07/02/2008

Mato Grosso na Lista Suja

 


Como se não bastassem os dados sobre desmatamento, referentes também ao cultivo de soja – segundo Douglas Morton, da Universidade de Maryland (EUA) – e ao alto índice de violência, o estado do Mato Grosso tem mais um motivo para se envergonhar: o fato de constar na “Lista Suja” do Ministério do Trabalho. Nesta lista, que é atualizada a cada seis meses, constam os empregadores que foram flagrados pelo Grupo Móvel de Fiscalização utilizando-se de trabalho escravo em propriedades ou empresas ou ainda aqueles que, depois de notificados, não indenizaram os trabalhadores.


 


Dezesseis empresas ou proprietários localizados em 14 municípios de Mato Grosso são citados por estarem se utilizando de trabalho escravo ou “degradante”, numa lista nacional em que se encontram 184 nomes. Destaque para Confresa e Poconé em número de trabalhadores libertos, embora os nove libertados em Nova Ubiratã não diminua em nada a gravidade da situação. Segundo a CPT, Comissão Pastoral da Terra, Mato Grosso é o segundo em número de trabalhadores libertos.


 


Em dias que falar em desmatamento deixa o governo e os secretários de Meio Ambiente se mexendo na cadeira, não podemos esquecer que o trabalho escravo está intimamente ligado ao desmatamento na Amazônia, como revelam as informações de Leonardo Sakamoto da ONG Repórter Brasil. As ações do Grupo Móvel de Fiscalização do governo federal encontraram a grande maioria destes trabalhadores privados de um trabalho digno principalmente em atividades agropecuárias, seguidas pelo cultivo canavieiro. Segundo a ONG Amigos da Terra, o efetivo bovino alcançou índices recordes na Amazônia, chegando à proporção de 9,31 cabeça/habitante em Mato Groso. E a mata vai dando lugar ao capim.


 


Certamente, isto não libera a responsabilidade dos empresários da soja e algodão que, apesar da grande tecnologia disponível, estão entre os três primeiros setores citados na lista. Disso bem sabem os 41 trabalhadores que recentemente foram resgatados no município de Tapurah, usados na lavoura de soja na fazenda Vale do Rio Verde. Classificados com trabalho degradante, uma modalidade de trabalho escravo, estes trabalhadores ficavam expostos ao agrotóxico, sem condições mínimas de higiene nos alojamentos e tratados diferentemente de outros trabalhadores da fazenda.


 


A fazenda Vale do Rio Verde é responsável por 5% da produção de algodão no estado e, segundo a mesma Repórter Brasil, é reincidente no Artigo 149 da Constituição, que versa sobre trabalho escravo e degradante. Foi flagrada cometendo este crime em 2001 e esteve na Lista Suja de julho de 2005 a julho de 2007. Esta fazenda está arrendada para o Grupo Bom Futuro, que tem como diretor-presidente Eraí Maggi, primo do governador Blairo Maggi.


 


Para aumentar nossa preocupação foram encontradas na Gleba Rio Ferro, em Feliz Natal, vinte pessoas em regime de trabalho escravo. Algumas famílias de trabalhadores moravam no local: quatro crianças e quatro mulheres, que cozinhavam para o grupo. O dono da terra é ninguém menos que o ex-prefeito de Vera (MT), Dorley Rodrigues Freire. Nesta propriedade foi encontrado o Torton, mais conhecido como “agente laranja” (mistura de dois herbicidas), que era manipulado pelos trabalhadores sem a mínima segurança.


 


Certamente temos que combater o desmatamento no Mato Grosso, na Amazônia e em qualquer lugar em que este ocorra de forma indiscriminada e criminosa como temos observado. Aqueles, não poucos, proprietários que vem desmatando muito mais do que os 20% permitidos na Amazônia devem sofrer as punições já previstas pelo “simples” fato de estarem cometendo crime! E para este fato não existem argumentos.


 


Não obstante, as ações necessariamente têm que ser conjuntas, reforçando os Grupos Móveis de Fiscalização para combater o trabalho escravo dando-lhes cada vez mais condições de trabalho; bloqueando qualquer crédito subsidiado para proprietários que desmatam ilegalmente; investindo cada vez mais nas tecnologias de imagens de satélite e em ações por terra, antes que seja mais tarde do que já é.


O que precisamos, talvez antes de tudo, é debelar esta idéia de que as ilegalidades fazem parte do processo de desenvolvimento do país. Este “jeitinho permitido” para que o país “cresça” gerando mais divisas para que possa depois “dividir o bolo”.


 


Quem sabe alguns passos maiores sejam dados quando o governador Blairo Maggi puser, enfim, em prática seu compromisso assumido em 2006 de combater o trabalho escravo no estado.


 


Há outro lado

Na outra ponta, a de incentivo à preservação, estão as comunidades indígenas e suas seculares formas de preservação ambiental. Numa observação, mesmo que superficial no mapa ambiental de Mato Grosso poderemos notar que as áreas preservadas, com mata nativa e com o mínimo de alteração, coincidem com as terras indígenas. Estas nem de longe se comparam com os “desertos verdes” de soja e seus banhos de agrotóxico.


 


Não se trata de apologia a nenhuma forma de indenização por esta prática, estes povos nunca precisaram receber nada para cuidar de seus territórios, de seus rios, de sua terra. O que precisamos garantir é que seus territórios demarcados sejam respeitados e que aqueles ainda em trâmite jurídico, embalados na lentidão judicial e nos recursos, sejam enfim reconhecidos, demarcados e entregues definitivamente àqueles que já vêm garantindo o futuro dos recursos naturais da forma mais sustentável.


 


Bom seria se os grandes devastadores da Amazônia, latifundiários auto-batizados de “empresários do agronegócio” pudessem, ao contrário de tentar assediá-los, aprender com os povos indígenas.


 


Gilberto Vieira – Cimi/MT

Fonte: Cimi - MT
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