01/07/2005

Informe nº 670

GUARANI RETOMAM SUA TERRA NO MATO GROSSO DO SUL. REAÇÃO DOS FAZENDEIROS CAUSOU A MORTE DE UM GUARANI


 


Um indígena foi morto e outros cinco estão feridos após reação de fazendeiros a uma retomada de terras realizada por indígenas Guarani. A retomada aconteceu no tekoha (terra tradicional Guarani) Sombrerito, no município de Sete Quedas, a cerca de 470 km de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, na madrugada de domingo, dia 26. A Polícia Federal esteve na fazenda retomada e, após ouvir um sargento da Polícia Militar e três indígenas, um inquérito foi instaurado.


 


Os indígenas mantêm-se na área e solicitam que a Funai publique o relatório de identificação da terra, finalizando assim o primeiro passo administrativo para a demarcação da Sombrerito. “Derramamos nosso sangue pela terra de todos os nossos irmãos Guarani. Precisamos que a Funai tire todos os invasores de nossas terras”, afirmou o cacique da aldeia mais próxima da retomada, Rosalino, no domingo. A Funai propô-se a intermediar um diálogo entre indígenas e fazendeiros para que os Guarani possam continuar nas terras.


 


O governador em exercício do Mato Grosso do Sul, Egon Krakhecke, conversou por telefone com Márcio Thomaz Bastos, ministro da Justiça, e cobrou agilidade na conclusão do estudo fundiário – passo que falta para a finalização do relatório de identificação da terra. Solicitou também o reforço da presença policial na área de conflito para o desarmamento.


 


“Queremos que a polícia federal tire as armas dos jagunços, pistoleiros e fazendeiros da região que continuam ameaçando e cometendo esses crimes contra nosso povo”, escreveram a Comissão de Direitos Indígenas Kaiowá Guarani e Comissão Estadual de Direitos Indígenas, formadas por lideranças de todo o Mato Grosso do Sul. De acordo com informações de indígenas que estiveram na retomada, 30 pistoleiros chegaram em duas pick-ups na manhã de domingo e desceram delas atirando. Um tiro atingiu o tórax do indígena Dorival Benitez, matando-o. Ari Benitez, irmão de Dorival, está ferido no braço. Outro indígena teve o olho ferido, um jovem de 19 anos sofreu ferimentos leves e uma mulher grávida foi machucada com pancadas.


 


“Especialmente depois da divulgação das mortes das crianças por desnutrição, órgãos públicos como a Funai afirmam que o reconhecimento de terras no Mato Grosso do Sul faz parte de suas prioridades. Na prática, não houve empenho efetivo para avanços nos processos de terras indígenas. Isso leva ao acirramento dos conflitos e a reações dos índios ao verem suas terras cada vez mais exploradas”, afirma Egon Heck, do Conselho Indigenista Missionário.


 


Retomadas


 


As retomadas de terras são a forma encontrada pelos indígenas para poder voltar a viver em seus territórios tradicionais que estão invadidos por fazendeiros. Não são, portanto, os indígenas que “invadem” a área, como afirma a imprensa quando noticia o caso, mas os ocupantes não-índios que as invadiram e tomaram. Como o Estado brasileiro, responsável pela demarcação das terras indígenas, não realiza as demarcações, os indígenas são obrigados a retomar as terras.


 


Em alguns casos, os fazendeiros entram nas terras indígenas por iniciativa própria; em outros, as terras indígenas foram distribuídas pelo Estado. Na região do que hoje chamamos Mato Grosso do Sul, o poder público foi grande incentivador da ocupação das terras indígenas através de sua política de colonização.


 


Indígenas foram expulsos nos anos 70A região onde está situada a terra Sombrerito foi, desde o início do século XX, produtora de erva mate, maior produto comercial da região por décadas. Indígenas eram empregados pela Companhia Matte Larangeiras e continuaram vivendo em seus territórios. Com a decadência do produto, a pecuária cresceu na região, já nos anos 1970. E a expansão do novo negócio dependia da expulsão da população indígena.


 


Os indígenas que viviam em Sombrerito foram expulsos dali em 1975, por um fazendeiro. Eles retomaram parte de suas terras em setembro de 1999. Pressionados, em dezembro do mesmo ano, parte do grupo deixou o território. As famílias que ali se mantiveram foram expulsas por jagunços em 2000, e refugiaram-se nas terras de Porto Lindo, Sete Cerros, Amambaí, Jaguapiré e Aldeia Limão Verde.


 


Também na década de 70, o Incra fixou pouco mais de uma dezena de famílias na região. Mas apenas 8 fazendeiros são donos de 90% da terra identificada como indígena, que tem cerca de 13.000 hectares. O GT de identificação da área foi instituído pela Funai em 2003.


 


QUATRO INDÍGENAS BRASILEIRAS INDICADAS NO PROJETO 1000 MULHERES PARA O PRÊMIO NOBEL DA PAZ DE 2005



 


Entre as 52 brasileiras indicadas pelo Projeto “1000 Mulheres Para o Prêmio Nobel da Paz de 2005”, estão quatro mulheres indígenas: Maninha Xukuru-Kariri, Joênia Batista de Carvalho, Zenilda Xukuru e Eliane Potiguara.


 


Desde que o Prêmio Nobel da Paz foi criado, em 1901, apenas 12 mulheres receberam o título. O projeto busca reconhecer o trabalho de mulheres que, em diversos espaços, lutam pela paz. No Brasil, o Comitê do programa recebeu 262 sugestões. A partir das histórias, da visão, do método de trabalho e das estratégias contadas por cada uma das 1000 mulheres de 150 países que foram selecionadas, um livro será publicado.


 


Entre as indicadas, estão Joênia Batista de Carvalho do povo Wapichana, que vive em Roraima,é advogada e atua no Conselho Indígena de Roraima, o CIR, e Maninha Xukuru-Kariri, que participa da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme) desde a sua criação, há 15 anos. Foi a primeira mulher a fazer parte da coordenação da entidade. “A sociedade tenta negar suas origens indígenas. Eles tomaram nossas terras, nossas línguas e nossas crenças. Hoje, nós sabemos quem nós somos, quais são os nossos direitos e a posição que queremos ocupar na história”, diz.


 


Zenilda Maria de Araújo, do povo Xukuru, que vive em Pernambuco, participa há duas décadas da luta de seu povo pela terra. Hoje, os Xukuru têm posse de mais de 70% de seu território, mas ainda vivem sob ameaças constantes dos fazendeiros da região. “As mulheres têm participação em tudo na vida da comunidade: na roça, em casa, na educação, na saúde, na luta. Estamos na frente das lutas, junto com os homens. Quando a gente começa a refletir sobre as lutas, a gente ganha mais coragem para continuar lutando”, conta.


 


Eliane Potiguara nasceu em 1950 e, de acordo com as informações do projeto 1000 mulheres, é escritora e foi fundadora do Grupo Mulher-Educação Indígena (GRUMIN), hoje chamado Rede de Comunicação Indígena.


 


Brasília, 30 de junho de 2005.


 


Cimi – Conselho Indigenista Missionário


 

Fonte: Cimi - Assessoria de Imprensa
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