03/05/2018

Justiça revoga reintegração de área pública ocupada pelos Kariri Xocó em Paulo Afonso

Segundo o MPF, o extinto Parque Operacional do DNER, em Paulo Afonso (BA), pertence à União e a construtora Uzi nunca exerceu posse das terras. A área é reivindicada pelo povo Kariri Xocó, às margens do rio São Francisco, de onde forma despejados de forma violenta

Indígenas Kariri Xocó de Paulo Afonso no cânion do rio São Francisco, parte do território que reivindicam. Foto: Renato Santana/Cimi

Após manifestação do Ministério Público Federal (MPF) em Paulo Afonso (BA), a Justiça Federal revogou a decisão liminar que concedia à Uzi Construtora Ltda a posse da área do extinto Parque Operacional do Departamento Nacional de Estradas e Rodagens (DNER), localizado às margens do Rio São Francisco, em Paulo Afonso – 464 km de Salvador. A decisão, de 27 de abril, garantiu, ainda, a permanência dos integrantes da tribo Kariri Xocó na Escola Municipal José Geraldo, “Aldeia Indígena Kariri Xocó da Bahia”, localizada nas proximidades do Parque.

Segundo a ação, em 25 de maio de 2017, os Kariri Xocó foram retirados da área do Parque e alocados, em caráter emergencial, na Escola Municipal José Geraldo para o cumprimento da liminar que concedeu reintegração de posse dessas terras à construtora Uzi. Posteriormente, após concluído o estudo da Superintendência de Patrimônio da União (SPU) que confirmou que área litigiosa era indubitavelmente da União, o MPF pediu a revogação da liminar. O pedido foi indeferido e a Justiça determinou, na ocasião, que os indígenas saíssem da escola em até seis meses.

Na última quinta-feira (26), moradores relataram ao MPF que, após a decisão liminar, a construtora iniciou vários processos na Justiça Estadual contra moradores ou proprietários da região do entorno, afirmando ser a dona do local. Segundo eles, diversos proprietários próximos à área estão sendo ameaçados, tendo suas terras invadidas, cercas queimadas, muros derrubados, inclusive com um representante da empresa armado acompanhando as ações.

Afirmaram também que, ao dirigirem-se à Prefeitura para questionar sobre a situação dos terrenos, os moradores foram informados de que “a empresa era envolvida nesta prática há muito tempo, tendo como prática a compra de escrituras antigas, alterações e fraudes; que a empresa aparentemente é bem aparelhada, tendo informações de que a Justiça teria fechado um Cartório em Feira de Santana (BA) por estar envolvido neste esquema”.

De acordo com as procuradoras da República Ludmilla Vieira de Souza Mota e Analu Paim Cirne Pelegrine, a área pertence à União – sendo, portanto, pública – e a construtora Uzi nunca exerceu posse no local. Certidões do Tabelionato de Notas e do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Paulo Afonso comprovam que o imóvel pertencia ao extinto Parque Operacional do DNER e, com o fim das atividades do órgão no local, foi incorporado ao patrimônio da União Federal. As informações são confirmadas pela SPU, que considera que a reintegração de posse à empresa gera “risco real ao patrimônio da União, que pode sofrer prejuízo decorrente de possível fraude levada a efeito pela Construtora Uzi Ltda”.

Assim, com base nesses novos elementos juntados ao processo, a Justiça Federal, revogou a liminar por considerar que a construtora não comprovou a posse da área e que há indícios de fraude na documentação apresentada pela empresa.

A Justiça ainda proibiu a construtora de realizar qualquer atividade no imóvel e nas áreas vizinhas até o fim do processo, sob pena de multa diária pessoal aos sócios e à pessoa jurídica no valor de R$ 10 mil. Além disso, proibiu que o Cartório de Registro de Imóveis de Paulo Afonso proceda qualquer alteração no registro de imóveis até posterior decisão na ação reivindicatória ajuizada pela União contra a Construtora Uzi.

Na decisão ficou determinado, ainda, que os documentos do imóvel sejam encaminhados para perícia técnica pela Polícia Federal, bem como para que apure sobre a possível ocorrência de crime.

Dando continuidade ao processo, o qual o MPF segue acompanhando, foi determinado, com urgência, o agendamento de audiência de instrução para ouvir os moradores e cidadãos prejudicados.

Número para consulta processual na Justiça Federal – 6517-70.2016.4.01.3306 – Subseção Judiciária de Paulo Afonso.

Confira a íntegra da manifestação e das decisões judiciais:

Manifestação do MPF de 26 de abril de 2018;

Decisão que deferiu a reintegração de posse;

Decisão de que determinou que índios saíssem da escola em 6 meses;

Decisão de 27 de abril, que revogou a reintegração de posse e a saída dos índios da escola.

Fonte: Ministério Público Federal (MPF) - Bahia
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