Justiça revoga reintegração de área pública ocupada pelos Kariri Xocó em Paulo Afonso
Segundo o MPF, o extinto Parque Operacional do DNER, em Paulo Afonso (BA), pertence à União e a construtora Uzi nunca exerceu posse das terras. A área é reivindicada pelo povo Kariri Xocó, às margens do rio São Francisco, de onde forma despejados de forma violenta
Após manifestação do Ministério Público Federal (MPF) em Paulo Afonso (BA), a Justiça Federal revogou a decisão liminar que concedia à Uzi Construtora Ltda a posse da área do extinto Parque Operacional do Departamento Nacional de Estradas e Rodagens (DNER), localizado às margens do Rio São Francisco, em Paulo Afonso – 464 km de Salvador. A decisão, de 27 de abril, garantiu, ainda, a permanência dos integrantes da tribo Kariri Xocó na Escola Municipal José Geraldo, “Aldeia Indígena Kariri Xocó da Bahia”, localizada nas proximidades do Parque.
Segundo a ação, em 25 de maio de 2017, os Kariri Xocó foram retirados da área do Parque e alocados, em caráter emergencial, na Escola Municipal José Geraldo para o cumprimento da liminar que concedeu reintegração de posse dessas terras à construtora Uzi. Posteriormente, após concluído o estudo da Superintendência de Patrimônio da União (SPU) que confirmou que área litigiosa era indubitavelmente da União, o MPF pediu a revogação da liminar. O pedido foi indeferido e a Justiça determinou, na ocasião, que os indígenas saíssem da escola em até seis meses.
Na última quinta-feira (26), moradores relataram ao MPF que, após a decisão liminar, a construtora iniciou vários processos na Justiça Estadual contra moradores ou proprietários da região do entorno, afirmando ser a dona do local. Segundo eles, diversos proprietários próximos à área estão sendo ameaçados, tendo suas terras invadidas, cercas queimadas, muros derrubados, inclusive com um representante da empresa armado acompanhando as ações.
Afirmaram também que, ao dirigirem-se à Prefeitura para questionar sobre a situação dos terrenos, os moradores foram informados de que “a empresa era envolvida nesta prática há muito tempo, tendo como prática a compra de escrituras antigas, alterações e fraudes; que a empresa aparentemente é bem aparelhada, tendo informações de que a Justiça teria fechado um Cartório em Feira de Santana (BA) por estar envolvido neste esquema”.
De acordo com as procuradoras da República Ludmilla Vieira de Souza Mota e Analu Paim Cirne Pelegrine, a área pertence à União – sendo, portanto, pública – e a construtora Uzi nunca exerceu posse no local. Certidões do Tabelionato de Notas e do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Paulo Afonso comprovam que o imóvel pertencia ao extinto Parque Operacional do DNER e, com o fim das atividades do órgão no local, foi incorporado ao patrimônio da União Federal. As informações são confirmadas pela SPU, que considera que a reintegração de posse à empresa gera “risco real ao patrimônio da União, que pode sofrer prejuízo decorrente de possível fraude levada a efeito pela Construtora Uzi Ltda”.
Assim, com base nesses novos elementos juntados ao processo, a Justiça Federal, revogou a liminar por considerar que a construtora não comprovou a posse da área e que há indícios de fraude na documentação apresentada pela empresa.
A Justiça ainda proibiu a construtora de realizar qualquer atividade no imóvel e nas áreas vizinhas até o fim do processo, sob pena de multa diária pessoal aos sócios e à pessoa jurídica no valor de R$ 10 mil. Além disso, proibiu que o Cartório de Registro de Imóveis de Paulo Afonso proceda qualquer alteração no registro de imóveis até posterior decisão na ação reivindicatória ajuizada pela União contra a Construtora Uzi.
Na decisão ficou determinado, ainda, que os documentos do imóvel sejam encaminhados para perícia técnica pela Polícia Federal, bem como para que apure sobre a possível ocorrência de crime.
Dando continuidade ao processo, o qual o MPF segue acompanhando, foi determinado, com urgência, o agendamento de audiência de instrução para ouvir os moradores e cidadãos prejudicados.
Número para consulta processual na Justiça Federal – 6517-70.2016.4.01.3306 – Subseção Judiciária de Paulo Afonso.
Confira a íntegra da manifestação e das decisões judiciais:
– Manifestação do MPF de 26 de abril de 2018;
– Decisão que deferiu a reintegração de posse;
– Decisão de que determinou que índios saíssem da escola em 6 meses;
– Decisão de 27 de abril, que revogou a reintegração de posse e a saída dos índios da escola.