TJ do Piauí suspende despejo Akroá-Gamella e encaminha ação à Justiça Federal
“Caso haja interesse da comunidade indígena, a ação deve tramitar perante a Justiça Federal”, determinou o juiz João Gabriel Furtado Baptista
A reintegração de posse contra 50 famílias Akroá-Gamella da aldeia Barra do Correntinho, município de Bom Jesus, foi suspensa pelo Tribunal de Justiça (TJ) do Piauí, no último dia 19. Além disso, o TJ encaminhou o processo para a Vara de Conflitos Fundiários da Justiça Federal por se tratar de litígio envolvendo Terra Indígena.
“Nos documentos que instruem o presente agravo, há o Relatório Técnico de ID 21386180 que identifica que os povos ocupantes da área disputada são indígenas, indicando a probabilidade de se tratar de demanda envolvendo o interesse de povos indígenas da etnia Akroá-Gamella (…) caso haja interesse da comunidade indígena, a ação deve tramitar perante a Justiça Federal”, determinou o juiz João Gabriel Furtado Baptista.
O despacho do TJ se deu em resposta ao agravo de instrumento da Defensoria Pública do Estado do Piauí contra decisão de Ação de Manutenção de Posse proposta pela Agropecuária Bomboi LTDA, com liminar publicada em 2007 determinando a retirada da comunidade indígena da área qualificada pelo Estado brasileiro como de reivindicação tradicional.
Mesmo sem abordar outros aspectos da ação judicial, a defesa dos Akroá-Gamella alega que o título apresentado à Justiça Estadual pela Agropecuária Bom Boi LTDA é falso. A conclusão foi apresentada pelo Instituto de Terras do Piauí (Interpi) e corrobora com o que as lideranças indígenas afirmam: a área tradicional reivindicada é alvo de de grilagem nas duas últimas décadas.
Por outro lado, em setembro deste ano, o Ministério Público Federal (MPF) impetrou ação exigindo que a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) realize os estudos de identificação e delimitação da Terra Indígena. O órgão indigenista do Estado já qualificou a demanda.
Despejo teve início
No último dia 14, o despejo teve início. Viaturas da Polícia Militar foram enviadas à aldeia, junto a um oficial de Justiça, mas não conseguiram retirar as 50 famílias Akroá-Gamella. Havia o questionamento da competência da Justiça Estadual em decidir sobre uma questão envolvendo povos indígenas.
A defesa dos indígenas procurou a Defensoria Pública, que recorreu da decisão. Conforme se verificou na primeira tentativa de retirada dos indígenas, tanto a Funai quanto o MPF não foram informados do despejo enquanto as viaturas da Polícia Militar se dirigiam ao território indígena sem a presença dos órgãos federais.
Ocorre que esta tentativa de despejo dos Akroá-Gamella está longe de questão fortuita e se enreda a outros ataques a territórios ocupados pelo povo no Piauí que sofreram investidas de invasores, de pessoas ou empresas que reclamam títulos de propriedade, além de uma outra ação de reintegração de posse.
Em julho deste ano, a comunidade de Barra do Correntinho já havia registrado boletins de ocorrência envolvendo ameaças a seus integrantes e depredação ambiental. Em Uruçuí, cerrado piauiense, um grupo passou a comandar grilagens de terras públicas retomadas pelo povo Akroá-Gamella para estabelecer nelas famílias de posseiros. No território há a presença de um outro povo, o Guegue de Sangue.
No último mês de outubro, o território Akroá-Gamella localizado em Laranjeiras, no município de Currais, foi invadido e devastado para a construção de uma rodovia com o objetivo de beneficiar o agronegócio, cujas fronteiras avançam na região, contando com apoio do governo estadual.