• 29/06/2017

    O Supremo e a (não) demarcação de terras indígenas


    Foto: José Cruz/Agência Brasil

    Erika Yamada e Valéria Burity*, publicado em Justificando

    Na última semana (22/06), a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Carmen Lúcia, recebeu uma delegação de mulheres e crianças Guarani-Kaiowá que descreveram o quadro de fome e insegurança alimentar, racismo e violências que se impõem aos indígenas frente à falta de demarcação de suas terras. A ministra afirmou que o Judiciário está cada vez mais atento à realidade dos Povos Indígenas relacionada à falta de demarcação de suas terras e garantiu ajuda nos problemas que dependam de decisão jurídica. Mas o que o STF pode de fato fazer?

    Em meio à crise política do país e no atual contexto de ruptura democrática, entender o papel e do poder do STF é fundamental. Há alguns anos, temas centrais do Legislativo e do Executivo são deslocados por diferentes motivos para a Suprema Corte, que, ao julgar, muitas vezes termina por legislar, ou afirmar e redefinir políticas públicas no Brasil. No campo dos direitos humanos, alguns avanços podem ser assinalados especialmente no que se refere ao reconhecimento pelo STF de direitos de caráter individual.[1] No entanto, há pelo menos uma década a corte não avança e ainda faz retroceder o reconhecimento de direitos étnicos coletivos, como os direitos territoriais indígenas e quilombolas.

    O Supremo também foi responsável pela concessão de uma série de medidas liminares que passaram a impedir o acesso de Povos Indígenas a territórios devidamente identificados e demarcados nos termos da Constituição Federal.[2] A sinalização de esforços do Executivo – desde pelo menos 2012 – e do Legislativo – com a tramitação da PEC 215/00 e com a instalação da CPI sobre a Funai e o Incra – visando paralisar ou acabar com a demarcação de terras indígenas acirraram conflitos e contribuíram para a escalada de assassinatos, tal como documentado todos os anos no Mato Grosso do Sul. Essa pressão política e social chega apenas parcialmente ao Judiciário. A morosidade no STF, por exemplo, só reforçou a estratégia de “judicialização” contra os processos de demarcações de terras indígenas precarizando ainda mais o direito dos indígenas. A judicialização transformou-se então em justificativa confortável do Estado para a negação do direito à terra dos Povos Indígenas.

    No entanto, apesar de formalmente protegido, esse direito não tem sido implementado pelo Estado brasileiro e o STF tem sua parcela de responsabilidade. Por exemplo, ao não julgar o mérito das ações e manter os indígenas fora de suas terras, a corte contribuiu e contribui para a consumação de situações de fato (ex. ocupação não indígena com violenta degradação ambiental) que, de acordo com sua própria jurisprudência, seriam consideradas demandas improcedentes ou inconstitucionais.

    Enquanto isso, cada vez mais impedidos de acessar seus territórios para cultivar suas roças de subsistência, caçar, pescar, praticar plenamente seus rituais, Povos Indígenas vão assistindo à derradeira derrubada de suas matas e degradação de seu ambiente juntamente com a morte de lideranças. Em resistência, muitos mantiveram-se em ocupações de ínfimas parcelas de seus territórios para reivindicar seus direitos. Contra isso também, cresceram as judicializações e, durante o julgamento do caso da terra indígena Raposa Serra do Sol/RR, uma nova âncora de conforto para a negação de direitos é apresentada: a tese do marco temporal.

    A tese do marco temporal tem sido usada pela 2ª turma do STF e, basicamente, impõe a data da Constituição Federal (05/10/1988) como uma data limite para a constituição de um direito que, em sua natureza, é originário, ou seja, não depende de um ato ou fato constituinte.  Esse entendimento diverge do que diz, expressamente, o artigo 231 da Carta Magna e de tudo o que as constituições, anteriores a de 1988, previram sobre os direitos territoriais indígenas, desde 1934. Num processo de involução inconstitucional, de acordo com a tese, para alguns ministros do STF, o direito à terra só não se perderia se, ao tempo da promulgação da Constituição, os povos e grupos indígenas não estivessem em seu território tradicional devido a “renitente esbulho” praticado por não índios.

    O conceito que vem sendo dado a “renitente esbulho” completa o marco de perversidade, pois para caracterização desse instituto seria necessário que, em outubro de 1988, os povos originários estivessem pleiteando a posse da terra no Poder Judiciário, ou ainda, estivessem sofrendo violência física direta contra a ocupação. A tese do marco temporal não abarca, portanto, milhares de casos ocorridos em um período de ditadura militar em que os Povos Indígenas já haviam sido expulsos e não haviam ajuizado ações por inúmeros motivos, entre eles, a dificuldade de acesso à justiça que até hoje os afeta. Por exemplo, essas mesmas decisões do STF que aplicam o marco temporal são proferidas em processos que não contam com a participação das comunidades indígenas cujas terras tem seu reconhecimento anulado.

    Vale registrar que o relatório da Comissão Nacional da Verdade comprovou inúmeras violações de direitos sofridas por esses povos durante a ditadura e em outros períodos. Ou seja, a tese do marco temporal diverge de toda lógica inserida na Constituição  e, em especial, do artigo 51 dos Atos de Disposições Constitucionais Transitórias, que evidencia a intenção da Constituinte de não legitimar arbitrariedades do período ditatorial. De acordo com esse dispositivo, deveriam ser “revistos pelo Congresso Nacional, através de Comissão mista, nos três anos a contar da data da promulgação da Constituição, todas as doações, vendas e concessões de terras públicas com área superior a três mil hectares, realizadas no período de 1º de janeiro de 1962 a 31 de dezembro de 1987”.

    Apesar de ser apenas um entendimento minoritário do STF, a tese do marco temporal vem alterando de fato a vida dos Povos Indígenas por exemplo das terras Limão Verde, Guyraroká, e, mais recentemente Buriti, todas no Mato Grosso do Sul. A tese do marco temporal, que deveria ser aplicada apenas no caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol abriu precedentes no STF que já estão sendo replicados por outros juízes para fundamentar a expulsão dos indígenas de suas terras.


    Faixa deixada por manifestantes de etnias indígenas em gramado em frente ao Congresso Nacional, em maio de 2017. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

    Num efeito bola de neve, diante do aumento da judicialização, o STF passou a ser demandado para analisar em caráter de urgência ordens de despejo ou reintegrações de posse que colocam as comunidades indígenas em risco ainda mais grave. Nesses casos, sempre de maneira precária porque apenas sob a forma de suspensão de liminar, o STF tem conseguido garantir a manutenção das comunidades indígenas em parcelas ínfimas de seus territórios reivindicados.

    Para os Povos Indígenas, a terra é a base para o gozo de uma multiplicidade de direitos humanos, como, por exemplo, o direito humano à alimentação e nutrição adequadas. Além da disputa judicial, as últimas décadas foram marcadas pelo acelerado agravamento nas condições de sobrevivência dos Povos Indígenas no Brasil. Em 2005, por exemplo, a morte por desnutrição de mais de 20 crianças em apenas duas aldeias (Bororó e Jaguapiru), no Mato Grosso do Sul, chamou a atenção da imprensa nacional e colocou a exigência  de medidas do Estado brasileiro para reverter este quadro, especialmente no que se refere à garantia de territórios e acesso a recursos naturais necessários à sobrevivência física e cultural dos Guarani e Kaiowá. Em 2010, sem avançar com a demarcação das terras indígenas pelo governo federal, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) confirmou o alarmante índice de 32,11 mortes de crianças menores de 1 ano de idade para cada 1000 nascimentos nas aldeias indígenas do município de Dourados (MS), sendo que a média nacional era de 19 mortes para cada 1000 nascimentos.

    Em 2016, um estudo da Fian Brasil demonstrou a disparidade do direito humano à alimentação e à nutrição entre a média nacional (4,8% em 2013) e a do povo indígena Guarani e Kaiowá (28% em 2013). Além disso, 100% dos domicílios desse povo indígena pesquisados apresentaram algum grau de insegurança alimentar e nutricional contra a média de 22,6% para a população brasileira em geral. O estudo confirma que, além da situação de confinamento, as inseguranças jurídicas em processos que se arrastam no tempo para a definição jurídica do direito à terra dos Povos Indígenas e a violência impune praticada contra lideranças e comunidades indígenas comprometem ainda mais a soberania alimentar desses povos no Mato Grosso do Sul.

    De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a inação do Estado brasileiro com relação às mortes e violências contra indígenas, bem como com relação à falta de demarcação de terras indígenas, insere o caso dos Guarani e Kaiowá como um caso de atenção para prevenção de situações de genocídio, conforme indicadores da ONU para tal. Com similar preocupação, o Parlamento Europeu aprovou resolução sobre a situação do Povo Guarani e Kaiowá e, considerando, entre outros elementos “que estão em curso algumas iniciativas para a reforma, interpretação e aplicação da Constituição Federal do Brasil e que estas eventuais alterações podem pôr em risco os direitos dos indígenas reconhecidos pela Constituição Federal do Brasil”, apelou às autoridades brasileiras para que desenvolvam um plano de trabalho visando dar prioridade à conclusão da demarcação de todos os territórios reivindicados pelos Guarani-Kaiowá e criar as condições técnicas operacionais para o efeito, tendo em conta que muitos dos assassinatos se devem a represálias no contexto da reocupação de terras ancestrais. Porém, além disso, sem um justo e efetivo posicionamento do STF, não haverá medida do Executivo que resolva essa agravada situação.

    A relatora especial da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, Victoria Tauli Corpuz, após sua visita ao Brasil, em março de 2016, afirmou que “a concentração de poder econômico e político nas mãos de um pequeno segmento da sociedade brasileira contribui, historicamente, para a exploração de terras e recursos dos povos indígenas, sem consideração com seus direitos ou bem-estar. Durante sua visita, ela repetidamente ouviu relatos de que ganhos políticos e econômicos individuais têm contribuído para o racismo institucional, para a violação de direitos dos povos indígenas e para os conflitos.”[5]

    Resta saber se, nesse contexto, o STF conseguirá sair de sua tradicional zona de conforto para fazer valer os direitos constitucionais dos Povos Indígenas, abordando o mérito das questões sem legislar ou modificar a Constituição Federal. Afinal, a aplicação da tese do marco temporal pela corte adianta os efeitos da proposta de emenda constitucional (PEC 215), antes mesmo dela ser aprovada, e fecha os olhos do Judiciário para o fato de que: impedir que os Povos Indígenas vivam em suas terras é impedir a existência de suas culturas e coletividades. Isso tudo, em benefício de quem?

    Erika Yamada é Relatora de Direitos Humanos e Povos Indígenas da Plataforma Dhesca e Perita no Mecanismo de Peritos da ONU sobre Direitos dos Povos Indígenas. Valéria Burity é Secretária Geral da FIAN Brasil, advogada, trabalha com o tema de Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas desde 2002.

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  • 29/06/2017

    Nota das Pastorais do Campo: Por Direitos e Democracia, a Luta é Todo o Dia!

    A Articulação das Pastorais Sociais do Campo manifesta total apoio e adesão à Greve Geral e às manifestações públicas previstas para o dia 30 de junho de 2017, contra as Reformas Trabalhista e Previdenciária e pela realização de eleições diretas no Brasil.

    É preciso pôr um fim às ações do governo golpista, entreguista e corrupto do presidente Michel Temer. Além de destruir os direitos dos/as trabalhadores/as das cidades e do campo, o governo Temer está acuado por acusações escabrosas e recorrentes e sob o inteiro domínio dos interesses do capital, de modo especial os ligados ao agronegócio. As ações nefastas do governo Temer se traduzem na absoluta paralisação da demarcação das terras indígenas, no fim da titulação de terras quilombolas e no abandono da regularização dos territórios de outras comunidades tradicionais; na reversão do processo de reforma agrária, proposto por meio da MP 759/16; na entrega do território nacional ao capital estrangeiro, através do PL 4059/12; na flexibilização das leis ambientais proposta por meio do PL 3729/04; no aumento descontrolado do desmatamento; na ocorrência de chacinas, de assassinatos e da criminalização de camponeses, quilombolas, indígenas e de apoiadores às lutas sociais no campo.

    Diante desse contexto cada dia mais caótico, torna-se necessário e urgente a realização de amplas e permanentes mobilizações populares que se contraponham às agressões generalizadas em curso.

    Portanto, além de se somar e denunciar a violência de todos os tipos cometida contra as mulheres, a população negra, os povos e comunidades tradicionais e campesinos, junto com outras forças sociais, desde já, a Articulação das Pastorais Sociais do Campo assume especial compromisso de colaborar na organização e realização do 23° Grito dos Excluídos, no dia 07 de setembro, que propõe aos brasileiros e brasileiras a reflexão e a ação a partir do Tema: “Vida em Primeiro Lugar” e do Lema: “Por Direitos e Democracia, a Luta é Todo o Dia”.

    Traga a sua bandeira de luta, o seu grito por justiça, promova e junte-se às mobilizações na sua região.

    Brasília, DF, 28 de junho de 2017.

    Cáritas Brasileira
    Cimi – Conselho Indigenista Missionário
    CPP – Conselho Pastoral de Pescadores
    CPT – Comissão Pastora da Terra
    SPM – Serviço Pastoral do Migrante


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  • 28/06/2017

    Nota do Cimi Rondônia sobre o assassinato do indígena Manoel Quintino da Silva

    Por Cimi Rondônia

    O cenário indigenista vivido no estado de Rondônia, no noroeste do Mato Grosso e no sul do Amazonas é desolador. São constantes os retrocessos nos direitos indígenas, e às contínuas invasões dos territórios vêm agravando as ameaças e ataques contra os povos indígenas. Territórios indígenas são saqueados por grupos econômicos inescrupulosos, que segundo o site Rondônia ao Vivo, são denominados como “máfia de madeireiros”, que exploram ilegalmente as terras indígenas e na maioria das vezes esquentam a ilegalidade com Planos de Manejos no entorno de Unidades de Conservação e Terras Indígenas.

    A impunidade que reina na região fortalece a prática da exploração ilegal dos recursos naturais dos territórios sem que sejam tomadas providencias para coibir as ações ilícitas destes grupos econômicos. Lideranças são ameaçadas de morte e as comunidades vivem o terror de ver estes grupos agirem nas portas de suas casas, roubando as riquezas de seus filhos/as. Desde 2013 se fechou o cerco para reduzir os direitos indígenas garantidos constitucionalmente e aumentou os ataques contra os povos indígenas em todo o território nacional. O agravamento das violações de direitos humanos dos povos indígenas é evidente.

    A falta de medidas eficazes na fiscalização e proteção das terras indígenas tem servido para insuflar a prática de novas invasões de madeireiros, garimpeiros, grileiros loteamentos e apossamentos ilegais de terras indígenas já demarcadas. Essas são práticas que estão em curso especialmente nas terras indígenas Uru Eu Wau Wau, Paiter/ Suruí, Karitiana, Kaxarari, Karipuna, Rio Negro Ocaia, Lage Novo, Ricardo Franco/Guaporé, Sotéreo/Mamoré, Mequém e Tubarão Latundê. Todas essas violações de direitos foram denunciadas na audiência pública em 12 de junho de 2017, ocorrido na Assembleia Legislativa. Junto as invasões denunciou0se as ameaças de morte que sofrem lideranças e a criminalização das lutas sociais.

    Diante desta conjuntura de violação dos direitos e de impunidade uma vida mais é ceifada. Manoel Quintino da Silva Kaxarari (40) foi assassinado na última segunda-feira, dia 26/06, na Vila Marmelo, localizada na BR 364 entre Extrema de Rondônia e Vista Alegre do Abunã. Sua vida foi tirada com violência e sem poder se defender. “Dois homens encapuzados, que desceram de uma motocicleta e chamaram por Manoel, que ao atender, foi alvejado com tiro no rosto. O índio ainda correu em direção ao quarto, mas foi alcançado e recebeu vários disparos pelas costas. Uma criança também foi atingida de raspão pelos pistoleiros. A extração ilegal de madeiras da T.I. Kaxarari por uma ‘máfia de madeireiros’ pode ser o motivador do crime”. (Site Rondônia ao Vivo)

    Até quando vamos conviver com a violência contra os povos indígenas e a impunidade que impera no estado brasileiro?

    Nossa solidariedade ao Povo Kaxarari e a todos os povos que vivem a mesma situação de vulnerabilidade e violação de seus direitos. Mais uma vida tombou, e a justiça?

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  • 28/06/2017

    Cerca de 2 mil indígenas fecharam seis rodovias no RS contra nomeação de ruralista à Funai


    Fotos: Ivan Cesar Cima / Cimi Sul

    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

    Seis rodovias foram trancadas, em diferentes trechos, por cerca de 2 mil indígenas Kaingang e Guarani Mbya nesta terça-feira, 27, envolvendo sete municípios do Rio Grande do Sul. O protesto, que teve início pela manhã e terminou no final da tarde, é contra a nomeação de Lauriano Artico à coordenação da Fundação Nacional do Índio (Funai) de Passo Fundo e pela continuidade das demarcações de terras que se encontram paralisadas. Os indígenas exigem ainda uma audiência com o ministro da Justiça, Torquato Lorena Jardim, para tratar de tais assuntos.

    Aldeias de terras indígenas em Iraí fecharam a BR-386, da TI Campo do Meio a BR-285, da TI Cacique Doble a RS-343, da TI Votouro a RS-480, TI Ventara a RS-135 e da TI Serrinha a RS-342. Além de Iraí, os protestos incidiram nos municípios de Cacique Doble, Liberato Salgano, Vicente Dutra, Ronda Alta, Ventara e Gentil. A região é de presença política e latifundiária do deputado federal ruralista Alceu Moreira (PMDB/RS), principal causador do protesto desta terça. 

    No dia 24 de maio, representações Kaingang e Guarani Mbya foram à Funai de Passo Fundo para uma reunião envolvendo suas demandas. Todavia, se negaram a tratar com Artico por ter sido nomeado ao cargo como exigência do parlamentar ruralista aos gestores da Funai. A nomeação não chegou a ser uma surpresa, mas causou indignação entre os indígenas. De todo modo, as reivindicações foram encaminhadas pelos indígenas à Brasília, incluindo a exoneração do afilhado político do ruralista gaúcho. 

    Pouco mais de 30 dias depois, nenhuma resposta chegou aos indígenas. O trancamento das rodovias surge neste contexto. “A Funai é um órgão que olha pro povo indígena, pros seus direitos e colocar alguém indicado de político do agronegócio é um absurdo. Não vai olhar pra demarcação, mas pro interesse de quem quer as nossas terras. É covardia isso”, explica a liderança indígena Luís Salvador Kaingang, conhecido como Saci.

    Conforme o entendimento dos indígenas, o atual governo não deseja o diálogo. Ao contrário, os Kaingang e Guarani Mbya percebem uma total indiferença do Ministério da Justiça e da Funai às demandas apresentadas. “Então a decisão é de seguir com as mobilizações”, pontua Saci. Outros dois pontos foram destacados pelos indígenas durante a o dia de protestos: contra o sucateamento da Funai, acentuado por indicações de ruralistas ao órgão indigenista, e contra o marco temporal, uma interpretação que entende uma terra indígena sujeita a demarcação apenas quando ocupada ou disputada pelo povo que a reivindica no ato da promulgação da Constituição Federal, em  5 de outubro de 1988.

    Ex-presidente denunciou aparelhamento

    O ex-presidente exonerado da Funai, o pastor Antonio Costa, indicação do PSC em loteamento realizado por Michel Temer após o impeachment da presidente Dilma Rousseff, concedeu entrevista coletiva no último dia à frente do órgão indigenista, em 5 de maio. De forma inequívoca, teceu críticas a como o atual governo toca a política indigenista e denunciou o aparelhamento da Funai por indicações de parlamentares ruralistas, além de forte pressão institucional para que órgão não cumpra com suas obrigações constitucionais.

    Na ocasião da exoneração de Costa, o ministro da Justiça era o deputado federal ruralista Osmar Serraglio (PMDB/SC). O ex-presidente da Funai atribuiu o fato do parlamentar ter sido ministro apenas dos ruralistas impondo uma ditadura sobre o órgão indigenista. Sua demissão, inclusive, teria ocorrido por se opor a tais desmandos e indicações de pessoas alheias às questões indígenas e teleguiadas por interesses antagônicos ao que se destina a missão institucional da Funai. 

    “[Fui exonerado] Por não ter atendido o pedido do líder do governo André Moura, que queria colocar 20 pessoas na Funai que nunca viram índios em suas vidas. Estou sendo exonerado por ser honesto e não compactuar com o malfeito e por ser defensor da causa indígena diante de um ministro ruralista”, afirmou, à época, Antonio Costa. Nesta segunda (26), durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos do Senado, o ex-presidente da Funai foi questionado e reiterou as denúncias feitas quando foi exonerado.

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  • 28/06/2017

    Lideranças Terena cobram melhorias na saúde indígena junto a Sesai, em Brasília


    Segundo o Marco Antoônio Toccolini, a secretaria possui um orçamento capaz de realizar melhorias na saúde indígena. Foto: Guilherme Cavalli / Cimi

    Por Guilherme Cavalli, da Assessoria de Comunicação

    Na manhã de ontem, terça-feira (27), lideranças do povo Terena apresentaram ao secretário da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), Marco Antônio Toccolini, exigências de melhorias nas políticas de saúde específica para indígenas. A reunião, que aconteceu em Brasília (DF), trouxe as principais demandas apontadas pelas lideranças correspondentes a investimentos nas estruturas de saúde, materiais básicos e contratações de novos agentes. As reinvindicações foram sistematizadas em documento na 10ª Assembleia do Povo Terena – Hánaiti Ho’únevo Têrenoe que aconteceu na Aldeia Buriti, em Dois Irmãos do Buriti (MS), de 31 de maio a 3 de junho.

    Discordante da fala assumida pelo presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) na noite de segunda-feira (26), quando Franklimberg Ribeiro Freitas recebeu a delegação Terena e iniciou a reunião expondo o corte de 40% dos recursos do órgão indigenista, Marco Antônio Toccolini apontou problemas que não são financeiros. Segundo ele, a secretaria ligada ao Ministério da Saúde possui um orçamento capaz de realizar melhorias na saúde indígena. “A Sesai tem dinheiro. O que nos falta é uma gestão que saiba gerir o orçamento”.


    Foto: Guilherme Cavalli / Cimi

    Há quatro meses à frente da secretaria, Marco Antônio Toccolini recebeu os indígenas Terena e durante as três horas de reunião ressaltou a ineficiência da repartição em gerir os seus recursos. “Meu desafio é quebrar uma má organização e eu me sinto sozinho nisso. Essa estrutura e sua má gestão acaba criando confronto com os indígenas por não gerar resultado”, comentou Toccolini. “Precisamos rever os contratos e estudar o porquê de não estarem gerando efeitos e melhorias na saúde indígena. Temos muitos problemas de execução de contrato. Isso é falta de gestão”.

    Além da fragilidade no gerenciamento financeiro, Marcos Toccolini expôs a ineficiência estrutural que perpassa a organização da secretaria. “Quando as demandas chegam até o escritório em Brasília, deduzimos que são resultados do trabalho dos Conselhos Distritais Indígenas”. Os Condisis são responsáveis por fortalecer as ações de saúde nas comunidades ao ouvir as demandas dos povos. “Contudo, percebo pela fala de vocês que as gestões destes conselhos não funcionam”, salientou.

    “Dizem que têm dinheiro, mas ele não chega até as bases”

    “Nos sentimos abandonados. Não temos viaturas da saúde, nos polos básicos de saúde não tem remédio e aqui em Brasília dizem para gente que tem dinheiro. Lá na base o discurso é outro. Esse é o grande questionamento nosso”. Maurílio Pacheco, liderança Terena presente na reunião com o secretário da Sesai questionou o governista sobre a adequação dos recursos nas realidades indígenas. “É difícil entender essa situação. Lá na base a saúde indígena nunca funcionou e aqui dizem que tem dinheiro”, comentou indignado.

    Para Elson Albuquerce, da aldeia Cachoeirinha, localizada na cidade de Miranda (MS), o descaso com a saúde indígena é uma realidade em quase todas as aldeias do povo Terena. A liderança questionou o porquê da dificuldade em repassar os recursos. “Só pode ser que a burocracia e a corrupção seguram o dinheiro”, ressaltou. “Na reunião cansamos de ouvir que tem recurso, mas não chega lá na ponta”. Sobre a falta de medicamentos básicos, como analgésicos, a liderança diz ter que arcar com seus recursos. “Vamos até o posto com a receita passada pelo médico e não conseguimos os medicamentos nem para dor de cabeça. Precisamos comprar remédio com o próprio dinheiro”.
    O cacique Daniel Matchua, do povo Kadiweu, embasou a reenvidarão: “Quando consultamos com o médico e entregamos a receita para o responsável dizem pra gente que não tem dinheiro para o remédio. O índio tem que ir na farmácia e comprar”. Marcos Antônio Toccolini, em postura de insuficiência, disse estar indignado.

    Transportes insuficientes

    A dificuldade de transporte para conduzir os doentes foi a exigência recorrente de todos as lideranças. Além da insuficiência de automóveis para atender as demandas, os carros que realizam o translado dos indígenas até os postos de saúde e hospitais são alugados e funcionam somente nos dias de semana e em horário comercial. "Eu já cansei de levar as pessoas com meu carro na cidade em situação de doença. Isso não é realidade na minha aldeia. É em quase todas as aldeias Terena”, comenta Elson. “Dentro da comunidade não tem hora para ficar doente. As distâncias são longas. Como fazemos quando precisamos do carro de saúde e ele não existe?”.


    Maurílio Terena cobra transparência das verbas destinadas para as Terras Indígenas. Foto: Guilherme Cavalli / Cimi

    Após a afirmação de Marcos Antonio de que a Sesai conta com um orçamento suficiente para cumprir as demandas da saúde indígena, Daniel Matchua solicitou ao secretário que seja enviado as lideranças os valores reais que são investidos nas aldeias que integram a organização. “As estruturas estão ruins, lá falam que não tem condições para melhorar a saúde indígena, e aqui falam que tem verba. Precisamos saber os valores que vão para as aldeias destinados a saúde”.

    A reunião com o secretário da Sesai faz parte de um cronograma de reinvindicações que as lideranças Terena trazem aos órgãos federais, resultado da 10ª Assembleia do Povo Terena – Hánaiti Ho’únevo Têrenoe que aconteceu há aproximadamente um mês. O grupo de 50 indígenas aguarda confirmação para reuniões no Ministério da Justiça, na 6ª Câmara – Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (MPF) e no Supremo Tribunal Federal (STF).


    Na segunda-feira o presidente da Funai recebeu delegação Terena. Foto: Guilherme Cavalli / Cimi

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  • 28/06/2017

    II Feira Tradicional Munduruku: cultura e resistência na Mundurukânia


    Por Barbara Dias, do Cimi Norte 2, e Rosamaria Loures
    Fotos de Barbara Dias

    A II Feira Tradicional Munduruku começou no dia 25 de junho na aldeia Jacaré Velho, no município de Jacareacanga (PA), alto Tapajós, e perdurará até o dia 29 na praça do centro da cidade.

    A Feira de artesanatos e alimentos tradicionais do povo Munduruku foi pensada a partir do movimento de resistência Munduruku Ipereğ Ayũ, que é uma organização referência contra a construção de barragens no rio Tapajós e contra as violações de direitos humanos, sociais, ambientais e culturais.

    Articulada pelas mulheres indígenas também como um espaço para formação política de gestão e proteção territorial, a Feira Tradicional surge em um contexto importante na região do Tapajós. A construção e o fortalecimento de alternativas para a soberania alimentar, por parte dos Munduruku, se contrapõe ao neoextrativismo que vem avançando para a região e que tem como base a exploração desenfreada dos recursos naturais minerários e florestais, causando impactos sociais e ambientais imensuráveis.

    Mais do que movimentar a renda das aldeias, a Feira fortalece as relações interpessoais e age como um momento de reafirmação da cultura Munduruku.  Exemplo disso, foi o Caxiri, bebida oferecida durante a Feira, o mingau Manicuera, ambos não são comercializados por serem bebida e alimento tradicional do povo Munduruku.

    O Movimento Munduruku Ipereğ Ayũ divulgou uma carta apresentando a feira. Leia abaixo:


    II Feira Tradicional Munduruku: cultura e resistência na Mundurukânia

    Nossa II Feira Tradicional Munduruku, começou dia 25 de junho na aldeia Jacaré Velho no município de Jacareacanga, no rio Tapajós, fizemos dois dias de feira e conversas sobre a história do Movimento Ipereg Ayu e nossos desafios.
    Agora vamos pra cidade mostrar quem somos e o que fazemos na nossa terra vamos ficar até dia 29 de junho e dia 30 voltamos pras nossas aldeias.

    Temos muito artesanato e alimentos tradicionais. Nossa alimentação também é nossa resistência, assim aprendemos. Nós do Movimento Ipereğ Ayũ, sabemos que continua a ameaça da construção de barragens no nosso rio Idixidi (rio Tapajós) e contra nossos direitos. Queremos que vocês pariwat entendam, o nosso direito é o direito da floresta é o direito da nossa cultura. Vamos continuar lutando contra as leis de qualquer governo contra nós.

