09/06/2005

Informe nº 667

ASSEMBLÉIA DA APOINME DECIDE FORTALECER O MOVIMENTO NAS BASES


 


A VI Assembléia da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme) acontece desde segunda-feira (dia 6), em Bahia da Traição, 90 km de João Pessoa, Paraíba. O encontro, que reúne cerca de 250 delegados, será encerrado hoje (dia 9), após planejar a atuação da entidade pelo próximo ano, focada na formação das lideranças, no fortalecimento do trabalho nas aldeias e na continuidade das articulações nacionais.


 


Quando a Apoinme foi criada, em 1990, os indígenas lutavam contra o preconceito da sociedade envolvente e com as dificuldades de reconhecimento étnico. Quinze anos depois, a Assembléia ainda precisa posicionar-se contra os órgãos oficiais como a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) que, baseados em “indícios de competência exclusiva da Funai” para o reconhecimento étnico, recusam-se a atender povos que não têm a situação fundiária regularizada ou não têm “reconhecimento étnico” da Funai. Para os indígenas, isto fere a Constituição Federal e a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que preconiza a auto identificação dos povos indígenas.


 


Nas deliberações da Assembléia, os participantes “repudiam veementemente” a Funasa por sua política de não atender aos índios que residem fora das terras indígenas ou aqueles cujas terras ainda não foram identificadas e delimitadas.


 


Conjuntura


 


A inexistência de uma política indigenista clara que embase a atuação do Estado brasileiro em relação aos indígenas, e a ausência dos povos no planejamento destas políticas levam à existência de um órgão como a Funai, que não consegue fiscalizar a atuação de outros órgãos e tampouco está comprometida com a regularização das terras indígenas. Nos debates, fica clara a falta de legitimidade de um órgão indigenista oficial que se propõe a funcionar sem que suas linhas e prioridades sejam definidas com a participação dos povos indígenas, como prevê a legislação nacional e a Convenção 169. “A Funai está baseada na tutela, em conceitos herdados da ditadura militar e que caíram por terra com a Constituição de 1988”, afirmou o antropólogo Estêvão Palitot, da Universidade Federal da Paraíba.


 


“O Mércio [Pereira Gomes, presidente da Funai] tem que respeitar este movimento. Estamos enfrentando esta política de não publicação dos trabalhos de identificação das terras. A Funai se aproveita dos atrasos dos relatórios, não dá atendimento dizendo que não tem relatório, que não tem recurso nesse ou naquele setor. E somos nós que estamos nas bases enfrentando pistoleiro, fazendeiro, garimpeiro e madeireiro”, afirmou a liderança Luiz Titiah, do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, que concluiu com a necessidade de fortalecimento do movimento indígena: “O que temos que fazer é fortalecer a nossa organização”, afirmou.


 


Neste contexto, a Assembléia decidiu por uma moção de repúdio ao presidente da Funai, pela sua postura discriminatória em relação aos povos indígenas do Nordeste e Leste. Em uma moção, posicionam-se contra “a política adotada pela Funai de redução de Terras Indígenas”, contra “a política contrária à revisão de limites de Terras Indígenas no Brasil já identificadas e homologadas”. A Apoinme questiona a “decisão do presidente da Funai em não constituir o Conselho de Política Indigenista Nacional”, com o qual Gomes comprometeu-se durante o Abril Indígena.


 


Os debates sobre a conjuntura nacional voltaram a abordar a difícil relação entre os povos indígenas e os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.


 


Saúde


 


Ao lado das críticas à qualidade do atendimento à saúde e à falta de transparência na gestão dos recursos públicos, os indígenas propuseram a realização de concurso público para contratação de profissionais da saúde, sobre a responsabilidade da Funasa, para retirar esta competência das prefeituras. Durante toda a Assembléia, a transferência das atribuições federais para terceiros foi criticada.


 


Dor


 


Entre os debates, os indígenas entoaram cantos e dançaram o Toré, ritual que hoje é realizado por grande parte dos povos da região, com características próprias em cada comunidade.


 


Desde o início da Assembléia, foi forte o sentimento de dor pela morte dos 17 indígenas Pankararu e Atikum, em acidente de carro ocorrido dia 1º de junho, quando eram transportados pela Funasa, de Recife para as aldeias. No acidente, faleceram também o motorista do veículo e um bombeiro.


 


História


 


A Apoinme nasceu da necessidade de estabelecer uma articulação permanente entre os povos indígenas das regiões nordeste e leste do país em suas lutas pela regularização das terras e pela garantia de políticas públicas.


 


Fundada em 1990 com o nome provisório de Comissão Leste/Nordeste, ela ganhou o nome atual em 1995, quando institucionalizou-se. Desde sua criação, a Articulação apóia as retomadas de terra, principal instrumento dos povos indígenas para a reconquista de seus territórios durante as últimas décadas.


 


Povos


 


Participam da Assembléia 43 povos indígenas de nove estados: Pernambuco, Alagoas, Ceará, Minas Gerais, Paraíba, Sergipe, Bahia, Espírito Santo e Rio Grande do Norte.


 


Esta é a primeira vez que indígenas do Rio Grande do Norte participam da Assembléia. São grupos que há cerca de 200 anos foram expulsos de suas terras, localizadas no atual estado da Paraíba, e migraram para o estado vizinho. Por conta do preconceito e da repressão, as comunidades conhecidas como Tapuia do Catu e por Família Mendonça do Amarelão tiveram que esconder suas identidades étnicas. Em 15 de junho, haverá uma audiência pública em Natal para debater com o poder público a situação dos indígenas.


 


Brasília, 9 de junho de 2005.


 


Cimi – Conselho indigenista Missionário


 

Fonte: Cimi - Assessoria de Imprensa
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