13/09/2018

Em Brasília, Guarani e Kaiowá mobilizam-se em defesa do tekoha Guyraroka e dos direitos indígenas

Indígenas de Mato Grosso do Sul aproveitaram suspensão de julgamento no STF para fazer semana de incidências na capital federal

Guarani e Kaiowá rezam em frente ao STF. Foto: Michelle Calazans/Cimi

Guarani e Kaiowá rezam em frente ao STF. Foto: Michelle Calazans/Cimi

Por Tiago Miotto, da Ascom/Cimi

Nesta semana, uma representação de cerca de 50 indígenas Guarani e Kaiowá esteve presente em Brasília para acompanhar o julgamento da ação rescisória movida pela comunidade do tekoha – lugar onde se é – Guyraroka, cuja demarcação foi anulada pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2014.

A ação da comunidade, endossada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), chegou a ser colocada em pauta no plenário virtual do STF entre o dia 7 de setembro e a tarde desta segunda, quando o ministro Edson Fachin pediu vista do processo. Com o pedido, a ação irá a julgamento no plenário físico, ainda sem data definida.

Durante a tarde de segunda, os Guarani e Kaiowá manifestaram-se em frente ao STF, com rezas e cantos, e comemoraram o pedido. Eles avaliam que têm mais chances de reverter a decisão de 2014 numa votação no plenário físico, onde os ministros podem debater e precisam sustentar oralmente suas posições.

Saiba mais: Comunidade Guarani Kaiowá busca reverter no STF decisão que anulou demarcação

A demarcação da Terra Indígena (TI) Guyraroka foi anulada em setembro de 2014, em uma decisão sumária baseada na tese restritiva do marco temporal e amplamente questionada. A comunidade não só não foi ouvida como sua participação no processo foi negada duas vezes pelo relator, o ministro Gilmar Mendes, com base na lei da tutela – superada pela Constituição de 1988. Vivendo em uma pequena retomada, os Guarani Kaiowá buscam reverter a decisão e garantir a demarcação completa de seu território.

“Nossa pauta mais urgente era retirar a votação do plenário virtual, e graças a Nhanderu conseguimos isso. Mas a luta continua, e Guarani Kaiowá não vai desistir até conseguir o que é nosso, foi nosso e vai continuar sendo nosso”

Manifestação em frente ao STF. Foto: Michelle Calazans/Cimi

Manifestação em frente ao STF. Foto: Michelle Calazans/Cimi

“O que mais me preocupa é esse marco temporal, que atrapalha nossa demarcação”, afirma Tito Vilhalva, liderança quase centenária do tekoha Guyraroka que esteve presente em Brasília para defender sua terra. “Vieram 50 lideranças pra Brasília, tivemos um resultado bom. Todo o povo abraçou junto, para a gente segurar esse nosso Guyraroka”.

Os Guarani e Kaiowá têm se unificado em defesa da terra de seu Tito. Foi no Guyraroka que ocorreu a última reunião da Aty Guasu, a Grande Assembleia Guarani e Kaiowá.

“A vinda da nossa delegação aqui em Brasília para defender Guyraroka é muito importante, porque é algo que afeta todos os indígenas Guarani e Kaiowá”, avalia Eliseu Lopes, liderança da Aty Guasu presente em Brasília.

“Não queremos que o Guyraroka seja anulado, porque aquela é uma terra tradicional nossa”

Indígenas manifestaram-se na AGU, onde protocolaram documento pedindo revogação do Parecer 001/2017. Foto: Egon Heck/Cimi

Indígenas manifestaram-se na AGU, onde protocolaram documento pedindo revogação do Parecer 001/2017. Foto: Egon Heck/Cimi

Semana de lutas

“Aproveitamos a semana em Brasília para marcar várias outras agendas no MPF [Ministério Público Federal], na Educação, na Saúde. Mas o mais importante é derrubar essa anulação do Guyraroka. Não queremos que o Guyraroka seja anulado e a comunidade seja despejada, porque aquela é uma terra tradicional nossa”, explica ele.

Além das incidências nos ministérios da Educação e da Saúde, na terça-feira (11), os indígenas participaram da capacitação para Preservação da Terra e da Água do Cerrado Brasileiro, promovida pelo Ministério Público Federal (MPF).

Na quarta (12), os indígenas realizaram um ato na Advocacia-Geral da União (AGU) e protocolaram um documento pedindo a revogação imediata do Parecer 001/2017, elaborado pela ministra Grace Mendonça e assinado pelo presidente Michel Temer.

Ato contra Parecer Antidemarcação da AGU, em Brasília. Foto: Egon Heck/Cimi

Ato contra Parecer Antidemarcação da AGU, em Brasília. Foto: Egon Heck/Cimi

O parecer obriga a administração pública federal a aplicar medidas que restringem os direitos dos povos indígenas, como o marco temporal, que determina que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem sob sua posse em 5 de outubro de 1988.

Considerada inconstitucional pelo MPF, a medida conhecida como “Parecer Antidemarcação” é denunciada pelo movimento indígena por ter sido negociada com a bancada ruralista para paralisar as demarcações de terras indígenas no Brasil. De frágil sustentação, o Parecer 001/2017 já sofreu uma derrota judicial em um caso específico, tendo sua aplicação suspensa na demarcação da TI Teresa Cristina, dos Bororo, em Mato Grosso.

Na quinta-feira, depois de mais uma semana de luta na capital federal, a delegação Guarani e Kaiowá rumou de volta para o Mato Grosso do Sul.

“Nossa pauta mais urgente era retirar a votação do plenário virtual, e graças a Nhanderu conseguimos reverter isso. Foi mais uma batalha vencida, mas a luta continua, e Guarani Kaiowá não vai desistir até conseguir o que é nosso, foi nosso e vai continuar sendo nosso”, afirma Erileide Domingues, moradora do tekoha Guyraroka.

Share this:
Tags: