram as principais conclusões sobre as iniciativas de tais projetos do tipo REDD:

    • “Não querem reduzir a poluição, e sim, querem pagar para continuar contaminando”.

    • Implicam na transferência da responsabilidade da poluição do planeta para os povos da floresta

    • Vêm de cima para baixo, impossibilitando que as comunidades definam suas próprias prioridades e projetos para o futuro

    • Promovem o controle externo dos territórios, o que implica em perda da autonomia territorial para os povos que dependem da floresta

    • Os chamados “benefícios” para as áreas da educação e saúde, por exemplo, se revelam uma falácia na medida em que tratam de esconder ou minimizar a responsabilidade do governo em garantir o acesso destas comunidades a necessidades consideradas básicas, garantidas por Lei.

    • Frente à ameaça do aquecimento global, estes projetos não somente significam falsas soluções, como aceleram o processo da destruição da vida na Terra, provocado pela premissa do capitalismo, baseado no crescimento ilimitado

    A partir destas conclusões, o grupo propõe as seguintes recomendações e estratégicas para enfrentar esta grande ameaça:

    • A união de todos é o único caminho para enfrentar esta ameaça que se apresenta na forma de um monstro com muitas cabeças: desde a exploração de madeira, petróleo e gás, hidrelétricas, estradas, até os serviços ambientais e REDD

    • É necessária uma contraposição a este processo: as comunidades devem ditar as regras das políticas que as beneficie, definir seus projetos para o futuro e lutar pelos direitos constitucionais, tais como demarcação de Terras Indígenas e regularização fundiária.

    • Exigir a transparência no uso dos recursos recebidos por governos e Ongs em nome dos povos indígenas e comunidades tradicionais, como extrativistas, ribeirinhos e colonos.

    Plácido de Castro, 21 de agosto de 2016.


    fotos: Tiago Miotto/assessoria de comunicação do Cimi

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  • 24/08/2016

    Apib encaminha reivindicações e pede compromisso de novo presidente da Funai

    Com a perspectiva de que o novo presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) seja nomeado nas próximas semanas, a Apib encaminhou ao ministro da Justiça uma carta com reivindicações com as quais considera que o novo titular do órgão indigenista deve se comprometer e o perfil que ele precisa ter.

    Leia o texto na íntegra:

    Carta No. 51/APIB/2016

    Brasília – DF, 22 de agosto de 2016.

    Assunto: sobre a Presidência da FUNAI e outras demandas

    Ao Excelentíssimo Senhor Alexandre de Moraes, Ministro de Estado da Justiça e Cidadania

    Governo Federal, Brasília – DF

    Prezado Senhor:

    Considerando que compete a vossa excelência a nomeação do Presidente titular da Fundação Nacional do Índio (Funai), a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), atendendo a orientação de suas bases, vem por meio da presente externar à vossa excelência as considerações e demandas abaixo, que inclusive ultrapassam os limites do órgão indigenista, em razão de outras políticas públicas voltadas aos povos indígenas.

    Reafirmamos, em primeiro lugar, que a Constituição Federal de 1988 avançou significativamente no reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, principalmente no relacionado à posse de suas terras tradicionais e no reconhecimento das identidades culturais diferenciadas (Art. 231) – do caráter multiétnico e pluricultural do país – bem como no fortalecimento da cidadania e autonomia desses povos, ao lhes reconhecer que “são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses “ (Art. 232).

    Assim, a Constituição colocou fim ao integracionismo e à tutela. Esse novo ordenamento jurídico brasileiro foi posteriormente reiterado pelos tratados internacionais assinados pelo Brasil: Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas e, mais recentemente, a Declaração Americana dos Direitos dos Povos Indígenas. Instrumentos estes que asseguram aos povos indígenas a manutenção da dinâmica própria de seus usos e costumes por meio de uma política indigenista que garanta o respeito a seus direitos coletivos, a demarcação e proteção de suas terras e promova seu desenvolvimento econômico, social e cultural, em novos parâmetros de qualidades diferenciados.

     O novo presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) necessariamente deverá ter conhecimento e respeito pleno a esses princípios basilares de garantia dos direitos indígenas, longe do indigenismo integracionista, tutelar, paternalista ou autoritário, junto aos 305 povos indígenas que habitam as distintas regiões e biomas do país, falantes de 274 línguas indígenas diferentes.

    O Presidente da Funai, além de ter esse perfil, deverá também estar comprometido com as seguintes reivindicações dos povos e organizações indígenas:

    Prezar pelo cumprimento da responsabilidade institucional da Funai que envolve:

    1. Dar sequência aos processos de demarcação das terras indígenas, instituindo grupos de trabalho (GTs) para assegurar a identificação e delimitação dos territórios indígenas, a fim de serem declarados pelo Ministro da Justiça como terras tradicionais e homologadas pela Presidência da República.
    1. Cumprir devidamente o seu papel do órgão articulador e fiscalizador junto a outras instâncias governamentais que implementam políticas públicas voltadas aos povos indígenas, principalmente nas áreas da sustentabilidade, da cultura, da saúde e da educação escolar indígena específicas e diferenciadas. É importante registrar que os povos e organizações indígenas são contrários às propostas de municipalização da saúde indígena por serem ilegais e precarizarem mais ainda a atenção básica à saúde dos povos.
    1. Assegurar a participação dos povos e organizações indígenas na formulação, avaliação e implementação da política indigenista do Estado Brasileiro, considerando o conjunto das mais de 4.800 propostas apontadas pelas bases do movimento indígena durante a construção da Conferência Nacional de Política Indigenista, mas sobretudo as 216 recomendações aprovadas pelas lideranças indígenas participantes do evento, no final do ano de 2015

    Por fim, Senhor Ministro, a APIB reitera junto ao governo federal, por meio da vossa excelência, as seguintes reivindicações:

    1. Compromisso de implementar, com dotação orçamentária necessária, a Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial das Terras Indígenas (PNGATI).
    1. Incidência no Congresso Nacional para inviabilizar a aprovação de dezenas de iniciativas legislativas que tramitam no intuito de suprimir os direitos indígenas, principalmente territoriais, tal e como a PEC 215, assegurados pela Constituição Federal de 1988.
    1. Sensibilização do Supremo Tribunal Federal (STF) para que interpretações reducionistas do direito originário dos povos indígenas a suas terras, como a tese do “Marco Temporal”, que remete a ocupação tradicional ao ano de 1988, não sejam consolidadas.
    1. Tomar as medidas cabíveis para colocar fim à violência e criminalização crescentes contra povos, comunidades e lideranças indígenas, pelo simples fato de defenderem os seus territórios da voracidade de invasores de todo tipo (fazendeiros, madeireiros, pescadores ilegais, garimpeiros etc.) e inclusive de empreendimentos governamentais.

    O fortalecimento da Funai, com orçamento e quadro de servidores adequados, certamente possibilitará o cumprimento desta agenda, visando uma Política Indigenista contemporizada com o novo marco jurídico nacional e internacional, de reconhecimento, proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas.

    Sendo o que tínhamos a manifestar, subscrevemo-nos.

    Atenciosamente.

    Sonia Guajajara

    P / Coordenação Executiva da APIB

    Articulação dos Povos Indígenas do Brasil

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  • 24/08/2016

    Em guerra de baixa intensidade com madeireiros, Guarda Florestal Ka’apor segue aguardando por Funai, Ibama e PF

    Caminhões e um trator madeireiros retidos pela Guarda Florestal Ka’apor no interior da Terra Indígena Alto Turiaçu (no mapa), no Maranhão, seguem aguardando a apreensão e investigação das autoridades públicas. Conforme informou uma comissão de três lideranças Ka’apor ao Ministério Público Federal (MPF) nesta terça-feira, 23, Funai, Ibama e Polícia Federal ainda não foram ao acampamento onde os veículos estão retidos.

    “O perigo é dos madeireiros voltarem em bandos para recuperar os veículos e ter um conflito com nossa Guarda Florestal. Depois as autoridades precisam investigar de quem são os caminhões, o trator. Entregamos ao Ibama já as coordenadas geográficas do ramal onde está o acampamento da Guarda com os veículos”, explica uma liderança Ka’apor presente na reunião com o MPF que não identificamos por razões de segurança. 

    Às margens do rio Hola, os Ka’apor localizaram no final da semana passada mais um ramal madeireiro. Seguindo a pista no interior da mata, os indígenas da Guarda Florestal encontraram seis caminhões e um trator. Os homens que trabalhavam na derrubada das árvores fugiram. Com a descoberta deste novo ramal, o Conselho Ka’apor determinou a abertura da 8ª Área de Proteção Ka’apor dentro da T.I Alto Turiaçu.

    Já são 120 indígenas trabalhando diariamente na proteção da Alto Turiaçu com dias e dias rodando as fronteiras da terra indígena, de barco, carro e caminhada, com as áreas circunvizinhas. De acordo com o Conselho Ka’apor, a Funai e o Ibama, responsáveis pela proteção da terra por ser um patrimônio da União, têm demonstrado contrariedade com a ação da Guarda alegando que com ela a violência contra os Ka’apor aumentou. Na foto, caminhão com toras retiradas do interior da T.I Alto Turiaçu circula sem impedimentos na BR-316.

    “O território está cercado pelos indígenas sob a coordenação da Guarda Florestal Ka’apor”, afirma a liderança Ka’apor ouvida. O indígena explica que um dos principais pontos do trabalho neste momento está em evitar o início de focos de incêndio. “Justamente por isso precisamos de mais apoio das autoridades para a compra de combustível e alimentação para manter as equipes na mata. Se Funai e Ibama não podem fazer esse trabalho, então que nos forneçam apoio”, diz a liderança Ka’apor. 

     
    Com o combate aos madeireiros, desde 2008, cinco lideranças Ka’apor foram assassinadas, 14 indígenas agredidos (fisicamente e a tiros), duas aldeias foram invadidas e cerca de oito lideranças e 12 guardas florestais ameaçados ou marcados para morrer. A jovem Iraúna Ka’apor, de 14 anos, segue desaparecida depois de ser sequestrada da aldeia Axiguirendá por madeireiros, segundo o Conselho Ka’apor – cartazes com o rosto da jovem foram espalhados pelos municípios do entorno da T.I alto Turiaçu. Em 26 de abril deste ano, completou ainda um ano do assassinato do agente de saúde Eusébio Ka’apor durante uma emboscada – tática comum usada pelos madeireiros para retaliar a ação da Guarda Florestal Ka’apor.

    “Precisamos de uma ação de Estado aqui para não acontecer o que aconteceu em dezembro de 2015 (conflito entre indígenas e madeireiros). Os Ka’apor vão agir em defesa do povo e da terra indígena. Avisamos os órgãos públicos responsáveis. Não aprecem. Depois os indígenas são culpabilizados pelo Poder Público”, afirma um indigenista que atua junto aos Ka’apor em contato com a assessoria de comunicação do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

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  • 24/08/2016

    Povo Pataxó da T.I Comexatibá sofre atentado e ameaças de despejo forçado da aldeia Cahy

    O povo Pataxó da Terra Indígena Comexatibá, antiga Cahy-Pequi, na Bahia, sofreu nesta segunda-feira, 22, um novo atentado. Homens não identificados pelos indígenas atearam fogo em uma ponte que passa sobre o rio do Peixe Grande e única forma de se entrar e sair da aldeia Cahy. Durante a ação, os criminosos realizaram vários disparos de arma de fogo para assustar os indígenas. O terror imposto aos Pataxó do Prado, como são historicamente denominados, ocorre de forma intermitente há ao menos três anos.

    A ponte fica a 300 metros da aldeia e é a única forma dos indígenas se locomoverem para Cumuruxatiba, cidade do entorno. “Nesses dias estamos recebendo verias ameaças por parte de grupo que não deseja a presença do povo na região. Um senhor chamado G.F.G* chegou na aldeia Cahy dois dias antes de atearem fogo na ponte avisando que era o dono daquelas terras e a comunidade tinha que sair por bem ou por mal”, explica uma liderança Pataxó que não identificamos por motivos de segurança.

    G.F.G interpelou o cacique da aldeia afirmando que possuía documentos comprovando que duas áreas onde os Pataxó estão a ele pertence. O cacique pediu que o sujeito se retirasse da aldeia. G.F.G, diz a liderança Pataxó, é aliado de outros dois latifundiários – V.A.S e A.S.N – que há anos se opõem à ocupação tradicional dos indígenas da T.I Comexatibá e estão associados a atos de violência e intimidação contra as aldeias.

    Um desses latifundiários, V.A.S, também é apontado pelos Pataxó como influente junto ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Na última semana, denuncia a liderança indígena, o ICMBio derrubou malocas e uma escola na antiga aldeia Cahy, sobreposta pelo Parque Nacional do Descobrimento (PND), e V.A.S ajudou os servidores federais na demolição. Um dos filhos de V.A.S, conforme os Pataxó, mora dentro do PND. 

    “Peço atenção ao que está acontecendo com os Pataxó do TI Comexatibá, que estão sofrendo grande repressão por parte do ICMBio mesmo quando fora do PND. Peço às autoridade  competentes  que tomem providências”, diz a liderança Pataxó pedindo atenção da Fundação Nacional do Índio (Funai), Ministério Público Federal (MPF), Advocacia-Geral da União (AGU) e Secretaria de Direitos Humanos do Ministério da Justiça e Cidadania. 

    Reintegrações e demarcação

    O atentado desta segunda é mais um de uma série de pressões realizadas por empresários, fazendeiros, agentes do Estado e políticos contra a demarcação da T.I Comexatibá. Localizada no exato local da chegada das caravelas de Pedro Alvarez Cabral, há 516 anos, tendo ao fundo o Monte Pascoal, a área é assediada por empreendimentos turísticos, como resorts, hotéis e restaurantes, que se aproveitam da história do lugar e do PND, uma das poucas áreas de Mata Atlântica preservada na região.

    “Nunca saímos dessa região. Nos expulsaram das áreas mais próximas do mar, mas nos deslocamos para outras localidades mais afastadas. A partir do século XX a situação foi ficando pior porque as cidades cresceram, a Mata Atlântica foi sendo devastada e os Pataxó também, porque Pataxó e Mata Atlântica são uma coisa só. Moramos muito tempo nas cidades, quase como mendigos, e decidimos voltar para as nossas terras”, explica Mandy Pataxó da aldeia Alegria Nova.

    A partir dos anos 1960 e até o ano 2000 o crescimento da região ao redor da T.I Comexatibá é vertiginoso: surgem 21 municípios e a população salta para cerca de 1 milhão de habitantes. Dos 3 milhões de hectares que compõem a região onde está a T.I Comexatibá hoje, 2 milhões estão dominados por meia dúzia de empresas. O eucalipto toma conta de 800 mil hectares e o restante da área é formado por fazendas de gado e, mais ao sul, pela plantação de cana-de-açúcar. No entanto, não é apenas o interesse privado que atormenta a rotina dos Pataxó.

    Em julho do ano passado, o ICMBio ingressou com duas ações de reintegração. Os procuradores do Instituto, vinculados à AGU, alegavam que a Funai, também composta por procuradores da AGU, não teria publicado o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação do território Pataxó.

    A Justiça Federal concedeu as liminares para o despejo sob o argumento de que o órgão indigenista havia pactuado o relatório para ser publicado dois anos antes. Se o relatório fosse publicado, as liminares seriam suspensas. No dia marcado para as ações de despejo, o Ministério da Justiça publicou o relatório e os Pataxó respiraram aliviados – por pouco tempo.

