FSM 2009: as árvores e as águas falarão
Mais de um quilômetro e meio de gente apinhada em movimento. Permanente. Durante todo o dia as árvores e a mata em recuperação na Universidade Federal Rural do Pará testemunham o andar alegre e apreensivo de corações e mentes em busca do outro mundo, em debate, em construção.
A crise global faz com que o imenso “seringal de gente” transforme por alguns dias a monotonia das seringueiras plantadas ao longo do caminho, em denúncia de um passado que precisa ser revisitado, porém com outro olhar e perspectiva de futuro. Mais do que isso. Em anúncio, em sementeira de milhares de cores e frutos no caminho plural do novo sendo semeado. A humanidade não é o que o capital quer. Uma homogeneidade burra e monótona. Ela é esse mar de cores e corpos pintados, de centenas de línguas se entrecruzando na comunicação universal de sons e gestos, de amor e destemor. Essa imagem bonita do janeiro chuvoso, mas sempre ensolarado, de Belém, certamente ficará marcada num quadro lindamente emoldurado com os dizeres: aqui Gaia respirou.
O tom desse FSM não poderia ser outro – em meio às águas e as florestas da Amazônia ameaçada e agredida, o grito da vida ganha o mundo, emerge do mais profundo das águas e florestas, da biodiversidade e das vozes silenciadas por séculos de opressão e extermínio. São os rios ameaçados pela contínua agressão dos agrotóxicos, por hidrelétricas que se transformarão em monumentos à insanidade, pela pesca predatória. O grito de basta. Urgente. Querem matar o rio Xingu, querem tragar o rio São Francisco, querem sujar com mercúrio o Tapajós, querem barrar o rio Madeira, Querem comprar e vender o rio Amazonas, Negócio de futuro! Contra isso tudo o que resta é o clamor permanente – “água e energia não se vende, se defende!”.
Entre luzes e sombras, entre monstros e fantasmas, entre guerras e esperança de paz, a humanidade vai lentamente construindo novos caminhos que necessariamente terão que superar a lógica neoliberal do consumismo, da exclusão, da acumulação, do modelo de produção capitalista, da mercantilização da vida. Temos que reencontrar o “bem viver”, quiçá na vida solidária e simples, na sabedoria milenar dos povos nativos, na reconstrução da harmonia entre todas as formas de vida.
Entre o calor e a chuva vai sendo construído mais esse importante marco na marcha mundial para os outros mundos possíveis. Talvez mais dos que as potentes câmeras, lentes, tele-objetivas conseguirem captar, aprisionar e registrar, as árvores e águas transformarão toda essa riqueza de rumos, sonhos, utopias e esperança em pedras preciosas para o futuro da humanidade. E as águas e as árvores falarão!
Egon Heck
Cimi
Belém, 30 de janeiro de 2009