“Sofremos um genocídio planejado e silenciado”, denuncia jovem Guarani Kaiowá ao Fórum da ONU sobre povos indígenas
Erileide Guarani Kaiowá deu voz as denúncias durante a 21ª Sessão do Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas, nesta quinta,28
Em dialogo sobre direitos humanos com o Relator Especial sobre os direitos dos povos indígenas, José Francisco Cali Tzay, e o Mecanismo de Experts sobre os Direitos dos Povos Indígenas da ONU (EMRIP), a jovem liderança Guarani e Kaiowá, Erileide Domingues, retorna ao Fórum Permanente das Nações Unidas para as Questões Indígenas (UNPFII), para denunciar o genocídio dos povos originários no Brasil. “Sofremos um genocídio planejado e silenciado”, afirma a jovem, em declaração escrita entregue a 21ª Sessão do UNPFII, nesta quinta-feira, 28 de abril, em Nova York/USA, onde ocorre o evento.
Represento a Grande Assembleia, Aty Guasu do Guarani e Kaiowá de Mato Grosso do Sul, Erileide desta que o tema do Fórum, “Povos indígenas, negócios, autonomia e os princípios de direitos humanos da devida diligência, incluindo o consentimento livre, prévio e informado”, é de extrema importância ao seu povo, mas que não tem o que falar sobre experiências empresariais indígenas ou de consentimentos construídos a partir do respeito aos nossos povos. Isso porque, seu povo vive sob constante de violências e violações, vindas de setores como agronegócio, inclusive com ataque de seguranças privados e policiais às retomadas Guarani e Kaiowá.
“Sofremos um genocídio planejado e silenciado”
“Mas a pedido do nosso Conselho, quero denunciar que o governo brasileiro está, atualmente, financiando o arrendamento de nossas poucas terras. Que a própria organização indigenista federal tem organizado e fomentado a invasão de nossas terras”, denuncia a jovem Guarani Kaiowá. Que ainda reforça o fato de que todo o processo de demarcação de terras indígenas encontra-se paralisado.
O território aos povos indígenas é tido como um espaço sagrado, sem a demarcação e proteção por parte do Estado, “meu povo está morrendo de fome porque não temos terra para plantar. As poucas que nos restam, o governo brasileiro está arrendando para os agricultores do agronegócio”, reforça Erileide.
Além de serem forçados a viver em pequenas áreas, empurrados para reservas minúsculas, a grande maioria delas encontra-se em conflito e sem assistência dos órgãos de Estado, como relatou Erileide à ONU. “Minha comunidade sobrevive com menos de 50 hectares e estamos cercados de plantações de soja e milho. Denunciamos o impacto dos venenos em minha família e nas pessoas próximas a mim”, reforça a jovem liderança Guarani e Kaiowá.
“Quero denunciar que o governo brasileiro está, atualmente, financiando o arrendamento de nossas poucas terras. Que a própria organização indigenista federal tem organizado e fomentado a invasão de nossas terras”
Indiferente a medida cautelar da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), ao Estado brasileiro, para que garanta o direito à vida e à integridade pessoal dos membros da comunidade Guarani Kaiowá, nenhuma manifestação ou medida foi adotada pelo atual Governo brasileiro. O que gera uma série de questionamentos aos Guarani e Kaiowá.
“Por que o governo brasileiro, respeitando nosso direito de consentimento, não investe no que queremos produzir para alimentar nossas famílias? Por que sujeitar nosso povo ao arrendamento de soja, milho justamente para sustentar vacas e outros animais pelo mundo à fora, enquanto nossas crianças passam fome?”, questiona Erileide em nome de seu povo.
“Por que o governo brasileiro, respeitando nosso direito de consentimento, não investe no que queremos produzir para alimentar nossas famílias?”
A política anti-indígena adotada pelo Governo Bolsonaro, além de não demarcar nenhum território indígenas, tem submetido os povos a grave situação de fome. “Temos comunidades que não recebem cestas básicas há 4 meses e estão em grave situação de fome”, conta a jovem Guarani Kaiowá. A fome tem sido tema recorrente de denúncias dos indígenas no Mato Grosso do Sul, “continua criança indo para cama passando fome”, já denunciava em 2019, Elizeu Pereira Lopes, liderança indígena da Aty Guasu.
Aos povos a solução está na garantida de seus direitos originários. “Não queremos receber cestas básicas, queremos ter nossa terra e cultivar nossa própria comida. Nossa autonomia foi roubada e o governo, com essa política de arrendamento, não pretende outra coisa, senão nos exterminar”, conclui Erileide.
“Queremos ter nossa terra e cultivar nossa própria comida, nossa autonomia foi roubada e o governo, com essa política de arrendamento, não pretende outra coisa, senão nos exterminar”
Sobre UNPFII 21
A 21ª sessão do Fórum Permanente das Nações Unidas para as Questões Indígenas (UNPFII 21), está sendo realizada na sede do órgão em Nova York, Estados Unidos, de 25 de abril a 6 de maio, deste ano. Com o tema “Povos indígenas, negócios, autonomia e os princípios de direitos humanos da devida diligência, incluindo o consentimento livre, prévio e informado”, a sessão de 2022 do Fórum Permanente está aberta à participação presencial e online, com transmissão ao vivo pelos canais oficiais (webtv.un.org).
Lideranças indígenas e organizações indigenistas, entre elas a Aty Guasu Kaiowá e Guarani, a Associação do Povo Karipuna, representantes da Organização das Mulheres Indígenas Mura de Autazes (AM), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a Rede Iglesias e Mineria e a Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam) retornam, presencial e por videoconferência, ao Fórum Permanente para política anti-indígena do atual governo brasileiro.
“A fome tem sido tema recorrente de denúncias dos indígenas no Mato Grosso do Sul”
Confira a denúncia de Erileide Domingues na íntegra:
Distintos membros deste Fórum Permanente,
Caro Relator Especial e membros do mecanismo de peritos
Meu nome é Erileide Domingues, sou do povo Guarani Kaiowá e aqui represento nossa Grande Assembleia, Aty Guasu do Guarani e Kaiowá de Mato Grosso do Sul, Brasil.
O tema desta sessão do Fórum é muito importante para o meu povo diante de toda a violência que sofremos. Infelizmente, não tenho o que falar sobre experiências empresariais indígenas ou de consentimentos construídos a partir do respeito aos nossos povos.
Mas a pedido do nosso Conselho, quero denunciar que o governo brasileiro está, atualmente, financiando o arrendamento de nossas poucas terras. Que a própria organização indigenista federal tem organizado e fomentado a invasão de nossas terras. E o que é pior, todo o processo de demarcação foi paralisado.
Meu povo está morrendo de fome porque não temos terra para plantar. As poucas que nos restam, o governo brasileiro está arrendando para os agricultores do agronegócio.
Minha comunidade sobrevive com menos de 50 hectares e estamos cercados de plantações de soja e milho. Denunciamos o impacto dos venenos em minha família e nas pessoas próximas a mim. E mesmo com medida cautelar da CIDH [Comissão Interamericana de Direitos Humanos], não tivemos nenhuma manifestação do governo para nos proteger.
Por que o governo brasileiro, respeitando nosso direito de consentimento, não investe no que queremos produzir para alimentar nossas famílias Por que sujeitar nosso povo ao arrendamento de soja, milho justamente para sustentar vacas e outros animais pelo mundo à fora, enquanto nossas crianças passam fome?
Temos comunidades que não recebem cestas básicas há 4 meses e estão em grave situação de fome. Não queremos receber cestas básicas, queremos ter nossa terra e cultivar nossa própria comida. Nossa autonomia foi roubada e o governo, com essa política de arrendamento, não pretende outra coisa, senão nos exterminar.
Para meu povo, sofremos um genocídio planejado e silenciado.
Obrigada!
Erileide Domingues