• 27/09/2017

    Povo Karipuna vive iminência de genocídio em Rondônia



    Por Ana Aranda, Especial para o Cimi Regional Rondônia  

    A Terra Indígena (TI) Karipuna, localizada nos municípios de Porto Velho e Nova Mamoré, com 153 mil hectares, homologada em 1998, fica no centro de uma região onde é grande e crescente a pressão sobre a floresta. Mal comparando, poderia se dizer que a TI estaria no olho de um furacão, devido à pressão de madeireiros, pescadores e grileiros que estão adentrando na mesma em  todos os seus quadrantes. Ultimamente, a ocorrência de loteamentos aumentou a preocupação dos indígenas.


    O procurador do Ministério Público Daniel Azevedo Lobo, que desde o início deste ano passou a acompanhar a difícil situação da etnia, considera a situação dos karipuna como de extrema vulnerabilidade. “Eu acho que se pode falar em uma pretensão de genocídio do povo karipuna, com o objetivo de invadir a TI, tirar os índios e ocupar a área. Para mim pode não ser um genocídio propriamente pela Lei Penal, mas é uma forma de genocídio do ponto de vista de direitos humanos. E também não afastamos a possibilidade de um genocídio do ponto de vista da lei penal, porque estas pessoas madeireiros e grileiros têm armas e muitas vezes são violentas. Então, pode haver genocídio, morte, violência”.

    Além do medo de serem atacados e mortos dentro da TI pelos invasores, os indígenas também enfrentam grandes dificuldades para a sua subsistência. A coleta da castanha, importante fonte de renda para os Karipuna, foi interrompida pelo temor de ameaças feitas pelos invasores. O medo impede que eles transitem livremente pelas suas terras.  Eles também encontram dificuldades para escoar a produção agrícola, porque a estrada de acesso está em precárias condições e fica intransitável durante o período das chuvas, situação que se agrava com o trânsito das dezenas dos pesados caminhões carregados de toras de madeiras nobres que deixam sulcos profundos no frágil leito de terra da via.


     


    Área derrubada no interior da TI Karipuna para loteamento com acesso pela Linha 15 de Novembro. Foto: Cimi Regional Rondônia

    Em maio deste ano, a Fundação Nacional do Índio (Funai) desocupou um posto de fiscalização localizado na entrada da TI. A estrutura financiada com recursos de compensação ambiental da obra da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio virou um elefante branco no meio da floresta. O gerador de energia elétrica do posto de fiscalização foi roubado e até mesmo os marcos da TI foram arrancados.

    O procurador Daniel Azevedo Lôbo  estranha “a coincidência” da desativação do posto da Funai com o início do chamado verão amazônico, caracterizado pela estiagem, que facilita as ações de retirada de madeira e desmatamentos.

    Fotos de satélite enviadas à Funai comprovam invasões

    Segundo dados do Projeto de Monitoramento do Desflorestamento na Amazônia Legal (Prodes), até o ano 2000, a área de desmatamento da TI era de 342 hectares. Até 2014, somava um acumulado de 1.279 hectares. Neste ano, a grande cheia do rio Madeira, cuja bacia inclui o Jaci-Paraná, na divisa da TI Karipuna, cessou a extração de madeira na região, mas em 2015 foram desmatados 123 hectares, de acordo com dados coletados a partir de fotografias de satélites pelo Serviço de proteção da Amazônia (Sipam). Boletins com estes dados são enviados sistematicamente para a Funai e outros órgãos de fiscalização. Em 2016, o desmatamento disparou, com um acumulado de 586,26 hectares, e  1.045,76  hectares de floresta foram derrubadas  no período de 1º de janeiro a 13 de agosto de 2017.



                     Parte da floresta completamente destruída a apenas uma hora da aldeia. Foto: Cimi Regional Rondônia


    As imagens também mostram uma linha bem definida que caracteriza uma estrada, crescendo da divisa para o interior da TI, nas linhas 15 de Novembro e 1º de Maio, na região de União Bandeirante. Em uma investigação feita juntamente com lideranças Karipuna, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) percorreu uma trilha feita na floresta a cerca de 7 horas de caminhada da aldeia Panorama. A entidade também localizou e fotografou “uma imensa clareira/derrubada em uma área de barreiro, importante ponto de caça dos indígenas, localizado à uma hora de caminhada da aldeia”.

    Moradores da Reserva Extrativista (Resex) Jaci-Paraná – localizada na margem oposta à TI Karipuna,  alertam que está aumentando a retirada de madeira na terra dos karipuna. “De madrugada a gente ouve a zoada dos caminhões saindo, carregados de madeira”, diz um morador. Ele fala de forma anônima, com medo de represálias, obedecendo a ordem de silêncio imposta na região.

    Equipe do Regional Rondônia do CIMI também identificou loteamentos na região do rio Formoso e rio Jaci-Paraná e nas Linhas 1º de Maio e  15 de Novembro. Fundos de fazendas localizadas na divisa da TI estariam sendo usadas para acesso a mesma.  Moradores denunciam que uma serraria clandestina estaria trabalhando na região.

    Recomendação do MPF exige ação da FUNAI

    Uma Recomendação do Ministério Público Federal assinada no dia 4 de setembro determina que a FUNAI elabore um plano emergencial de ação e autorize a liberação de recursos “para assegurar a proteção do povo Karipuna e a integridade de sua área demarcada” em um prazo de 10 dias úteis a partir da emissão do documento. O MPF também requer a elaboração e execução de um plano continuado de proteção à TI e seu povo. Os planos devem integrar as equipes da FUNAI com agentes do Batalhão da Polícia Ambiental do Estado de Rondônia e, como se trata de uma área federal, com reforço da Força Nacional de Segurança, do Exército Brasileiro e do IBAMA.



        Estrada aberta por madeireiros no interior da TI Karipuna com acesso pela Linha 1 de Maio. Foto: Cimi Regional Rondônia

    A Recomendação cita a ocorrência de oitenta e oito áreas da TI com retirada da cobertura vegetal (corte raso) captadas com imagens de satélite LANDSAT-8, de acordo com informações do SIPAM no âmbito do Programa de Monitoramento de Áreas Especiais (ProAE).  

    Segundo a Recomendação, “o processo de ocupação da TI Karipuna tem ocorrido por meio de loteamento, por não índios, principalmente em sua porção ocidental, inclusive com desmate e corte raso, abertura de linha e carreadores, fixação de marcos e plantio inicial de pasto e outras culturas, objetivando a ocupação paulatina da terra pública, processo que vem se aprofundando, desde 2016, conforme demonstram dados obtidos a partir de imagens de satélite e relatos de servidores da FUNAI e do Batalhão de Polícia Ambiental – BPA”.

    A TI Karipuna é citada no Boletim de Desmatamento da Amazônia Legal produzido pelo IMAZON em julho de 2017, a partir de imagens de satélite do sistema MODIS, como a segunda terra indígena mais desmatada na Amazônia Legal.

    O acesso à Terra Indígena Karipuna a partir da BR-364, no trecho da estrada que liga  Rondônia ao Acre é feito pela RO-101, no distrito de Jaci-Paraná. Esta estrada dá acesso ao distrito de União Bandeirantes, na Capital, e segue até a RO-421, onde está localizado o município de Buritis e o distrito de Jacinópolis de Nova Mamoré, que estão localizados no entorno da TI Karipuna e desenvolvem uma intensa atividade madeireira.



                                    Picada aberta por madeireiros no interior da TI Karipuna. Foto: Cimi Regional Rondônia

    Neste mês de setembro, grandes nuvens de fumaça encobrem a região e comprovam o uso intensivo do fogo para abertura de novas áreas e a preparação da terra para a lavoura e a pecuária. A maior parte das propriedades é coberta de pasto. Pequenas propriedades cultivam café, mandioca, cacau, cupuaçu, abacaxi e banana, entre outros produtos. Caracterizadas pelo uso de maquinário pesado, áreas preparadas para a produção de soja e milho são cada vez mais freqüentes e já começam a substituir a criação de gado.

    Madeira é retirada de Terras Indígenas e outras áreas protegidas  

    A madeira que transita livremente pelas estradas, localidades e cidades estaria sendo “esquentada” por concessões de planos de manejo emitidos pela Secretaria Estadual de Desenvolvimento Ambiental (Sedam). Moradores da região denunciam que a madeira vem sendo retirada das TIs e áreas de preservação ambiental da região (TIs Karipuna e Karitiana, Floresta Nacional do Bom Futuro, Resex Jaci-Paraná e Parque Estadual de Guajará-Mirim).

    O procurador Daniel Azevedo Lôbo ratifica esta informação “União Bandeirantes é uma área federal, da União e pela Lei Complementar 140 qualquer retirada de madeira em área federal é de atribuição do Ibama e não da Sedam. Muitas vezes, o pessoal apresenta um contrato de posse, de compra e venda entre particulares, não apresenta o domínio da terra e simplesmente a Sedam vem autorizando estes planos de manejo. Então é uma vertente que a gente pretende trabalhar, juntamente com o colega de Guajará-Mirim. Isto acontece no Estado todo e até em outros Estados do Brasil, esta criação de  Planos de Manejo nas proximidades de Terras Indígenas”.



         Placa indica a operação de um Plano de Manejo não-indígena no interior da TI Karipuna. Foto: Cimi Regional Rondônia

    O coordenador do Departamento de Desenvolvimento Florestal da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Ambiental (Sedam), Huérique Charles Lopes Pereira, informa que a Sedam aprovou três Planos de Manejo no entorno da TI Karipuna, localizados a 20,6430, 21.0100 e 13,4170 quilômetros da divisa da mesma.

    O coordenador se comprometeu em tomar providências com relação à denúncia do povo Karipuna e do CIMI.  “Em todos os projetos aprovados no entorno (da TI Karipuna)  será feito um monitoramento via imagem de satélite e o acompanhamento da movimentação de saldo.  Constatado  a incongruência ou divergência no movimento, ou indício ou não indício de exploração, já é designada  uma equipe  para ir In loco, é feito um bloqueio do projeto  e o sistema DOC e é feita vistoria in loco. Constatado [o ilícito] são tomadas todas as medidas, auto de infração, embargo, incremento para os órgãos de controle. E também pode ser  feita através de denúncia. Feita uma denúncia de um objeto específico em um local específico também é mandada diligência [ao local]”.

    Daniel Lobo alerta que “o estado de Rondônia passou e continua passando por um processo de avanço muito agressivo da exploração madeireira, acompanhada pela grilagem de terras públicas. Ocupar a terra pública em si é uma atividade ilegal, mas como isso tem sido feito com tanta freqüência  no Estado de Rondônia é aceito como se fosse normal, as pessoas não olham como se fosse uma situação ilícita”, considera ele.

    No caso das Terras Indígenas, ele diz que existem dois tipos de processos, aquele em que o objetivo é de exploração da madeira, minérios e outros produtos da floresta, com [a participação de] pessoas que têm interesse no valor comercial da madeira. E outro processo com interesse de ocupar terras públicas a fim de pleitear a regularização, posteriormente. Para o procurador, este último caso, que caracteriza a invasão (esbulho possessório) propriamente, ocorre atualmente nas Terras indígenas Uru-Eu-Wau-Wau e Karipuna.


     

                                Posto de fiscalização da Funai na TI Karipuna: desativado. Foto: Cimi Regional Rondônia


    O procurador participou da Operação Jurerei, desencadeada pela Polícia Federal em 2 de agosto deste ano, quando foi desarticulada uma organização criminosa que loteava terras dentro da TI Uru-Eu-Wau-Wau e afirma que organizações criminosas agem de forma análoga para a invasão das duas TIs. Para ele, fazendeiros com propriedades lindeiras de áreas protegidas que querem expandir suas terras juntamente com madeireiros agem em conjunto com “aventureiros” que pleiteiam a posse e posterior legalização de terras públicas.

    “Os processos dialogam, muitas vezes estas associações que reivindicam terras  já trabalham junto com os fazendeiros. Alguns ficam na área e isto ficou bem caracterizado na Operação Jurerei, feita recentemente na TI Uru-Eu-Wau”, afirma Daniel Lobo.

    A coordenadora do Cimi Regional Rondônia, Laura Vicuña, avalia que “a invasão, o desmatamento e o esbulho possessório verificado contra os Karipuna têm uma relação estreita com a política indigenista e ambiental do governo brasileiro e com as diversas iniciativas da bancada ruralista no Congresso Nacional que visam a desconstrução da Constituição Federal.

    A tramitação da PEC 215/00, a tese do Marco Temporal e o Parecer 001/2017 da AGU aprovado pelo presidente Temer em julho são exemplos de iniciativas que tem sido usadas como instrumentos para ‘justificar’ as ações ilegais em questão e, por isso, servem como estímulo às mesmas”.

    Organização criminosa comanda invasões

    A liberdade com que os madeireiros e grileiros agem no local está baseada em uma logística montada pelo que o procurador Daniel Lôbo define como “uma perigosa organização criminosa”.  

    Olheiros permanecem em locais estratégicos e avisam sobre qualquer movimento estranho à rotina do lugar e principalmente sobre a presença de representantes de órgãos de fiscalização. Eles usam uma eficiente rede de comunicação com  aparelhos de rádio-amador, que  cobrem toda a região.



    Cena é comum por toda a TI Karipuna: árvores marcadas, estacas para definir lotes e toras, muitas toras. Foto: Cimi Regional Rondônia

    Um levantamento feito pelo CIMI baseado em depoimentos de moradores, que só falam de forma anônima, listou pontos de observação dos olheiros em restaurantes, bares, casas particulares e até mesmo em igrejas.

    Ameaças impedem trânsito dos indígenas dentro do território

    O medo de um ataque tem impedido a extração de castanha e as dificuldades de escoamento da produção desestimulam a agricultura na TI Karipuna. Uma das lideranças da etnia, André Karipuna afirma que tem medo de um ataque para o extermínio do seu povo,  “que vive uma situação extrema de risco de vida”, segundo o MPF. A presença de estranhos dentro da TI intimida os indígenas e impede que eles transitem livremente no local. O acesso à aldeia pelo rio Jaci-Paraná até o distrito homônimo requer de quatro a seis horas de barco, dependendo do tipo de embarcação e das condições do rio. Já a estrada é precária e fica intransitável durante o período das chuvas.

    Adriano Karipuna, outra liderança da etnia, diz que a principal reivindicação do seu povo é a fiscalização e retirada dos invasores. “Já fizemos muitas denúncias, mas até agora não foi tomada nenhuma medida”, lamenta. Ele também cita a necessidade de um projeto agrícola para melhorar a renda e a segurança alimentar. Outra necessidade é o fornecimento de energia elétrica. Os indígenas utilizam um motor para o fornecimento de energia durante poucas horas da noite. Em setembro, o motor utilizado no poço artesiano queimou e o abastecimento passou a ser feito com a água bruta do rio. A aldeia Panorama tem uma escola com as quatro primeiras séries. A ampliação do ensino na aldeia impediria que crianças e adolescentes tivessem que ir para a cidade, onde vivem em situação de vulnerabilidade, afirma Adriano.


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  • 27/09/2017

    Sesai demitirá 10 mil servidores não concursados até dezembro; Lei da Terceirização força mudança, diz secretaria

    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

    A saúde indígena está em vias de sofrer transformações como consequência da Lei da Terceirização, sancionada pelo Palácio do Planalto em março deste ano. Para se adaptar à nova legislação, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) cancelará até o dia 31 de dezembro os contratos vigentes com as três entidades que prestam o serviço nas aldeias dos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI’s) do país. Cerca de 10 mil servidores não concursados, entre indígenas e não-indígenas, serão demitidos até o final do ano.


    Durante o encontro da Comissão Intersetorial de Saúde Indígena (Cisi), ocorrida em Brasília entre 30 de agosto e 1 de setembro, ocasião em que a agenda de mudanças foi apresentada, o governo prometeu que os 10 mil demitidos devem ser re-contratados pelas novas entidades terceirizadas celebradas pelos chamamentos públicos – estimados para a partir de outubro. O movimento indígena, ao contrário, reivindica a "constituição de grupo de trabalho, com a nossa participação, para traçar uma proposta de um modelo de atenção à saúde indígena" (Apib, 2016).   

    Na prática, a execução da política pública já é terceirizada para os indígenas, e continuará da mesma forma. No entanto, hoje o monopólio está com a Missão Caiuá, administradora de 19 DSEI’s, e com o Instituto Materno Infantil de Pernambuco (IMIP) e a Sociedade Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), que cuidam dos demais distritos. O desejo da Sesai, organismo vinculado ao Ministério da Saúde, é que mais entidades façam parte do quadro de terceirizadas ampliando também o espectro da iniciativa de terceirização nos novos contratos. Pelos corredores do Ministério da Saúde, porém, há quem acredite que nada desta agenda ocorrerá terminando com a prorrogação dos atuais contratos para o fim de 2018. Em face da conjuntura desfavorável às populações que mais necessitam das políticas públicas, servidores concursados da Sesai torcem para que mudanças mais profundas sejam tratadas apenas com o próximo governo.

    O fato é que a saúde indígena vem sofrendo sucessivas tentativas de rearranjos, desde a transição da Funasa e passando pelo governo Dilma Rousseff, para não enfrentar uma alternativa rechaçada pelo Executivo. "Na verdade estão fazendo uma engenharia para burlar aquela recomendação do MPF (Ministério Público Federal) sobre a necessidade de concursos públicos para todos os servidores, prestadores de serviços e funcionários. O concurso atenderia especificidades indígenas locais para não gerar desvantagens aos indígenas. Como o governo não vai fazer, a Lei da Terceirização se tornou o caminho mais viável para esta operação", analisa o coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Sul e integrante da Cisi, Roberto Liebgott.

    Fontes consultadas pela reportagem entendem ainda a medida como uma estratégia para ampliar o acesso aos recursos do governo para a saúde indígena, atendendo assim interesses políticos limitados pelo atual monopólio – o que o governo de Dilma Rousseff também tentou. Em 2017, o orçamento da Sesai atingiu R$ 1,6 bilhão. A intenção, conforme estas fontes, seria se apoderar da forma mais direta possível do orçamento da saúde indígena. O contexto, de acordo com a análise, é de que o ministro da Saúde, Ricardo Barros, está sem musculatura política, enquanto o governo de Michel Temer não tem limites em adotar medidas que atendam a interesses nada republicanos pela falta de certeza se consegue chegar ao fim; a saída seria aproveitar ao máximo o tempo que lhes resta.  

    Primeira experiência: DSEI Amapá/Norte do Pará

    O primeiro a ter um chamamento público aberto sob os novos moldes foi o DSEI Amapá/Norte do Pará, processo que ainda está em curso. O planejamento da Sesai, exposto na reunião da Comissão, prevê que nesta semana, a última do mês, os outros 33 editais ficarão prontos e abertos com o intuito de atrair, prioritariamente, Organizações da Sociedade Civil com Interesse Público (Oscip) para a saúde indígena. Aprovadas, assumem em 1 de janeiro de 2018. O objetivo é que até o final do ano novos contratos estejam celebrados em consonância à Lei da Terceirização – antes dela havia súmulas da Justiça Federal que, por exemplo, permitiam apenas terceirização para atividades-meio; Michel Temer liberou para qualquer atividade.

    No caso do DSEI Amapá/Norte do Pará, o MPF, em junho do ano passado, cobrou a Sesai sobre a contratação imediata de profissionais para composição de vagas em atendimentos médicos nas aldeias – o déficit, à época, era de 400 profissionais. O fato é que os contratados dos prestadores de serviços se encerrava em dezembro daquele ano e por lei não podiam ser renovados. Em julho deste ano a situação seguia na Justiça Federal com a determinação de prorrogação dos antigos contratos. Nesse meio tempo, Temer sancionou a Lei da Terceirização. Dessa forma, o DSEI se tornou o primeiro a entrar nesta nova modalidade.  

    Apesar do MPF atuar no caso para garantir a efetivação da política pública terceirizada, o DSEI Amapá/Norte do Pará atende mais de 12 mil indígenas que estavam sem o serviço, o entendimento dos procuradores é de que a melhor maneira do governo federal atender a acentuada demanda é pelo concurso público. A terceirização teve início em 12 de agosto de 2011, após terminada a transição que decretou o fim da Funasa, quando foi publicado pela Sesai o edital de chamamento público nº 01/2011 visando a seleção de entidades privadas sem fins lucrativos para execução, por meio de convênios, das ações complementares na atenção à saúde dos povos indígenas.

    Para os procuradores 6ª Câmara do MPF, responsável pela questão indígena, o chamamento regularizou a terceirização. Em 2012 ações foram impetradas pelos procuradores em todo o Brasil. Se questionava que, neste primeiro chamamento, apenas uma entidade foi aprovada para cuidar de todo o país. Aos poucos a Sesai foi se adequando às recomendações, mas sempre convicta no caminho da terceirização e buscando maneiras de fugir do concurso público.

    Em recente tentativa, entre os anos de 2014 e 2015, a Sesai realizou um amplo trabalho de convencimento nas aldeias para a ideia da criação do Instituto Nacional de Saúde Indígena (Insi). A tensão prevaleceu: na compreensão de lideranças indígenas, MPF e organizações indigenistas a proposta ia além da terceirização completa, mas propunha uma espécie de privatização da saúde indígena, pois o Insi passaria a ser contratado pela Sesai para prestar o serviço da política pública; o Instituto, por sua vez, seria gerido por Oscip’s.    

    O Insi não seria obrigado a cumprir as exigências dos processos públicos de licitação, contratação de profissionais via concurso público e não estaria sob a jurisdição da Justiça Federal. A Procuradoria da República apontou à época que era proibido pela Constituição Federal esse tipo de serviço complementar porque ele não poderia ser realizado com recursos públicos. A Advocacia-Geral da União (AGU) pensava diferente. A proposta do Insi acabou enviada ao Congresso no formato de Projeto de Lei, que nunca chegou a ser votado.

    #OcupeSesai

    Em fevereiro deste ano, a Articulação Nacional dos Povos Indígenas (Apib) organizou o movimento #OcupeSesai contra a terceirização da política pública. Numa quarta-feira, dia 22, o prédio do Ministério da Saúde, em Brasília, foi ocupado por quase 500 indígenas. Na ocasião, as lideranças defenderam o Subsistema de Saúde Indígena, criticaram as mudanças propostas ventiladas pelo governo federal e afirmaram que a postura só serviria para alocar nos quadros da Sesai indicações político-partidárias. Os indígenas se opunham à municipalização ou privatização, propondo discutir um sistema nacional para a execução da política pública.

    Os protestos vinham ocorrendo desde o final de 2016. Em novembro, a Apib e o Fórum de Presidentes dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena (FCondisi) emitiram nota contra a retirada da autonomia dos DSEI’s. Em determinado momento, as entidades se expressaram: "Está claro é a tentativa desenfreada e desrespeitosa desse governo de impor como novo modelo de gestão da atenção à saúde indígena a celebração de convênios junto a Organizações Sociais – O.S, proposta que rechaçamos de forma veemente". E seguiu pedindo pela "continuidade dos serviços de saúde, por meio da prorrogação dos convênios até dezembro de 2017".     

