Petição do Cimi Regional Nordeste ao Ministério Público Estadual
Recife, 05 de julho de 2005.
Aos Exmos. Srs.
Dr. FRANCISCO SALES
DD. Procurador Geral de Justiça de Pernambuco
Dr. WESTEI CONDE Y MARTIN JÚNIOR
DD. Coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias (CAOP-PE) do Ministério Público do Estado de Pernambuco
CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO – REGIONAL NORDESTE, associação civil sem fins lucrativos, CGC/MF nº 00.479.105/0007-60, com sede na Rua 13 de Maio, nº 288, Santo Amaro, Recife, no Estado de Pernambuco, VEM, por intermédio de seus Advogados, expor e requerer o que adiante se segue :
01. Preliminarmente, registra que os graves episódios adiante descritos foram relatados por 07 indígenas em depoimentos tomados por termo e anexos à presente petição (Docs 01 a 07), os quais descrevem com detalhes os fatos criminosos e violentos recentemente ocorridos no Território Indígena Truká, praticados por policiais militares com requintes de desumanidade, crueldade e configurando gravíssimas violações aos direitos humanos e à dignidade da pessoa, inclusive com a execução sumária de um indígena e de seu filho.
02. Com efeito, no dia 30 de junho de 2005, o Povo Truká recebeu a visita do Ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, juntamente com outras autoridades para a solenidade de assinatura do Convênio firmado para a construção de 140 casas, além do início das obras de asfaltamento da estrada principal e das vicinais que cortam a terra indígena.
03. Durante todo o dia os indígenas observaram a presença de soldados do exército e policiais militares fardados, além de quatro agentes, à paisana, do serviço de inteligência da polícia militar, dos quais, três foram de logo identificados pelos índios Truká como sendo o Tenente Hans, e os policiais Murilo e Jaelson.
04. Como esses policiais à paisana sempre cometeram muitos eventos de violência na Comunidade Indígena e na Cidade de Cabrobó, sendo conhecidos pelas ações no grupo de extermínio denominado “Mamãe Cria e Nós Mata”, o Cacique juntamente com outra liderança requereram ao Comandante da Polícia Militar Capitão Flávio Bione que determinasse a saída daqueles homens, o qual lhes garantiu que logo após a chegada do Ministro na Terra Indígena eles se retirariam.
05. Depois da solenidade com as autoridades os indígenas deram início ao festejo de comemoração do Convênio. Assim, depois de servido o lanche, três indígenas foram até uma construção próxima para pegar alguns tijolos e improvisar uma churrasqueira. Nesse momento, encontraram os quatro policias ainda à paisana, agachados no muro e portando duas pistolas cada um.
06. Ao perceberem que foram vistos, os policiais partiram para cima dos três índios, pegando um deles como refém e caminhando em direção à multidão que estava reunida assistindo ao show de uma banda de música. Os policiais dispararam várias vezes contra os índios e para cima, causando um tumulto geral e ferindo algumas pessoas, dentre elas os índios Marcos, no abdômen, e Edimilson Pereira da Silva, atingido de raspão nas costas.
07. Foi então que o Tenente Hans deparou-se com o Indígena Adenilson dos Santos Barros, conhecido como Dena, entrando em luta corporal com este, que, ao tentar fugir, foi alvejado pelo Tenente com um tiro na perna, pelas costas, e, em seguida, quando estava no chão, recebeu do mesmo policial, mas dois tiros nas costas, com inequívoca intenção de uma covarde execução.
08. Em seguida, quando o filho da vítima, o adolescente Jorge dos Santos Barros, se aproximou do Tenente e implorou para que este não matasse seu pai, ainda vivo, foi executado pelo policial Jaelson, que lhe deu dois tiros, um que lhe transfixou o tórax e outro nas nádegas.
09. Mas a barbárie não se encerrou com os assassinatos. Enquanto os indígenas estacionavam um carro próximo para socorrer as vítimas, o Tenente Hans atirou em direção ao veículo, ordenando que o motorista se retirasse do carro e pegando as chaves da ignição e impedindo, juntamente com os outros policiais, de armas apontadas para os índios, que a Comunidade Indígena socorresse as vítimas.
10. Em torno de 30 minutos depois, conforme os relatos anexos, chegaram três viaturas da Polícia Militar, agora com policiais fardados, os quais socorreram as vítimas e retiraram os executores do local. Evidentemente que não foram presos em flagrante delito, mas apenas retirados do local pelos seus colegas de farda.
11. Quando os indígenas chegaram no Hospital de Cabrobó com as vítimas, estavam presentes o Chefe de Posto da Funai Marcos Florentino, o Comandante da Polícia Militar Capitão Bione, o Promotor de Justiça Local, Dr. Epaminondas e os Policiais autores dos assassinatos.
12. Pouco tempo depois, foi anunciado o falecimento dos indígenas Adenilson dos Santos Barros, o “Dena” e de seu filho, Jorge dos Santos Barros de apenas 17 anos. O outro indígena baleado no abdômen, Marcos, foi transferido para o Hospital Dom Maia em Petrolina, onde continua internado.
13. Esta ação criminosa da Polícia Militar de Pernambuco é mais uma das que se tornaram uma inaceitável e permanente prática no território indígena Truká, sem que haja qualquer respeito ao princípio da legalidade e ao Estado Democrático de Direito e à dignidade do cidadão.
14. É do conhecimento geral em Pernambuco que, sob o pretexto de uma atuação sigilosa, a Polícia Militar, através da 2ª Companhia, que é seu serviço de inteligência, vêm promovendo uma verdadeira chacina de pessoas humildes, como é o caso desses indígenas.
15. Com efeito, ante a todo o exposto, o Conselho Indigenista Missionário requer que V.Exas. :
15.1. Recebam as lideranças Indígenas Truká, para que o Ministério Público conheça mais detalhadamente os fatos e possa apurar, em inquérito específico, as denúncias da ação violenta da Polícia Militar na área indígena, bem como encaminhar medidas processuais e administrativas para punir os criminosos e para fazer respeitar assegurar os direitos constitucionais e legais da comunidade Truká;
15.2. Promovam articulações urgentes para exigir que as autoridades responsáveis do Governo do Estado tomem urgentes providências, dentre elas (1) promovam a imediata prisão dos criminosos; (2) façam cessar a coação oficial sobre a comunidade Truká; e (3) determinem providências imediatas para garantir a segurança da comunidade e do indígena Marcos, que se encontra convalescendo do tiro recebido.
Nestes Termos,
Pede deferimento.
Recife, 05 de julho de 2005.
BRUNO RIBEIRO DE PAIVA
OAB/PE 178-B
SANDRO HENRIQUE CALHEIROS LÔBO
OAB/PE 815-B
DANIEL PINHEIRO VIEGAS
OAB/PE 22.525