09/09/2020

MPF recomenda à Funai revogação de orientação que impede assistência jurídica do órgão a indígenas

Diretriz contraria Constituição e a própria finalidade do órgão indigenista, afirma Câmara de Populações Indígenas do MPF

Acampamento Terra Livre 2018. Foto: Guilherme Cavalli/Cimi

Acampamento Terra Livre 2018. Foto: Guilherme Cavalli/Cimi

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou nesta sexta-feira (4) ao presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marcelo Augusto Xavier, que revogue, no prazo máximo de dez dias, orientação interna que impede a atuação jurídica do órgão na defesa de indígenas considerados “integrados”. Segundo a Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tracionais do MPF (6CCR), a medida contraria a Constituição Federal e a própria finalidade da Funai de proteger e promover os direitos dos povos indígenas.

A diretriz interna se baseia em parecer elaborado pela Procuradoria Federal Especializada da Funai. Segundo entendimento aprovado pela presidência do órgão indigenista, a ocupação de terras particulares por indígenas não deve gerar a atuação jurídica da Funai. Em 26 de agosto, a orientação foi comunicada à Ouvidoria, aos coordenadores regionais, e aos diretores de Administração e Gestão, de Proteção Territorial e de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável por meio de ofício-circular, para aplicação em casos concretos.

Na recomendação, a 6CCR destaca que é dever da Funai fornecer assistência jurídica aos povos indígenas. O documento também lembra que, a partir do reconhecimento pela Constituição Federal do direito à diversidade cultural, o paradigma integracionista foi rompido. “Restou superada a classificação do art. 4º da Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio), que categoriza os povos indígenas como ‘isolados’, ‘em vias de integração’ e ‘integrados’, conforme já reconhecido pela própria Funai”, afirma a recomendação.

O MPF aponta a morosidade administrativa no procedimento de demarcação como um fator de escalada de conflitos nos territórios ocupados por indígenas. Esclarece ainda que a Constituição Federal declarou como dever da União concluir o processo num prazo de cinco anos a partir de sua promulgação, em 5 de outubro de 1988. “Os governos devem adotar medidas necessárias para identificar as terras que os povos indígenas ocupam tradicionalmente e garantir a proteção efetiva dos seus direitos de propriedade e posse”, registra a recomendação, fazendo referência às determinações previstas na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e em outros tratados internacionais.

Subversão – A Câmara do MPF ressalta que a proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas e a garantia do direito originário das terras tradicionalmente ocupadas e usufruídas por eles são algumas das finalidades da Funai, estabelecidas pelo Decreto 9/2017. “Os dispositivos constitucionais estabelecem ser papel da União e da Funai defender a territorialidade indígena e prestar assistência jurídica em favor dos povos indígenas e contra terceiros, independentemente da etapa do procedimento demarcatório”, conclui o documento.

Foi fixado prazo de dez dias para que a Funai cumpra a solicitação do MPF. Em caso de omissão na adoção da medida recomendada, medidas administrativas e ações judiciais cabíveis poderão ser tomadas, alerta o órgão.

Íntegra da recomendação

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