    Conforme destacou a indígena Sônia Guajajara, durante o #OcupeSesai deste ano, "a criação da SESAI foi o nosso principal instrumento para a gestão da Política de Atenção à Saúde Indígena. É notório que muitos desafios ainda precisam ser superados, dentre estes desafios destacamos a necessidade de estruturação de uma política de valorização e incentivo da mão de obra qualificada na saúde indígena junto às nossas comunidades".

     


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  • 27/09/2017

    STF determina volta à prisão de fazendeiros envolvidos em ataque a indígenas no Mato Grosso do Sul


    Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil

    Por Secretaria de Comunicação Social da PGR

    A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a prisão preventiva de cinco fazendeiros acusados de envolvimento em um ataque a indígenas no Mato Grosso do Sul, em junho do ano passado. O ataque à comunidade Tey Kuê, na Fazenda Yvu, localizada em Caarapó/MS deixou um morto e oito feridos.

    Na decisão desta terça-feira (26), os ministros entenderam que não há ilegalidade nas prisões que justifique a atuação do STF e reverteu liminar que havia sido concedida em outubro de 2016, de forma monocrática pelo ministro Marco Aurélio.

    Leia : Dossiê Massacre de Caarapó
    Meu glorioso Clodiodi: Um ano do Massacre de Caarapó, demarcação foi anulada e fazendeiros soltos

    Em sustentação oral, o subprocurador-geral da República Humberto Jacques afirmou que o caso envolve “uma perfeita sucessão de invasões sobre um
    solo onde quem primeiro pisou foram os indígenas”. Segundo ele, “essas pessoas sofreram um atentado com espingardas e grande violência por uma milícia organizada por fazendeiros”.

    O subprocurador-geral destacou que houve mortes, nesse e em outros episódios registrados no Mato Grosso do Sul, a ponto de o Ministério Público Federal montar a Força-Tarefa Avá-Guarani para tentar pacificar a situação. Na avaliação do coordenador da FT, o procurador da República Marco Antônio Delfino, “a decisão do STF é acertada e reconheceu a periculosidade dos envolvidos”.

    Entenda o caso

    Em outubro do ano passado, o MPF, por meio da força-tarefa Avá Guarani denunciou à Justiça Federal em Dourados cinco proprietários rurais envolvidos na retirada forçada de indígenas da Fazenda Yvu, em Caarapó (MS). Os fazendeiros respondem por formação de milícia armada, homicídio qualificado, tentativa de homicídio qualificado, lesão corporal, dano qualificado e constrangimento ilegal. As penas podem chegar a 56 anos e 6 meses de reclusão.

    Segundo as investigações, os denunciados organizaram, promoveram e executaram o ataque à comunidade Tey Kuê no dia 14 de junho. Cerca de 40 caminhonetes, com o auxílio de três pás carregadeiras e mais de 100 pessoas, muitas delas, armadas, retiraram à força um grupo de aproximadamente 40 índios Guarani Kaiowá da propriedade ocupada – que incide sobre a Terra Indígena Dourados Amambaipeguá.

    A prisão preventiva foi declarada pela Justiça Federal em Dourados em julho de 2016. O Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região e Superior Tribunal de Justiça (STJ) já haviam negado pedidos de liminar em HC.

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  • 25/09/2017

    Kuñangue Aty Guasu: encontro de rezas, forças e sonhos para o presente e futuro


    Texto e fotos por Lídia Farias de Oliveira, do Regional Cimi MS

    A Kunhaguê Aty Guasu (Assembleia das mulheres) Guarani e Kaiowá teve início na noite do dia 18 de setembro no tekoha Kurusu Ambá, em Coronel Sapucaia (MS), com uma forte reza tradicional das mulheres Guarani e Kaiowá. Mais de 200 tons de vozes femininos eram ouvidos naquele momento, além do som dos mbaracas e takapu’s que entoavam os rituais religiosos na abertura deste importante espaço de reencontro, rezas, conversas, sonhos e expectativas.

    Na vida do povo Guarani e Kaiowá tudo tem uma explicação espiritual. Era possível perceber esta relação em todos os momentos da Aty Kunã, desde a acolhida dos participantes até as horas do pouso. Entre os barracos construídos pela comunidade para as pessoas de fora e as barracas levadas para o acampamento, era nítida a alegria expressada no Guaxiré (dança tradicional) que acontecia todas as noites. Era maravilhoso acordar no meio da noite com os cantos e perceber que mulheres, homens e jovens seguiam de mãos dadas dançando nas grandes e animadas rodas de suas danças tradicionais.

    Era um encontro de muitas energias positivas, a Kunhaguê Aty Guasu contou com representantes de quase todos os Tekoha – lugar onde se é – Guarani e Kaiowá do sul de Mato Grosso do Sul, representantes do povo Terena do norte do estado, assim como representantes do Conselho Continental da Nação Guarani e do povo Mbya Guarani das aldeias Terra Roxa, no Paraná, e Tenondé Porã, em São Paulo.

    A Aty Kunã atraiu várias organizações ligadas aos direitos humanos, movimentos sociais e universidades, representantes da ONU mulheres-Brasil, Ministério Público Federal (MPF), FIAN Brasil/internacional, Cese, movimento da Liga das Camponesas Pobres, movimento de mulheres, Comitê de apoio e solidariedade aos povos indígenas, CTV, UEMS, FAIND, entre outras, prestigiaram e contribuíram com este lindo encontro.

    Frente ao cenário politico que o Brasil vem enfrentando, onde o objetivo principal é a retirada de direitos humanos, temas como Terra, saúde, educação, trabalho, segurança, benefícios sociais, saneamento básico, autonomia e fortalecimento das lutas dos povos indígenas fizeram parte de todas as discursões da grande assembleia.


    Em destaque estava a questão da luta pelo território. Infelizmente, nos últimos anos as iniciativas anti-indígenas têm se intensificado no Brasil. Michel Temer, para se manter no cargo de presidente da República, tem sido “todo ouvidos” aos interesses do agronegócio nacional e internacional. Articulado com os poderes Legislativo e Judiciário, o governo federal vem tentando criar propostas totalmente favoráveis aos interesses do capital, como é o caso da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que transfere a responsabilidade de demarcar terras indígenas do poder Executivo (Funai) para o poder Legislativo (Congresso Nacional), onde pelo menos 300 deputados são ou estão aliados ao ruralismo.

    Outra pauta abordada sobre a questão da terra foi a tese do Marco Temporal, uma iniciativa que vem se firmando cada dia mais no poder Judiciário brasileiro, onde as disputas são intensas em torno da interpretação do texto constitucional. Ruralistas e alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) defendem que os povos indígenas só teriam direito aos seus territórios se estivessem sobre eles em 5 de outubro de 1988.

    Os Guarani e Kaiowá afirmaram durante a Aty Kunã que o marco temporal, antes mesmo de virar lei, já vem causando muito sofrimento para as comunidades indígenas neste estado. A Terra Indígena Guyraroka, desde 2014, vem enfrentando este mal: a portaria que declarava os limites da aldeia foi anulada pela 2ª turma do STF e, em 2016, o processo transitou em julgado. A posição inconstitucional de Gilmar Mendes preponderou, com a decisão de que, como a terra não estava na posse dos indígenas em 1988, eles não terim direito a ela.

    A terra sem mal dos Guarani e Kaiowá parece se distanciar cada vez mais. Outras cinco áreas indígenas do estado de Mato Grosso do Sul sofrem com o efeito desta tese.


    Mesmo com todas estas atrocidades contra a vida destes povos, os Guarani e Kaiowá seguem resistindo – prova disso foi a organização e realização deste Aty Kunã. As mulheres Guarani e Kaiowá, devido à falta de recursos financeiros da Funai, conquistaram junto à sociedade e organizações parceiras cada grão de arroz servido durante a Aty. Isso demostra que não é uma tese ou PEC que vai destruir a esperança e a Mbarete (força) destes povos.

    A sabedoria das mulheres indígenas ficou explícita na condução da assembleia. Elas conseguiram transformar o encontro em um espaço de trocas de experiência entre os anciões, crianças e jovens, rezadoras e rezadores, que puderam partilhar cantos, rezas, medicinas tradicionais, Risos, Sonhos, Vida.

    “A Aty Kunã é o espaço para os rezadores e pra Nhande Si, isso é ótimo, o povo Guarani e Kaiowá precisa da reza. Tem que continuar a Aty Kunã, as crianças, os rezadores junto, isso faz vim a chuva boa, a planta boa, a mandioca, o milho branco e a gente faz o batizado da criança”, afirma Ivone Argemiro Jorge, da Aldeia Panambizinho, em Dourados (MS).

    Mulheres, homens, jovens, Nhande Si (nossa mãe) e Nhande Ru (nosso Pai), afirmam que vão seguir avançando ao encontro de seus tekoha tradicionais, de saúde e educação de qualidade, de respeito e reconhecimento de valores e de seus modelos de vida alternativos para o planeta. “Se o governo não concluir a demarcação de nossas terras, vamos continuar retomando nossos tekoha, nós mesmo vamos demarcar as nossas terras”, ressalta Leila Rocha, liderança do tekoha Yvy Katu, localizado em Iguatemi (MS).

    A Kunhãgue Aty Guasu encerrou no dia 22 de setembro com a seguinte certeza: o caminho da terra sem mal é longo, mas será concluído pelos guerreiros e guerreiras do povo Guarani e Kaiowá. Enquanto houver o som do Mbaraca e do Takuapu, vai ter luta.

    Clique aqui para ler o documento final da Aty Kunã

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  • 25/09/2017

    Munduruku ocupam Funai exigindo audiência e demissão de político nomeado para coordenação


    Ocupação da Funai em Itaituba (PA). Foto: Barbara Dias/Cimi Norte 2

    Por Renato Santana e Tiago Miotto, da assessoria de Comunicação
    Fotos: Barbara Dias/Regional Cimi Norte 2

    Lideranças Munduruku do Alto e do Médio Tapajós ocuparam o prédio da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Itaituba (PA), na manhã desta segunda (25). Os indígenas, que exigem uma audiência com o presidente da Funai e a exoneração de um político do PSC nomeado na semana passada para um cargo de chefia na Coordenação Regional da Funai na região do Tapajós, afirmam que só deixarão a sede do órgão depois de terem suas reivindicações atendidas.

    Os Munduruku denunciam a nomeação política do ex-prefeito de Aveiro, Olinaldo Barbosa da Silva, conhecido como Fuzica, para a Divisão Técnica (DIT) da Coordenação Regional Tapajós, segundo mais importante cargo na hierarquia da coordenação. A nomeação é uma indicação do PSC, o mesmo partido responsável por indicar os últimos presidentes da Funai, incluindo o atual, general Franklinberg Ribeiro de Freitas.

    Durante sua desastrosa passagem pelo ministério da Justiça do governo Temer, o ruralista Osmar Serraglio (PMDB-PR) chegou a afirmar que a Funai era “do PSC, do deputado André Moura”, líder do governo na Câmara dos Deputados. As denúncias de loteamento de cargos na Funai têm sido reiteradas por indígenas e foi reverberada pelo último ex-presidente do órgão indigenista, Antônio “Toninho” Costa, exonerado em maio.

    “[Fui exonerado] Por não ter atendido o pedido do líder do governo André Moura, que queria colocar 20 pessoas na Funai que nunca viram índios em suas vidas. Estou sendo exonerado por ser honesto e não compactuar com o malfeito e por ser defensor da causa indígena diante de um ministro ruralista”, declarou, à época, Toninho Costa.

    “Sabemos que essa é uma tentativa do PSC em se fortalecer para as próximas eleições, não vamos deixar que usem nossos direitos pra seus interesses eleitorais”, afirmam, em carta, o movimento Ipereg Ayu e a Associação Pariri, representações Munduruku. “Só vamos sair da CR de Itaituba com as respostas da nossas demandas e confirmação da presidência da Funai na audiência da aldeia Missão Cururu”.

    Audiência com presidente

    Os Munduruku também cobram uma audiência com o presidente da Funai para tratar de acordos feitos durante a ocupação do canteiro de obras da Usina Hidrelétrica (UHE) São Manoel, no rio Teles Pires. Na ocasião, como contrapartida ao término da ocupação, Franklinberg prometeu fiscalizar os acordos assumidos pelas empresas hidrelétricas com os indígenas.

    “Desde que deixamos a ocupação da Usina Hidrelétrica de São Manoel nem a empresa e tampouco o presidente da Funai cumpriram com as promessas que fizeram ao povo Munduruku”, afirma a carta.

    Para ser construída, a UHE São Manoel destruiu locais sagrados para os indígenas e removeu urnas funerárias da região, sem avisar nem respeitar os ritos e a espiritualidade dos Munduruku. Por isso, a concessão da licença de operação à usina, liberada pelo Ibama em setembro, é definida por eles como um “desrespeito aos nossos pajés, lideranças, as nossas crianças, aos caciques, guerreiros e guerreiras”.


    Indígena cobra de Olinaldo Barbosa, o Fuzica (de óculos) a renúncia ao cargo na Funai

    Interferência política

    A chefia da DIT, objeto da nomeação criticada pelos indígenas, é um cargo estratégico. Todas as outras funções da coordenação – de gestão ambiental e social, de planejamento e de pessoal – passam pela chancela da DIT, que tem – ou deveria ter – caráter técnico administrativo.

    Filiado ao Partido Social Cristão (PSC), Olinaldo Barbosa, mais conhecido como Fuzica, chegou à Prefeitura de Aveiro em agosto de 2010. A então prefeita, Maria Gorete Xavier Dantas, teve o mandato cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Pará. A determinação era para que o segundo colocado assumisse, posto que o terceiro colocado também teve a candidatura cassada.

    Em 2012, Fuzica concorreu e permaneceu na Prefeitura com mais de 50% dos votos válidos. A partir daí o prefeito passou a conviver com denúncias de improbidade administrativa, malversação de recursos públicos, acusação de fraudes em licitação, atrasos e irregularidades em repasses. Em agosto de 2014, a Câmara dos Vereadores de Aveiro decidiu por unanimidade afastar Fuzica por 180 dias.

    O prefeito ficou longe de suas funções por apenas nove dias. O juiz Marcelo Gomes, da Justiça Estadual de Itaituba, atendeu a pedido liminar da defesa de Fuzica sob o argumento de que ele não teve direito a ampla defesa e o reintegrou ao posto. Ao mesmo tempo, blogueiros e sites da região divulgaram fotos de Fuzica e sua família em praias do país.  

    A situação chegou ao Ministério Público, que em julho de 2015 encaminhou à Justiça Federal de Itaituba uma denúncia contra Fuzica por improbidade administrativa baseada em dois processos. No entanto, o social-cristão chegou ao fim do mandato e se candidatou à reeleição em 2016; ficou em quarto lugar. Em janeiro deste ano, sob vaias, transmitiu o cargo para o madeireiro e filiado ao PMDB, Vilson Gonçalves.


    Falta de consulta

    Os e as Munduruku também cobraram da Funai o respeito a seu protocolo de consulta. “A gente não aceita esse tipo de pessoa, a gente quer pessoas que têm compromisso com os povos indígenas. Na ocupação do canteiro de obras [da UHE São Manoel], o presidente da Funai disse que estava considerando o protocolo de consulta Munduruku, mas ele não está cumprindo o acordo que fez conosco”, critica Kabaywun Munduruku, uma das muitas mulheres indígenas que participam da ocupação.

    Após a pressão dos indígenas, Fuzica assinou um documento, enviado à sede nacional de Brasília, afirmando que não irá assumir o cargo. Os indígenas afirmam que permanecerão em alerta, até que a revogação da nomeação política seja publicada no Diário Oficial da União.

    Clique aqui para ler a carta divulgada pelos indígenas na ocupação

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  • 25/09/2017

    ONU cobra ações de proteção do Brasil para indígenas isolados na Amazônia


    Foto: Marcelo Camargo/Arquivo ABr

    Por Helena Martins, da Agência Brasil – EBC

    A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e o Escritório Regional para América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) emitiram nota  instando o Estado brasileiro a desenvolver políticas para a proteção de indígenas que optam por viver isolados.

     O posicionamento decorre de denúncias sobre assassinatos de dez índios que vivem nessas condições no Vale do Javari, no oeste do Amazonas, por um grupo de garimpeiros. Os organismos vinculados às Nações Unidas dizem estar preocupados com a situação das comunidades indígenas no Brasil e citam que esses povos estão sendo massacrados.

    Há dez dias, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) e a Polícia Federal (PF) informaram que apuram a possível ocorrência de mortes. A pedido da Funai, a Polícia Federal (PF) instaurou inquérito policial e a Procuradoria da República em Tabatinga (AM) passou a acompanhar as investigações.

    No posicionamento oficial sobre o caso, CIDH e ACNUDH “celebram” a decisão de realizar as apurações e cobram que o Estado apresente “os resultados de tais investigações sobre todas as ações de violência e alegadas incursões com a devida diligência, de uma maneira adequada e culturalmente apropriada”, bem como julgue e sancione “os possíveis responsáveis de forma ágil e efetiva”.

    A Funai informou à Agência Brasil que as investigações acerca dos possíveis assassinatos de indígenas isolados no Vale do Javari seguem em curso e que ainda não há data prevista para a conclusão dos trabalhos. Sobre as outras questões levantadas pelas CIDH e ACNUDH, a Funai não se manifestou.

    Outras denúncias

    A comissão e o ACNUDH registram o recebimento de outras denúncias de situações que ameaçam os povos indígenas da região do Vale do Javari, que onde se registra a maior presença de povos em isolamento no mundo. “Segundo a informação recebida pelas instituições, o suposto massacre seria uma das numerosas denúncias de parte das comunidades indígenas em relação a incursões e ataques contra povos indígenas em isolamento voluntário e contato inicial na área, perpetrados por garimpeiros, produtores e extrativistas de madeira ilegais”, diz a nota.

    Incursões violentas de garimpeiros, produtores e extrativistas de madeira ilegais; possível massacre de integrantes da comunidade indígena em contato inicial Warikama Djapar, a suspensão, há alguns anos, das atividades de uma Base de Proteção Etnoambiental (BPE) da Funai na região voltada a oferecer salvaguarda aos isolados são apontados como exemplos de outras situações preocupantes relacionadas a esses povos.

    O comunicado destaca que contatos não desejados constituem um sério risco para a sobrevivência física dos povos em isolamento voluntário, pois resultam em agressões, problemas de saúde devido à ausência de defesas imunológicas e escassez de alimentos, entre outros riscos. Tais impactos são irreversíveis e podem, segundo os órgãos, resultar em seu desaparecimento. Diante desse cenário, CIDH e ACNUDH exigem “esforços diligentes do Estado brasileiro para adotar políticas e medidas apropriadas para reconhecer, respeitar e proteger as terras, os territórios, o meio ambiente e as culturas destes povos, bem como sua vida e integridade individual e coletiva”.

    Nesse sentido, “exortam o Estado a implementar políticas imediatas para efetuar, nos territórios indígenas, controle de entrada, vigilância permanente, e ações de localização e monitoramento dos movimentos territoriais dos povos em isolamento. Ademais, a comissão e o ACNUDH instam o Estado brasileiro a adotar medidas para prevenir e responder as atividades ilegais de mineração, cultivo, caça, pesca e extrativismo ilegal de madeira nos territórios indígenas sob análise”, acrescentam os organismos da ONU.

    Tratados internacionais

    Em plano internacional, o Brasil, por ser signatário de vários tratados internacionais que tratam do tema, como a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, possui o compromisso de garantir que esses povos isolados tenham o direito de vive de acordo com suas culturas.

    A situação da população indígena no Brasil também tem sido objeto de discussões no Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Ontem, representantes da sociedade civil apresentaram carta em que reportam ataques aos direitos desses povos, como a paralisação nas demarcações das terras indígenas e os alarmantes casos de suicídio entre os Guarani e Kaiowá, relacionados à situação precária em que vivem. As organizações cobraram a estruturação de políticas efetivas por parte do governo brasileiro.

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  • 25/09/2017

    Comissão Pastoral da Terra (CPT) publica Atlas de Conflitos na Amazônia Legal



    Na próxima quinta-feira (28), às 14 horas, no Centro Cultural Missionário, em Brasília (DF), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), com o apoio da Comissão Episcopal para a Amazônia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), lançará o “Atlas de Conflitos na Amazônia”. O material tem enfoque no mapeamento, por municípios, dos locais onde existem conflitos no campo na Amazônia Legal. A maior disputa pela terra e os grandes números de pessoas violentadas, atualmente, encontra-se nessa região.

    No Atlas, cada regional da Comissão Pastoral da Terra apresenta os conflitos a partir de uma contextualização elaborada pelos agentes de pastorais de cada Estado. Para aproximar ainda mais o leitor da realidade, o Atlas traz casos emblemático de cada regional. Os estados que compõem a Amazônia Legal e, que, portanto, são os regionais da CPT, por ordem alfabética, compreendem: Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.

    Mapeamento sistemático de áreas em disputa na Amazônia

    A Amazônia tem destaque no aumento da violência no campo no Brasil nos últimos anos. Em 2016, foram registrados 61 assassinatos por conflitos no campo no país, sendo que 48 destes assassinatos ocorreram na Amazônia Legal. Neste ano de 2017, já foram registrados 63 assassinatos em conflitos no campo, até o momento, sendo 49 na região.

    Os dados acima são disponibilizados anualmente pela Comissão Pastoral da Terra na publicação impressa e digital “Conflitos no Campo Brasil”. Já o “Atlas de Conflitos na Amazônia” tem uma proposta metodológica diferente, pois mostra os conflitos que permaneceram vigentes nos últimos anos nesta região.

    A partir de um alinhamento técnico com o Centro de Documentação Dom Tomás Balduino, da CPT, e com a assessoria do geógrafo e professor da Universidade Estadual de Montes Claros (UniMontes-MG), Gustavo Ferreira Cepolini, cada regional da CPT contribuiu no levantamento dos dados para o Atlas, registrando detalhes como: municípios onde o conflito estava localizado, nome da comunidade, número de famílias impactadas, identidade (posseiros, sem terra, indígenas, quilombolas etc.), com quem disputavam seus territórios, e outros.

    Serviço

    Lançamento do Atlas de Conflitos na Amazônia
    Quando: 28 de setembro (quinta-feira), às 14h.
    Onde: Centro Cultural Missionário (CCM) – Sgan, 905 – Conjunto C – Asa Norte – 0790-050 – Brasília (DF).

    Composição da mesa:

    Dom Leonardo Ulrich Steiner
    secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

    Felício Pontes Junior
    Procurador Ministério Público Federal (MPF) atua nos feitos cíveis relativos à defesa dos direitos e interesses das populações indígenas e comunidades tradicionais

    Manuel Cardeal
    representante do Seringal Itatinga, munícipio de Manoel Urbano, Acre e ameaçado pelo projeto de Redução de Emissões provenientes de Desmatamento  e Degradação (REED)

    Darlene Braga
    representante da articulação da Comissão Pastoral da Terra (CPTs) Amazônia.

    Cleber César Buzzatto

    secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

    Gustavo Henrique Cepolini Ferreira

    Mestre e Doutorando em Geografia Humana e assessor do Atlas de Conflitos na Amazônia

    Outras informações:
    Cristiane Passos (CPT) – (62) 4008-6406 / 99268-6837
    João Damasio (CPT) – (62) 4008-6412 / 99143-8923
    Osnilda Lima (REPAM) – (61) 98366-1235

     

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  • 22/09/2017

    Cercados, Guarani Nhandeva temem ataque de pistoleiros em retomada no Mato Grosso do Sul


    Retomada fica dentro de terra delimitada pela Funai em 2016 com 19,7 mil hectares. “Precisamos da Polícia Federal. Estamos cercados e em perigo”, denuncia liderança

    Por Tiago Miotto/Cimi e Rafael de Abreu

    Após a retomada de uma fazenda localizada dentro do perímetro da Terra Indígena Ypo’i/Triunfo, no município de Paranhos (MS), fronteira com o Paraguai, indígenas do povo Guarani Nhandeva foram cercados por pistoleiros e, com medo de ataques e mortes, pedem a presença da Polícia Federal. A retomada ocorreu no início desta semana e o grupo está isolado e sem alimentação.

    “Precisamos de apoio o mais rápido possível. Estamos cercados e passando perigo”, denuncia uma das lideranças da retomada, não identificada por razões de segurança. “Parte do grupo foi dividido pelos pistoleiros que estão nos cercando. Ficamos sem comunicação com o pessoal que está na retomada”.

    Os pistoleiros chegaram logo após a retomada e permanecem cercando os Guarani Nhandeva, que, sem sinal de telefone, estão com dificuldades de comunicação. Segundo informações dos indígenas, a tensão tem aumentado na retomada e nenhuma autoridade chegou ainda na área. Eles temem que ataques possam ocorrer à noite e, por isso, reforçam que a presença da Polícia Federal é urgente.

    Assassinatos, água envenenada e cárcere privado: um histórico de violência e violações

    A Terra Indígena Ypo’i/Triunfo foi uma das incluídas no Termo de Ajustamento de Condutas (TAC) celebrado entre Ministério Público Federal (MPF) e Fundação Nacional do Índio (Funai) em 2007, após diversas tentativas dos indígenas de retornarem para seus tekoha e sucessivas expulsões por parte de fazendeiros.

    O TAC estabeleceu o ano de 2009 para que a Funai publicasse os Relatórios Circunstanciados de Idenficação e Delimitação (Rcid) de um conjunto de terras Guarani e Kaiowá, no sul do Mato do Grosso do Sul, sob pena de multa diária de mil reais em caso de descumprimento do prazo. Atualmente, essa multa já soma uma cifra milionária e segue crescendo a cada dia.

    No final daquele ano, com o prazo da publicação vencido e sem perspectiva de verem a demarcação de Ypo’i/Triunfo concluída, os Nhandeva resolveram retomar uma fazenda incidente sobre sua terra tradicional. No dia seguinte à retomada, foram brutalmente atacados por pistoleiros, que despejaram os indígenas e assassinaram os irmãos Rolindo e Genivaldo, ambos professores, cujos corpos desapareceram.

    Os indígenas conseguiram retornar e permanecer na área retomada, garantida por decisão da Justiça. A violência e as violações, entretanto, continuaram: fazendeiros envenenaram o córrego que era a única fonte de água dos indígenas, e seu direito de entrar e sair da área retomada foi restrito pelo fazendeiro, que os cerrou por mais de 100 dias atrás das porteiras da fazenda.

    Em 2015, uma nova retomada foi feita, e desde então os Guarani Nhandeva seguem vivendo em pequenas áreas de mato retomadas dentro da terra indígena. Após anos de luta, finalmente, em 19 de abril do ano passado, Dia do Índio, o Rcid de Ypo’i/Triunfo foi publicado pela Funai, reconhecendo aos indígenas os 19,7 mil hectares desta área.

    Desde 2016, os indígenas aguardam a publicação da Portaria Declaratória da área pelo Ministério da Justiça, para proceder com a demarcação da área e encerrar a situação crítica de vulnerabilidade em que vivem. Foi nesse contexto que, sem mais aguentar esperar, resolveram realizar a retomada que está agora cercada por jagunços.

    “Não queremos que se repita o que aconteceu com Rolindo e Genivaldo”

    O assassinato dos irmãos Rolindo e Genivaldo Vera segue vivo na memória dos Guarani Nhandeva de Ypo’i/Triunfo. O corpo de Genivaldo foi encontrado nove dias depois do ataque, a trinta quilômetros do local do ataque, e o de seu irmão jamais foi localizado.

    “Por isso estamos pedindo que a Polícia Federal venha aqui urgente garantir a nossa segurança. Por causa da demora da Polícia Federal que os professores Rolindo e Genivaldo Vera foram assassinados aqui nessa mesma região”, afirma outra liderança, ressaltando que eles também esperam a Funai e pedem que a informação “chegue até o presidente” do órgão.

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  • 22/09/2017

    Taxa de mortalidade envolvendo atos contra a própria vida é maior entre indígenas, aponta boletim

    Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

    O primeiro Boletim Epidemiológico de Tentativas e Óbitos por Suicídio no Brasil, divulgado nesta sexta-feira, 22, pelo Ministério da Saúde, informa que os maiores índices de mortalidade estão entre os povos indígenas. A taxa entre os índios é quase três vezes maior (15,2), a cada 100 mil habitantes, do que o registrado entre os brancos (5,9) e negros (4,7), aponta o boletim. A divulgação dos números abarca um período de óbitos e tentativas de suicídios entre 2011 e 2016.

    Entre os jovens indígenas está o maior número de suicídios. A faixa etária de 10 a 19 anos concentra 44,8% dos óbitos – brancos e negros possuem a mesma porcentagem, 5,7%. Em pelo menos mais uma faixa etária, o suicídio entre os indígenas é maior: dos 20 aos 29 anos, correspondendo a 30% dos registros ante quase 20% de brancos e negros. Na medida em que a idade avança para os indígenas, o índice cai: entre 30 e 39 anos, 15%; 40 a 49 anos, 10%; 50 a 59 anos, 5%; 60 em diante, menos de 5%.

    As mulheres indígenas também possuem taxas mais elevadas de óbitos por atentados contra a própria vida (7,7) se comparado com mulheres brancas (2,7) e negras (1,9). Entre os homens, no entanto, a quantidade de suicídios é bem mais acentuada: 23,1 – brancos (9,5) e negros (7,6). Os indígenas correspondem a 0,47% da população do Brasil, com 896.917 indivíduos (IBGE,2010). Dessa maneira, o suicídio entre as populações indígenas é considerado um sério problema de saúde – sobretudo porque está concentrado na infância, adolescência e juventude.

    O suicídio entre crianças e jovens indígenas no Brasil, por exemplo, foi classificado como pandemia por pesquisa do Programa de Estudos sobre Violência da Faculdade Latino Americana de Ciências Sociais (Flacso). O relatório ‘Violência Letal Contra as Crianças e Adolescentes do Brasil’, divulgado em junho de 2016, aponta que em ao menos um município, 100% do total de suicídios entre indígenas ocorreu na faixa dos 10 e 19 anos. Dos 17 municípios com número igual ou superior a 10 mil crianças e jovens – critério para o levantamento – , com alta densidade populacional indígena, 327 indígenas acima dos 20 anos se suicidaram entre 2009 e 2013. Desse total, 163 crianças e adolescentes tiraram a própria vida – quase a metade do número final e a maioria em relação às demais faixas etárias reunidas.

    “Vemos nos municípios arrolados que os suicídios na faixa de 10 a 19 anos representam entre 33,3%, em São Gabriel da Cachoeira (AM), e 100%, em Tacuru (MS), do total de suicídios indígenas, verdadeira situação pandêmica de suicídios de jovens indígenas”, destaca trecho do relatório. No Mato Grosso do Sul, a pesquisa aponta 5,2% suicídios de crianças e jovens por 100 mil habitantes. No Amazonas, a taxa é de 4,0%. A mortandade suicida nestes estados é puxada de forma trágica pelas crianças e jovens indígenas, conforme constataram os pesquisadores. AM e MS são os que mais possuem municípios envolvidos no suicídio entre a faixa etária do estudo.

