Informe nº. 645
OMISSÃO DO GOVERNO NA HOMOLOGAÇÃO DE RAPOSA SERRA DO SOL ABRE ESPAÇO PARA NOVOS ENTRAVES JURÍDICOS A ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu segunda-feira (3/1) a Portaria 820, do Ministério da Justiça, que em 1998 estabeleceu a demarcação contínua da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. Com a nova decisão judicial, voltam os entraves para a homologação contínua da terra indígena. A decisão da ministra deverá ser avaliada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que volta a se reunir em fevereiro. Até lá, o processo de homologação da terra indígena ficará suspenso. Assim como aconteceu durante o governo Fernando Henrique Cardoso, em 2003 e no início de 2004, o Governo Federal se omitiu e deixou passar a possibilidade de homologar Raposa Serra do Sol em área contínua, o que foi possível entre o dia 15 de dezembro, quando o ministro Carlos Ayres Britto suspendeu as liminares contra a Portaria 820, e o dia 3 de janeiro de 2005. Entre negociações para o orçamento de 2005 e a manutenção da base ampla de sustentação do governo, que inclui oligarquias regionais, latifundiários e interessados, mais uma vez o reconhecimento dos diretos dos indígenas de Raposa Serra do Sol foi protelado. Cada vez que se protela esta decisão, se intensifica a ofensiva dos setores antiindígenas contra os direitos constitucionais conquistados pelos povos brasileiros. De Roraima, chegam informações de que os arrozeiros já se articulam para invadir mais terras indígenas com suas plantações. O cenário de ameaças de violência contra os indígenas continua forte na região. A homologação de terras indígenas pressupõe, em grande parte dos casos, tensionar o jogo político com os setores oligárquicos do país. Nem mesmo apelos da sociedade civil brasileira, da CNBB ou de órgãos internacionais como a OEA, que solicitou do governo brasileiro a adoção de medidas cautelares para a segurança dos direitos indígenas, parecem ser suficientes para o governo. Segundo um jornal de Roraima, em reunião ocorrida ontem, no Planalto, com o governador daquele Estado, Ottomar Pinto (PTB), o ministro Aldo Rebelo, os senadores Mozarildo Cavalcanti (PPS) e Augusto Botelho (PDT), e deputados federais de Roraima, o presidente afirmou que a decisão final da demarcação se aproximará do consenso e que ninguém será pego de surpresa. O direito dos povos indígenas, já anteriormente reconhecido pelo estado brasileiro, através da Constituição Federal, e confirmado pelo Ministro de Estado da Justiça, é trazido para ser rediscutido na arena política, com um resultado contrário aos índios já previamente definido, diante da disputa entre forças desiguais. Inicia-se então um processo de negociação de direitos, onde sempre impera a lei do mais forte. A primeira pergunta feita aos índios é sobre a extensão dos direitos que estão dispostos a ceder. Para forçar um acordo, a parte mais fraca é submetida a toda sorte de pressões. Em nível local, esta estratégia revela a sua face mais cruel com índios sendo feridos e mesmo mortos à bala, com a destruição de malocas, com o seqüestro de religiosos da Diocese de Roraima, conhecida pela sua posição a favor da causa indígena e pela omissão das autoridades. Não há dúvidas sobre a presença ancestral dos indígenas na Raposa Serra do Sol. O que há são interesses econômicos sobre a terra indígena. INDÍGENAS OCUPAM SEDE DA FUNAI EM MANAUS. ÓRGÃO PEDIU REINTEGRAÇÃO DE POSSE Desde a última segunda-feira (3/1), indígenas ocupam a sede da Fundação Nacional do Índio em Manaus, no Amazonas, solicitando a demarcação de terras indígenas que fazem parte da área de atuação da Administração Regional da Funai em Manaus. Pedem também a substituição do atual administrador regional da fundação, Benedito Rangel de Moraes. Os índios alegam má administração e responsabilizam o administrador por não apurar casos de estupro de mulheres indígenas que teriam sido praticados por funcionários do órgão na regional de Manaus. Os indígenas afirmam que só sairão do prédio com a presença do presidente da Funai, Mercio Pereira Gomes. De acordo com o indígena Benjamim Baniwa, Pereira Gomes informou, hoje pela manhã, que não irá a Manaus. “Ele disse que não vai porque considera invasão e já pediu reintegração de posse do prédio”. Os índios estão buscando interlocutores para impedir que a Polícia Federal entre no prédio. “Estamos aguardando o senador Jefferson Peres e deputados estaduais para tentar uma solução. É estranho que o comportamento do Rangel e do presidente do órgão que deve defender os interesses indígenas seja o de chamar a polícia”, contesta Baniwa. Ainda segundo Baniwa, o movimento que começou com 32 indígenas do povo Mura reúne 130 indígenas de 10 etnias do Amazonas. Alguns dos povos presentes vivem a até 600 km de distância de Manaus e, com a chegada de novos povos aumentaram as denúncias contra o administrador regional. “Não dá mais para o Rangel continuar na administração. Ele não vai mais ter como aparecer nas áreas indígenas. Na minha região [município de Barcelos, AM] ele não vai poder aparecer”, afirma o indígena do povo Baniwa. Brasília, 6 de janeiro de 2005. Cimi – Conselho Indigenista Missionário