No Tocantins, apoiadores do atual governo tentam inviabilizar participação de indígenas nas eleições deste ano
Prefeituras do estado do Tocantins negam transporte público aos indígenas no segundo turno; Regional do Cimi recorreu ao TRE-TO para garantir a ida dos indígenas aos locais de votação
Transporte público gratuito negado, tentativa de compra de voto e ameaças. Esse é o cenário vivido pelos povos indígenas do estado do Tocantins diante do período eleitoral. Empresários, ruralistas e, até mesmo, prefeituras se juntaram para impedir que os indígenas participem das eleições deste ano – ou, em alguns casos, para influenciá-los a não votarem em Lula, candidato à presidência da oposição.
No primeiro turno, muitos indígenas – como ocorreu nos povos Xerente e Apinajé – não conseguiram votar devido à falta de transporte público gratuito nas aldeias. Agora, no segundo turno, a situação não é diferente: apoiadores do atual presidente seguem inviabilizando o voto dos indígenas.
Exemplo disso é o que ocorreu em Itacajá (TO). A prefeita Maria Aparecida, apoiadora de Bolsonaro, alegou “falta de combustível e de veículos para transportar” os indígenas até os locais de votação.
“Temos a informar que a prefeitura vai ceder os 03 ônibus escolares próprios e o veículo Jeep Compass. No tocante aos demais veículos, torna-se inviável neste 2º turno das eleições a cessão dos mesmos por questão de abastecimento, visto que no 1º turno tivemos ajuda de custo de abastecimento através de doações”, diz um trecho do documento encaminhado pela prefeitura de Itacajá (TO) ao Tribunal Regional Eleitoral do Tocantins (TRE-TO).
“Torna-se inviável neste 2º turno das eleições a cessão dos mesmos por questão de abastecimento”
“Portanto, os veículos locados ficarão à disposição da Justiça Eleitoral para o transporte de eleitores no 2º turno das eleições/2022 com a seguinte condição: abastecimento de veículos por conta da justiça eleitoral, pois no 2º turno não teremos doações para as despesas supracitadas. […] Informamos, ainda, que os veículos que fizeram o transporte do eleitorado indígena no 1º turno foi doação dos comerciantes locais”, diz outro trecho.
Além disso, entre as estratégias denunciadas pelos indígenas para impedi-los de votar estaria, ainda, a compra de votos. Nesse caso, os indígenas receberiam dinheiro para não ir votar.
E não para por aí: indígenas do povo Krahô denunciaram nas redes sociais que um ex-prefeito de Goiatins (TO) compareceu à aldeia Pedra Branca, na Terra Indígena (TI) Krahô, prometendo a doação de vaca aos indígenas caso votassem em Bolsonaro. No entanto, os Krahô têm mantido uma postura firme, e recusam a compra dos votos.
Ciente dos casos, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Goiás/Tocantins já acionou os órgãos competentes para que tomem as devidas providências.
Denúncia à Justiça Eleitoral
O Cimi Regional Goiás/Tocantins também decidiu levar as denúncias relacionadas ao transporte público gratuito ao TRE do Tocantins e aos juízes das Zonas Eleitorais onde os indígenas votam. De acordo com um procurador regional eleitoral do Tocantins, a Polícia Federal já foi acionada para investigar os supostos crimes eleitorais.
A solicitação do Cimi Regional Goiás/Tocantins teve como base uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). No dia 19 de outubro, a Suprema Corte formou maioria de votos para confirmar a decisão do ministro Luís Roberto Barroso, que autorizou todos os estados brasileiros a oferecer transporte gratuito no segundo turno.
“Acreditamos que nenhum cidadão deve ser excluído deste direito, nem pela sua condição social, gênero, classe social, raça, credo, partido político, orientação sexual, cor e grau de escolaridade. O ministro Barroso também reforçou na sua decisão que o voto é um direito constitucional e que, por isso, não pode haver qualquer discriminação de eleitores por sua posição política”, afirmou o Cimi Regional Goiás/Tocantins em documento encaminhado ao TRE do Tocantins e às Zonas Eleitorais.
“O voto é um direito constitucional e que, por isso, não pode haver qualquer discriminação de eleitores por sua posição política”
“Dada a situação de polarização, intolerância e ânimos exaltados na campanha eleitoral deste ano e, principalmente, neste 2º turno, se faz necessário que a coordenação e fiscalização do transporte público gratuito fornecido pelos municípios aos indígenas em todo o território do estado do Tocantins fique sob a tutela da Justiça eleitoral, a fim de evitar que comunidades indígenas fiquem sem poder votar”, completa.
TRE-TO permitirá o deslocamento
Em resposta à prefeitura de Itacajá (TO), o TRE do Tocantins irá disponibilizar 12 veículos para translado dos eleitores do povo Krahô.
“A 33ª Zona Eleitoral foi informada, pela Prefeitura de Itacajá, de que veículos cedidos por empresários e candidatos durante o Pleito de 02 de outubro não serão disponibilizados para o dia 30. Para suprir essa lacuna, serão direcionados 12 (doze) veículos com tração 4 x 4 (cedidos pelo Tribunal) para atender especificamente a área indígena. A determinação é para que nenhum eleitor deixe de comparecer às urnas por falta de transporte”, afirmou, em ofício, o juiz eleitoral Carlos Roberto de Sousa Dutra.
“A determinação é para que nenhum eleitor deixe de comparecer às urnas por falta de transporte”
Do mesmo modo que a 33ª Zona Eleitoral deu resposta positiva para solucionar o problema de transporte para os indígenas Krahô, inviabilizado pela prefeita de Itacajá, todos os juízes eleitorais têm respondido ao Cimi Regional Goiás/Tocantins que será garantido o transporte público gratuito para os indígenas participarem do segundo turno eleitoral. Inclusive, enviando as informações dos locais da saída, nome das aldeias, os horários de saída e retorno e as rotas que os veículos farão no dia da votação.
Além disso, a presidência do TRE do Tocantins afirmou ao Cimi Regional Goiás/Tocantins, por meio de documento encaminhado por e-mail, que a Justiça Eleitoral do Tocantins “não tem medido esforços” para garantir aos tocantinenses o direito de voto.
“Por isso mesmo, as providências adotadas por ocasião do 1º Turno das Eleições Gerais 2022 estão sendo mantidas e aperfeiçoadas para o 2º Turno de votação. Tudo visando garantir a efetividade dos direitos de cidadania e a festa da democracia”, afirmou a presidência.