    Um estudo das Nações Unidas (ONU) de 2009 coloca o suicídio dos jovens indígenas em um contexto de discriminação, marginalização, colonização traumática e perda das formas tradicionais de vida, mas adverte sobre a complexidade dos fatores que intervêm na transmissão desses traumas entre gerações na forma de comportamento suicida. “A marginalização desses jovens tanto em suas próprias comunidades, ao não encontrar nelas um lugar adequado às suas necessidades, quanto nas sociedades envolventes, pela profunda discriminação, forja um sentimento de isolamento social que pode conduzir a reações autodestrutivas do ponto de vista ocidental”, diz trecho do estudo.

    Setembro Amarelo

    O Ministério da Saúde decidiu pelo lançamento este mês devido ao Setembro Amarelo, período de campanha determinado para a prevenção e a importância da conscientização sobre o assunto. Conforme a amostragem, o número de suicídios aumentou sendo a quarta principal causa de morte no país.


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  • 21/09/2017

    CIDH e ACNUDH expressam preocupação sobre denúncias de massacre contra indígenas isolados


    Garimpo ilegal no rio Jandiatuba, onde massacre de isolados foi denunciado. Foto: MPF/AM

    Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e Escritório Regional para América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH)

    Washington D.C. / Santiago do Chile – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e o Escritório Regional para América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) expressam sua preocupação com a informação recebida sobre um possível massacre de indígenas em isolamento voluntário conhecidos como “flecheiros”, perto do alto curso do rio Jandiatuba, no território indígena Vale do Javari, localizado no extremo oeste do estado do Amazonas. A informação amplamente difundida em meios de comunicação indicaria que cerca de 10 pessoas indígenas em isolamento, incluindo mulheres e crianças, foram assassinadas. O Ministério Público Federal (MPF) confirmou publicamente que está investigando denúncias sobre mortes de indígenas em isolamento no território indígena Vale do Javari.

    A Comissão e o ACNUDH observam com preocupação que a região enfrenta atualmente uma situação caracterizada pelo aumento das incursões e de atos de violência contra as comunidades indígenas  em isolamento voluntário e contato inicial na região do Vale do Javari. Segundo a informação recebida pelas instituições, o suposto massacre seria uma das numerosas denúncias de parte das comunidades indígenas em relação a incursões e ataques contra povos indígenas em isolamento voluntário e contato inicial na área, perpetrados por garimpeiros, produtores e extrativistas de madeira ilegais. Ambas instituições receberam também informação sobre o possível massacre de integrantes da comunidade indígena em contato inicial Warikama Djapar. Ao mesmo tempo, a CIDH e o ACNUDH receberam informação indicando que a suspensão há alguns anos das atividades da “Base de Proteção Etnoambiental (BPE)” da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), localizada no rio Jandiatuba, a qual oferecia salvaguarda aos povos indígenas isolados na Amazônia, havia deixado as comunidades em isolamento voluntário e contato inicial em uma situação de desamparo frente a terceiros.

    A Comissão e o ACNUDH recordam que os Estados têm uma obrigação especial de proteção e respeito com relação aos direitos das comunidades em isolamento voluntário e contato inicial por sua situação única de vulnerabilidade. Esta obrigação foi consagrada diretamente no artigo 26 da Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indigenas, e também foi refletida na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, na Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, na Convenção 169 da OIT sobre povos indígenas e tribais em países independentes, na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, assim como nas Diretrizes de Proteção dos Povos Indígenas em Isolamento Voluntário e em Contato Inicial da Região Amazônica, do Gran Chaco e da Região Oriental do Paraguai. Os Estados se comprometeram a garantir o direito dos povos indígenas isolados e em contato inicial a permanecer nesta condição e a viver livremente e de acordo com suas culturas. A Comissão e o ACNUDH também observam que a região do Vale do Javari conta com a maior presença de povos indígenas em isolamento no mundo, o qual exige esforços diligentes do Estado brasileiro para adotar políticas e medidas apropriadas para reconhecer, respeitar e proteger as terras, os territórios, o meio ambiente e as culturas destes povos, bem como sua vida e integridade individual e coletiva.

    Neste sentido, a CIDH e o ACNUDH celebram a decisão do Ministério Público Federal (MPF) no Estado do Amazonas e da Polícia Federal (PF) de realizar uma investigação em conjunto com a Polícia Federal sobre as ações das quais teriam sido vitimas os “flecheiros”. O governo brasileiro informou que as investigações pelo MPF e PF estão ocorrendo a pedido da FUNAI, e que os garimpeiros que foram vistos falando do suposto ataque foram presos e conduzidos a prestar depoimento, cumprindo mandado de busca e apreensão. O governo também informou que realizou operação de combate ao garimpo ilegal na região. Nestes termos, a CIDH e o ACNUDH urgem o Estado brasileiro a apresentar os resultados de tais investigações sobre todas as ações de violência e alegadas incursões com a devida diligência, de uma maneira adequada e culturalmente apropriada, bem como julgar e sancionar os possíveis responsáveis de forma ágil e efetiva.

    A Comissão e o ACNUDH reiteram que os Estados estão obrigados a adotar medidas céleres e integrais para respeitar e garantir os direitos das comunidades índigenas ao gozo e controle de seus territórios e a viver livres de todo tipo de violência e discriminação. Este dever de proteção é acentuado em terras indígenas demarcadas administrativamente para a proteção de comunidades indígenas em isolamente voluntário e contato inicial, como a Terra Indígena Vale do Javari. Ao mesmo tempo, a Comissão e o Escritório do ACNUDH recordam que os Estados devem adotar medidas imediatas de ação de maneira articulada, destinadas à prevenção das incursões aos territórios dos indígenas em isolamento voluntário e contato inicial na Terra Indígena do Vale do Javari. Os contatos não desejados e as incursões por parte de terceiros nos territórios dos povos em isolamento voluntário e contato inicial constituem um sério risco para sua sobrevivência física. Tais contatos resultam em agressões diretas, problemas sérios de saúde devido à falta de defesas imunológicas, e escassez de alimentos, entre outros riscos. Todos estes problemas têm um impacto irreversível na capacidade do povo afetado de sobreviver e podem resultar em seu desaparecimento.

    A Comissão e o ACNUDH exortam o Estado a implementar políticas imediatas para efetuar, nos territórios indígenas, controle de entrada, vigilância permanente, e ações de localização e monitoramento dos movimentos territoriais dos povos em isolamento. Ademais, a Comissão e o ACNUDH instam o Estado brasileiro a adotar medidas para prevenir e responder ãs atividades ilegais de mineração, cultivo, caça, pesca e extrativismo ilegal de madeira nos territórios indígenas sob análise. A CIDH e o ACNUDH reconhecem a importância da recente ação tomada pelo Exército para combater a presença dos garimpeiros ilegais no rio Jandiatuba, e insta o Estado a seguir ampliando esforços nesta direção.

    A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

    O Escritório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos (ACNUDH) tem o mandato de promover e proteger o desfrute e a realização plena, para todas as pessoas, de todos os direitos contemplados na Carta das Nações Unidas, bem como nas leis e nos tratados internacionais de direitos humanos. O ACNUDH realiza o seu trabalho à luz do mandato que lhe foi conferido pela Assembleia Geral das Nações Unidas em sua resolução 48/141. Sua sede internacional se encontra em Genebra, na Suíça. Já o Escritório Regional do ACNUDH para América do Sul está localizado em Santiago, no Chile, e cobre os seguintes países: Argentina, Brasil, Chile, Equador, Peru, Uruguai e Venezuela.

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