TRF 1 nega provimento de recurso aos envolvidos no assassinato de Paulo Paulino Guajajara
O crime ocorreu em novembro de 2019, na Terra Indígena Arariboia, no sul do Maranhão; Integrantes dos Guardiões da Floresta e familiares de Paulo Paulino Guajajara acompanharam a sessão
Na tarde de ontem (24), a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1º Região (TRF1) negou provimento de recurso aos envolvidos no assassinato do guardião da floresta Paulo Paulino Guajajara, ocorrido em novembro de 2019, na Terra Indígena (TI) Arariboia, localizada no sul do Maranhão.
Familiares de Paulino e representantes da Associação Ka’aiwar dos Guardiões da Floresta da TI Arariboia acompanharam a sessão junto à equipe do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Maranhão e assessores jurídicos da instituição que acompanham o caso.
TRF1 negou provimento de recurso a um dos envolvidos no assassinato do guardião da floresta
A violência contra o povo Guajajara é crescente no Maranhão. De acordo com dados do Relatório de Violência contra os povos indígenas, publicado anualmente pelo Cimi e disponibilizados na plataforma Caci, nos últimos 20 anos, foram contabilizados 41 assassinatos contra o povo Guajajara. Desses casos, 19 ocorreram na TI Araribóia.
No recurso impetrado, o acusado alega não haver indícios suficientes para comprovar sua acusação, além de questionar a competência da Justiça Federal no julgamento desse caso. No entanto, são de instância federal os casos que envolvem conflitos de terras e povos originários. O recurso refere-se à decisão proferida pelo juiz substituto da 1ª Vara Criminal Federal do Maranhão, Luiz Régis Bomfim Filho, em 2022.
O acusado alega não haver indícios suficientes para comprovar sua acusação e questiona a competência da Justiça Federal no julgamento desse caso.
O desembargador-relator do recurso, Pablo Zuniga, apresentou em sua alegação os motivos para negar o provimento em sentido estrito. “Não há dúvida de que há um pano de fundo de proteção a comunidades indígenas e a própria terra Arariboia, que é, na verdade, o que nos faz concluir, de forma singela, que a competência é mesmo da Justiça Federal”. apontou em trecho de sua decisão.
Em seu parecer, o desembargador presidente da sessão, Leão Aparecido Alves, seguiu a decisão do desembargador-relator de negar o provimento de recurso. “Ao quanto da jurisdição federal e, também, em deixar ao júri o julgamento final da causa, porque ele é o soberano natural dos crimes contra a vida”, evidenciou o magistrado.
“A competência é mesmo da Justiça Federal”
Presente na sessão, o pai de Paulo Paulino Guajajara, José Maria Paulino Guajajara, cobra justiça em relação ao caso. “Os madeireiros tem raiva mesmo de nós, indígenas. Nunca foi feita a justiça, mesmo em relação a outros parentes que foram assassinados, por isso que o branco gosta de nos matar”, enfatizou.
Gilderlan Rodrigues, da coordenação colegiada do Cimi Regional Maranhão, avalia que, nessa sessão, o TRF1 confirmou a legitimidade da luta dos Guardiões da Floresta, ao negar o provimento ao recurso de um dos acusados pelo assassinato da liderança Guajajara. “Esse julgamento destaca que a luta do povo Guarajara e dos Guardiões da Floresta é pela preservação do território. Se mantém a decisão de levar a júri popular, isso é importante, porque serão os primeiros a responderem por assassinato de indígenas”, ressalta.
“Nunca foi feita a justiça, mesmo em relação a outros parentes que foram assassinados, por isso que o branco gosta de nos matar”
Julgamento histórico
Para o assessor jurídico do Cimi Regional Maranhão, Gabriel Serra, a negativa unanime do TRF 1 ao provimento do recurso ao acusado representa uma vitória jurídica emblemática para os povos indígenas. “A negativa ao recurso ressalta a gravidade dos crimes cometidos, que não apenas vitimaram indivíduos, mas atacaram a integridade cultural e territorial de uma comunidade indígena”, afirmou.
“O reconhecimento judicial da importância da proteção ao território e aos Guardiões que o defendem é uma demonstração de respeito e valorização do modo de vida indígena, reforçando a necessidade de uma resposta jurisdicional adequada quando tais direitos são violados”, acrescenta o advogado.
“A negativa ao recurso ressalta a gravidade dos crimes cometidos”
Durante a sessão, a assessora jurídica do Cimi, Caroline Hilgert, destacou que o julgamento do caso de Paulo Paulino Guajajara representa um avanço contra a impunidade em relação à violência contra os povos indígenas. “São 20 anos que diversos assassinatos ocorreram na Terra Indígena Arariboia contra os Guardiões da Floresta e, até hoje, esse é o primeiro que tem uma sentença de pronúncia. É o primeiro caso, em 20 anos, que se está caminhando”, pontuou a advogada.
O presidente da Associação Ka’aiwar, Olímpio Guajajara, evidenciou a importância do julgamento no Tribunal do Júri para os Guardiões da Floresta e o povo Guajajara. “Teve um bom resultado essa vinda à justiça. Pela primeira vez a justiça brasileira vai levar os assassinos de uma liderança indígena a julgamento popular”, destacou.
“São 20 anos que diversos assassinatos ocorreram na Terra Indígena Arariboia contra os Guardiões da Floresta e, até hoje, esse é o primeiro que tem uma sentença de pronúncia”
Segundo Gabriel Serra, após a publicação do acórdão resultante do julgamento da 4º turma do TRF1, a abertura do prazo e análise dos possíveis recursos, o processo irá para a 1º instância na seção judiciária do Maranhão, em São Luís, onde será procedida as próximas fases processuais até o julgamento pelo Tribunal do Júri.
Entenda o caso
Aos 26 anos, o Guardião da Floresta Paulo Paulino Guajajara, conhecido como Lobo, foi assassinado por madeireiros, no dia 1º de novembro de 2019, na Terra Indígena Arariboia. Na mesma ocasião, Laércio Guajajara, liderança da região, foi alvejado, mas conseguiu fugir pela mata entre os disparos.
Paulo Paulino Guajajara deixou esposa, um filho e um legado de proteção à natureza junto aos Guardiões da Floresta, grupo responsável por fiscalizar e denunciar invasões à mata na TI Arariboia.
Laércio Guajajara, sobrevivente da emboscada, foi atingido no braço e nas costas, sobrevivendo ao ataque, tendo ainda uma bala alojada na coluna.