• 25/07/2017

    Dez anos após declaração internacional, indígenas sofrem


    Membro da tribo Tariana, na região amazônica do Brasil. Foto: Julio Pantoja/Banco Mundial

    Em seu décimo aniversário, a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas enfrenta sérios obstáculos para proteger populações tradicionais em todo o mundo. Segundo a relatora especial da ONU para os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, a expansão das indústrias extrativistas, do agronegócio e dos “megaprojetos” de desenvolvimento e infraestrutura que invadem as reservas ainda permanecem como as principais ameaças para a maioria dos povos indígenas.

    Para ela, as consequências dos projetos que não obtêm consentimento livre informado dessas populações – e que ocorrem em diversos países, como o Brasil – continuam a resultar na expropriação de terras, despejos forçados, falta de acesso aos meios de subsistência, bem como na perda da cultura e de locais espirituais.

    “Estou particularmente preocupada com o crescente número de ataques contra líderes indígenas e membros da comunidade que procuram defender seus direitos sobre as terras. Os povos indígenas que tentam proteger seus direitos humanos fundamentais estão sendo ameaçados, presos, perseguidos e, nas piores situações, se tornam vítimas de execuções extrajudiciais”, afirmou Tauli-Corpuz.


    Relatora especial das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, durante reunião em Genebra em março. Foto: ONU/Jean-Marc Ferré

    Ela ressaltou que, apenas no ano passado, a ONU enviou comunicados manifestando preocupação sobre esse tipo de ataques em diversos países, a maioria na América do Sul – incluindo o Brasil. Em 2016, a relatora alertou que a situação dos povos indígenas era a mais grave desde a criação da Constituição brasileira de 1988.

    Em nível internacional, a Declaração reforçou a importância da implementação de medidas protetivas aos povos indígenas e suas terras na legislação de diversos países. Nações como Equador, Bolívia, El Salvador e Quênia revisaram suas constituições, incorporando medidas positivas. Já em Belize, Colômbia e México, a Declaração é usada como orientação de jurisprudência em tribunais superiores e constitucionais.

    A Declaração forneceu uma ferramenta inestimável para estimular os movimentos de povos indígenas nos níveis nacional e global, na busca por afirmar seus direitos inerentes por melhor capacitação”, acrescentou a relatora.

    No entanto, obstáculos significativos continuam a prejudicar a capacidade dos povos indígenas de desfrutarem de seus direitos estabelecidos no documento.

    “Enquanto um número crescente de países está adotando uma legislação que reconhece os direitos dos povos indígenas, lamentavelmente, muitas vezes há inconsistências flagrantes entre essa legislação e outras leis, principalmente as relativas aos investimentos (…) Essas incluem leis sobre atividades extrativistas, como mineração, bem como leis sobre silvicultura, agricultura e conservação”, ressaltou.

    Para ela, a exclusão de povos indígenas na concepção e implementação de leis e políticas que os afetam está vinculada a permanência da discriminação e do racismo. “Isso decorre do legado de leis e políticas coloniais racistas passadas que continuam a distorcer as percepções dos povos indígenas e desconsiderar sua governança e leis tradicionais.”

    A relatora observou também que a Declaração fornece orientações-chave sobre as medidas que os Estados precisam tomar para quebrar o ciclo da discriminação racial, permitindo que os povos indígenas desfrutem seus direitos humanos em pé de igualdade com a sociedade em geral.

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  • 25/07/2017

    Na 43ª Assembleia, Cimi Regional MT reflete atual conjuntura e denuncia violações nos direitos dos povos indígenas


    Grupo que particiou da 43 ª Assembleia do Cimi MT, um dos regionais mais antigos do organismo da CNBB

    O contexto traz grandes desafios. Direitos sociais são usurpados por um governo perpetrado por um grupo político representante dos setores da indústria, do agronegócio e do capital internacional. “O Poder Executivo, na ânsia de manter o apoio dos parlamentares aliados, cede a todas as pressões”. Diante a atual conjuntura, missionários e missionárias do Conselho Indigenistas Missionário (Cimi) do Regional Mato Grosso (MT) reafirmam em Assembleia o profetismo na missão junto aos povos indígenas. O encontro aconteceu na última semana, de 17 a 21, em Fátima de São Lourenço (MT), com o tema Espiritualidade e Profecia no desafio da Missão.

    A 43ª Assembleia do Cimi Regional Mato Grosso, um dos mais antigos do organismo pertencente a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), reuniu 35 missionários e missionárias. O encontro foi assessorado pelo secretário executivo do Cimi, Cleber Buzatto, e por Dom Juventino Kestering, bispo referencial do Cimi junto ao Regional Oeste II da CNBB.

    Entre os assuntos debatidos na Assembleia, esteve a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215 e o parecer elaborado pela Advocacia-Geral da União (AGU), que restringe as demarcações de Terras Indígenas (TI) as condicionantes estabelecidas no processo da TI Raposa Serra do Sol. Segundo o documento final, “estas medidas visam beneficiar o avanço do agronegócio sobre os territórios indígenas com o objetivo de garantir a exploração de suas riquezas para os grandes grupos econômicos”.

    Na conjuntura brasileira, em que a bancada ruralista, após a última eleição parlamentar, sente-se fortalecida para anular os direitos arduamente conquistados pelos povos indígenas, os missionários do Regional reassumiram o compromisso profético de denunciar as violações de direitos constitucionais. “Diante deste quadro alarmante de violações dos direitos constitucionais, nós, missionários e missionárias do CIMI MT, denunciamos a prepotência destes atos que põem em risco a existência dos povos indígenas como sociedades com direitos imemoriais reconhecidos em Convenções Internacionais das quais o Brasil é signatário”, descreve a carta final da Assembleia.


    Documento Final da 43ª Assembleia do Regional Mato Grosso

    Nós, missionários e missionárias do Cimi Regional Mato Grosso, juntamente com o Bispo referencial do Cimi junto ao Regional Oeste II da CNBB, D. Juventino Kestering, realizamos a nossa 43ª. Assembleia, celebrando a memória do martírio do Padre Rodolfo Lunkenbein e de Simão Bororo, assassinados em defesa da terra do povo Boe-Bororo. Com o tema Espiritualidade e Profecia no desafio da Missão, nossa Assembleia foi precedida por um retiro espiritual orientado por D. Erwin Kräutler, bispo emérito da Prelazia do Xingu, PA e ex-presidente do Cimi.

    Durante a Assembleia refletimos sobre os grandes desafios enfrentados pelos povos indígenas no atual contexto político em consequência do assalto ao poder perpetrado pelos grupos econômicos representados por setores da indústria, do agronegócio e pelo capital internacional. A bancada ruralista, após a última eleição parlamentar, está se sentindo fortalecida para anular os direitos arduamente conquistados pelos povos indígenas assegurados na Constituição Federal de 1988. A PEC 215 continua em tramitação, ameaçando retirar da Funai a competência relativa aos processos de identificação e de demarcação das terras indígenas, atribuindo-a ao Congresso Nacional.

    Por sua vez, o Poder Executivo, na ânsia de manter o apoio dos parlamentares aliados, cede a todas as pressões e reduz drasticamente o orçamento da Funai, impedindo-a de cumprir seu papel institucional de demarcação e proteção das terras indígenas. A Advocacia Geral da União, AGU, elaborou Parecer que obriga todos os órgãos da União a aplicarem, de forma vinculante, as condicionantes estabelecidas no processo da Terra Indígena Raposa Serra do Sol estendendo-as a todas as terras indígenas em estudo. Avalia-se que cerca de noventa por cento dos processos em andamento serão arquivados em decorrência deste Parecer.

    Estas medidas visam beneficiar o avanço do agronegócio sobre os territórios indígenas com o objetivo de garantir a exploração de suas riquezas para os grandes grupos econômicos. Em decorrência, os povos indígenas sofrem toda sorte de violências, como no caso dos Gamela, do Maranhão. Muitas lideranças indígenas são injustamente criminalizadas ou assassinadas, como aponta o Relatório de Violência Contra os Povos Indígenas, dados de 2015, publicado em 2016. Comissões Parlamentares de Inquérito foram instaladas contra os aliados destes povos, como a CPI do CIMI na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul e a CPI da Funai/Incra que tramitou na Câmara dos Deputados.  Nesta última, foi proposto o indiciamento de um grande número de pessoas sob alegações infundadas e caluniosas. A relação do Estado brasileiro tem sido denunciada e condenada em várias Cortes internacionais.

    Diante deste quadro alarmante de violações dos direitos constitucionais, nós, missionários e missionárias do CIMI MT, denunciamos a prepotência destes atos que põem em risco a existência dos povos indígenas como sociedades com direitos imemoriais reconhecidos em Convenções Internacionais das quais o Brasil é signatário.

    Inspirados na sabedoria, espiritualidade e resistência milenares dos povos indígenas, que consideram a vida um direito inalienável a todos os seres presentes na Mãe Terra, nos posicionamos contra este processo genocida que ameaça os povos originários e toda a humanidade. Os valores presentes nas cosmovisões destes povos nos ensinam que é possível um outro modo de nos relacionarmos com o ambiente, capaz de eliminar a ganância e a ambição desmedidas que produzem injustiças e desigualdade social e ameaçam a vida sobre a terra. Finalmente, invocamos as palavras do profeta, tão atuais para o momento que vivemos:
    “Suas obras são criminosas e suas mãos praticam a violência. Seus passos levam para o mal e eles correm para derramar sangue inocente. Seus planos são criminosos, sua estrada é feita de ruína e destruição… É por isso que o direito está longe de nós e a justiça nunca chega ao nosso alcance”. Isaías 59,6-9.

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  • 25/07/2017

    No Acre, lideranças indígenas e extrativistas são ameaçadas por se posicionarem contra políticas de “economia verde”


    Fotos: Tiago Miotto / Cimi

    Em encontro realizado na cidade de Xapuri (AC), de 26 a 28 de maio, povos da floresta criticaram as políticas de economia verde e demonstram preocupação com novos acordos discutidos entre o governo e a indústria de aviação. Na ocasião, representantes de cinco povos indígenas e de comunidades tradicionais que vivem e trabalham na floresta apresentaram denúncias de impactos de projetos de economia verde. O argumento é de que as políticas de compensação de carbono preveem restrições às comunidades, como limitações para práticas de agricultura, pesca, caça e uso de bens florestais.

    Por assegurarem a posição contra as ações que violentam o direito aos territórios tradicionais e que apresentam uma falsa solução à crise do clima, indígenas, seringueiros e outros participantes do encontro receberam constantes ameaças. “Muitas dessas lideranças passaram a ser pressionadas e ameaçadas pelos "donos do poder no Acre", denuncia a carta de moção de repúdio e solidariedade divulgado por entidades que trabalham com esses povos e comunidades. “Não há necessidade de colocar o futuro destes povos e comunidades em risco através de projetos questionáveis e nebulosos”.

    “Entendemos que, na medida em que a falência do modelo subjacente das políticas e dos projetos ambientais e climáticos em questão se torna obvia, sua defesa por parte daqueles que tem seus interesses particulares entrelaçados com tais políticas e projetos tende a se tornar cada vez mais repressiva e violenta”, sustenta a moção.

    O texto garante que as ações de afronta são “tentativa de intimidar ou censurar as pessoas e organizações que criticam e se opõem ás políticas ambientais e climáticas que vêm sendo implementadas pelo governo do Acre”. No Brasil, o Acre é considerado um laboratório para implementação de políticas baseadas na ideia de que é possível compensar poluição gerada em determinadas regiões – prevalentemente Europa e América do Norte – com a manutenção de florestas em outras regiões. A economia “verde” pretende ampliar os lucros das corporações, instituições financeiras e de outras organizações protagonistas dessa proposta, como empresas de consultoria e grandes ONGs preservacionistas.

    “Denunciamos e repudiamos especificamente as tentativas do governo do Acre e de organizações não governamentais ligadas a ele, de difamar tais críticos, ao alegar que os questionamentos por eles articulados inviabilizariam a chegada de recursos que poderiam beneficiar povos das florestas no Acre”, ressalta a nota.  

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    O documento exige posicionamento da Fundação Nacional do Índio, acusada pelas lideranças de intensificar as intimidações aos funcionários que colaboram com a posição assumida. “Exigimos ainda, que a FUNAI cumpra sua missão, que consiste em proteger e promover os direitos dos povos indígenas. Com tais intimidações, a FUNAI fere mais uma vez os direitos à livre expressão destes povos”.

    As propostas de compensação de carbono, que surgem em um contexto de negociações internacionais e em uma conjuntura nacional de crise, trazem restrições a comunidades ribeirinhas, indígenas, pequenos agricultores, extrativistas que são proibidos de cultivar seus espaços, de uso tradicional da mata. Violações culturais e sociais são impostas a esses grupos que se relacionam com a natureza de forma saudável e autônoma. Os mecanismos implantados pelos offsets florestais preveem restrições às comunidades tradicionais, como limitações para práticas de agricultura, pesca, caça e uso de bens florestais.

    Projetos, como o Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Evitados (REDD), propõem que empresas que poluem em outros continentes possam “compensar” os danos causados a natureza financiando iniciativas que, de maneira autoritária e sem consulta prévia das comunidades, instalam normas de relação com a terra. Além dos governos de países desenvolvidos, indústrias poluidoras são as principais financiadoras das iniciativas de economia verde. Não se pensa outro modelo de desenvolvimento, mais sustentável e auto gestor. As empresas continuam poluindo e desmatando. Com a “compra de créditos de carbono” são autorizadas a seguir sua lógica de mercado.

    Instituições que desejarem assinar a Moção de Repúdio e Solidariedade devem enviar e-mail para acre@wrm.org.uy até o dia 28 de julho. A moção de repúdio será encaminhada ao Governo do Acre, Ministério da Justiça, FUNAI/Brasília, Ministério Público Federal (MPF) do Acre, 6ª Câmara do MPF-Brasília, KFW/Governo da Alemanha.

    Leia o documento na íntegra abaixo:

    Moção de repúdio e solidariedade

    No período de 26 a 28 de maio do corrente, realizou-se em Xapuri no Acre, o Encontro “Os efeitos das políticas ambientais/climáticas para as populações tradicionais”. Além da publicação da Declaração de Xapuri, foram divulgados também vídeos com falas de lideranças indígenas, seringueiros e outros participantes do referido evento. Desde então, muitas dessas lideranças passaram a ser pressionadas e ameaçadas pelos "donos do poder no Acre".

    Indignados com mais essa agressão aos direitos desses povos e populações que vivem nas e das florestas, nós que participamos do referido Encontro e demais apoiadores das lutas desses povos e populações da Amazônia, manifestamos nosso veemente repúdio a toda e qualquer tentativa de intimidar ou censurar as pessoas e organizações que criticam e se opõem ás políticas ambientais e climáticas que vêm sendo implementadas pelo governo do Acre.

    Denunciamos e repudiamos especificamente as tentativas do governo do Acre e de organizações não governamentais ligadas a ele, de difamar tais críticos, ao alegar que os questionamentos por eles articulados inviabilizariam a chegada de recursos que poderiam beneficiar povos das florestas no Acre.  Sabemos que o governo possui suficientes recursos para resguardar os direitos e atender os legítimos interesses dos povos indígenas e comunidades locais. Não há necessidade de colocar o futuro destes povos e comunidades em risco através de projetos questionáveis e nebulosos. O governo deveria agir com transparência acerca da aplicação dos recursos que já recebeu através de tais projetos e com isto revelaria  quem são seus verdadeiros beneficiários.

    Exigimos que a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) pare de intimidar funcionários que participam nestas discussões e articulações da sociedade civil. Exigimos ainda, que a FUNAI cumpra sua missão, que consiste em proteger e promover os direitos dos povos indígenas. Com tais intimidações, a FUNAI fere mais uma vez os direitos à livre expressão destes povos.

    Entendemos que, na medida em que a falência do modelo subjacente das políticas e dos projetos ambientais e climáticos em questão se torna obvia, sua defesa por parte daqueles que tem seus interesses particulares entrelaçados com tais políticas e projetos tende a se tornar cada vez mais repressiva e violenta. Como já disse o filósofo Paul Valery: quem não pode atacar o argumento, ataca o argumentador.

    Não podemos tolerar a continuidade desses ataques! Por isso, reiteramos o nosso apoio à Declaração de Xapuri. Reafirmamos nossa solidariedade com todos e todas que sofrem ameaças ou represálias em consequência da firmeza de seu posicionamento político em defesa dos seus territórios contra a exploração incessante do capital: vocês não estão sozinhos!

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  • 24/07/2017

    Entidades denunciam estado de exceção imposto a indígenas e quilombolas por governo federal


    14° Acampamento Terra Livre – Abril de 2017. Foto: Mídia Ninja/MNI

    Por Guilherme Cavalli, da assessoria de comunicação

    A Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro, juntamente com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Sul e a Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas do Rio Grande do Sul divulgaram uma nota pública onde questionam o parecer chancelado pela Presidência da República na última quinta-feira (20).

    O governo federal adotou uma orientação da Advocacia-Geral da União (AGU) que determina a toda administração federal que julgue as demarcações de Terras Indígenas (TI) a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a TI Raposa-Serra do Sol (RR), de 2009. Entre os pontos mais inconstitucionais encontra-se o entrave de que só tem direito à terra os povos que estavam sob posse de seu território em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.

    “Essa nefasta articulação que tem como pano de fundo a sustentação política do atual (e ilegítimo) Presidente da República, objetivando, dentre outras medidas, negar autorização à persecução criminal do mesmo ante o Supremo Tribunal Federal pelo Parlamento”, redigem as instituições signatárias.

    O documento assinado pelas instituições afirma que o parecer “está sendo ardilosa e fraudulentamente utilizada pelo Chefe do Poder Executivo para ludibriar, enganar e corromper princípios constitucionais”. O texto assegura que essas são articulações do governo para “impedir que os direitos dos povos indígenas e quilombolas sejam efetivamente respeitados pelo Estado brasileiro, que, pela elite racista e classista que dele se apoderou, simplesmente advoga verdadeiro etnocídio”.

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    Temer negocia nossos direitos em troca de favores políticos, denuncia Conselho Indígena de Roraima
    MPF divulga nota pública contra retrocesso em demarcação de terras indígenas

    A partir da análise de conjuntura que denuncia o “compromisso do atual governo com a maximização da exploração capitalista”, a nota pública manifesta as artimanhas governamentais que se “valem de todos os expedientes ao alcance da engenharia jurídica de corte reacionário que permeia esse ilegítimo governo” para sustentar um governo ilegítimo e “ implantar verdadeiro estado de exceção em relação a segmentos sociais vulneráveis politicamente”.

    O governo de Michel Temer, segundo as entidades, deseja “surrupiar direitos dos indígenas e quilombolas, afrontando inclusive normativas internacionais as quais aderiu o Estado brasileiro”.

    O parecer foi assinado por Michel Temer com o objetivo de blindar seu governo – a ser julgado pela Câmara que decidirá se a acusação de corrupção seguirá ou não para o STF. No centro das negociações, como moeda de troca para garantir o apoio da bancada ruralista (41% dos parlamentares da Câmara), encontra-se a agenda ambientalista. Nas últimas duas semanas, Temer direcionou ao Congresso projetos que diminui o tamanho da Reserva do Jamanxim (PA) e aprovou o parecer que paralisa a demarcação das Terras Indígenas. A flexibilização de regras para licenciamento ambiental, a liberação de agrotóxicos e venda de terras para estrangeiros também se apresentam como futuras moedas de troca do peemedebista.

    “Se havia alguma dúvida sobre o desleixo com o ser humano por parte dos atuais governantes do Brasil, o ato em questão é sinal claro de que para além disso, há por parte dessa gente, o compromisso com a barbárie”, encerra a nota das entidades.

    Leia na íntegra:

    Nota para a Opinião Pública
    O governo federal e o estado de exceção em relação a indígenas e quilombolas.

    No dia 20 de julho de 2017, a par de uma clara e inequívoca articulação com a bancada de parlamentares ruralistas formada no Congresso brasileiro, a Presidência da República chancelou parecer  da Advocacia Geral da União que para além de limitar os direitos dos povos indígenas e quilombolas, avança no sentido de constranger o Supremo Tribunal Federal que pautou para o próximo mês de agosto o julgamento de ações que dizem diretamente a esses povos, ou seja, quanto ao direito, ou não, de terem assegurados seus ancestrais direitos à luz do que prevê e fixa a Constituição de 1988.

    Essa nefasta articulação que tem como pano de fundo a sustentação política do atual ( e ilegítimo) Presidente da República, objetivando, dentre outras medidas, negar autorização à persecução criminal do mesmo ante o Supremo Tribunal Federal pelo Parlamento, simplesmente afronta de modo ignóbil e direto a Constituição da República fazendo – o ato chancelado – tábua rasa dos preceitos fixados na Constituição Federal, arvorando-se  em uma decisão da Corte Suprema para uma caso específico e que não tem – e nunca teve – a extensão pretendida pelos setores do agronegócio e da mineração. Ou seja, uma decisão questionável e ainda em discussão tomada por parte do Supremo Tribunal Federal quando julgou, caso pontual (estamos nos referindo a o julgamento concernente à terra indígena Raposa Serra do Sol ), está sendo ardilosa e fraudulentamente utilizada pelo Chefe do Poder Executivo para ludibriar, enganar e corromper princípios constitucionais claros e taxativos de modo a manietar e impedir que os direitos dos povos indígenas e quilombolas sejam efetivamente respeitados pelo Estado brasileiro, que, pela elite racista e classista que dele se apoderou, simplesmente advoga verdadeiro etnocídio.

    Esse texto não permite por sua extensão que nos aprofundemos em detalhes técnicos e legais, mas inexorável e irretorquível que o compromisso do atual governo com a maximização da exploração capitalista não tem limites – o que comprovam outras contrarreformas sociais de autoria do mesmo governo e que vêm sendo arrancadas a fórceps de um Congresso quase que totalmente comprometido com o rentismo e a exploração dos debaixo, contando com forte apoio da mídia burguesa. Para tanto valem todos os expedientes ao alcance da engenharia jurídica de corte reacionário que permeia esse ilegítimo governo, ainda que isso signifique rasgar a Constituição da República e implantar verdadeiro estado de exceção em relação a segmentos sociais vulneráveis politicamente.

    A releitura, melhor, a interpretação casuísta e absolutamente descompassada   do conteúdo do disposto nos arts. 231 e 232 da Constituição da República, assim como do art.68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, sem embargo das regras regulamentares dessas balizas constitucionais, é meio e modo de, mais do que negar, surrupiar direitos dos indígenas e quilombolas, afrontando inclusive normativas internacionais as quais aderiu o Estado brasileiro.
    O ato de chancela do (ilegítimo) Presidente da República é típico do arbítrio e atentatório aos princípios civilizatórios inscritos no Preâmbulo da Constituição de 1988. Se havia alguma dúvida sobre o desleixo com o ser humano por parte dos atuais governantes do Brasil, o ato em questão é sinal claro de que para além disso, há por parte dessa gente, o compromisso com a barbárie.

    Rio de Janeiro, 22 de julho de 2017
    Comissão de Direitos Humanos – OAB/RJ
    Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas/RS
    Conselho Indigenista Missionário – Regional Sul

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  • 21/07/2017

    Ka’apor e Gamela divulgam cartas em apoio aos Munduruku


    Mulheres Munduruku estiveram à frente da ocupação da UHE São Manoel. Foto: Juliana Rosa Pesqueira/Fórum Teles Pires

    Matéria atualizada em 24/07/2017 às 15:00

    O Conselho de Gestão Ka’apor e o povo Gamela, ambos do Maranhão, divulgaram cartas em apoio aos Munduruku que na última semana ocuparam o canteiro de obras da usina hidrelétrica (UHE) São Manoel, na divisa do Pará com o Mato Grosso. “Não pudemos esta ai, mas estamos com vocês aqui”, afirma a carta dos Ka’apor. “Os direitos nossos a gente não vende e nem negocia, a gente conquista em movimento e com luta com nossos parentes”.

    Há mais de 500 anos o projeto colonizador tem encharcado o chão sagrado com o nosso sangue, mas não conseguiu nos exterminar, manifestam-se os Gamela, vítimas recentes de um brutal ataque que deixou 22 indígenas feridos, cinco dos quais por armas de fogo. Manifestamos nossa solidariedade à luta de vocês contra a destruição dos seus rios, florestas, Lugares Sagrados. Não podemos ficar calados. Vamos pedir a força dos nossos Encantados para guiarem e protegerem vocês na luta que estão fazendo”, prosseguem.

    A ocupação iniciou na madrugada de sábado para domingo (16), e durou até quarta-feira (19), quando os indígenas seguiram para Alta Floresta, onde foram buscar as urnas funerárias que as empresas responsáveis pela construção da hidrelétrica haviam removido para a construção da obra, sem nunca devolvê-las aos Munduruku.

    “A ocupação acaba aqui, mas a luta continua. A gente não tá saindo porque tinha que sair ou porque a empresa mandou não. É porque a gente está indo atrás dessas urnas”, afirmou Kabaiwun Munduruku, uma das lideranças do movimento Ipereg Ayu.

    Os indígenas deixaram o canteiro de obras depois de uma reunião realizada com a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Ministério Público Federal (MPF) e os representantes das empresas responsáveis pelas Usinas Hidrelétricas de São Manoel e Teles Pires (leia dossiê sobre violações de direitos na construção desses empreendimentos).

    Os Munduruku exigem que a Funai dê um parecer contrário à concessão de Licença de Operação à UHE São Manoel, e também cobraram a publicação da Portaria Declaratória da Terra Indígena (TI) Sawre Muybu e a identificação e delimitação das TIs Sawre Jaybu e Sawre Apompu até outubro de 2017.

    A UHE São Manoel é uma entre cerca de 140 projetos de geração de energia previstos na bacia do Tapajós, em que pelo menos 900 mil pessoas serão impactadas, conforme destacou uma carta de organizações da sociedade civil em apoio aos Munduruku. Além da remoção das urnas funerárias, os Munduruku também denunciam a destruição da corredeiras de Sete Quedas do rio Teles Pires, um local sagrado sobre o qual foi construída a UHE Teles Pires, já em funcionamento.

    Outro aspecto denunciado pelos Munduruku é a ausência de consulta aos povos indígenas impactados a respeito da realização desses empreendimentos, conforme determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). No final de 2016, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região ordenou a realização de consulta prévia, livre e informada com os povos indígenas Kayabi, Munduruku e Apiaká atingidos pela obra da UHE Teles Pires.

    Leia as cartas de solidariedade abaixo ou acesse a carta dos Ka’apor em pdf:

    Território Indígena Alto Turiaçu – Maranhão
    Povo Ka’apor
    Jumu’e ha renda Keruhu – Centro de Formação Saberes Ka’apor
    Tuxa – Conselho de Gestão Ka’apor

    Nossos braços e nossas mãos aos parentes, guerreiros e guerreiras do Movimento Ipereg Ayu

    Parentes Munduruku. Não pudemos esta ai, mas estamos com vocês aqui. Vocês mostraram esses dias que só com mobilização e organização a gente vence. Que os direitos nossos a gente não vende e nem negocia, a gente conquista em movimento e com luta com nossos parentes.

    A gente esta acompanhando os esforços, sacrifícios e luta de vocês para chegar até essas barragens que destroem os lugares sagrados em nome do dinheiro, do lucro dos ricos para gerar energia para os ricos. Só vocês conhecem o que os espíritos dos rios e da floresta tem a dizer pra vocês. Assim nós aqui. Só nós sabemos o que os espíritos da floresta, dos rios, da terra tem pra dizer pra nós.

    Os Pariwat, os Karai nunca vão saber, entender o sentido de nossa luta, de nossa vida. Eles podem atacar e querer derrubar a nossa organização e luta, mas não vão conseguir. Por isso parente, a gente unidos, tem que continuar se reunindo, se organizando e lutando do nosso jeito pelos nossos projetos de vida. Nosso futuro não está na cidade, nem venda de madeira e estacas, nem pastos, nem roças grandes, nem agronegócio, nem garimpo, nem barragem, nem projetos do governo. Nossa floresta, nossos rios, nossa terra são sagrados para nós. O mais importante agora é nossos Planos de Vida que vão guiar nossos passos para o bem viver nos nossos territórios.

    Piranta ha johu Katu!


    Conselho de Gestão Ka’apor
    Guerreiros da Floresta Ka’apor

    Carta dos Gamela:

    Aos Guerreiros e Guerreiras Munduruku

    Guerreiras e guerreiros, acompanhamos a luta de vocês em defesa do Território Sagrado contra a violência do Estado brasileiro e das empresas/empresários que avançam com suas ações genocidas, pondo em grave risco a vida de vocês, das florestas, das águas, dos animais… e todo o planeta.

    Nós também estamos sendo atacados – o último ataque ocorreu em 30 de abril deste ano e deixou vários gravemente feridos à bala e com facões – nosso povo está ameaçado de morte por causa da luta em defesa do Território dos nossos Encantados e das nossas futuras gerações, contudo estamos de pé.

    Há mais de 500 anos o projeto colonizador tem encharcado o chão sagrado com o nosso sangue, mas não conseguiu nos exterminar. Nossos parentes semeados se tornam árvores que crescem, florescem e espalham sementes.
    Parentes, mais do que nunca precisamos fortalecer a aliança entre nós e com as comunidades quilombolas, ribeirinhos, camponeses, das periferias das cidades… para defender a vida.

    Manifestamos nossa SOLIDARIEDADE à luta de vocês contra a destruição dos seus rios, florestas, Lugares Sagrados. Não podemos ficar calados. Vamos pedir a força dos nossos Encantados para guiarem e protegerem vocês na luta que estão fazendo.

    Um abraço solidário

    Povo Akroá Gamella
    Viana (MA), 19 de julho de 2017

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  • 21/07/2017

    Temer negocia nossos direitos em troca de favores políticos, denuncia Conselho Indígena de Roraima


    Foto: Beto Barata (PR)

    Por Guilherme Cavalli, assessoria de comunicação

    Em carta direcionada ao procurador geral da república, Rodrigo Janot, Conselho Indígena de Roraima (CIR) pede que a Procuradoria Geral da República (PGR) tome “providencias necessárias e urgentes contra a efetividade de qualquer ato administrativo dos itens inconstitucionais”. O CIR denuncia a inconstitucionalidade do parecer emitido ontem (20) pela Advocacia Geral da União e assonado pelo presidente da República. O embasamento para o parecer corresponde a Ação 3388/RR, que decidiu a demarcação da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol (RR), em 2009.

    Na carta, o CIR recupera os Embargos Declaratórios do Supremo Tribunal Federal (STF) que reprova a decisão como vinculante para demais processos envolvendo demarcação de TI. “A decisão proferida na Pet 3.388/RR tem a força intelectual e persuasiva de uma decisão do Supremo Tribunal Federal, mas não é vinculante, em sentido técnico, para juízes e tribunais, quando do exame de outros processos, relativos a terras indígenas diversas; ” (fls.40-EMB.DECL.NA PETIÇÃO 3.388 RORAIMA) ”.

    Entretanto, mesmo após o julgamento dos embargos de declaração da Petição, quando os Ministros do STF definiram que “a decisão proferida em ação popular é desprovida de força vinculante, em sentido técnico” e que “os fundamentos adotados não se estendem, de forma automática, a outros processos que se discuta matéria similar”, o tema continua a gerar divergências.

    Sob embarco declaratório, permanece estabelecido que a ação envolvendo a TI Raposa Serra do Sol não é uma decisão vinculante para outros julgamentos. Contudo, o conselho representante dos nove povos de Roraima sustenta que o parecer da AGU insiste em direcionar as ações correspondentes as demarcações das terras tradicionais sob a alegação do marco temporal. “Por diversas formas, políticos anti-indígenas tentam oficializar as condicionantes do caso Raposa Serra do Sol como regras a serem efetivas. Isso está proposto tanto na Portaria 303/AGU como no texto substitutivo da PEC 215. Tais proposições visam a negação dos direitos indígenas e em especial ao direito a demarcação das terras indígenas”, comenta a nota do Conselho Indígena.

    A tese do marco temporal nega o direito originário a terra ao propor uma interpretação restritiva dos direitos indígenas e da própria decisão de 2009. Define que só poderiam ser consideradas terras tradicionais aquelas que estivessem sob posse dos indígenas na data de 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição.

    Agronegócio incide sobre os direitos das populações indígenas

    Assinado pelo consultor-geral da União substituto André Rufino do Vale, o parecer optou por teses processuais que acordam com interesses da bancada ruralista. A carta do CIR denuncia que essas ações foram direcionadas na pretensão de ajudar Michel Temer em “negociar nossos direitos indígenas com a bancada de anti-indigena em troca de favores políticos em votos decisivos nas comissões do Congresso Nacional”, analisa o texto. “Os direitos constitucionais não devem se atropelados e curvados a interesses políticos e econômicos”.

    Em um vídeo publicado pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Luiz Carlos Heinze (PP-RS) expõe a articulação da bancada ruralista com o governo de Michel Temer para paralisar as demarcações das terras indígenas. Segundo o deputado, as conversas para a emissão do parecer iniciaram há três meses. “Ainda em abril, [reunimos] com o ministro Padilha, com o ministro Osmar Serraglio e com a ministra Greice. Nós acertamos um parecer vinculante”, comenta Heize ao expor o acordo entre Casa Civil, Ministério da Justiça e Advocacia Geral da União para salvar Temer. No vídeo divulgado na última sexta-feira (14), seis dias antes da AGU divulgar o parecer, Heinze afirma que o documento assinado por Michel Temer e pelo advogado geral da união “unifica” todas as decisões do Supremo Tribunal Federal referente a demarcação das terras tradicionais.

    O fortalecimento do marco temporal como condicionante para a paralização das demarcações das TI é uma das propostas assumidas pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) para o biênio 2016-2017. Em maio de 2016, na reunião do Conselho Nacional dos Secretários de Estado de Agricultura (Conseagri), o presidente da FPA, Marcos Montes (PSD-MG), apresentou a pauta da bancada ruralista. No primeiro item  Direito de Propriedade e Segurança Jurídica destaca-se a tese: “Respeito ao marco temporal e condicionantes do STF oriundos do caso Raposa Serra do Sol (PET 3388/STF). Republicação da Portaria 303 da AGU”.

    Acesse a nota do Conselho Indígena de Roraima

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  • 21/07/2017

    MPF divulga nota pública contra retrocesso em demarcação de terras indígenas


    Foto: Leonardo Prado/Secom/PGR

    O Ministério Público Federal (MPF) se manifestou, em nota pública, contra o parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), aprovado pelo presidente Michel Temer, sobre os processos de demarcação de terras indígenas.

    Para a Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR/MPF), a posição do presidente da República demonstra que “o atual governo faz o que os antecessores já faziam: não demarca, não reconhece e não protege terras indígenas”.

    O parecer, divulgado nessa quinta-feira (19), orienta a administração federal a vincular as condicionantes estabelecidas no caso Raposa Serra do Sol para outros processos demarcatório, mesmo tendo o Supremo Tribunal Federal expressamente reconhecido que a decisão tomada na PET 3388 não é dotada de eficácia vinculante para outras terras indígenas.

    Leia a íntegra da nota pública do MPF:

    O Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, é firme desde sempre na determinação do dever do respeito às terras indígenas. A decisão no caso Raposa Serra do Sol é extraordinariamente bela e afirmativa dos direitos originários dos índios às terras de sua ocupação tradicional.

    Todo o esforço do Estado brasileiro desde então é distorcer o conteúdo da decisão do Supremo, para desobrigar-se do seu dever de proteger o direito dos índios às suas terras indígenas.

    O Supremo Tribunal Federal determina ao Estado brasileiro demarcar as terras indígenas, sem hostilizar as comunidades indígenas e respeitar a diversidade étnica e cultural. Também determina que se reconheçam aos índios os direitos às terras quando delas retirados à força e a elas impedidos de retornarem. O Supremo Tribunal Federal, nessa mesma decisão, proclamou que essa dinâmica de ocupação indígena é revelada a partir do saber antropológico posto em prática, respeitando a metodologia “propriamente antropológica”, para evidenciar o que ocupam, como ocupam e quanto ocupam, como permanecem com os laços culturais, religiosos, sociais com aqueles espaços, mesmo quando forçados a deles se retirarem.

    O Parecer 001/2017/GAB/CGU/AGU, aprovado pelo presidente Michel Temer, que pretende ter força vinculante, põe no papel o que o atual governo faz e os que antecederam já faziam: não demarcar, não reconhecer e não proteger. Deliberadamente passa ao largo dos pontos acima referidos e realça limitações definidas pelo Supremo para o caso Raposa Serra do Sol.

    Se marco temporal existe, não está em 1988, mas na continuidade da história constitucional da afirmação dos direitos territoriais indígenas, que se inicia em 1934, repetido em 1937 e 1946, ampliado em 1967 e mais ainda na EC de 1969, e densamente positivado na Constituição de 1988. Esse histórico tem ressonância na jurisprudência consolidada e reiterada do Supremo Tribunal Federal, muito embora tenha sido ignorado pelo parecer.

    O parecer tem apenas um grande mérito: traz as digitais do presidente da República e, portanto, faz dele o responsável direto da política indigenista da sua administração.

    O Supremo Tribunal Federal terá agora em agosto nova e plural oportunidade de debater vários desses temas.
    Os índios nada podem esperar da Administração. A certeza dos índios e a esperança de seu futuro estão nas mãos da Justiça! 

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  • 21/07/2017

    Nota Pública: Michel Temer violenta os direitos dos povos indígenas para tentar impedir seu próprio julgamento


    Foto: Takukam Takuikam

    O presidente Michel Temer aprovou e mandou publicar no Diário Oficial da União o parecer 001/2017 da Advocacia-Geral da União (AGU), que obriga a administração pública federal a aplicar, a todas as Terras Indígenas do país, condicionantes que o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu, em 2009, quando reconheceu a constitucionalidade da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. O parecer simula atender uma orientação do STF, mas, na verdade, os ministros da corte já se manifestaram pela não obrigatoriedade da aplicação daquelas condicionantes a outros processos de demarcação.Importante lembrar que, em 2010, quando a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) apresentou proposta de súmula vinculante sobre o tema, o STF rejeitou o pedido por entender que não seria possível editar uma súmula sobre um tema no qual ainda não havia reiteradas decisões que pudessem demonstrar a consolidação de entendimento sobre o assunto.