    Reunimos um pouco de tudo que fazemos: arte, comida e cantamos um pouco e nos divertimos muito Nossa Feira Tradicional é cheia de vida lá sabemos se o parente inventou algo novo ou se quando foi na floresta viu alguma novidade. Fazemos assim, por que esse é o nosso caminho, é esse o nosso jeito, aqui até vemos o sol de outro jeito e o céu tem outro nome pra nós. Isso tudo é o nosso plano de vida!

    Vamos explicar: Nosso Plano de Vida é construído para o território Munduruku, para os rios serem livres de barragens, as mulheres com sua força estão preocupadas. Já construíram o Plano e estão colocando em prática, como a nossa Feira Munduruku.

    A Feira é pra fortalecer nosso caminho. Sem buracos no chão da floresta e sem veneno no rio Idixidi. Também vai trazer dinheiro pras nossas famílias e ajudar as aldeias. Aqui nos fortalecemos, aqui somos Wuyjugu. Tomando caxiri, mingau de manicuera.

    Pra cá vieram artesãos, caciques, lideranças, puxadores, professores, cantores e cantoras, jovens e crianças, e até palhaços. Nosso agradecimento a Rádio Margarida, nossas crianças gostaram muito. E a Rosamaria Loures por começar a nos devolver sua pesquisa sobre o Movimento.

    Aqui na II Feira Tradicional Munduruku estamos aprendemos muito pra continuar na luta!

    Sawe!

    Movimento Ipereg Ayu
    Associação Da’uk
    Associação Pariri (Munduruku do território Dajé Kapap Eipi)





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  • 28/06/2017

    Encontro internacional reafirma compromisso pela proteção e afirmação dos direitos de povos indígenas isolados e de recente contato


    Participantes reunidos ao final do Encontro Olhares Sobre as Políticas de Proteção aos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato. Foto: Acervo CTI

    Representantes de diversos povos e organizações indígenas, além de organizações da sociedade civil do Brasil, Colômbia, Paraguai, Peru e Venezuela se reuniram em Brasília entre os dias 19 e 22 de junho no encontro internacional Olhares Sobre as Políticas de Proteção aos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato.

    O evento foi realizado pelo CTI em parceria com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB, com o objetivo de debater diferentes perspectivas indígenas sobre suas relações com povos isolados e de recente contato na bacia amazônica e Gran Chaco, com vistas à construção de subsídios e orientações para o fortalecimento das políticas públicas de proteção e afirmação de direitos desses povos/grupos.

    Apesar dos avanços no desenvolvimento de políticas de proteção de povos indígenas isolados e de recente contato verificados em alguns países da América do Sul nas últimas décadas, diversas ameaças aos direitos indígenas têm se intensificado nos últimos anos, com efeitos particularmente graves sobre estes povos.

    Resultado dos debates do encontro, a  Carta de Brasília – Manifesto em defesa dos povos indígenas isolados e de recente contato na Bacia Amazônica e Gran Chaco chama a atenção para o aumento exponencial da violência e discriminação contra os povos indígenas e sua relação direta com iniciativas dos poderes legislativo, executivo e judiciário. Alerta para a situação crítica em que se encontram os povos indígenas isolados e de recente contato na América do Sul e solicita à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e à ONU que atuem como observadores e no acompanhamento de políticas voltadas à proteção destes povos.

    O manifesto traz uma série de propostas e reafirma o compromisso conjunto dos povos indígenas e organizações presentes pela garantia de direitos e a proteção territorial desses povos. Reforça princípios básicos, como a intangibilidade de seus territórios e o respeito à sua autonomia, suas formas de relação com outros povos e sua opção pelo isolamento. Neste sentido, aponta a urgência do reconhecimento e regularização fundiária destes territórios na bacia amazônica e Gran Chaco, e também da implementação de medidas para a sua proteção, independente da conclusão desses processos.

    Também são apontados como princípios básicos o reconhecimento das políticas indígenas de proteção destes povos e a ampla participação indígena em espaços de coordenação, tomada de decisão e implementação de políticas públicas voltadas à proteção de povos isolados e de recente contato.

    Diversas propostas destacam a importância do envolvimento dos povos indígenas vizinhos de povos/grupos isolados para a sua proteção. O apoio e fortalecimento de estratégias comunitárias e planos de gestão territorial, a promoção de intercâmbios, de atividades de formação e de diálogos e acordos territoriais para o estabelecimento de ‘zonas tampão’ são alguns exemplos. A demanda por melhoria e intensificação do atendimento à saúde junto a povos e populações do entorno de território de isolados também é destacada. “O bem-estar dos povos isolados e de recente contato depende necessariamente do bem-estar das comunidades vizinhas”, afirma o manifesto.

    O documento demanda que os órgãos de Estado competentes identifiquem situações de iminentes contatos ou conflitos e dialoguem com as comunidades envolvidas para orientação mútua e elaboração conjunta de planos de contingência em cada caso específico, respeitando os protocolos e formas indígenas de manejar situações envolvendo povos isolados. Propõe, ainda, a elaboração de protocolos de consulta junto a povos de recente contato.

    Também enfatiza a necessidade de fortalecimento da Fundação Nacional do Índio (Funai) e de suas Frentes de Proteção Etnoambiental no Brasil, e de que a atuação do órgão se dê em parceria e com ampla participação dos povos indígenas, suas comunidades e organizações. Exige, ainda, que o governo colombiano decrete o marco normativo que estabelece a política para a proteção de povos isolados e de recente contato, fruto de processo de consulta junto a comunidades e organizações indígenas naquele país. E insta o Estado peruano a realizar processo similar.

    Diante do atual contexto vivido pelos povos indígenas em diferentes países da América do Sul, diversos trechos do documento reafirmam a necessidade de ampliação e fortalecimento de articulações e da cooperação técnica entre organizações indígenas e organizações da sociedade civil.

    Participaram do encontro Olhares sobre as Políticas de Proteção aos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato representantes dos povos Katxuyana, Wai Wai, Hexkaryana, Kahyana, Tunayana, Zo’é, Manchineri, Huni Kuin, Jaminawa, Apurinã, Jamamadi, Ashaninka, Guajajara, Awa Guajá, Kanamari, Kulina-Pano, Matsés, Matis, Marubo, Yanomami, Galibi-Marworno, Karipuna, Baré, Kamejeyá (Yucuna), Yaimajã (Tanimuca), Ide-masã (Macuna), Yine, Uwottüja (Piaroa) e Shipibo.

    O evento é uma das atividades do Projeto Proteção Etnoambiental de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato na Amazônia, realizado pelo CTI em parceria com a Funai e com apoio financeiro do Fundo Amazônia.

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  • 27/06/2017

    “Nossa missão está no Evangelho”, afirma dom Roque Paloschi


    "Se nós não gritarmos, as pedras vão gritar”. Foto: Augusta Eulália Ferreira

    Em nota divulgada pela Presidência da entidade na última quinta-feira (22), a Conferência dos Bispos do Brasil (CNBB) manifestou seu total apoio e solidariedade ao Cimi, alvo da Comissão Parlamentar de Inquérito denominada (CPI) da Funai e Incra, que indiciou mais de cem lideranças indígenas, antropólogos, procuradores da República e pessoas ligadas ao próprio organismo. No texto, aprovado pelo Conselho Permanente, os bispos ressaltam o aumento da violência no campo no período de funcionamento da CPI.

    Em entrevista a Rádio Vaticano, Dom Roque Paloschi, presidente do Cimi, agradeceu o ato da CNBB. "Na condição de Presidente do CIMI, louvar e bendizer a Deus por este gesto de ternura e de carinho que o Conselho Permanente da CNBB, com a Presidência da CNBB consequentemente, manifestou ao CIMI através da nota em defesa dos direitos indígenas e do trabalho que o CIMI realiza”, comentou.

    Ouça a entrevista completa no site da Rádio Vaticano

    “Não há nenhum fazendeiro indiciado na CPI. Somente pessoas que lutam pela vida dos povos indígenas”, afirma dom Leonardo Steiner, da CNBB

    O arcebispo de Porto Velho (RO) caracterizou a CPI como "parcial, unilateral e antidemocrática, na medida em que também alimentou a violência no campo ao longo do seu funcionamento". Sobre a conjuntura política que a Comissão Parlamentar foi instaurada, o religioso afirmou a continuidade do trabalho realizado pelos missionários e missionárias do Cimi na defesa dos direitos indígenas. "Nós continuamos caminhando na certeza de que não são estas ameaças da Bancada alimentada pelo agronegócio e pela corrupção que o mundo inteiro está acompanhando que vai amedrontar o sonho e a esperança dos povos indígenas e de seus aliados".

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  • 26/06/2017

    Em Pimenta Bueno (RO), II Encontro da Juventude Indígena reflete conjuntura política e direito dos povos tradicionais


    Com o tema “Juventude Indígena em luta pelos direitos garantidos pela Constituição Federal de 1988”, representantes dos povos Aikanã, Sabanê, Tawandê, Guarassugwe, Kampé, Guaratira, Mamaindê, Latundê, Arara, Kwazá, Migueleno, Gavião, Zoró, Kujubim, Tupari, Sakyrabiat se reuniram no último final de semana, de 23 a 25, para o II Encontro de Jovens Indígenas. A assembleia aconteceu em Pimenta Bueno, cidade localizada na região sul do estado de Rondônia.

    Debates sobre a conjuntura atual do país e a legislação indígena fizeram do encontro um espaço de formação para as lideranças jovens. Para Célio Arara, o final de semana significou um momento de construção de novos saberes. “Estarmos aqui reunidos contribuiu para realizar uma troca de saberes e de experiências e partilhas das histórias dos povos”, afirmou. Para os jovens Ademildo Sakyrabiat e Sabrina Arara momentos como esse contribuem na unificação das reinvindicações e atribuem as juventudes o protagonismo de transformação. “Os jovens antes de ser o futuro, são o presente dos povos indígenas, nós estamos lutando, realizado nossas artes, nossas festas”.

    Frei Volmir C. Bavaresco, em um resgate histórico das lutas dos povos indígena de Rondônia, recordou de encontros que firmaram a presença e identidade dos povos na região, como a reunião dos grandes caciques e tuxauas que deu início a luta organizada. “Os indígenas eram proibidos de realizar qualquer manifestação cultural, como falar a língua materna”, lembrou o missionário. Em seguida, Pedro Alcântara, expos uma análise de conjuntura nacional, regional e local, onde destacou os ataques violentos aos direitos fundamentais dos trabalhadores, estudantes e comunidades tradicionais pelo governo federal. “Existe em curso um apossamento e exploração das terras indígenas, quilombolas e demais comunidade tradicionais afim de mercantilizá-las; as violências praticadas por ruralistas contra as comunidades indígenas e a Crise política e institucional”, destacou o missionário do Cimi.

    O II Encontro de Jovens Indígenas contou com a participação de membros não indígenas da Pastoral da Juventude (PJ) e da Juventude Missionária (JM) em um intercâmbio cultural e de saberes. 

    Com informações do Cimi Rondônia


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  • 26/06/2017

    Recomendação do MPF pede que estado priorize contratação de professores indígenas em escolas indígenas


    A recomendação é para duas coordenadorias de educação do estado da Serrinha, mas se estende às demais escolas indígenas. Foto: Maia Rubim/Sul21

    Por Fernanda Canofre, da Sul 21

    Uma recomendação do Ministério Público Federal (MPF) de Passo Fundo, na região norte do Rio Grande do Sul, expedida no dia 16 de junho, pede que a Secretaria Estadual de Educação contrate professores indígenas ou candidatos indígenas aprovados em concursos, para lecionar nas escolas indígenas, ao invés de ampliar a carga horária de outros docentes. O documento é endereçado diretamente às 7ª e à 39ª Coordenadorias Regionais de Educação, responsáveis por escolas da região, incluindo a Escola Estadual Indígena de Ensino Médio Fág Kavá, localizada dentro da Terra Indígena de Serrinha, no município de Ronda Alta.

