16/12/2008

Proposta de decreto sobre ingresso em terras indígenas viola direitos indígenas

A Casa Civil está analisando uma proposta de decreto sobre o ingresso e a atuação de pessoas naturais e jurídicas em terras indígenas para eventual assinatura do Presidente da República. A Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) foi informada sobre a proposta, elaborada pelo Ministério da Justiça, durante sua reunião, nos dias 11 e 12 de dezembro.


 


O Cimi espera que, antes de qualquer decisão sobre esta matéria, ela seja submetida à apreciação da CNPI, tendo em vista o impacto de seu conteúdo para os indígenas brasileiros.


 


A proposta de decreto condiciona o ingresso e a atuação, de qualquer pessoa natural e jurídica, “com a finalidade de desenvolver atividade comercial, agropecuária, religiosa, cultural, assistencial, educacional, beneficente, de saúde, saneamento ou ambiental”, em todas as terras indígenas à autorização do Ministério da Justiça. E caso a terra indígena se localize na faixa de fronteira ou na Amazônia Legal (todos os estados da região norte, mais o Maranhão e o Mato Grosso) a autorização ficaria condicionada à prévia consulta do Ministério de Defesa e do Conselho de Defesa, no prazo de 30 dias.


 


Em outras ocasiões, a Funai adotou medidas semelhantes a esta proposta de decreto. Nestas ocasiões foram demonstradas as impropriedades em se pretender regular o acesso a terras indígenas, uma vez que o poder de polícia atribuído à Funai não lhe possibilita decidir quem pode ter contato com os índios. Os indígenas têm capacidade plena para discernir sobre o que é melhor para o interesse de suas comunidades.


 


Para ingressar e atuar em terras indígenas, uma pessoa se submete à vontade das comunidades, pois os indígenas são os titulares da posse permanente e do usufruto exclusivo das riquezas naturais existentes nas terras que tradicionalmente ocupam. Por esta razão, a autorização somente pode ser dada pelos índios. Este direito não lhes pode ser suprimido.


 


A administração pública pode, nos limites de suas atribuições constitucionais, garantir aos povos indígenas o direito à posse da terra o usufruto das riquezas nelas existentes, respeitando os bens indígenas, conforme determina o art. 231 da Constituição. No entanto, a proposta de decreto expressa concepção equivocada, pois atribui ao Ministério da Justiça o poder arbitrário de decidir sobre quem pode ter contato com os índios.


 


De acordo com a proposta, um índio não poderá ingressar em uma terra indígena de outro povo para comercializar produtos agrícolas ou artesanais, numa comum relação de contato interétnico. Apenas as organizações indígenas podem fazer isso, desde que não estejam realizando qualquer atividade em parceria com organizações não-indígenas.


 


O Cimi considera fundamental que a regulação do ingresso e atuação em áreas indígenas não obedeça quaisquer concepções arbitrárias, que impliquem substituir a vontade dos índios, como cidadãs e cidadãos brasileiros que são.


 


O necessário exercício do poder de polícia pela administração pública, que tem sido reclamado pelos povos indígenas e seus aliados para coibir as agressões contra os indígenas, somente pode ser praticado com respeito aos direitos indígenas assegurados no texto constitucional.


 


Brasília – DF, 16 de dezembro de 2008.


Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

Fonte: Cimi
Share this: