04/04/2007

Lugar da Missão em Aparecida

Paulo Suess


I. Contextualização da V Conferência


 


Missão e missionariedade, como pano de fundo, vão ganhar destaque na V Conferência do Episcopado da América Latina e do Caribe. O fato do encolhimento do catolicismo no Brasil e, por tabela, na América Latina, a perda de 1% dos adeptos a cada ano, enquanto os mórmons no Brasil, por exemplo, cresceram nos últimos seis anos 460%, levaram as instâncias responsáveis a escolherem o Brasil como país e Aparecida como lugar para a realização desse evento.[1] Alguns setores esperam com o imaginário de Nossa Senhora Aparecida e com a missão como marketing mais agressivo reverter a tendência do retrocesso estatístico. Nesta perspectiva, a Missão seria apenas um tema estratégico em torno de preocupações estatísticas. Mas, a preocupação maior, que corresponde à natureza missionária da Igreja, deve girar em torno de uma possível perda da qualidade ou funcionalidade de nossa presença missionária no meio do povo. Qualidade e funcionalidade implicam olhares diferentes, porém, têm também pontos de convergência.


 


Na economia, o conceito do crescimento se tornou uma palavra chave. É importante ressaltar que não podemos simplesmente transpor esse conceito para o campo religioso. Mas, nos pontos extremos da escala crescimento-decrescimento, o fator quantitativo se transforma num dado qualitativo. Igrejas vazias seriam também um indicador qualitativo. Mostraria que nem os pobres estão mais conosco, contrariando até a previsão de Jesus: “Pobres sempre tereis convosco” (Jo 12,8). Também o contentamento com a existência eclesial como “pequeno rebanho” pode revelar um aspecto elitista em contraste com a universalidade da missão (cf. Lc 12,32). Tudo isso são apenas tendências e possibilidades. A realidade da Igreja latino-americana é muito mais complexa, o que dificulta a construção de um consenso pastoral. Afinal, o êxodo eclesial aponta para um excesso ou para a falta de radicalidade evangélica (cf. Jo 6,67)? Em dois aspectos, no campo econômico e no campo ético, as comunidades evangélicas que acolhem os migrantes católicos não facilitam a vida dos seus neófitos. Exigem o págamento do dízimo em dia e não permitem bebídas alcoólicas.


 


Numa auto-avaliação, ainda bastante genérica, podemos afirmar que o encolhimento numérico dos fiéis é uma conseqüência da perda eclesial de “atratividade”. O que significa “atratividade eclesial”? Ela pode significar falta de coerência evangélica e relevância sociopolítica para o mundo dos pobres-outros. As perdas estatísticas podem apontar para o espírito da época, que tem dificuldades de assumir compromissos a longo prazo, mas também para perdas de profundidade, radicalidade e credibilidade da nossa presença. Afinal, fizemos muitas promessas ao povo que não cumprimos.


 


II. Lembrete das decisões já tomadas


 


Os delegados de Aparecida não se devem deixar guiar por estratégias mercadológicas nem precisam inventar novos paradigmas. Depois da missão colonial até o Vaticano II, depois do diálogo do Vaticano II, da libertação, da opção pelos pobres e da assunção como pressuposto da redenção, em Medellín (1968) e Puebla (1979), Santo Domingo (1992) procurou aprofundar o paradigma da inculturação. Bons textos e análises, inclusive das respectivas Conferências Episcopais, não faltam. Aparecida precisa apenas operacionalizar algumas das decisões tomadas desde o Vaticano II. As grandes contribuições, que a fila do povo e os próprios bispos-delegados elencaram desde Medellín, precisam ser realmente assumidas, recontextualizadas e transformadas em ações concretas para a construção de uma sociedade justa e solidária.


 


Essas contribuições, que são do conhecimento do povo e dos seus pastores, podem ser nucleadas como imperativos que emergem do Evangelho:


 


– a assunção da realidade, compreendida como sinal de Deus no tempo, deve tornar-se novamente ponto de partida de qualquer reflexão teológica e ação pastoral, segundo o princípio do Santo Irineu: Assumir para redimir (cf. Puebla 400);


– a opção pelos pobres, que pode ser aprofundada em duas direções: a) como opção pela pessoa de Jesus Cristo, que se identifica com os pobres (Mt 25) e b) como opção pelos pobres e com os pobres, respeitando sua subjetividade e seu protagonismo na construção do Reino;


– o reconhecimento teológico-pastoral da Igreja local, que exige mudanças estruturais; a Igreja local precisa romper com qualquer tipo de tutela colonial e praticar a sua idade adulta;


– a ampliação, decentralização e reestruturação dos ministérios para que na prática pastoral possam responder à diversidade sociocultural, dispersão geográfica e necessidade espiritual do povo de Deus;


– a participação qualitativa e diferenciada dos leigos, sobretudo das mulheres, na Igreja;


– a co-responsabilidade significativa do Povo de Deus na escolha dos seus pastores, sem os formalismos democráticos da sociedade civil, porém com regras de participação estabelecidas;


– a formação dos agentes pastorais (diáconos, futuros padres, leigos) a serviço e na proximidade do povo simples e pobre;


– continuidade e aprofundamento do diálogo ecumênico e inter-religioso.


 


Tudo isso já foi decidido e textualmente assumido. A novidade de Aparecida pode emergir da assunção e operacionalização estrutural dessas decisões tomadas nas Conferências anteriores. O povo de Deus está cansado de sempre novas conferências, análises e interpretações sem encaminhamentos concretos. Muitas propostas ficaram paradas no meio do caminho. Puebla nos lembra: “Se não ajudamos a concretizar a libertação que Cristo conquistou na cruz, mutilamos a libertação de modo irreparável, e a mutilamos igualmente se esquecemos o eixo da evangelização libertadora, que é a que transforma o homem em sujeito de seu próprio desenvolvimento individual e comunitário” (Puebla 485).


 


Os delegados da V Conferência precisam ter clareza sobre os passos concretos que devem, podem e querem dar. A voz do povo está documentada, a interpretação da realidade está ao alcance de todos, a alteridade dos povos indígenas e dos afro-americanos está ameaçada, o grito dos pobres está no ar. Precisamos de um novo Pentecostes!


 


III. Fio teológico-pastoral condutor


 


Para facilitar o processo decisório em Aparecida, procuramos, a seguir, lembrar o fio teológico-pastoral condutor em continuidade com as reflexões missiológicas do Vaticano II, de Medellín, Puebla e Santo Domingo.


 


1. A missão da Igreja tem a sua origem na “missão de Deus” (missio Dei). Essa missão de Deus Trindade significa a abertura da relação intratrinitária que se concretiza, historicamente, na Criação, na Encarnação e na Redenção (cf. AG 2ss). Através do envio de Jesus Cristo ao mundo, a “missão de Deus” adquiriu densidade, visibilidade e vulnerabilidade históricas. Jesus de Nazaré nos revela o rosto paterno e materno de Deus, um Deus misericordioso e justo. Ele caminha não só na frente e no meio de seu povo, mas se identifica com o setor mais vulnerável desse povo, até a sua Parusia (cf. Mt 25,31ss). A abertura da relação intratrinitária de Deus para a humanidade fragilizada constitui uma nova lógica nas relações entre Deus e a humanidade e entre as pessoas humanas. É a lógica de Deus-Amor, a lógica do dom (da graça, da gratuidade) e da doação (lava-pés e cruz como condensação do serviço).


 


2. O Vaticano II deixou marcas teológico-pastorais novas para a ação missionária da Igreja. Essa missionariedade não é mais algo exterior, uma entre muitas atividades. O Concílio definiu a missionariedade como parte integrante da identidade eclesial. A Igreja conciliar se considera por sua natureza missionária (cf. AG 2) e se definiu como povo de Deus, sacramento universal da salvação e como mistério. O povo de Deus em seu conjunto, por sua natureza e vocação, é missionário. É chamado “para manifestar e comunicar a caridade de Deus a todas as pessoas e povos” (AG 10).