    Este ano, o ICMBio entrou com outras três reintegrações. A alegação é de que os Pataxó estariam devastando a porção de Mata Atlântica preservada pelo PND. “O ICMBIO ignora, na sua base etnocêntrica, que, assim como na Amazônia, o etnoconhecimento dos indígenas sobre a natureza, desenvolvidos epistemicamente, os alçam a reconhecidos preservadores das florestas. Os Pataxó também demonstram isso”, aponta a professora Maria Giovanda Batista que coordena o Núcleo de Estudos e Pesquisas Interculturais e da Temática Indígena da Universidade do Estado da Bahia, em Teixeira de Freitas.

    Conforme a estudiosa, a cosmologia Pataxó está atrelada à Mata Atlântica: “Os nomes dos filhos são de pássaros deste bioma e, da mata, eles retiram suas indumentárias, além da alimentação, a mesa farta… não há possibilidade de sustentação do ecossistema Mata Atlântica sem a demarcação da terra Pataxó”, diz Maria Giovanda ao concluir: “Um ambiente não pode ser sustentável com a desterritorialização de 15 mil indígenas, cuja população de crianças chega a oito mil”. Desde 2000, com o início das retomadas Pataxó de aldeias da T.I Comexatibá, 20 mil árvores nativas da Mata Atlântica foram plantadas pelos indígenas.

    Se antes a desculpa era a falta do Relatório de Identificação, agora o ICMBio alega que os Pataxó não podem ficar em seu território tradicional sobreposto pelo PND porque a homologação da T.I Comexatiba não ocorreu. O assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Adelar Cupsinski alerta que conforme a Constituição federal uma terra para ser considerada indígena não precisa ser homologada: “Se trata de num direito originário e o procedimento demarcatório é um conjunto de atos administrativos que define o tamanho da terra, ou seja, do direito que já existe”.

    Aldeia Cahy sob ataque

    Em agosto de 2015, homens armados invadiram a aldeia Cahy, em Comexatiba, e queimaram uma maloca que continha artesanatos e objetos de uso tradicional e religioso. Em seguida, ocorreu uma série de ataques de pistoleiros e os indígenas chegaram ao ponto de esconder seus filhos em caixas d’água à noite, com medo dos tiros.

    No início deste ano, no dia 19 de janeiro, uma ação de reintegração de posse ocorrida na mesma aldeia Cahy surpreendeu dezenas de famílias. Além do posto de saúde e da escola, várias casas foram destruídas, muitas delas com os pertences dos indígenas em seu interior.

    Conforme o relato dos indígenas, aproximadamente 100 policiais federais, militares e civis, acompanhados de agentes da Companhia Independente de Policiamento Especializado/Mata Atlântica (Caema), chegaram à aldeia às sete horas da manhã, anunciando a reintegração de posse. “Eles deram um prazo para a gente retirar as coisas das casas, mas o prazo não foi suficiente. Mesmo assim, eles tocaram as patrolas por cima, com as coisas dentro mesmo”, afirma Xawã Pataxó, liderança da aldeia Cahy.

    “A reintegração aconteceu de surpresa, no dia em que a comunidade estava se organizando para a festa de São Sebastião. A escola estava sendo organizada para o início do ano letivo, e eles tiraram tudo de dentro e jogaram numa área quase um quilômetro longe da aldeia, de fogão a giz de cera”, relata a liderança.
     

    *A opção pelas iniciais se dá em decorrência da falta de investigações: por mais que os Pataxó apontem seus algozes, de forma exaustiva, não há nenhuma investigação em curso apurando as responsabilidades destes indivíduos.

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  • 23/08/2016

    Indígenas e quilombolas protestam no TRF-4 (RS) contra o Marco Temporal e são recebidos por desembargadora

    Um ato público contra o Marco Temporal tomou as ruas do centro de Porto Alegre (RS) nesta terça-feira, 23, e terminou no Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região com a entrega de um documento assinado por indígenas e quilombolas. Cerca de 200 Kaingang, Guarani Mbyá e quilombolas, representados por uma comissão de 20 integrantes, foram recebidos pela desembargadora Marga Ingo Tessler. A comissão de indígenas e quilombolas pediu que a 3ª e 4ª turmas do TRF-4 não tomem como referência o Marco Temporal para decidir sobre a ocupação de terras indígenas e quilombolas no estado.

    “O Marco temporal é uma interpretação que tem violado o direito dos povos indígenas. No decorrer do tempo, e é no tempo dos avós e bisavós, fomos expulsos com violência de nossas terras e confinados em reservas. Esse entendimento só reforça essa injustiça, e então reforçamos que nosso direito à terra é originário”, destaca Angélica Kaingang. Para a indígena, o Marco Temporal vai de encontro ao que a Constituição Federal assegura.

    A interpretação afirma que se não houver a comprovação de que determinada terra indígena reivindicada é alvo de processo judicial ou conflito fundiário desde 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição, ela não pode ser demarcada. Na Carta Magna, porém, o direito dos povos indígenas é à terra, sendo originário, ou seja, aqui eles viviam antes da criação do Estado Nacional e a demarcação é mero ato administrativo. 

    "O marco temporal da Constituição de 1988 pretende impor a necessidade da presença dos povos e comunidades na posse da terra em 1988 e caso nelas não estivessem deveriam estar postulando as terras judicialmente ou estarem em disputa física – o chamado renitente esbulho (SIC)”, diz a carta entregue pelos indígenas e quilombolas para a desembargadora Marga Ingo Tessler.

    Conforme o coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Sul, Roberto Liebgott, a desembargadora da 3ª Turma do TRF-4 afirmou que este é um entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) e “mostramos a ela que se trata de algo que não está definido pela Corte Suprema, inclusive com decisões contrárias ao argumento do Marco temporal. Tomando por base as condicionantes da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, onde o Marco Temporal aparece, cabe lembrar que a decisão do STF sobre elas não é vinculante às demais terras indígenas do Brasil”, diz Liebgott. O missionário indigenista lembra que os indígenas do Rio Grande do Sul foram confinados em oito reservas.

    "Com o Marco Temporal, nenhuma terra indígena será demarcada no estado. No caso dos Guarani, grupos do povo sempre circularam perto das terras tradicionais por uma característica continental do povo. Já os Kaingang foram retirados à força e só nas últimas décadas passaram a sair para retomar suas terras. A tese é um arranjo anti-indígena para vilipendiar o direito constitucional desses povos", explica Liebgott.
      

    Na carta entregue, indígenas e quilombolas argumentam contra o Marco Temporal: "Três elementos causam as principais controvérsias nos julgamentos de tribunais referentes às demarcações de terras e que tomam como base o marco temporal: há, nos julgados dos tribunais, insuficiente entendimento conceitual e não há convergência no entendimento da aplicação do marco temporal nos processos que envolvem a demarcação de terras tradicionalmente ocupadas por indígenas; há divergências entre os magistrados no tocante aos conceitos de direito indígena e quilombola à terra – posse, ancestralidade, usufruto e bens da União – e posse e propriedade oriundos do direito civil; há desconhecimento quanto a aplicabilidade do direito em relação às diferenças étnicas, culturais e ao fato dos povos terem sido considerados sujeitos de direitos individuais e coletivos – plenamente capazes, portanto (Art. 232 CF/1988)”.

    Indígenas e quilombolas expressaram à desembargadora que o Marco Temporal é parte de uma conjuntura de ataque aos direitos territoriais destes povos. "Projetos de lei e emendas à Constituição Federal são elaborados para aniquilar com qualquer possibilidade de que demarcações de terras sejam normatizadas pela Lei Maior do país. Só para se ter uma ideia da articulação e da força que se volta contra os povos indígenas no âmbito Legislativo, tramitam, hoje, no Congresso Nacional mais de 100 proposições que visam alterar artigos concernentes aos direitos indígenas e quilombolas”, diz um trecho da carta entregue.

    Um direito não pode limitar outro

    “Nos parece cruel esse marco temporal porque como a gente pode estar na terra se fomos expulsos dela? Sem contar que antes de 1988 éramos tutelados e a Funai estava nas mãos dos militares”, afirma Maninho Kaingang. A partir de 2014, passou a ser comum no Rio Grande do Sul campanhas anti-indígenas. Ações de parlamentares da bancada ruralista do estado, que motivaram manifestações públicas de racismo e preconceito, se tornaram comuns lançando pequenos agricultores contra indígenas, criminalizados pelas forças policiais. Nesse sentido, os indígenas frisaram para a desembargadora que não querem tomar direitos alheios.

    "A tradicionalidade da ocupação indígena e das ocupações quilombos não pode ser negada, valem os preceitos constitucionais de que estas terras – no caso das indígenas – são bens da União, que são inalienáveis e indisponíveis e que os direitos indígenas sobre elas são imprescritíveis (Art. 231, § 4º). Não é possível, portanto, imaginar que o erro cometido pelo Estado – ao disponibilizar para colonização e titular terras que não lhe pertenciam – não seja corrigido agora para evitar que ocorra uma injustiça contra os agricultores. É necessário, isso sim, exigir que o Estado responda por seus erros sem que se penalizem os agricultores, estes que, com seu suor, produzem alimentos”, dizem indígenas e quilombolas na carta ao TRF-4.

    No Sul, os povos e comunidades tradicionais estão atentas ao que ocorre na Corte Suprema. ”Ainda, no dia 11 de maio de 2016, acompanhamos o julgamento no STF do processo que tratou da demarcação da terra indígena Yvy Katu (MS 27939 – Rel. Min. Edson Fachin), dos índios Guarani Kaiowá, Mato Grosso do Sul. Naquele julgamento, o Pleno decidiu que o recurso de mandado de segurança constitui via inadequada para dirimir controvérsias relacionadas as demarcações de terras indígenas. Fica consignado naquele julgamento que a  decisão do STF acerca do caso Raposa Serra do Sol não se vincula a outros  casos similares, ou seja, se garantiu que os casos sejam analisados dentro de seu contexto histórico e das peculiaridades de cada povo”, diz a carta.

    As demarcações, conforme afirmam as lideranças, são as iniciativas mais eficazes do Estado para evitar os conflitos no campo, promover reparação e justiça, além de fortalecer a democracia com a garantia de direitos fundamentais. “Para tanto, pedimos a observância dos direitos constitucionais, especialmente relacionados aos seguintes temas: a observância do direito de consulta das comunidades indígenas antes do julgamento dos processos de seus interesses e o afastamento do chamado marco temporal”, solicitam os indígenas e quilombolas. As lideranças alegam que muitas vezes as decisões da Justiça Federal contra a ocupação tradicional são tomadas sem ouvir as aldeias e comunidades bem como sem as informações necessárias.

    Fotos: Roberto Liebgott/Cimi Regional Sul

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  • 23/08/2016

    Última semana para ajudar a Comissão Guarani Yvyrupa a realizar sua assembleia


    Entre os dias 12 e 16 de setembro de 2016, os Guarani das regiões sul e sudeste pretendem realizar a terceira edição da assembleia da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), na aldeia Tenondé Porã, zona sul do município de São Paulo. Para conseguir realizar o encontro, que deve reunir 200 lideranças Guarani de diversos estados das duas regiões mais ao sul do Brasil, a CGY lançou uma campanha de arrecadação coletiva, que vai somente até o dia 29 de agosto.

    A meta é atingir um financiamento de 15 mil reais, que servirão para garantir o transporte, a alimentação e a infraestrutura para a hospedagem dos parentes Guarani na aldeia Tenondé Porã. No momento, a campanha já teve 126 colaboradores e faltam apenas dois mil reais para que a meta seja atingida e o encontro seja viabilizado de forma coletiva.