    O MPF afirma ter considerado a recomendação “necessária” depois de um inquérito civil apurar a ausência de professores na escola da Serrinha e ainda constatar que o Estado vinha aumentando a carga horária de não-indígenas, em detrimento de professores indígenas que já trabalhavam no local, em contrato temporário.

    Há dois anos, a falta de educadores indígenas fez com que Lúcia Fernanda Inácio Belfort Sales tirasse o filho de 12 anos de uma das escolas da Serrinha. Moradora da Terra Indígena, a kaingang disse que o mantinha no local por causa do ensino bilíngue, obrigatório em escolas indígenas por lei. Porém, depois de dois anos sem aulas de kaingang, ela decidiu matriculá-lo em uma escola da cidade. “A qualidade [da escola indígena] está muito prejudicada, se for pra estudar matemática e etc, deixo ele lá fora que as escolas estão muito melhores”, explica.

    Fernanda, que também é membro do Instituto Kaingang e foi a primeira indígena a receber título de mestre em Direito no país, conta que a situação se repete há anos e dois professores indígenas – de Inglês e História – estariam sendo preteridos para as vagas, enquanto professores não-indígenas ganham preferência. Ela lembra que em 2012, uma das escolas foi esvaziada porque diversos pais decidiram tirar os filhos da escola indígena e matriculá-los em outras instituições de ensino da região. A decisão gerou conflito com o então cacique do local, Antônio Ming, e alguns pais tiveram de recorrer à Justiça para que as crianças pudessem estudar fora da Terra Indígena.

    Segundo a Secretaria Estadual de Educação, o Rio Grande do Sul tem atualmente 6.469 alunos e 17 professores indígenas, em 17 coordenadorias de educação. A Seduc nega que o ensino de Kaingang esteja suspenso na Serrinha e diz que “vem se esforçando para se adaptar à legislação nacional”. Na escola que motivou a recomendação, dos 16 professores, nove são não-indígenas e sete são indígenas.

    Um dos problemas alegados pela Seduc seria que “não há professores indígenas com formação suficiente para atender todos os alunos”. “No último concurso público, realizado em 2013, apenas 43 professores da etnia foram aprovados. Diante da impossibilidade de contemplar todos os estudantes, os professores não-indígenas que ocupam as vagas são sempre supervisionados por professores índios para facilitar aos alunos a aprendizagem no seu próprio idioma”.

    Procurada pela reportagem, a diretora da escola Fág Kavá disse que estava “proibida de falar” e desligou o telefone em duas tentativas de contato. A assessora de educação indígena da 7ª Coordenadoria Regional de Educação, localizada em Passo Fundo, disse não poder se pronunciar sobre o assunto.

    Conflito de legislações é entrave

    A questão na escola da Serrinha parece apontar para um problema maior. O conflito entre duas legislações: o que diz a lei estadual sobre educação e contratação de servidores e o que está estipulado para a Legislação Escolar Indígena, do Ministério da Educação. A análise é do assessor do departamento pedagógico em educação indígena, da Secretaria de Educação, Rodrigo Venzon.

    “É comum que elas entrem em conflito, porque quando legisladores fazem leis convencionais, nunca pensam nos indígenas. Eles não lembram que existe educação indígena, fazem regras gerais, não contemplam questões de especificidades que estão previstas em convenções internacionais. Justamente por isso que nas conferências nacionais de educação indígena tem se falado em constituir um sistema próprio”, explica ele.

    Pela lei do Estado, para que um professor seja chamado para um cargo temporário é preciso que haja vaga mostrando que a turma não está sendo atendida. A contratação é encaminhada pelos próprios diretores das escolas nestes casos, mas a prioridade é sempre para professores indígenas. Venzon observa, no entanto, que “a formação superior dos indígenas tem sido muito restrita”. A maioria dos indígenas que se dedica à licenciatura acaba estudando Pedagogia, o que faz com que a presença de docentes indígenas em séries iniciais seja quase integral na rede indígena gerida pelo Estado gaúcho. Porém, em matérias que exigem licenciaturas específicas há defasagem.

    “O que a gente tem feito são termos de cooperação com as universidades, porque a oferta de formação superior indígena é uma atribuição da União. Mas estudantes indígenas a partir do quarto semestre de faculdade, já podem ter preferência no contrato”, explica Venzon.

    A Lei de Diretrizes Básicas da educação menciona a educação de povos indígenas em dois pontos, que focam no ensino bilíngue. O artigo 32 diz que embora a educação seja ministrada em Língua Portuguesa, as comunidades têm direito de utilizar suas línguas e processos de aprendizagem. Os artigos 78 e 79, do Ato das Disposições Gerais e Transitórias da Constituição de 1988, também falam de ensino integrado e colocam como dever do Estado oferecer “educação bilíngue e intercultural que (…) proporcione a oportunidade de recuperar suas memórias históricas e reafirmar suas identidades, dando lhes, também, acesso aos conhecimentos técnico científicos da sociedade nacional”. A LDB prevê ainda formação de corpo docente e material pedagógico especializado. O Plano Nacional de Educação (PNE), assinado em 2001, também traz diretrizes para a Educação Escolar Indígena.

    Como alguém que estudou em escola indígena e em escola privada, Fernanda diz que sabe bem a diferença entre as duas e que, para os filhos, quer a oportunidade de uma educação que considere e ampare sua própria cultura. “A diferença é a vivência que você tem de uma história oral que não foi contada. Nosso povo recebeu roupa envenenada com varíola e com doenças há poucas décadas, isso não está escrito nos livros que são mandados para gente. Ali está falando de Duque de Caxias, de Padre José de Anchieta. A vivência dos kaingang foi minada através de atitudes do próprio governo”.

    Além da recomendação às duas CRES que atendem à região da Terra Indígena da Serrinha, o MPF também pediu que as demais coordenadorias do estado sejam orientadas para adotar as mesmas providências.

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