16/02/2009

No ano de 2008, Lula não homologou demarcações de terras indígenas

Cláudio Luiz Beirão -Assessor Jurídico do Cimi


 


            Em 2008 o governo do presidente Lula bateu mais um recorde, em relação aos povos indígenas: não homologou sequer uma demarcação de terras tradicionais. Deste fato podem-se tirar algumas constatações em relação à política indigenista desse governo. A primeira delas é de que os setores anti-indígenas – dentro e fora do governo – lograram êxitos na estratégia de impedir a demarcação de terras indígenas.


            O ato de homologação de uma demarcação constitui-se em ato administrativo onde a autoridade máxima do governo federal aprova por meio de decreto a demarcação de uma determinada terra indígena, anteriormente declarada pelo ministro da Justiça. Assim, o presidente só homologa uma demarcação (colocação dos marcos oficiais) depois de realizados os trabalhos de campo feitos pela Fundação Nacional do Índio (Funai).


            Se observarmos o quadro de desempenho deste governo, em relação às terras indígenas, constatamos que em 2007, após a mudança de ministro da Justiça – saiu Thomaz Bastos e entrou Tarso Genro –, conseguiu-se avançar nos procedimentos de demarcações. Naquele ano, foram publicadas 20 portarias que declaram como terras indígenas áreas em Estados que têm como governadores aliados do governo mas opositores dos interesses dos povos indígenas, tais como: Mato Grosso do Sul, André Puccineli;  Mato Grosso, Blairo Maggi, e Santa Catarina, Luiz Henrique.


            Apesar dessa resposta positiva do governo federal às mobilizações do “Abril Indígena”, a pressão política continuou e os parlamentares ruralistas, da própria base de sustentação do governo, iniciaram uma “onda” de apresentação de projetos de decretos legislativos (PDCs) na tentativa de sustar as portarias declaratórias.


            Junto com essas movimentações políticas os invasores de terras indígenas ajuizaram diversas ações judiciais que resultaram em paralisação de diversas atividades da Funai para demarcação de terras indígenas, principalmente naqueles Estados. Dessa forma, sem a demarcação não teria o que ser homologado.


            Mas, tirando as áreas com decisões judiciais suspendendo os efeitos das portarias declaratórias, com certeza, o governo poderia ter homologado pelo menos 10 demarcações de terras situadas em Estados como Acre e Amazonas que não têm oposições ostensivas dos governadores e dos parlamentares.


            A situação mais gritante dessa omissão do governo Lula é o caso dos Tupinikim e Guarani que ocupam terras no Espírito Santo. Em 2007, o Ministério da Justiça promoveu um acordo entre a Funai, lideranças indígenas e a empresa Aracruz Celulose S.A a fim de que fossem demarcadas cerca de 18 mil hectares de terras tradicionais ocupadas indevidamente pela empresa. No acordo, aquela empresa retiraria os eucaliptos plantados na área e ao mesmo tempo a Funai faria a demarcação. Isso de fato ocorreu, mas mesmo assim não houve a homologação da demarcação das terras indígenas Tupinikim e Comboios. O governo não cumpriu a sua parte no Termo de Ajustamento Conduta firmado entre as partes perante o Ministério Público Federal do Espírito Santo e a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF.


            Uma outra constatação da não homologação de terras por parte do governo Lula, é a de que as homologações ocorridas nos primeiros anos eram apenas resultados de atividades feitas pelos governos anteriores. Ou seja, o atual governo só aprovou o que já havia sido realizado pela administração pública federal, em termos de identificação, delimitação, declaração e demarcação, etapas principais e necessárias do procedimento administrativo de demarcação de uma terra indígena tradicional.


            A boa notícia para os povos indígenas, trazida pelos Diários Oficiais da União (DOU) em 2008 é de que a Funai constituiu nesse ano mais de 60 grupos técnicos (GTs) para realizarem estudos de identificação e delimitação de terras indígenas em todo Brasil. Ou seja, apesar das pressões dos setores anti-indígenas, até mesmo dentro do próprio governo, o movimento indígena conseguiu vencer essa primeira batalha em seu pleito de que o Estado brasileiro não pode deixar de cumprir a sua obrigação constitucional de demarcar as terras indígenas tradicionalmente ocupadas.


            As mobilizações devem continuar para que as outras instâncias governamentais que participam desse procedimento administrativo assumam o seu papel e não fiquem segurando a tramitação dos processos causando prejuízo aos povos indígenas.

Fonte: Cimi
Share this: