O fórum de luta e os povos indígenas no sul da Bahia
Todos nós sabemos que há muito tempo a região cacaueira vem passando por crises econômicas, sem que os seus auto-proclamados “representantes políticos” consigam apontar uma solução. Desemprego, falta de moradia e de saneamento, violência e degradação ambiental são o resultado direto do modelo de desenvolvimento imperante no Sul da Bahia, e não acontecem por causa das publicações dos relatórios de identificação das terras indígenas, ou por conta da regularização do território Pataxó Hã-Hã-Hãe, e muito menos pela abertura das áreas de reforma agrária.
Os dados governamentais revelam que, em cidades como Pau Brasil, constantemente usada como exemplo pelos latifundiários da região para justificar seus falsos argumentos de que a demarcação de terras indígenas traria miséria e desemprego ao município, houve um significativo aumento nos índices de qualidade vida da população, a partir do crescimento das retomadas das áreas pelos Pataxó Hã-Hã-Hãe. E não é preciso ser economista para perceber e entender este fenômeno. Todos sabem que os fazendeiros e grandes empresários da região não investem os seus lucros na região, e muitos deles nem moram nas cidades onde têm suas “propriedades”. Compram apartamentos em Salvador, ou em outras regiões; seus filhos estudam foram; compram seus carros, móveis, nas grandes cidades e, portanto não fazem nenhum investimento nestes pequenos municípios.
A retomada de terras pelos Pataxó Hã-Hã-Hãe causou um significativo aumento no comércio, uma melhoria nas condições da saúde, da educação, e viabilizou investimentos governamentais por causa do aumento populacional em Pau Brasil, Camacan, e Itajú do Colônia.
Agora na questão Tupinambá de Olivença, os donos do poder com seus auxiliares (políticos, imprensa descomprometida com a verdade, e até mesmo os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário), usam os mesmo argumentos para colocar a opinião pública contra a população indígena. Tentam condicionar a queda do turismo à publicação do Relatório do TI Tupinambá, quando todos sabem que há muito tempo Ilhéus passa por dificuldades no setor turístico, devido à exploração do turista com preços exorbitantes nas tarifas; a falta de infra-estrutura; e despreparo para o atendimento adequado aos turistas. Estão querendo se aproveitar para transferir suas incompetências para a publicação do Relatório.
O mais engraçado, para não dizer tragicômico são aqueles que dizem defender os pequenos agricultores. Os mesmos grandes proprietários de terra que quase nunca registraram seus trabalhadores, e que muitas vezes ocupam indevidamente terras devolutas e áreas de preservação permanente – APP, e que sempre desrespeitaram a legislação ambiental, esses sim os grandes responsáveis pela a situação de miséria vivenciada na região, agora querem dar uma de “amigos dos pobres”. Repare que estão juntos com políticos locais, e que vivem falando no PAC do Cacau – “maracutaia” para perdoar dívidas bancárias de latifundiários às custas do Tesouro Nacional.
Vale salientar a todos, em especial aos pequenos agricultores que forem afetados pelo processo demarcatório, que seus direitos serão respeitados (indenização de sua propriedade adquirida de “boa fé”), e em muitos casos além da indenização da propriedade, a realocação para um outro pedaço de terra para que possam continuar exercendo a sua atividade produtiva. Esclarecemos aos moradores de Ilhéus e demais cidades vizinhas da área reivindicada que nenhuma área urbana, ou até as pequenas aglomerações rurais, não serão afetadas pela demarcação, como falsamente anunciam os grandes fazendeiros e políticos em busca de votos. Vila Brasil, Sururu e os demais lugarejos não foram colocados dentro do território indígena, apesar de fazerem parte do território original. Isto justamente para evitar que os pequenos produtores e moradores destes lugares fossem prejudicados.
Por tudo isto, o Fórum de Luta por Terra, Trabalho e Cidadania – Região Cacaueira, que reúne diversas entidades e movimentos sociais populares de vários municípios do sul da Bahia, e em atividade desde 1996, vem a público se solidarizar com a luta da comunidade Tupinambá de Olivença, e dos Pataxó Hã-Hã-Hãe. Em nome da verdade vem denunciar toda esta “orquestração” com elementos de campanha eleitoral, montada para prejudicar o povo Tupinambá; e para repudiar a continuação de práticas coloniais e discriminatórias contra as populações tradicionais.
Rebatemos publicações sensacionalistas divulgadas na região contra os Povos Indígenas (Tupinambá de Olivença, Pataxó Hã-Hã-Hãe e Pataxó do Extremo Sul), retratando-os como selvagens, bandidos, empecilhos ao desenvolvimento, ameaçadores; entre outras expressões racistas, e que tem o claro objetivo de fortalecer uma opinião publica anti-indígena que, conseqüentemente, incentiva a eliminação gradual e contínua dos Povos Indígenas Brasileiros.
Denunciamos as perseguições e violações que sofrem estes Povos por defenderem a integridade, a manutenção, ou a devolução dos seus territórios que são os poucos espaços que lhes restam, depois de 509 anos de roubo, expulsões e etnocídio. As terras indígenas são terras da União, não podem ser compradas e nem vendidas. Exigimos o respeito aos direitos constitucionais, em especial aos Artigos 231, 232. Questionamos as interpretações jurídicas, como as condicionantes fixadas pelo Supremo Tribunal Federal e outras decisões judiciais que não tomam em conta a existência, diversidade, especificidade, sistema cultural, espiritual e organizacional dos povos indígenas e vão eliminado seus direitos.
Por fim, para nós, membros desta sociedade dominante que se auto-denomina civilizada, somos desafiados a compreender, respeitar, e apoiar as iniciativas dos povos indígenas, em reafirmar suas identidades. E como aprendemos a pensar nos índios a partir de idéias cristalizadas, e a reconhecê-los por traços exteriores, é mais fácil dizermos que “eles não são mais índios”, do que tentarmos compreender que “o essencial é invisível aos olhos”. Não são os aspectos aparentes, os traços biológicos, ou os comportamentos exóticos, que deveríamos considerar ao olhar para estes povos, mas sim, a partilha de um modo próprio de pensar, de entender a vida, e de entender-se no mundo.
Como a luz, que não pode ser contida ao amanhecer, assim ressurgem os Tupinambá de Olivença, silenciados e considerados extintos. Eles nos oferecem uma nova chance de valorizar a vida, a resistência, a diversidade cultural, mas se quisermos, podemos manter nossos olhos fechados, privando nosso espírito de desfrutar da beleza das cores, das formas, das diferentes maneiras de pensar e de viver.