Morro do Osso: A luta dos Kaingang na capital gaúcha
Há quatro anos, um grupo de 23 famílias Caingangues ocupa uma área de
Roberto Liebgott é coordenador do Conselho Indigenista Missionário – CIMI – da Região Sul do Brasil.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Os índios Caingangues que ocupam o Morro do Osso,
Roberto Liebgott – Eles o ocuparam no dia 9 de abril de 2004, numa sexta-feira santa, pois lembro bem do dia. A área que foi estabelecida como de preservação propriamente são de
IHU On-Line – Então, a principal questão não é a preservação ambiental?
Roberto Liebgott – A questão ali não é realmente preservação ambiental. É um lugar onde estão se concentrando moradores de classe média alta por ser uma região muito bonita e ter uma visão ampla de todo o Guaíba.
IHU On-Line – Como os índios agirão caso a Funai afirme que a área do Morro do Osso é de preservação e solicitarem a retirada deles?
Roberto Liebgott – Uma área de preservação não necessariamente impede que seja também uma área indígena. Se comprovado no estudo antropológico que ali de fato se configura como um espaço territorial de ocupação dos índios, ele necessariamente precisa ser demarcado, o que não significa dizer que a preservação deixará de existir. Então, depende agora desse estudo que a Funai se comprometeu
IHU On-Line – Que outras áreas consideradas de preservação natural também são reivindicadas pelos índios aqui no Rio Grande do Sul?
Roberto Liebgott – No entorno de Porto Alegre, há algumas áreas para serem demarcadas para os índios Guaranis, como, por exemplo, o Parque de Itapuã. O grupo já foi instalado e certamente em breve os trabalhos antropológicos serão instalados, assim como os estudos antropográficos etc. Existem também outras áreas pleiteadas na região de Passo Fundo, como a Mata Castelhana. Há várias áreas que foram instituídas como de preservação ambiental, mas que também fazem parte de territórios indígenas.
IHU On-Line – Como está a situação das pessoas que estão vivendo no Morro do Osso?
Roberto Liebgott – São 23 famílias que vivem da produção de artesanato. Esse artesanato é confeccionado no Morro do Osso e é vendido em feiras da cidade ou no centro de Porto Alegre. Basicamente, a fonte de subsistência dessas famílias é o artesanato. Assim como a de centenas de outras famílias indígenas, que também moram ou
IHU On-Line – Roberto, mas como está a questão da educação das crianças que vivem no Morro do Osso?
Roberto Liebgott – As crianças Caingangues do Morro do Osso têm já uma escola dentro da própria comunidade. Nela, que é diferenciada, eles aprendem primeiro na língua caingangue e, depois de um período de quatro anos, passam a integrar também escolas públicas na região do entorno do Morro do Osso. Assim, algumas crianças ainda freqüentam a escola dos índios e outras a escola dita normal.
IHU On-Line – Com base em que os índios descobriram que o Morro do Osso abriga um cemitério indígena?
Roberto Liebgott – A história do Morro do Osso é bem antiga. Existem estudos de pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul que comprovam que historicamente os índios passaram por essa região, e o Morro do Osso seria um ponto de passagem, onde eles faziam suas paradas para confecção de produtos, tratamentos médicos etc. Nesse local, também foi constituído um cemitério, e a própria prefeitura de Porto Alegre, ao longo dos anos, para fazer a divulgação do Morro do Osso, se utilizava de afirmações de que ali tem constituído antigos sítios arqueológicos e também cemitérios indígenas. Por isso, deu-se o nome à região de Morro do Osso, ou seja, em função das ossadas que foram encontradas ali nesse local.
IHU On-Line – Como está a situação da demarcação de terras indígenas aqui no estado?
Roberto Liebgott – Aqui no estado, existem perspectivas de demarcação para os povos Caingangues e Guaranis. Existem muitas promessas por parte da Funai, através de grupos de trabalho para fazer o procedimento demarcatório, para identificar as áreas. No entanto, há uma morosidade muito grande. Há pelo menos 22 áreas Guaranis que precisam ser regularizadas. Grande parte dessas áreas estão entorno de Porto Alegre, como nas cidades de Barra do Ribeiro, Viamão, Guaíba, Osório. Há necessidade para que haja maior mobilização entre os índios para que pressionem a Funai e, assim, esses grupos de trabalho sejam constituídos.
IHU On-Line – E como essa situação do Morro do Osso está sendo conduzida e como deverá ser solucionada em sua opinião?
Roberto Liebgott – Em nossa opinião, cabe à Funai a criação do grupo de trabalho para proceder com a identificação e, então, comprovar se de fato é uma área de ocupação tradicional ou não. Caso seja uma área de ocupação tradicional, o procedimento é muito bem definido pela constituição, ou seja, a área precisa ser demarcada e passa a ser de usufruto dos índios, nesse caso dos Caingangues. Caso não tenha essa comprovação da ocupação tradicional, o poder público precisa negociar com a comunidade a perspectiva de reassentamento em uma hora onde condições dignas de vida e sobrevivência sejam garantidas. Para que, afinal, tenham perspectivas de futuro.
A comunidade do Morro do Osso está muito tranqüila. Os índios têm consciência e noção dos seus direitos e isso é muito importante. Existe na contramão disso uma pressão intensa por parte dos moradores da região e por parte da prefeitura de Porto Alegre que se nega a reconhecer aos índios esse direito. Aguardamos que a Funai proceda com os estudos para que a área seja caracterizada como região indígena.