02/02/2023

Decisão judicial retira um terço da TI Taego Ãwa (TO), do povo Avá-Canoeiro

A diminuição do território retira áreas essenciais para a sobrevivência dos indígenas, como o Rio Javaés e a maior parte das áreas não inundáveis

Depois de capturados, os Avá-Canoeiro foram expostos em um cativeiro à população local. Foto: Klaus Gunther

Por Assessoria de Comunicação do Cimi

A longa luta pela demarcação da Terra Indígena (TI) Taego Ãwa (TO), do povo Avá-Canoeiro, parecia ter sido encerrada em novembro de 2022. Em um primeiro momento, pensou-se que haviam ficado no passado o histórico marcado por violências, contatos forçados com não indígenas e omissão do Estado e dos órgãos responsáveis pelos direitos indígenas.

A decisão, que parecia favorável aos Avá-Canoeiro – povo formado por um pouco mais de 30 indígenas –, causou um choque aos indígenas e às organizações que apoiam a causa: ao final da sentença judicial, decidiu-se pela redução de, aproximadamente, um terço (1/3) do território.

Em nota técnica publicada logo após a decisão judicial, a antropóloga Patrícia de Mendonça Rodrigues e a bióloga Luciana Ferraz explicam que a diminuição da terra indígena retira, inclusive, áreas importantes para a sobrevivência dos Avá-Canoeiro.

“Ao final da longa sentença judicial, decide-se pela diminuição de cerca de 1/3 da terra indígena, subtraindo partes essenciais do território: o acesso ao principal rio da região, o Rio Javaés, e a maior parte das áreas não inundáveis”, relatam as pesquisadoras.

“Em outras palavras, aos Avá-Canoeiro restou uma terra inundável em sua maior parte e sem conexão com o principal rio utilizado para a sobrevivência cotidiana e como via de transporte”, complementam a explicação.

“Aos Avá-Canoeiro restou uma terra inundável em sua maior parte e sem conexão com o principal rio utilizado para sobrevivência”

Em 2012, o jovem Diego Avá-Canoeiro empunha sua borduna e questiona autoridades: “Como vocês reagiriam se alguém entrasse em suas casas, destruísse o que vocês têm e ameaçasse a sobrevivência de suas famílias?” foto: Egon Heck/Cimi

O povo Avá-Canoeiro aguarda há quase 50 anos – desde 1973 – para voltar a viver em um território próprio, em uma comunidade de parentes, apesar de a TI Taego Ãwa já ter sido declarada como de posse indígena pelo Ministério da Justiça, em 2016. A decisão de novembro do ano passado é parte de uma batalha judicial iniciada em 2018 com uma Ação Civil Pública do Ministério Público Federal (MPF) em favor da demarcação do território.

“É notável que a Ação Civil Pública do MPF pedia apenas a demarcação de uma terra indígena já reconhecida oficialmente, mas o Juiz Federal de Gurupi acabou deferindo o pedido dos ocupantes da área para a realização de uma perícia judicial antropológica com o objetivo de averiguar a tradicionalidade da ocupação, o que retardou em anos o objetivo da ação inicial”, afirmam as pesquisadoras em outro trecho da nota técnica.

 

Resposta do povo

De acordo com Eliane Franco, da coordenação colegiada do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Goiás/Tocantins, o povo Avá-Canoeiro recorreu da decisão judicial, com embargos de declaração.

“O juiz não levou em consideração a perícia que foi realizada, declarando a Terra Indígena Taego Ãwa como terra tradicional do povo Avá-Canoeiro. Houve muitas falhas na decisão do Juiz Federal no processo de demarcação do território, dentre eles a diminuição da terra indígena, o acesso ao Rio Javaés e a permanência dos ocupantes não indígenas dentro do território”, explica.

“Houve muitas falhas na decisão do Juiz Federal no processo de demarcação do território, dentre eles a diminuição da terra indígena”

Os Avá-Canoeiro não aceitaram nenhum tipo de negociação. A proposta apresentada é desvantajosa aos indígenas, considerando que destinaram um local inabitável para o povo. A decisão descaracteriza estudos realizados para demarcação de territórios indígenas, já garantidos nos artigos 231 e 232 da Constituição Federal de 1988.

Ainda segundo Eliane, os Avá-Canoeiro ganharam na Justiça o direito de fazer parte do processo, sendo resguardados por um advogado. Além disso, advogados que compõem a Assessoria Jurídica do Cimi também acompanham a defesa da comunidade.

 

Assentamento

Cerca de metade da Terra Indígena Taego Ãwa é ocupada pelo Projeto de Assentamento Caracol e a outra metade por duas fazendas que adquiriram terras vendidas pela Fazenda Canuanã a terceiros.

“Na sentença em questão [decisão judicial], o juiz informa, com base no levantamento fundiário finalizado pela FUNAI/INCRA [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] em 2021, por ordem judicial, que apenas 30 famílias – das 103 que vivem atualmente na Terra Indígena Taego Ãwa – são originárias da Ilha do Bananal e estão no assentamento desde o início. Os outros lotes do assentamento, terra da União, foram repassados ilegalmente a outras pessoas ao longo dos anos”, diz a nota técnica mencionada nesta matéria.

Na avaliação de Eliane Franco, “foi erro do Estado quando os assentados foram retirados do território da Ilha do Bananal para ser alocados em outra terra indígena”.

“Foi erro do Estado quando os assentados foram retirados da Ilha do Bananal para ser alocados em outra terra indígena”

“O Estado brasileiro tem que reparar esse dano, direcionando os assentados e os fazendeiros para outro local, e definindo a demarcação do povo Avá-Canoeiro. Queremos que a justiça seja feita. Que os assentados possam ir para outro local, com condições dignas. E que os Avá-Canoeiro voltem para a terra que foram retirados na década de 1970, na época da ditadura militar, período que foram caçados e retirados de seu território”.

 

Para ler a nota técnica completa, acesse aqui.

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