 


3. Nos processos da assunção do Vaticano II na América Latina e no Caribe produziu-se um deslocamento do “ter missões” ao “ser missionário”; o deslocamento de uma Igreja que tem missões territoriais, pelas quais se fazem coletas e orações para que possam trazer a humanidade não-cristã à Igreja Católica, para uma Igreja na qual a missionariedade representa uma orientação fundamental de todas as suas atividades. A partir dessa missionariedade fazemos a leitura “do ser católico” como um “estar universalmente próximo” aos pobres-outros e como “responsabilidade para com o mundo” (AG 36b).


 


4. A Igreja Povo de Deus vive essa responsabilidade em meio a conflitos estruturalmente produzidos pelo antiprojeto do Reino, o capitalismo. Esses conflitos têm o rosto humano concreto das vítimas (Puebla 31-41). Não basta condenar abusos do capitalismo neoliberal ou querer humanizá-lo. Ele representa o antiprojeto. O antiprojeto é o reino do pão não partilhado, do poder que não se configura como serviço, do privilégio que favorece a acumulação e do prestígio que organiza eventos de ostentação em vez de articular processos de transformação. O antiprojeto é a realização de tudo aquilo que está na perícope da tentação de Jesus no deserto (Lc 4,1ss). Essas tentações acompanham a Igreja em toda a sua história. Diante do mundo espetacular e conflituoso, esse povo peregrino, “avançando pela estreita via da cruz” (AG 1c), está ao lado das vítimas, dos pobres e dos outros.


 


5. A Igreja que é essencialmente missionária aprendeu os dois movimentos estruturantes de sua missionariedade com Jesus de Nazaré. São eles: CONVOCAR e ENVIAR. Convocar significa chamar da dispersão desarticulada, de uma massa indefinida, de um sistema, de um aparato institucional, para constituir comunidades de irmãs e irmãos, e enviar essas comunidades ao mundo, anunciando a justiça do Reino. Aqui está também o sentido da vida comunitária dos religiosos e das religiosas, e também das Comunidades Eclesiais de Base e de todas as comunidades missionárias: congregar em função do envio e envio em função de formar, nas comunidades, agentes do Reino.


 


6. Entre convocação e envio, configuram-se novos contornos formais da missionariedade da Igreja: proximidade na universalidade, ruptura em continuidade e unidade na diversidade.


 


a) A proximidade universal dá continuidade ao aggiornamento, pensado por João XXIII e pelos padres conciliares, como princípio estruturante de uma leitura teológica inserida no tempo e no espaço. Proximidade aponta para a realidade dos pobres e para alternativas ao mundo globalizado, tão indiferente em face do diferente. Nessa realidade, os pobres representam a universalidade temporal e geográfica (“pobres sempre tereis”) e a contextualidade (inculturação, inserção) que desafiam a Igreja. Os pobres-outros não são contexto do Evangelho, mas são seu texto universal. “Proximidade na universalidade” pode ser compreendida como alternativa à colonização cultural e à exclusão social. “Proximidade na universalidade” visa uma nova compreensão da unidade, unidade como articulação de múltiplos projetos de vida com horizontes diferentes, mas não concorrentes.


b) Ruptura em continuidade é a proposta que emerge de um profundo discernimento da realidade. Ela aponta para a ruptura com o sistema “lucro logo existo”. Geralmente não conseguimos chegar além de rupturas simbólicas. Viver em continuidade com o mundo onde há trigo e joio, sem ser do mundo, representa uma conversão cotidiana. A gratuidade representa a ruptura simbólica sempre possível e nunca completa.


c) Unidade na diversidade representa a unidade no Espírito Santo com sua dimensão histórica e escatológica. É a articulação sempre precária dos diferentes num objetivo comum que tem muitos nomes: Reino de Deus, outro mundo possível (Fórum Social Mundial), Terra sem Males (guarani). Unidade na diversidade aponta também para a dimensão ecumênica e macroecumênica (inter-religiosa) da natureza missionária da Igreja.


