Justiça nega recurso impetrado pela Itaipu contra os Guarani no Paraná
O Tribunal Regional Federal da 4ª. Região, com sede em Porto Alegre (RS), por unanimidade, negou provimento à ação impetrada pela empresa Itaipu Binacional contra os Guarani que vivem nas aldeias Tekoha Marangatu, Tekoha Porá e Tekoha Karambey, no município de Guaíra, no oeste paranaense.
Com isso, o Tribunal confirmou a decisão da Justiça Federal de Umuarama, PR, de dezembro de 2007, em relação à ação em que a Itaipu Binacional pedia a reintegração de posse das áreas de terra onde estão localizadas as três aldeias. Na sentença, o Juiz Federal defendeu enfaticamente o direito dos Guarani sobre suas terras tradicionais, afirmando: “Ante o exposto, julgo improcedente o pedido possessório formulado pela ITAIPU BINACIONAL e declaro que as terras ocupadas pelos índios Avá-Guarani nos lotes abordados (Tekoha Porá; Karumbey e Tekoha Marangatu) constituem terras indígenas tradicionalmente ocupadas, não podendo ser objeto de domínio ou posse, senão pelos próprios índios, conforme disposição constitucional, independente de prévia demarcação”.
Na decisão do TRF 4, publicada ontem, 27 de outubro, os desembargadores citam parte da sentença da primeira instância:
“Atualmente as ocupações indígenas em Guaíra concentram-se em três lotes: 1) Tekoha Porá (sul); 2) Karumbey (norte), e 3) Tekoha Marangatu, na Faixa de Proteção. É sobre a área desses três lotes que a requerente postula a proteção possessória. Todavia, segundo o estudo antropológico em questão, os dois primeiros lotes são provenientes de uma mesma antiga aldeia indígena, invadida pelo crescimento da cidade, que restringiu a extensão do território anteriormente ocupado pelos índios, envolvendo-o na zona urbana. Portanto, a área em questão representa terra tradicionalmente ocupada pelos índios, já que originária de uma só terra indígena, atualmente transformada em dois lotes de cerca de 2 has., mas que certamente alcançava uma dimensão muito maior, e que acabou sendo restrita ante o crescimento da área urbana de Guaíra”.
Citam ainda parte do parecer do representante do Ministério Público Federal, segundo o qual “o argumento de que o alcance da norma inscrita no art. 231 da CF deve restringir-se às terras atualmente ocupadas por silvícolas não prospera. O art. 231 da Constituição deve ser interpretado segundo a lição de José Afonso da Silva: ‘o tradicionalmente refere-se não a uma circunstância temporal, mas ao modo tradicional de os índios ocuparem e utilizarem as terras e ao modo tradicional de produção, enfim, ao modo tradicional como eles se relacionam com a terra, já que há comunidades mais estáveis, outras menos estáveis, e as que têm espaços mais amplos em que se deslocam, etc. Daí dizer-se que tudo se realiza segundo seus usos, costumes e tradições”.[1] Assim, o conceito de posse indígena remete à ocupação de forma tradicional. Se os índios foram expulsos ou afastados da área no passado, isso não pode ser obstáculo ao reconhecimento do direito que possuem”.
O Cimi comemora, com os Guarani, mais esta vitória frente à poderosa e intransigente empresa Itaipu Binacional. Durante a construção da Hidroelétrica Itaipu, na fronteira do Brasil com o Paraguai, no rio Paraná, os direitos dos povos indígenas foram absolutamente desrespeitados, sendo que dezenas de Tekoha (território tradicional) foram cobertos pelas águas inundadas. Como se não bastasse, vergonhosamente, a Itaipu Binacional continua sua “cruzada” antiindígena tentando, mais uma vez, inclusive judicialmente, expropriar os Guarani de suas terras tradicionais, alegando, sem legitimidade, ser “proprietária” dos pequenos pedaços de mata que restaram ao longo do rio alagado.
Guarapuava, PR, 27 de outubro de 2008
Cleber C. Buzatto, Marline Dassoler Buzatto e Diego Pelizzari
CIMI Sul – Equipe Paraná
[1] [SILVA, José Afonso da, Terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, in Santilli, Juliana (coord.), Os Direitos Indígenas e a Constituição, Porto Alegre: NDI e Fabris Editor, 1993, p. 47].’