19/05/2006

MPF/PA vai recorrer para manter suspensos estudos de Belo Monte

O Ministério Público Federal no Pará deve ajuizar nos próximos dias recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) para suspender novamente quaisquer procedimentos de licenciamento da usina hidrelétrica de Belo Monte. Os procuradores da República que atuam no caso vão contestar a decisão do juiz Herculano Martins Nacif, da Vara Federal de Altamira, e tentar restabelecer os efeitos da liminar anterior, concedida pelo juiz Antonio Carlos Campelo, substituto de Nacif.


 


A Procuradoria da República em Altamira sustenta ser ilegal a maneira como Ibama e Eletronorte pretendem fazer os estudos de impacto ambiental (EIA), com base em um Decreto Legislativo considerado inconstitucional e sem prévia audiência com as comunidades indígenas afetadas pelo empreendimento. “Nosso maior temor é que se repita o desperdício de dinheiro público do estudo anterior, de 2001, que custou 8 milhões de reais e foi considerado irregular em todas as instâncias do Judiciário, justamente por não obedecer os procedimentos determinados pela legislação. O dinheiro foi jogado fora por pressa e falta de respeito aos trâmites legais. Essa mesma pressa que é demonstrada agora pode anular mais uma vez os estudos”, afirma Marco Antonio Almeida, procurador em Altamira, responsável pelo pedido de suspensão do EIA.


 


O procurador Felício Pontes Jr, de Belém, também atuando no caso, explica que não produz efeito legal argumentar que os índios serão ouvidos durante os estudos. Para ele, a Constituição é clara a respeito dos requisitos de uma autorização para obras do porte de Belo Monte. “O artigo 231 não deixa margem para dúvidas. A autorização do Congresso é política, e não técnica, e só pode ser definida após consulta às comunidades indígenas afetadas. É fundamental obedecer a esse mandamento, sob pena de jogarmos por terra todo o esforço dos constituintes de 1988 em garantir o direito dos índios às suas terras e recursos”, diz.


 


O artigo a que se refere Pontes define um rito para que o Estado brasileiro possa efetivar grandes obras de engenharia afetando comunidades indígenas: o Congresso Nacional ouve primeiro os índios para então decidir, politicamente, se há mais vantagens ou desvantagens para o país em levar adiante determinado empreendimento. Essa decisão é expressa por meio de um decreto legislativo, como o de nº 788/2005, que foi o primeiro baseado no artigo 231 e autorizou a usina de Belo Monte. O problema é que, aprovado em tempo recorde, apenas 15 dias, acabou editado sem a necessária oitiva aos indígenas afetados.


 


“A pressa de quem defende o projeto de Belo Monte é que está atrapalhando, porque impede a obediência às leis brasileiras e o respeito necessário aos bens ambientais, que deveriam ser preocupação do Congresso, da União e de todos os brasileiros”, diz Pontes. O próprio senador paraense Luiz Otávio Campos, durante a sessão que aprovou o decreto, se espantou com a rapidez do trâmite. “Estou na Casa há mais de sete anos, e há projetos que estão aqui desde que cheguei e não saem das comissões, não andam. E esse projeto, por incrível que pareça, foi apresentado no dia 8 de julho (2005), na semana passada. Faz quatro dias que esse projeto foi aprovado na Câmara e vamos aprová-lo aqui no Senado hoje. Eu nunca vi isso! Manifesto apenas minha admiração… Mas queria saber o motivo de tanta urgência”, discursou o senador.


 


Veja o que diz o artigo 231, parágrafo 3º da Constituição Brasileira, sobre aproveitamento hidrelétrico em terras indígenas: “O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.”


 


O jurista Dalmo Dallari, um dos mais respeitados do país, interpretou assim a necessidade de ouvir as comunidades indígenas: “Não é pura e simplesmente ouvir para matar a curiosidade, ou para ter-se uma informação relevante. Não. É ouvir para condicionar a decisão. O legislador não pode tomar decisão sem conhecer, neste caso, os efeitos dessa decisão. Ele é obrigado a ouvir. Não é apenas uma recomendação. É, na verdade, um condicionamento para o exercício de legislar. Se elas (comunidades indígenas) demonstrarem que será tão violento o impacto (da mineração ou da construção de hidrelétrica), será tão agressivo que pode significar a morte de pessoas ou a morte da cultura, cria-se um obstáculo intransponível à concessão da autorização”.


 


Helena Palmquist


Assessoria de Comunicação


Procuradoria da República no Pará


Fones: (91) 3299.0148 / (91) 3222.1291 / (91) 9999.8189


 

Fonte: Procuradoria da República no Pará
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