    A aplicação daquelas condicionantes a outras situações resulta em graves restrições aos direitos dos povos indígenas. Por exemplo, a autorização que o STF deu para a eventual instalação de infraestrutura para a defesa nacional naquela terra indígena de fronteira poderá, com o parecer da AGU, ser aplicada em qualquer outra região para desobrigar governos, concessionárias e empreiteiras a consultar previamente os povos indígenas, na abertura de estradas, instalação de hidrelétricas, linhas de transmissão de energia ou quaisquer outros empreendimentos que poderão impactar as Terras Indígenas.

    O parecer pretende institucionalizar e pautar as decisões do STF sobre a tese do “marco temporal”, que restringe o direito às terras que não estivessem ocupadas pelos povos indígenas em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Isso representa uma ampla anistia à remoção forçada de comunidades indígenas praticadas durante a ditadura militar. Decisões do próprio STF rejeitaram mandados de segurança contra demarcações fundamentados nessa tese. O parecer da AGU toma partido numa discussão que ainda está em curso na Suprema Corte para impor restrições administrativas às demarcações de Terras Indígenas e ao usufruto exclusivo dos povos indígenas sobre os recursos naturais dessas áreas.

    O parecer aprovado por Temer foi anunciado previamente pelo deputado federal ruralista Luis Carlos Heinze (PP-RS) pouco antes da votação na Câmara do pedido de autorização para que o STF julgue o presidente por corrupção passiva, deixando claro que os direitos dos povos indígenas estão sendo rifados em troca dos votos ruralistas para manter Temer no poder. Heinze é o mesmo parlamentar que, em 2013, afirmou publicamente que índios, quilombolas e gays são “tudo o que não presta”.

    As organizações signatárias manifestam o seu veemente repúdio ao parecer 001/2017 da AGU, que será denunciado em todos fóruns e instâncias competentes. Temos consciência dos inúmeros danos que estão sendo causados ao país e a todos os brasileiros na “bacia das almas” desse governo, mas pedimos o apoio dos demais movimentos sociais e da sociedade em geral contra mais esta violência.

    Solicitamos ao Ministério Público Federal (MPF) que requeira a suspensão dos efeitos do parecer da AGU, cujas proposições são consideradas inconstitucionais por juristas de renome. Solicitamos, ainda, que o STF ponha fim à manipulação das suas decisões pelo atual governo, a qual tem o objetivo de desobrigar o reconhecimento do direito constitucional dos povos indígenas sobre suas terras e impor restrições aos outros direitos desses povos.

    Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib)
    Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME)
    Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (ARPINSUDESTE)
    Articulação dos Povos Indígenas do Sul (ARPINSUL)
    Grande Assembléia do Povo Guarani (ATY GUASU)
    Comissão Guarani Yvyrupa
    Conselho do Povo Terena
    Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB)
    Articulação dos Povos Indígenas do Amapá e Norte do Pará (APOIANP)
    Associação Agroextrativista Puyanawa Barão e Ipiranga (AAPBI)
    Associação Apiwtxa Ashaninka
    Associação Brasileira de Antropologia (ABA)
    Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC)
    Associação do Povo Arara do Igarapé Humaitá (APAIH)
    Associação dos Povos Indígenas do Rio Envira (OPIRE)
    Associação dos Produtores Kaxinawa da Aldeia Paroá (APROKAP)
    Associação dos Produtores Kaxinawá da Praia do Carapanã (ASKPA)
    Associação Indígena Katxuyana, Kahiana e Tunayana (Aikatuk)
    Associação Indígena Nukini (AIN)
    Associação Nacional de Ação Indigenista-Bahia (Anai-Bahia)
    Associação Sociocultural Yawanawa (ASCY)
    Associação Terra Indígena Xingu (ATIX)
    Associação Wyty-Catë dos povos Timbira do MA e TO (Wyty-Catë)
    Centro de Trabalho Indigenista (CTI)
    Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP)
    Comissão Pró-índio do Acre (CPI-Acre)
    Conselho das Aldeias Wajãpi (APINA)
    Conselho Indígena de Roraima (CIR)
    Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
    Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN)
    Federação dos Povos Indígenas do Pará
    Federação das Organizações e Comunidades Indígenas de Médio Purus (Focimp)
    Hutukara Associação Yanomami (HAY)
    Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB)
    Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepe)
    Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN)
    Instituto Socioambiental (ISA)
    Rede de Cooperação Amazônica (RCA)
    Operação Amazônia Nativa (Opan)
    Organização dos Agricultores Kaxinawá da Colônia 27 (OAKTI)
    Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi de Pauini (Opiaj)
    Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ)
    Organização dos Professores Indígenas do Acre (OPIAC)
    Organização dos Povos Indígenas Apurina e Jamamadi de Boca do Acre Amazonas (Opiajbam)
    Organização Geral Mayuruna (OGM)

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  • 20/07/2017

    Dallari: Parecer da AGU não é vinculante. É apenas opinativo, inconstitucional e ilegal



                  Dalmo Dallari na TI Tenondé Porã. Foto: Carlos Penteado/CPI-SP

    Por Dalmo de Abreu Dallari, jurista e professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo*

    Como acaba de ser divulgado pela imprensa, os agentes do agronegócio e seus auxiliares subservientes estão montando uma farsa jurídica tendo por objetivo a espoliação das comunidades indígenas, extorquindo delas grande parte de seus direitos às terras que tradicionalmente ocupam, direitos expressa e claramente assegurados pela Constituição.

    Para dar a aparência de legalidade à invasão das áreas indígenas foi montada uma farsa, que, em resumo, seria a simulação de um parecer vinculante emitido pela Advocacia Geral da União e assinado pelo Presidente da República, restringindo os direitos dos índios às terras que concretamente ocupavam quando foi posta em vigor a Constituição de 1988. Quanto a este ponto, o simulado parecer vinculante retomaria a tese nesse sentido que foi intitulada de «marco temporal» na ação referente à reserva indígena Raposa Serra do Sol, em 2009, e até agora não confirmada por decisão do plenário do Supremo Tribunal.