    É possível fazer doações de diversos valores, e cada uma delas conta com uma recompensa diferente, como forma de gratidão – é possível receber fotos, artesanatos, camisetas, mapas e até livros, de acordo com a contribuição.

    Clique aqui para acessar o site e contribuir.

    Leia, abaixo, a descrição do evento feita pelos próprios Guarani da Comissão:

    Entre os dias 12 e 16 de setembro de 2016 realizaremos nossa assembleia da Comissão Guarani Yvyrupa na aldeia Tenondé Porã, zona sul do município de São Paulo. Pretendemos reunir mais de 200 parentes Guarani dos estados do sul e sudeste do Brasil. As assembleias da CGY são um momento muito importante para nós. A cada três anos, muitos de nossos caciques, lideranças e anciões se encontram para avaliarmos o momento político que vivemos e a atuação da CGY.

    Trata-se de um espaço para pensarmos coletivamente quais foram os principais erros e os principais acertos que cometemos nos últimos anos e o que precisamos mudar para que nossa luta se fortaleça ainda mais.

    A assembleia também é um importante espaço de formação, por conta do grande número de jovens lideranças que participam dela. Nesse ano pretendemos realizar oficinas sobre direito territorial e ambiental, assunto que temos achado cada vez mais importante compreender para garantir a conquista da demarcação e a preservação de nossas terras. Além disso, a assembleia é o momento no qual elegemos nossa Coordenação Geral, lideranças que serão os principais representantes da CGY em suas regiões, sendo responsáveis por articular as pautas e reivindicações locais com as do movimento indígena de todo o país.

    Como usaremos o dinheiro:

    Nossa organização hoje tem poucos recursos, o que impossibilita que realizemos nossa assembleia da forma como gostaríamos e ainda faz com que tenhamos que comprometer parte importante do nosso orçamento que deveria ser usado para outras atividades fundamentais como formações, reuniões de articulação política e manifestações ao longo de todo ano.

    Nossas comunidades estão espalhadas do Rio Grande do Sul até o Espírito Santo e para realizar a assembleia teremos gastos com o deslocamento das lideranças. Além disso, teremos gastos com a alimentação e hospedagem dos mais de 200 parentes durante os cinco dias de encontro. Para garantirmos uma boa recepção de todos, faremos ainda pequenas reformas de infraestrutura na aldeia Tenondé Porã, que irá sediar a assembleia.


    Sobre a CGY

    Yvyrupa é a expressão utilizada em guarani para designar a estrutura que sustenta o mundo terrestre, e para nós seu significado evoca o modo como sempre ocupamos o nosso território de maneira livre antes da chegada dos brancos, quando não existiam as fronteiras (municipais, estaduais e federais) que hoje separam nosso povo.

    Em uma grande assembléia, reunindo mais de 300 lideranças políticas e espirituais, realizada em novembro de 2006 na Terra Indígena Peguaoty, no município de Sete Barras/SP, fundamos a “Comissão Nacional de Terras Guarani Yvyrupa”, posteriormente nomeada apenas Comissão Guarani Yvyrupa (CGY).

    Desde então a CGY vem se consolidando como importante protagonista político do movimento indígena nacional, realizando suas assembléias anuais, e garantindo, pouco a pouco, vitórias importantes na longa luta pelo reconhecimento dos direitos territoriais de nosso povo.

    A forma de articulação interna da CGY apóia-se nos modos próprios de organização política guarani, não buscando sobrepujar a autoridade dos caciques e lideranças espirituais e sim fortalecê-los, e por isso não buscamos replicar a lógica do sistema representativo característico da política dos brancos.

    Nossa legitimidade advém do fato de que as comunidades Guarani encontram nas lideranças que compõem a coordenação da organização importantes mediadores, tradutores e assessores dos caciques e lideranças locais frente aos conflituosos e burocráticos processos de identificação e delimitação das terras indígenas guarani.

    Fotos: divulgação

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