31/03/2005

Informe nº 657

POR UMA NOVA POLÍTICA INDIGENISTA, ABRIL TERÁ MOBILIZAÇÕES EM TODO O PAÍS


 


O mês de abril será marcado por uma série de eventos e protestos indígenas. Além de críticas à ausência e à ineficiência de políticas públicas específicas, serão levantadas propostas para a atuação do estado brasileiro em relação aos povos indígenas. Algumas destas propostas já foram apresentadas no “Manifesto de Abril”, lançado hoje (31), em Brasília.


 


O Manifesto denuncia que o número de terras declaradas como de posse indígena é, no governo Lula, o pior desde o fim do regime militar. Foram declaradas 13 terras indígenas nos dois anos de gestão, enquanto o governo Fernando Henrique Cadoso, também indiferente à matéria, declarou a média de 14 terras indígenas por ano de mandato. “Terras Indígenas viraram moeda de troca na barganha política com governadores de alguns estados”, afirmam as entidades do Fórum em Defesa dos Direitos Indígenas que assinam o texto. (leia aqui o manifesto na íntegra)


 


O documento cita também a volta dos setores militares aos espaços de definição sobre a política indigenista e a interferência da “velha ordem latifundiária que, sob a máscara do agronegócio, está determinando a cadência das demarcações das Terras Indígenas. O sojicultor Blairo Maggi, Governador de Mato Grosso, solicitou ao Governo Federal uma ilegal e imoral moratória de demarcações no Estado que administra e, surpreendentemente, foi atendido. As demarcações de Terras Indígenas em Santa Catarina foram condicionadas a uma também ilegal comissão estadual”.


 


As críticas são estendidas à Fundação Nacional do Índio (Funai). “O órgão indigenista proclama, por meio do seu presidente Mércio Gomes, o ´fim das demarcações´, cujo prazo por ele definido coincide com o fim do mandato do atual governo. Ao mesmo tempo a Funai reduz progressivamente o número de Grupos Técnicos para identificar Terras Indígenas e se recusa a reconhecer aquelas áreas indevidamente excluídas das terras já demarcadas”.   


 


Durante o lançamento do manifesto, a liderança indígena Jecinaldo Barbosa, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), destacou que a falta de uma política indigenista clara leva a uma “desorganização” do governo. “Por isso, mesmo havendo verbas para a saúde, por exemplo, não se consegue resolver o problema”, afirma.


 


Para a estruturação de uma política indigenista consistente, o documento apresenta como propostas:


 


– a criação de um Conselho Nacional de Política Indigenista com a efetiva participação indígena e da sociedade civil em sua composição.


– que o Congresso rejeite a Proposta de emenda constitucional n.º 38/1999 e o PLS n.º 188/2004 dos Senadores Mozarildo Cavalcante e Delcídio Amaral, bem como outras iniciativas legislativas que visem obstruir ou impedir o reconhecimento dos territórios indígenas. Neste sentido, propõe também que os direitos indígenas sejam regulamentados dentro do Estatuto das Sociedades Indígenas e não de forma isolada.


– que o Ministro da Justiça declare imediatamente como de posse indígena as terras: 1. Morro dos Cavalos (SC), 2. Las Casas (PA), 3. Aldeia Condá (SC), 4. Toldo Imbu (SC), 5. Piaçaguera (SP), 6. Toldo Pinhal (SC), 7. Yvy-Katu (MS), 8. Cachoeirinha (MS), 9. Batelão (MT) e 10. Balaio (AM). Que a TI Raposa Serra do Sol seja homologada em área contínua.


– que se garanta, em lei, dos mecanismos previstos na Convenção da Diversidade Biológica, de repartição justa e eqüitativa de benefícios e anuência prévia e informada, para o acesso aos conhecimentos dos povos indígenas e das populações locais.


 


Relatório da Anistia Internacional


 


Também durante o lançamento do manifesto para a imprensa, o vice-presidente do Cimi, Saulo Feitosa, destacou a proximidade entre as propostas do Fórum e as apresentadas pela Anistia Internacional (AI), que divulgou ontem (30) o relatório chamado “Estrangeiros em nosso próprio país”.


 


As recomendações da Anistia passam pela reestruturação do órgão indigenista oficial, pelo cumprimento dos compromissos da campanha eleitoral de Lula. Indicam também que “soluções justas e rápidas para as reivindicações não resolvidas sobre terras indígenas poderiam ter um grande impacto na redução dos níveis de pobreza, violência e outros abusos contra os povos indígenas. Esta questão deveria ser imediatamente priorizada pelo governo brasileiro, de acordo com suas obrigações constitucionais”.


 


Focado nas violações dos direitos humanos dos povos indígenas brasileiros, o relatório da AI trabalhou em duas frentes principais: a privação dos grupos indígenas de suas terras – ocupadas ilegalmente por fazendeiros, não demarcadas ou apropriadas pelas forças armadas -, e os casos de conflitos e assassinatos, envolvendo os cinta larga em Rondônia, os Xucuru em Pernambuco, os Guarani- Kaiowá do Mato Grosso do Sul e os Kaingang no Rio Grande do Sul.


 


Acampamento


 


As atividades do “Abril Indígena” terminarão com um grande acampamento, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília. Serão armadas cinco malocas onde ocorrerão plenárias, oficinas e seminários.


 


O acampamento ocorre de 24 de abril a 3 de maio, quando se reunirá com uma marcha de trabalhadores rurais, organizada pela Via Campesina.


 


HOMOLOGADA ÑANDE RU MARANGATU. NA TERRA BURITI, POSSIBILIDADE DE DESPEJO CONTINUA


 


Foi homologada no dia 29 de março a demarcação da terra indígena Ñande Ru Marangatu, localizada no município de Antônio João, Mato Grosso do Sul. O decreto assinado pelo Presidente da República garante aos Guarani-Kaiowá a permanência em seu território tradicional.


 


Agora, cabe ao Governo Federal a retirada dos fazendeiros invasores da terra indígena para que este povo possa viver em sua terra.


 


Ñande Ru Marangatu foi demarcada em outubro de 2004 com uma extensão total de 9.316 hectares. No mesmo mês, os Guarani-Kaiowá da região, que até então viviam em 26 hectares de terra, retomaram cerca de 500 hectares de suas terras tradicionais.


 


Inconformados com o reconhecimento das terras como sendo de ocupação tradicional indígena, alguns fazendeiros iniciaram uma disputa judicial que levou à iminência de ações de despejo dos indígenas de suas terras demarcadas.


 


Na terra retomada, os Guarani-Kaiowá de Ñande Ru Marangatu puderam voltar a produzir alimentos para subsistência, como mandioca, feijão, milho, batata, arroz, e banana.


 


A disputa judicial que levou às ameaças de reintegração de posse em Ñande Ru Marangatu é baseada nos mesmos argumentos contrários aos direitos indígenas que estão sendo utilizados em outros processos de disputa por terras no MS, como na terra Buriti, do povo Terena, localizada nos municípios de Dois Irmãos do Buriti e Sidrolândia. Ali, há uma reintegração de posse que pode ser cumprida a partir hoje (dia 31).


 


Ontem (dia 30), lideranças indígenas que participavam da Conferência Regional de Política Indigenista no Mato Grosso do Sul fecharam a estrada que liga a cidade de Dourados A Ponta Porã, carregando faixas em solidariedade ao povo Terena e exigindo a regularização de todas as terra indígenas do estado.


 


Brasília, 31 de março de 2005.


 


Cimi – Conselho Indigenista Missionário


 

Fonte: Cimi - Assessoria de Imprensa
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