28/09/2023

“Direitos originários, territórios livres”: Cimi inicia sua XXV Assembleia Geral

De 27 a 30 deste mês, lideranças, missionários e apoiadores da causa indígena reúnem-se em Luziânia (GO) para reafirmar sua caminhada junto aos povos originários

XXV Assembleia Geral do Cimi. Foto: Jesica Carvalho/Cimi Regional Maranhão

Por Assessoria de Comunicação do Cimi

Com o tema “Direitos originários, territórios livres: Justiça e paz como fontes do Bem Viver – conviver”, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) deu início ontem (27) a XXV Assembleia Geral da instituição. O evento ocorre entre os dias 27 e 30 de setembro, no Centro de Formação Vicente Cañas, em Luziânia (GO). No encontro, cerca de 140 missionários e missionárias reafirmam sua caminhada junto aos povos indígenas e debatem o projeto missionário de transformação social encampado pelo Cimi. 

Realizada de dois em dois anos, esta edição conta com a presença de delegados e delegadas do Conselho, lideranças indígenas, organizações parceiras, apoiadores, missionários e missionárias, bem como assessores do Cimi de todas as regiões do país. Também participam do evento convidados representantes de entidades e instituições que apoiam as causas indígenas e as lutas populares.

No decorrer dos quatro dias da Assembleia Geral, serão realizados debates e reflexões sobre o atual contexto político, indigenista e eclesial, no qual o Cimi se insere, além de trocas de experiências e deliberações, como a eleição do novo secretariado nacional para o mandato dos próximos quatro anos.

Com o tema “Direitos originários, territórios livres: Justiça e paz como fontes do Bem Viver – conviver”, o Cimi deu início ontem (27) a XXV Assembleia Geral

XXV Assembleia Geral do Cimi. Foto: Hellen Loures Cimi

Direitos originários, territórios livres

O tema do encontro – direitos originários e os territórios livres – é também um dos fundamentos da ação missionária da instituição. Na celebração de abertura, Dom Roque Paloschi, presidente da entidade, lembrou que é mais que necessário que a ‘justiça e a paz’ aconteça, para que os territórios livres, sejam fontes do bem viver e do conviver”, afirmou o presidente, que também é arcebispo de Porto Velho.

Na ocasião, Dom Roque destacou ainda o caráter combativo da instituição, que busca enfrentar questões que estão no bojo da luta anticapitalista, como é o caso da questão fundiária no Brasil. “A questão da terra toca num ponto nevrálgico do sistema capitalista, na sua estrutura fundiária. Por isso, a pastoral do Cimi está e estará sempre envolvida em conflitos. A pastoral indigenista, desde a criação do Cimi, torna-se uma pastoral profética que acompanha os povos indígenas nas horas de luta. Esta é a nossa missão, ser presença e lutar com os povos indígenas pela garantia do direito originário”, frisou o arcebispo. 

“Esta é a nossa missão, ser presença e lutar com os povos indígenas pela garantia do direito originário”

XXV Assembleia Geral do Cimi. Foto: Hellen Loures Cimi

A luta dos povos indígenas, de igual modo, foi celebrada por Dom Leonardo Steiner, arcebispo de Manaus e o primeiro “cardeal da Amazônia”, presente virtualmente na abertura da Assembleia Geral do Cimi. 

“Quantas assembleias, quantos pensamentos, quantas lutas, quantas orações, quantos desejo de servir, quanto desejo de justiça. E, ao celebrarmos esta Assembleia, nós podemos celebrá-la como uma verdadeira ação de graças. Quanta luta, quanta tentativa para que o marco temporal não fosse um marco que pudesse marcar a vida dos nossos povos indígenas. Superada essa fase, nós ainda teremos muita luta. Que o nosso querido Cimi possa sempre ser uma bandeira de esperança, mas também uma bandeira de paz”, frisou o cardeal.

“Ao celebrarmos esta Assembleia, nós podemos celebrá-la como uma verdadeira ação de graças. Quanta luta, quanta tentativa para que o marco temporal não fosse um marco que pudesse marcar a vida dos nossos povos indígenas”

XXV Assembleia Geral do Cimi. Foto: Jesica Carvalho/ Cimi Regional Maranhão

A resistência indígena e os desafios missionários

Durante a manhã de abertura do evento, o secretário executivo do Cimi, Antônio Eduardo Cerqueira; a vice-presidenta,  Lúcia Gianesini e o presidente Dom Roque Paloschi rememoraram os últimos quatro anos de trabalho missionário da instituição, ressaltaram os principais desafios enfrentados e exaltaram o fortalecimento da resistência indígena, que tem, cada vez mais, protagonizado a luta por seus direitos. 

Apesar da recente vitória no Supremo Tribunal Federal (STF), que derrubou a tese ruralista do marco temporal, os desafios no que se refere a atuação indigenista e missionária junto aos povos indígenas continuam. Principalmente “com a análise  pelo STF das teses levantadas, em especial, sobre indenizações no processo de demarcação de terras indígenas”, afirmou Antônio Eduardo.

Apesar da recente vitória no STF, que derrubou a tese ruralista do marco temporal, os desafios no que se refere a atuação indigenista e missionária junto aos povos indígenas continuam

XXV Assembleia Geral do Cimi. Foto Hellen Loures/ Cimi

Para além disso, “as forças agressivas do capital particularmente ligadas ao agronegócio, à mineração, à infraestrutura, dentre outras, têm atuado de modo cada vez mais organizado, agressivo e sistemático contra o direito sagrado e constitucional dos povos às suas terras demarcadas e protegidas”, lembrou Irmã Lúcia.  

Ao longo desses quatro anos, as ameaças e os ataques aos povos indígenas foram constantes e sistemáticos. Alguns dos desafios enfrentados foram lembrados pelos membros missionários: a política anti-indígena do governo Bolsonaro, a proposição  à Câmara Federal do Projeto de Lei (PL) 191, que buscava abrir as terras indígenas à exploração econômica  e a aplicação do parecer 001/17, que concebeu o marco temporal no âmbito da administração pública federal, além da paralisação das demarcações das terras indígenas.

“As forças agressivas do capital têm atuado de modo cada vez mais organizado, agressivo e sistemático contra o direito sagrado e constitucional dos povos às suas terras demarcadas e protegidas”

Ao mesmo tempo, não foram poucas as ações realizadas pelos povos indígenas a fim de enfrentar e contrapor grupos contrários aos direitos indígenas. Sejam desde suas aldeias, de seus territórios ou em Brasília, junto aos mais diversos órgãos dos poderes do Estado, “o processo de mobilização foi exemplar”, enalteceu o secretário. 

XXV Assembleia Geral do Cimi. Foto: Jesica Carvalho/Cimi Regional Maranhão

Entre a memória e o projeto do amanhã

Passados mais de 50 anos de caminhada missionária, o Cimi encontra-se no limiar entre a memória e o projeto de um amanhã ainda em construção. “Estamos nessa dobradiça e precisamos pensar entre a memória e o projeto de um caminho, um caminho que tem pedras”, explicou Paulo Suess, assessor teológico do Cimi, durante sua fala na tarde do primeiro dia da Assembleia, na roda de conversa “Direito originário e as pedras no caminho – contradição e construção”.

São muitas as pedras colocadas sobre o caminho dos povos indígenas e, por sua vez, dos missionários e missionárias, que buscam caminhar lado a lado a esses povos. Dentre as pedras do passado, Suess destacou a pedra da ditadura militar, já no início da trajetória da instituição e a pedra do desenvolvimentismo transamazônico, que provocou inúmeros tropeços, atravessamentos e mortes de um número importante de integrantes da população indígena da época.

“Estamos nessa dobradiça e precisamos pensar entre a memória e o projeto de um caminho, um caminho que tem pedras”

XXV Assembleia Geral do Cimi. Foto Hellen Loures Cimi

O assessor teológico do Cimi destacou ainda as tradições missionárias coloniais e colonialistas que foram ressignificadas pela instituição ao que se refere ao conceito de missão, “que significa preservar a vida e não o da conversão dos povos indígenas à nossa religião, porque nós não temos o monopólio da salvação, nós não temos monopólio nenhum”, salientou Suess. 

“A  religião, a sigla, não é importante diante da atuação pastoral concreta de tirar as pedras do caminho do outro, de garantir um futuro, garantir o lutar por esse futuro, o lutar pela vida. A missão como luta pela vida, cuja vida é ameaçada”, definiu o teólogo.

“Missão significa preservar a vida e não a conversão dos povos indígenas à nossa religião, porque nós não temos o monopólio da salvação, nós não temos monopólio nenhum”

Laura Vicuña, que participou no modo virtual da Assembleia, também integrou a roda de conversa “Direito originário e as pedras no caminho – contradição e construção”. Catequista franciscana de origem indígena Kariri e missionária do Cimi Regional Rondônia, a religiosa apresentou uma perspectiva importante sobre o trabalho pastoral e missionário da instituição junto aos povos indígenas.

Ao longo do dia foram realizadas ainda rodas de conversa e espaços de avaliação, com o objetivo de traçar caminhos futuros e debater temas sensíveis ao trabalho missionário. A programação da Assembleia Geral segue até o dia 30, quando ocorrerá a eleição da próxima gestão do secretariado nacional do Cimi. 

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