11/08/2005

Informe nº 676: Processo para a homologação da terra dos Javaé e Karajá perde-se na burocracia da política indigenista

PROCESSO PARA A HOMOLOGAÇÃO DA TERRA DOS JAVAÉ E KARAJÁ PERDE-SE NA BUROCRACIA DA POLÍTICA INDIGENISTA



 


O último passo no processo de reconhecimento de uma terra indígena pelo Estado brasileiro é a homologação. Para que ele aconteça, o ministro da Justiça envia o processo administrativo para o presidente da República, que assina um decreto. O processo da terra Iñawébohona, dos povos Javaé e Karajá, no Tocantins, foi encaminhado para a assinatura presidencial em 18 de abril deste ano, pelo ministro Marcio Thomaz Bastos. Mas a terra não foi homologada. O processo parou. Não chegou à Presidência da República e ainda voltou para a Funai.


 


Os indígenas que vivem nesta terra só ficaram sabendo disto depois de dois dias fazendo pressão política em Brasília para tentar entender as causas da demora para a homologação, que já poderia ter sido encaminhada há dois anos.


 


Desde o dia 02 de agosto, eles tentavam marcar audiências com os ministérios da Justiça e do Meio Ambiente (MMA), com a Fundação Nacional do Índio (Funai) e com o órgão ambiental brasileiro, o Ibama. Só o MMA respondeu, dizendo que assunto não era de sua responsabilidade.


 


Mesmo sem reuniões agendadas, 20 lideranças Javaé, Xerente e Karajá vieram para a capital do país. Na tarde do dia 09, foram para a porta do Ministério da Justiça (MJ), na Esplanada dos Ministérios, pressionar para serem atendidos. Conseguiram. O MJ ordenou à Funai que recebesse o grupo, que se reuniu com presidente do órgão, Mércio Pereira Gomes. Uma surpresa, já que a gestão atual da Funai tem adotado uma política de receber pouquíssimos grupos indígenas.


 


A pauta com a Funai e o Ministério da Justiça era a homologação da terra Iñawébohona, que fica na Ilha do Bananal, sobre o rio Araguaia, no Tocantins. Há quase dois anos, em 12 de agosto de 2003, o processo de demarcação da terra chegou ao ministério, que tem a função de, em um prazo de 30 dias depois do recebimento, analisa-lo e, aprovando-o, encaminhá-lo ao presidente da República. Caso o processo seja desaprovado, ele deve voltar à Funai “mediante decisão fundamentada”.


 


Durante a reunião, Gomes não sabia dizer aos indígenas o que impedia o prosseguimento do processo de homologação da terra. Após três horas de reunião, telefonemas para o Ministério da Justiça e muita conversa, o presidente do órgão indigenista oficial admitiu que o processo havia voltado do MJ para a Funai. Mas ninguém ali sabia onde os papéis estavam. O processo estava “perdido”.


 


Na manhã desta quinta-feira, os indígenas voltaram à Funai. Diziam que não sairiam de lá sem cópia do processo. Depois de muita procura, o referido processo foi encontrado, e esclareceram o que ninguém parecia saber: o processo voltou para a Funai com a sugestão de que fosse criado um Grupo de Trabalho (GT) com Ibama e Funai para resolver o impasse colocado pelo Ibama, que administra o Parque Nacional do Araguaia, criado dentro da terra indígena. 


 


A sobreposição do parque em terras indígenas tem gerado problemas no dia-a-dia das comunidades, já que o Ibama tem restrições ao uso do espaço. O exemplo mais recente foi o impedimento da chegada de luz elétrica a algumas aldeias, que levou a não-construção de um poço artesiano. Sem eles, os Javaé continuam tendo que beber água do rio, poluída pelas plantações em volta da ilha. 


 


A Funai já havia se posicionado dizendo que os questionamentos do órgão ambiental não eram impedimento para a homologação da terra, pois os títulos que existem sobre uma terra indígena são nulos. Mas a Assessoria Jurídica do MJ voltou a recomendar a criação do GT em abril de 2005. Como a Funai não encaminhou o GT e tampouco questionou a sugestão do MJ, o processo ficou parado – e perdido – desde maio, na mais recente versão do “deixa-que-eu-deixo”.


 


Para tentar resolver o impasse, os Javaé conseguiram que fosse agendada mais uma reunião, na próxima sexta-feira, 12, com os presidentes da Funai, do Ibama e com o Ministério Público Federal. Afirmam estarem dispostos a não tomar o caminho de volta para casa sem uma resposta definitiva sobre os encaminhamentos necessários à homologação de sua terra.


 


FUNAI COMPROMETE-SE A DECLARAR TERRAS TUPINIKIM E GUARANI, NO ESPÍRITO SANTO


 


Uma audiência pública sobre a situação das terras dos povos Tupinikim e Guarani, no Espírito Santo, foi realizada ontem, dia 10, pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, em Brasília. Parte do território indígena, que estava sob a posse da multinacional Aracruz Celulose e era utilizado para a plantação de eucaliptos, foi retomada pelos indígenas em maio deste ano. Desde então, indígenas e a empresa voltaram a disputar a terra.


 


“Nós não vamos abrir mão da terra. Podemos conversar sobre como será a indenização pelo que a empresa construiu ou plantou sobre ela, mas sobre a terra não abrimos mão”, afirmou o indígena Antonio Carvalho.


 


Para os indígenas, a audiência tinha como objetivo garantir o compromisso da Funai e do Ministério da Justiça para a publicação de uma portaria declaratória que finalmente reconheça a posse indígena sobre toda a área já antropologicamente reconhecida. Roberto Lustosa, da Funai, afirmou que o órgão indigenista pretende encaminhar a publicação, desde que não haja possibilidade de questionamentos judiciais. “A portaria só vai surgir depois que não houver risco de que ela seja logo em seguida contestada por uma decisão judicial”. Segundo ele, o governo considera que a portaria de demarcação de toda a extensão da terra, que foi substituída por outra, deverá ser resgatada: “A portaria de 1998 nunca contestou o laudo antropológico realizado pela Funai”, afirma.


 


Os indígenas já iniciaram a reconstrução de aldeias e afirmam que pretendem retirar da área o eucalipto. A terra, localizada no município de Aracruz, no Espírito Santo, é identificada antropologicamente pela Funai desde 1998 com cerca de 18.000 hectares, mas foi demarcada em ilhas totalizando 7.061 hectares depois de um acordo que passava à Aracruz o direito sobre parte da terra em troca de pagamentos. O acordo, firmado entre indígenas e a empresa em condições questionáveis, contou inicialmente com o apoio do Ministério Público Federal (MPF). Um mês depois, o próprio MPF passou a questionar a legitimidade do acordo, já que as terras indígenas são, por definição constitucional, inalienáveis.


 


Participaram da audiência lideranças indígenas dos dois povos, representantes da Funai e do Ministério da Justiça, o Ministério Público Federal e um representante da Aracruz Celulose, Carlos Alberto Roxo, que afirmou que a empresa deve entrar na Justiça para tentar garantir sua posse sobre a terra.


 


Brasília, 11 de agosto de 2005.


 


Cimi – Conselho Indigenista Missionário


 

Fonte: Cimi - Assessoria de Imprensa
Share this: