23/10/2018

Indígenas e Quilombolas fortalecem resistência contra fascismo e racismo

O encontro, realizado no Quilombo dos Lemos, pautou dois eixos de análise e reflexão: defesa dos territórios tradicionais e o contexto da adversidade na defesa de direitos constitucionais.

Assembleia dos Povos no Quilombo dos Lemos. Foto: Onir Araújo/Frente Quilombola do RS

Por Michelle Calazans, Ascom Cimi

Povos indígenas Kaingang e Guarani e Quilombolas reforçaram no último sábado (20), na Assembleia dos Povos, em Porto Alegre (RS), o debate em prol da luta e resistência contra o fascismo e racismo no Brasil. O encontro, realizado no Quilombo dos Lemos, pautou dois eixos de análise e reflexão: defesa dos territórios tradicionais e o contexto da adversidade na defesa de direitos constitucionais.

O debate repercutiu a conjuntura política nacional, tendo em vista as reiteradas ameaças apresentadas contra os povos indígenas e quilombolas, pelo candidato da extrema direita às eleições presidenciais, Jair Bolsonaro (PLS). O candidato declarou que não pretende demarcar um centímetro sequer de terra em favor das comunidades indígenas e quilombolas. Jair Bolsonaro trata como privilégio o que representa uma dívida histórica, no âmbito da demarcação de terras tradicionais.

A assembleia reforçou a vivência de conflitos e violências brutais praticadas no estado. Foto: Roberto Liebgott/Cimi Sul

Os indígenas Kaingang e Guarani e Quilombolas enfrentam desafios comuns na região: grilagem de terras tradicionais. Apesar de as denúncias recorrentes, a situação desses povos engrossa, inclusive, o caótico cenário de completa omissão por parte do governo ao patrimônio desses povos originários. A assembleia reforçou a vivência de conflitos e violências brutais praticadas no estado.

Segundo o coordenador do Cimi Sul, Roberto Liebgott, a análise, luta e resistência são fundamentais neste momento em que o Brasil vive um cenário de ‘genocídio legislado’ com mais de 100 propostas legislativas em tramitação no Senado e na Câmara dos Deputados em detrimento à cultura, ao território e à própria existência dos povos indígenas, registrados na publicação do Cimi “Congresso Anti-Indígena: os parlamentares que mais atuaram contra os direitos indígenas”. Para ele, o posicionamento do candidato Jair Bolsonaro fomenta o discurso de ódio, intolerância e violência contra esses povos originários.

Completa omissão ao patrimônio indígena

Informações do Relatório “Violência contra os povos indígenas no Brasil – Dados 2017”, publicado pelo Cimi no mês passado, fundamentam, não somente a real situação no Rio Grande do Sul, mas também reitera a denúncia de completa omissão por parte do governo ao patrimônio indígena no território nacional.

O relatório aponta que, no último ano o governo Temer não homologou nenhuma terra indígena. Este fato o coloca como o presidente com o pior desempenho neste quesito. Além disso, o Ministério da Justiça assinou apenas duas Portarias Declaratórias e a Fundação Nacional do Índio (Funai) identificou seis terras como sendo de ocupação tradicional indígena.

Considerando que a Constituição Federal de 1988 determinou a demarcação de todas as terras indígenas do Brasil até 1993, fica evidente uma completa omissão do governo

Em âmbito nacional, das 1.306 terras reivindicadas pelos povos indígenas, um total de 847 terras (o que representa 64%) apresenta alguma pendência do Estado para a finalização do processo demarcatório e o registro como território tradicional indígena na Secretaria do Patrimônio da União (SPU). Destas 847, um volume de 537 terras (63%) não teve ainda nenhuma providência adotada pelo Estado. Considerando que a Constituição Federal de 1988 determinou a demarcação de todas as terras indígenas do Brasil até 1993, fica evidente uma completa omissão do Executivo no cumprimento desta sua obrigação constitucional.

Além dos 847 casos de omissão e morosidade na regulamentação de terras, a violação de direitos constitucionais dos povos indígenas também reflete no aumento de casos de conflitos relativos à direitos territoriais, 20 casos. Bem como no número de invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio, que repercute 96 casos no último ano.

Violação de direitos humanos pelo agronegócio

Na semana passada – de 15 a 19 de outubro -, em Genebra (Suíça), a Liderança Karipuna e representantes do Cimi, reivindicaram a criação de mecanismos de punição, civil e criminal, para as empresas nacionais e transnacionais que violam direitos humanos dos povos indígenas e de suas terras originárias.

Liderança André Karipuna relata as violações de direitos que os povos indígenas estão submetidos no Brasil. Foto: Portal ONU

A reivindicação apresentada na quarta sessão do Grupo de Trabalho Intergovernamental sobre Empresas Transnacionais e outras Empresas de Negócios com respeito aos Direitos Humanos (OEIGWG), ressaltou a nítida relação entre empresas que financiam campanhas políticas e ataques aos povos indígenas e suas terras tradicionais. Apesar das denúncias do Cimi, a embaixadora do Brasil na ONU, Maria Nazareth Farani Azevedo, negou a existência desse tipo de relação. 

Para a delegação brasileira, a própria identificação de violações de direitos humanos nos processos de produção deve ser razão suficiente para a imediata suspensão das exportações dos respectivos produtos: “A partir do momento que existe agressão aos direitos fundamentais dos povos indígenas, essa relação – agronegócio, violação de Direitos Humanos e política nacional – é automaticamente consolidada”.

 

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