Em encontro, mulheres indígenas da Bahia e de Minas Gerais defendem projeto de vida
Com o tema “Mulheres Indígenas Contra os Projetos de Morte”, o objetivo do evento foi discutir os impactos do Projeto de Lei (PL) 490, do PL 191, do marco temporal e de outros projetos de morte vigentes
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Leste, com o apoio da Cáritas Alemã, promoveu o Encontro de Mulheres Indígenas do Oeste, ainda no mês de comemoração do dia das mulheres em transição para o abril indígena. Com o tema “Mulheres Indígenas Contra os Projetos de Morte”, o objetivo do evento foi discutir os impactos do Projeto de Lei (PL) 490, do PL 191, do marco temporal e de outros projetos de morte vigentes, destacando os impactos dessas propostas anti-indígenas na vida dos povos originários.
O encontro aconteceu em Bom Jesus da Lapa, na Bahia, entre os dias 31 de março e 2 de abril. A programação contou com uma mesa de lideranças indígenas e, durante o encontro, foram abordados os projetos de lei em tramitação, a análise de conjuntura, os estudos e as partilhas entre as mulheres indígenas sobre os atuais desafios enfrentados. O evento contou, ainda, com a participação de convidadas de comunidade quilombola, da Cáritas Diocesana, de representantes da educação local e da Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB).
No evento, foi recordada também a participação histórica das mulheres indígenas nas agendas de lutas, com enfoque nas lutas nacionais contra esses projetos, que têm contado com a participação e organização massiva das mulheres na defesa dos seus territórios.
Para Jaciara, parteira do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, “a mulher indígena e a terra são como uma coisa só. Se tirar a mulher do seu território, a gente adoece. A terra dá a vida, dá o alimento, a mulher também. A gente precisa parir nos nossos territórios, perto dos nossos parentes em ritual. Precisa ensinar os filhos dentro da nossa cultura”.
“A mulher indígena e a terra são como uma coisa só. Se tirar a mulher do seu território, a gente adoece”
O Encontro contou com aproximadamente 50 participantes, com a participação dos povos indígenas do Oeste, Kiriri, Tapuia, Tuxá, Pankararu e Atikum, com o intercâmbio das mulheres Xacriabá do norte de Minas Gerais e das mulheres Tupinambá, Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe do Sul e Extremo Sul da Bahia. Juntas, as mulheres contribuíram com a compreensão da luta contra todos os projetos de morte, destacando que só é possível vencê-los os enfrentando com um projeto de vida que os povos indígenas pautam e vivem historicamente, na construção do Bem Viver.
O encontro foi celebrado e encerrado com a leitura da “Carta das Mulheres Indígenas Contra os Projetos de Morte”, produzida pelas participantes a partir dos seus acúmulos e das reflexões desses dias de reunião.
Veja a carta na íntegra:
Mulheres Indígenas Contra os Projetos de Morte
As mulheres indígenas dos povos Tupinambá, Pataxó Hã Hã Hãe, Atikum, Kiriri, Pataxó, Pankaru, Tapuia, Tuxá (Bahia) e Xakriabá (Minas Gerais), reunidas entre os dias 31 de março e 02 de abril de 2022, em Bom Jesus da Lapa – BA, manifestam preocupação com os Projetos de Lei que estão em discussão na Câmara dos Deputados, especificamente o PL 191 e o PL 490, e com a retirada de nossos direitos originários.
Entendemos que esses projetos causarão grandes danos nos nossos territórios e em nossas vidas, trazendo guerra para o Brasil. Isso prejudicará os jovens, as crianças e nossos anciões, destruirá as matas e as nascentes, aumentará a poluição e as invasões e legalizará a mineração e o desmatamento que condenamos.
Sempre estivemos no Brasil e somos quem mais preserva a Natureza. Esses projetos de morte exterminarão os povos indígenas se forem aprovados, porque nossa existência depende da demarcação das nossas terras. Lutamos muitos anos pelos nossos direitos territoriais, que podemos perder caso esses PLs sejam aprovados.
Precisamos que todas as bancadas de deputados e senadores apoiem os indígenas e sejam contrários aos PLs 191 e 490. Precisamos que o STF defenda os nossos direitos de que tanto precisamos.
Reivindicamos os nossos direitos originários!
Pedimos para todos os(as) deputados(as) olharem para todos os povos indígenas porque precisamos da nossa Mãe Terra, das matas e das nascentes para viver e protegê-las. Nós também escolhemos nossos representantes de quatro em quatro anos, mas até agora não temos nossos territórios garantidos. Precisamos ser vistas.
As mulheres geram vida, assim como a Mãe Natureza.
Sabemos como produzir alimentos e riquezas sem destruir tudo ao nosso redor e, por isso, entendemos que temos a propor Projetos de Vida para o Brasil. Precisamos ser escutadas.
Só de sabermos que esses projetos de morte estão em discussão já sofremos danos psicológicos. Além disso, a violência nos nossos territórios tem crescido com a política anti-indígena. Precisamos que isso acabe!
Não queremos nada além de nossas terras, porque já estamos nelas há muitos anos.
Nossa história não começou em 1500, já estávamos aqui antes dos portugueses e isso deve ser reconhecido. Nossos territórios já foram roubados, não vamos deixar isso acontecer novamente.
Basta à política contrária à nossa existência!
Não queremos que seja destruído o que herdamos da nossa ancestralidade.
Muitos já se foram, muitos ainda estão aqui e queremos continuar seguindo em frente em nossos territórios, lutando por nossas culturas e por nossos povos.
Mulheres indígenas reunidas na Bahia,
02 de abril de 2022