    Antes de tudo, trata-se de um parecer simulado, pois não foi elaborado por solicitação do Presidente da República para esclarecer qualquer dúvida ou para orientar uma decisão. Com efeito, num video que está sendo divulgado pela Frente Parlamentar do Agronegócio o Deputado Federal Carlos Heinze, do PP do Rio Grande do Sul, integrante da bancada do Agronegócio, informa o seguinte : «Nós acertamos um parecer vinculante em decorrência do qual mais de 700 processos envolvendo a demarcação de áreas indígenas serão atingidos, suspendendo essa demarcação».

    Esse é um pormenor fundamental do ponto de vista jurídico: o Presidente da República não solicitou esse parecer e ele não é expressão de uma análise jurídica, mas de uma conjugação de interesses manifestamente ilegal. Por essas razões, o parecer que for encaminhado ao Presidente da República com a chancela da Advocacia Geral da União, como referido no site da Frente Parlamentar do Agronegócio,  não atende aos requisitos legais para ser vinculante, ou seja, para ser legalmente obrigatório.

    Quanto ao efeito vinculante de um parecer, vem muito a propósito relembrar aqui uma notável análise jurídica feita pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, no processo do Mandado de Segurança 24.631-6 do Distrito Federal, fundamentando seu voto, que foi acolhido pela Suprema Corte. O Ministro ressaltou, então, os aspectos doutrinários nestes termos : «A doutrina nacional reconhece, genericamente, a natureza meramente opinativa dos pareceres lançados nos processos administrativos» (MEIRELLES , Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, 28a. ed., São Paulo, Malheiros, 2003, p.189). E acrescenta mais adiante : «se a lei (I) não exige expressamente parecer favorável como requisito de determinado ato administrativo, ou (II) exige apenas o exame prévio por parte do órgão de assessoria jurídica, o parecer técnico-jurídico em nada vincula o ato administrativo a ser praticado, e dele não faz parte. Nesses casos, se o administrador acolhe as razões do parecer, incorpora, sim, ao seu ato administrativo, os fundamentos técnicos; mas isso não quer dizer que, com a incorporação dos seus fundamentos ao ato administrativo, o parecer perca sua autonomia de ato meramente opinativo que nem ato administrativo propriamente é, como bem define Hely Lopes Meirelles».

    Embora se esteja usando maliciosamente a expressão «parecer vinculante», pretendendo dar-lhe  o caráter de obrigação legal, o parecer emitido pela Advocacia Geral da União é apenas opinativo. Esse qualificativo não torna sem importância os pareceres nem reduz a responsabilidade dos seus emitentes, mas –este é o ponto essencial no caso em exame- ele é apenas opinativo, não é vinculante.

    Outro ponto de fundamental importância refere-se ao conteúdo do parecer. A decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no caso da área indígena Raposa Serra do Sol, não foi até agora confirmada pelo Plenário. Essa infeliz decisão restringiu os direitos das comunidades indígenas às áreas das quais detinham a posse efetiva quando da promulgação da Constituição de 1988, gerando a expressão «marco temporal». A grande demora na apreciação final pela Suprema Corte decorre, precisamente, do elevado número de questionamentos assinalando a inconstitucionalidade da restrição imposta pelo «marco temporal». Com efeito, a Constituição estabelece, enfaticamente, que as comunidades indígenas têm direito às áreas que tradicionalmente ocupam, não se admitindo, como é amplamente sustentado em obras de doutrina jurídica e já foi reafirmado em inúmeras decisões judiciais, que uma terra indígena ilegalmente invadida perca a condição de área de ocupação tradicional de uma determinada comunidade.

    Em suma, o referido parecer não se enquadra em qualquer hipótese legal para ser vinculante e ainda contém inconstitucionalidade manifesta quando adota a tese do «marco temporal». Além disso, tendo em conta o que foi divulgado pelas redes sociais, o processo de elaboração do parecer foi flagrantemente ilegal. Por todas essas razões, ele deve ser ignorado na consideração dos fundamentos jurídicos dos direitos indígenas.

    * Artigo publicado no Jornal do Brasil


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  • 20/07/2017

    Mobilização Munduruku segue para Alta Floresta (MT)


     Fotos: Caio Mota / Juliana Pesqueira

    Alta Floresta – A ocupação do canteiro de obras da Usina Hidrelétrica São Manoel feita pelo povo Munduruku e liderada pelas mulheres da etnia encerrou na noite da última quarta-feira, 19, após reunião realizada entre os indígenas, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), o Ministério Público Federal (MPF) e oa representantes das empresas responsáveis pelas Usinas Hidrelétricas de São Manoel e Teles Pires.

    As pautas de reivindicações dos indígenas foram entregues e os cerca de 200 Munduruku decidiram sair da ocupação e seguir a mobilização até a cidade de Alta Floresta (MT), onde as urnas funerárias dos seus ancestrais estão guardadas.

    Confira na íntegra o texto das reivindicações aqui.

    Há anos os indígenas reivindicam que as urnas sejam devolvidas ao povo Munduruku. Estes artefatos estavam no local sagrado da etnia, a cachoeira de ‘Sete Quedas’, e foram violados pela Companhia Hidrelétrica Teles Pires (CHTP) durante a construção da UHE Teles Pires.

    Doze urnas funerárias estão sob a posse da CHTP desde 2014.

    A procuradoria da Republica em Mato Grosso, em 2015, recomendou que as urnas deveriam ser mantidas pela CHTP até que as lideranças indígenas junto da FUNAI e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) definam um local para elas serem guardadas. Desde fevereiro de 2017, as urnas funerárias do povo Munduruku estão no Museu Histórico de Alta Floresta (MT), local para onde os indígenas que estavam no canteiro de obras da UHE Teles Pires decidiram ir.

    “A ocupação acaba aqui, mas a luta continua. A gente não ta saindo porque tinha que sair ou porque a empresa mandou não. É porque a gente está indo atrás dessas urnas”, afirmou Kabaiwun Munduruku, uma das lideranças do movimento Ipereg Ayu.

    Mobilização

    Há dois meses as mulheres Munduruku iniciaram uma mobilização na aldeia Santa Cruz que reuniu lideranças, caciques, pajés e crianças para reivindicar, entre outras coisas, o respeito aos locais sagrados do povo Munduruku e aos direitos indígenas que vem sendo violados pelas construções de Usinas Hidrelétricas na bacia do Tapajós.

    A mobilização chegou ao canteiro de obras da UHE São Manoel na madrugada do dia 16. Durante os 4 dias de ocupação as obras permaneceram paradas.

    A UHE São Manoel está em fase final de construção e o processo para ter a Licença de Operação está em análise no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA).

    Veja também:
    Povo Munduruku reivindica direitos em hidrelétrica.
    Mulheres pautam ocupação em hidrelétrica



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