As falsas vítimas?
De absurdo em absurdo vai se completando o cerco de negação aos diretos dos povos indígenas no Brasil. Há poucos dias o presidente da Funai manifestou abertamente sua vontade em limitar os territórios indígenas com a intervenção do STF. Isso porque ele é um funcionário público pago para defender os indígenas e não um representante de madeireiras, fazendeiros, grupos econômicos, etc.
Agora, vem a tendenciosa e preconceituosa reportagem da revista Veja em, “as falsas vítimas”, de 29 de março de 2006, que criminaliza os indígenas e seus movimentos, associando-os, tendenciosamente, como faz com o MST.
O conteúdo desenrolado pelos repórteres tem tudo a ver com a exposição do presidente da Funai. A questão é urgentemente fundiária e não de banditismo ou bandalheira indígena, como sugerem o presidente e a revista. Em relação a essas declarações cabe a pergunta: Existe uma Lei Constitucional que determina o tamanho da propriedade no Brasil? Ou a lei prevalecente é o ilimitado uso da violência, da grilagem e das fraudes? Sim, porque até agora os números que crescem no campo são os de assassinatos, violências e desrespeitos contra pequenos trabalhadores, de quilombolas e dos povos indígenas e não o contrário. A realidade está aí para ser comprovada.
Se os repórteres não possuem a capacidade de sentir culpa ou responsabilidade pelo sofrimento imposto a muitos brasileiros, que tenham a hombridade de reconhecer as gritantes injustiças sociais do país. Ninguém precisa só e puramente dos sentimentos de culpa de quem quer que seja, mas de, primeiramente, reconhecê-las e engajar-se para tornar o Brasil um país decente. A reportagem atribui poderes aos missionários religiosos, ongs e Funai de aumentarem as terras indígenas. Poder que só existe no imaginário dos produtores da matéria e de quem mais dela comungar. O engajamento jornalístico/informativo dos produtores da matéria está explicito.
Não são os indígenas os vilões e os grupos econômicos, pobres e indefesos, as vitimas. Mas a conjuntura antiindígena, o capitalismo selvagem e as estruturas existentes (leis absoletas e a burocracia do Estado) no país, capazes de darem apoios e submeterem essas populações a inúmeras e estúpidas violências.
Uma reportagem de tal conteúdo só contribui para aumentar o preconceito e a maneira deturpada com que são vistos esses povos por uma grande maioria da população. Os indígenas não protagonizam as ações que protagonizam por dinheiro, como quer nos fazer crer a revista, mas por inúmeras situações de abandono e principalmente para permanecerem e obterem a terra, um bem vital, que por ela perdem a própria vida.
Política que sustenta os discursos em defesa da economia e da exportação, tão defendida por esses segmentos, vem sendo realizada às custas da fome e da morte de muitos brasileiros. Como exemplo a invasão e agressão da Polícia Federal aos Tupiniquim em Aracruz (ES), a expulsão dos Guarani de suas terras em Nhanderu Marangatu (MS), as pressões contra o povo Pataxó na Bahia e Macuxi em Roraima; o descaso generalizado com a saúde; e a determinação do governo de prosseguir com uma política nacional de hidroelétricas, estradas e projetos econômicos a custo do meio ambiente, da vida e dos territórios tradicionais indígenas.
A reportagem exime os grupos econômicos citados de qualquer culpabilidade e de novo, criminaliza os movimentos populares e seus protagonistas. Os movimentos que os indígenas desencadeiam pelo país afora, são para chamarem a atenção pelos seus Direitos. Isso causa um incômodo, porque traz a tona os índios vivos e em plena ebulição no cenário nacional; quando a muitos interessariam seu desaparecimento e passassem a figurar somente nas páginas dos livros de história, de preferência em cores preta e branca, para se ter a certeza que de lá não saltariam, porque ‘índio bom é índio morto’.
Quanto às vultosas verbas e números de encher os olhos que os grupos econômicos perderam e ‘gastaram’ com indígenas (isso se foi os indígenas que as administraram), não chega nem perto do que representa seus lucros, as benesses e concessões que a União, proprietárias das terras, lhes concede, mesmo muitas delas sendo territórios indígenas de tempos imemoriais. Que vida boa e segura os indígenas e milhares de brasileiros teriam se fosse concedida a eles tanta benesse. Por tanto os grupos em questão tem a ver sim, como também o governo e toda a sociedade com essa problemática urgente que o país deve a esses povos.
Rosana Diniz – Cimi MA