 


IV. Continuidade de compromissos e opções


 


Da natureza missionária que se configura como responsabilidade para com o mundo, emergem os compromissos e opções concretas de uma Igreja Povo de Deus, que em sua coerência evangélica e fidelidade ao Reino se torna boa notícia:


 


1. Converter-se ao Reino


Converter-se ao Reino é tarefa de cada dia. Nessa tarefa a Igreja “se evangeliza a si mesma” (EM 15) através da denúncia e da ruptura com o sistema que cria vítimas e do anúncio da Boa-Nova de um outro mundo que está se gestando no meio de nós (cf. EN 15). Medellín, mas também Puebla e Santo Domingo descrevem essa ruptura em termos teológicos como “conversão”, “criação nova”, “opção pelos pobres” e “libertação”. Aparecida pode fazer a leitura da conversão em chave de “gratuidade”. A gratuidade reduz a nossa vulnerabilidade a um mínimo.


 


2. Caminhar com as vítimas e resgatar a sua memória


A vida de todos os cristãos, nas mais diversas configurações sociais e culturais (jovens, idosos, empobrecidos, migrantes, classe média), está vinculada à causa dos pobres e dos outros, que são vítimas do anti-reino hegemônico. Em seus discursos axiais da Sinagoga de Nazaré (Lc 4), das Bem-aventuranças (Mt 5) e do Último Juízo (Mt 25), Jesus é muito claro. Os protagonistas e o núcleo central de seu projeto, que é o Reino, são as vítimas (os pobres, cativos, cegos, famintos, oprimidos, peregrinos estranhos, maltrapilhos, enfermos). Caminhar com as vítimas de ontem e hoje significa recordar, escutar e respaldar as suas vozes, numa proximidade inserida e inculturada, e numa solidariedade até as últimas conseqüências.


 


Para pobres, excluídos e, culturalmente, outros, a memória do passado é um instrumento decisivo para a construção de sua identidade, a cicatrização de suas feridas e a mobilização de sua resistência. Ao insistir na brasa escondida do passado, toda a atividade missionária se torna catalisadora de esperança. Quem está em paz com seu passado está preparado para essa missão sem fronteiras. A mensagem fundamental da missão é a esperança.


 


3. Os pobres, a epifania de Deus


As vítimas não são apenas os protagonistas ou os destinatários do projeto de Deus; são lugar da epifania de Deus, por excelência. No cristianismo, a questão social está estreitamente vinculada à questão da ortodoxia, e pecado significa indiferença diante da exploração dos pobres e do desprezo que sofrem. Neles, a Igreja reconhece “a imagem de seu Fundador pobre e sofredor” (LG 8c).


A Igreja só tem uma doutrina suficientemente verdadeira na proximidade aos pobres. Existe uma vinculação entre verdade e pobreza. No cristianismo, essa pobreza do próprio Deus tem muitos nomes: encarnação e presépio, cruz e sepúlcro vazio, pão eucarístico. Num belo texto, o então Cardeal Ratzinger escreveu: “A pobreza é a verdadeira aparição divina da verdade”.[2] A partir da teologia latino-americana, faríamos um acréscimo: a pobreza vivida pelos pobres e diferentes, pelos que sofrem e pelos migrantes. Sobretudo os migrantes de hoje representam Jesus Cristo em seu despojamento radical. Eles são portadores do Evangelho do caminho. Uma Igreja a caminho é uma Igreja simples, transparente e pascal.


 


4. Práticas significativas de participação


Reconhecer o outro-pobre em sua dignidade e alteridade significa inclusão e participação. Puebla dedicou uma das cinco partes de suas Conclusões à “comunhão e participação” (Puebla 563-891). Impulsionar práticas significativas de participação do povo de Deus é uma expressão coerente da natureza missionária da Igreja. Essa participação e partilha fraterna dos serviços e poderes vai dinamizar a opção pelos pobres através de uma opção com os pobres, que são porta para a Vida.


 


5. Viver a gratuidade como atitude pascal


Seguir Jesus no Espírito Santo significa viver a gratuidade como atitude pascal. O Evangelho da Graça se faz presente em todas as formas de doação da vida como abertura ao Reino: no diálogo inter-religioso, na presença silenciosa, no testemunho, na contemplação e na ação, na solidariedade, na misericórdia e na justiça, enfim, na proclamação da palavra da vida (cf. EN 22). A gratuidade é a condição da não-violência, da paz e da esperança de que um outro mundo – sem a lógica de custo-benefício – é possível e antecipada nas celebrações dos sacramentos como ritos de iniciação e transformação.


 


V. Quo vadis Aparecida?


 


A lenda conta que num tempo de grandes perseguições dos primeiros cristãos, São Pedro, com medo do martírio iminente, fugiu da capital do Império. Na Via Áppia, já a alguns quilômetros de Roma, enxergou de longe o Cristo indo ao seu encontro, carregando a cruz. E Pedro perguntou ao mestre: “Aonde vais, Senhor (quo vadis, domine)?” E Jesus respondeu: “Vou carregar mais uma vez a cruz, em teu lugar, por que tu abandonaste o meu povo”.


 


Aonde irás, Aparecida? Vais assumir mais algumas promessas para depois não cumpri-las? Resistirás à lógica do mundo com suas estruturas de exclusão e consumo privilegiado? Haverá, em Aparecida, conversão ao Reino? Conversão ao Reino significa novamente sentir o sopro do Espírito e assumir seus dons como tarefas. E esses dons apontam (a) para a assunção dos pobres na gratuidade como resistência à exclusão e à lógica de custo-benefício e (b) para a assunção dos outros na diversidade articulada como “unidade do Espírito Santo” em construção.


 


Diante dos desejos de acumulação e exclusão, o Espírito Santo aponta para a partilha, a gratuidade e a assunção da diversidade. Os dons de Deus se multiplicam na medida em que são gastos. Caminhar é a forma mais radical da partilha. No desapego do caminho e na riqueza da diversidade dos encontros está a possibilidade de um mundo novo. Os delegados de Aparecida, com coragem, sabedoria e despojamento pessoal podem abrir novos caminhos para as Igrejas latino-americana e do Caribe.


 


Segundo Sto. Agostinho, o Espírito Santo é Deus no gesto do dom.[3] Na tradição da Igreja, o mesmo Espírito é chamado “pai dos pobres” (Seqüência de Pentecostes) e, na Redemptoris Missio, “o protagonista de toda a missão eclesial” (RM 21b). A partir de uma dificuldade da Igreja Católica – Como lidar com o pentecostalismo? –, emerge como guia de uma solução o Espírito Santo, que aponta para a missionariedade, a gratuidade e os pobres-outros. Nele coincidem a missão ad gentes com a missão ad pauperes.


 


A gratuidade é a maneira de Deus agir. Nele tudo é graça, generosidade e misericórdia. Os pobres-outros são os escolhidos para sustentar e transformar o mundo. Quem os envia é o Espírito Santo. Nesse mesmo Espírito Santo, Maria Aparecida profetiza essa transformação: Deus “dispersou os homens de coração orgulhoso. Depôs poderosos de seus tronos e exaltou os humildes. Cumulou de bens a famintos e despediu ricos de mãos vazias” (Lc 1,51ss).


 


A gratuidade impulsiona à simplicidade. No mundo competitivo e excludente, onde tudo vale somente pelo seu preço de mercado, a essência do cristianismo está vinculada à derrota do reino da necessidade pela cruz de Cristo e à recuperação de um espaço alternativo de não-mercado e gratuidade. A partir da cruz, o cristianismo dispensa a necessidade de outros sacrifícios redentores e rejeita todo poder que exige sacrifícios e cria vítimas. O “sacrifício” pós-pascoal é “memória”, “ação de graças” (Eucaristia) e “solidariedade com os sacrificados” até os confins do mundo e na “unidade do Espírito Santo”.


 


Aonde vais, Aparecida? O povo de Deus espera sinais de justiça, gestos de coragem e decisões de inclusão (participação) eclesial, não para fugir do Império, mas para transformá-lo.


 


(o texto será publicado em: Vida Pastoral, n. maio/junho 2007)


 








[1] Cf. O Estado de S. Paulo, 10.12.2006, A32.



[2] J. RATZINGER, Der Dialog der Religionen und das jüdisch-christliche Verhältnis, in: IDEM, Die Vielfalt der Religionen und der Eine Bund. 3.ª ed., Bad Tölz: Urfeld, 2003, 93-121, aqui 116.



[3] AGOSTINHO, A Trindade, livro XV, n. 29.

Fonte: Paulo Suess
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