02/02/2006

Apresentação









 
Escultura (Merida/Peru).
Plumário (extraído do livro “A Plumária Indígena Brasileira).
Foto: Navarro


 


A Assessoria Teológica tem três tarefas principais: a animação das bases missionárias, a articulação teológica do trabalho missionário do Cimi com a Igreja institucional e, por último, a vinculação do trabalho missionário do Cimi com as grandes questões de hoje e com os movimentos sociais mostrando que a razão da nossa fé acrescenta algo importante às lutas por transformação e justiça. As três tarefas são tarefas teológicas.


Do meio dos conflitos diários, caracterizados pelos três “Rs” REALIDADE, RUPTURA E REINO, pode-se forjar uma “teologia de esperança” que contradiz a lógica hegemônica do custo-benefício e suas conseqüências que banalizam a morte e o sofrimento dos povos indígenas. Essa teologia, seja como Teologia Índia ou Teologia Missionária, como espiritualidade ou como releitura da história, diz: a presença missionária nas aldeias tem sentido e pode ser relevante para a vida dos povos indígenas. O alcance da luta indígena pela terra vai muito além de meras reivindicações étnicas. Trata-se da instauração de uma nova lógica nas relações sociais e ecológicas da humanidade. A luta dos pequenos nem foi nem será em vão.


A segunda tarefa da Assessoria Teológica é construir uma ponte ao ser e coração da Igreja que se define essencialmente missionária. Essa ponte há de ser ecumenicamente construída entre dois abismos; entre o abismo do vale tudo de um relativismo secularizante, e o abismo do fundamentalismo proselitista que procura através de uma “assistência missionária” ganhar almas para o céu. O papa Bento XVI, em sua primeira encílica Deus Caritas Est, sublinhou bem que “a caridade não deve ser um meio em função daquilo que hoje é indicado como proselitismo. O amor é gratuito; não é realizado para alcançar outros fins” (DCE 31).


A terceira tarefa da Assessoria Teológica nos aproxima ao mundo não-indígena. Os caminhos de nossa intervenção missionária nesse mundo não são as auto-estradas do “espírito da época” que vê grande parte da humanidade e, sobretudo, os povos indígenas apenas no retrovisor e como obstáculo. A partir da prática missionária junto aos povos indígenas não produzimos uma teologia provincial. Estamos junto às vítimas sistêmicas, mas somos ao mesmo tempo universalmente articulados. No desacordo e na ruptura com o “espírito da época” está a possibilidade de uma nova relevância profética e missionária, captando a luz dos sinais de Deus no mundo de hoje para o bem de todos.


Nossa presença na luta dos povos indígenas é teologicamente relevante. Nos faz redescobrir algumas exigências do mistério e da utopia da vida como tal. Precisamos suspender a marcha para o abismo, abandonar a prisão das necessidades, sonhar o prazer da liberdade e da responsabilidade recíprocas. Os povos indígenas nos fazem pensar a essência da vida, escondida nos mistérios “aquém do pensamento e além da sociedade: na contemplação de um mineral mais belo que todas as nossas obras; no perfume mais sábio que os nossos livros, respirado no âmago de um lírio; ou no piscar de olhos, cheio de paciência, serenidade e perdão recíproco que um entendimento involuntário permite, por vezes, trocar com um gato” [Lévi-Strauss, Tristes trópicos].


 

Fonte: Paulo Suess (Assessor Teológico do Cimi)
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