Julgamento da Terra Indígena Guyraroka adiado no STF: “Vamos respirar e continuar essa luta”
Por falta de tempo, recurso do povo Guarani Kaiowá contra anulação de demarcação não foi votado pelo plenário da corte; não há previsão de nova data para julgamento
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Criança Guarani Kaiowá acompanha sessão no plenário do STF. Foto: Tiago Miotto/Cimi
[Atualizado em 1º/07/2019, às 14h]
O julgamento da admissibilidade da Ação Rescisória (AR) 2686, por meio da qual o povo Guarani Kaiowá busca reverter a decisão que anulou a demarcação da Terra Indígena (TI) Guyraroka, foi adiado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A ação estava pautada para a tarde do dia 27 de junho, quinta-feira, junto a outros processos que tratam da demarcação de terras indígenas. Sem tempo para serem julgados naquele dia, os processos sobre o tema acabaram sendo remanejados para o segundo semestre, incluídos na pauta da sessão do dia 24 de outubro.
A demarcação da TI Guyraroka foi anulada pela Segunda Turma do STF em 2014, com base na tese inconstitucional do “marco temporal” e sem que os indígenas fossem ouvidos no processo. Com base nisso e em outras violações flagrantes, os Guarani e Kaiowá buscam que a Corte anule a decisão que invalidou a demarcação de sua terra.
“Esperamos que, quando julgarem, eles considerem que diante deste julgamento está a vida do povo Guarani Kaiowá e da comunidade do Guyraroka”
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Tito Vilhalva, ancião do tekoha Guyraroka, comemorou cem anos durante semana de luta pela demarcação de sua terra em Brasília. Foto: Adi Spezia/Cimi
Uma delegação de cerca de cinquenta Guarani e Kaiowá acompanhou a sessão no plenário do STF, quando foram comunicados do adiamento. Entre eles, seu Tito Vilhalva – que completou impressionantes cem anos em Brasília, um dia antes da sessão no STF – e dona Miguela Almeida, anciões do tekoha Guyraroka. “A gente veio aqui para marcar presença com as lideranças, a juventude, os rezadores, e dizer aos ministros que os indígenas da comunidade Guyraroka existem sim, para que nos vissem no julgamento”, afirma Erileide Domingues, Guarani Kaiowá do tekoha Guyraroka.
Ela diz que a delegação ficou frustrada com o adiamento, mas que o povo aproveitou a semana em Brasília para marcar presença no Supremo e fazer pressão em defesa de seus direitos originários.
“Estamos divididos, mas dá para a gente respirar e continuar essa luta”, avalia Erileide. “Esperamos que, quando julgarem, eles considerem que diante deste julgamento está a vida do povo Guarani Kaiowá e da comunidade do Guyraroka”.
“A posição firme de nossos povos é não que haverá desistência e nem recuo”
A Aty Guasu, Grande Assembleia dos povos Guarani e Kaiowá, emitiu uma nota no dia 26 de junho na qual afirma que a aplicação da tese do marco temporal resulta em “genocídio e massacre contra os povos indígenas”.
“Após a aplicação dessa tese do marco temporal, desde 2014 começaram a aumentar os ataques genocida, massacre e violência contra o povo Guarani e Kaiowá”, denuncia a nota.
“A posição firme de nossos povos é não que haverá desistência e nem recuo”, afirma a Aty Guasu. “Vamos reafirmar a nossa resistência e lutas históricas pela demarcação de nossas terras como povo indígena originário do atual Brasil, lutando contra aplicação da tese do marco temporal”.
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Dona Miguela Almeida, esposa de seu Tito, também acompanhou o julgamento. Foto: Tiago Miotto/Cimi
Na avaliação do assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e um dos advogados da comunidade Guyraroka na ação rescisória, Adelar Cupsinski, “o caso não está suficientemente maduro” no âmbito do STF.
“O Supremo, em 2014 e 2015, tomou algumas decisões que causaram muitas controvérsias, entre as quais o fato de os povos indígenas não estarem constituídas nos processos que tratam sobre suas demarcações”, aponta Cupsinski.
Na sessão plenária do STF, os ministros ocuparam-se primeiro de um processo sobre questões fiscais e, depois, de uma disputa de limites entre os estados de Mato Grosso e Pará, de modo que não houve tempo para a pauta indígena. Entre as ações pautadas e não julgadas pelo plenário do STF estava a Ação Cível Originária (ACO) 304, que trata sobre a demarcação da TI Parabubure, do povo Xavante, no Mato Grosso.
“Nossa impressão é que a temática indígena está candente no STF. Acreditam que, em breve, os ministros deverão pegar um caso, possivelmente o caso Xokleng de repercussão geral, para ter uma decisão mais abrangente e que contemple de forma mais segura os direitos indígenas para todos os povos indígenas do Brasil”, avalia Cupsinski.