Câmara realiza Audiência Pública sobre Raposa Serra do Sol
Pela primeira vez, indígenas de Roraima puderam ontem (12) expor seus argumentos em defesa da demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol (RR), na Câmara dos Deputados. Os povos indígenas defendem que a demarcação seja feita conforme determina o decreto de homologação assinado em 2005 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A exposição aconteceu durante uma Audiência Pública promovida pela Comissão de Legislação Participativa, por meio de sugestão do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Dela participaram representantes do Ministério Público, do governo federal e de entidades indígenas e indigenistas da sociedade civil que apóiam a causa.
No próximo dia 27, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgará ações que contestam a demarcação da área de 1,7 milhão de hectares e a obrigatoriedade da saída dos arrozeiros que mantêm propriedades produtivas.
O indígena Macuxi Djacir da Silva, um dos coordenadores do Conselho Indígena de Roraima (CIR), abriu as exposições com uma apresentação da história e de dados sobre Raposa Serra do Sol. “Queremos que nos respeitem. Somos os primeiros habitantes do Brasil. Os arrozeiros poluem o rio Surumu e provocam a morte de animais. O avanço da monocultura gera impactos ambientais como o desmatamento e a contaminação das águas”, afirmou.
Paulo Santilli, coordenador geral de identificação e delimitação da Funai, abordou aspectos da organização social e da disposição geográfica das comunidades, justificando que é a partir de fatores sociológicos e ecológicos que se organizam estes povos. “As aldeias se deslocam ao longo do tempo, num movimento histórico”, o que seria desrespeitado caso a demarcação acontecesse de forma diferente da determinada pelo decreto de homologação. O modo de vida tradicional e peculiar deve ser protegido por razões antropológicas e por determinação constitucional. “Seria uma injustiça o Estado brasileiro negar a identidade dos povos que ali vivem. Negar esse direito dos índios à sua preservação e reprodução cívico-cultural”, disse.
O representante do Cimi, Saulo Feitosa, rebateu algumas falácias sobre a demarcação de Raposa – como a da ameaça ao território nacional e a da incapacidade dos povos indígenas para a segurança da nação – construídas por setores como do agronegócio e da mineração que, historicamente, sempre foram inimigos dos índios. “A homologação de Raposa constitui uma ameaça não ao território nacional, mas à destinação mercadológica das terras indígenas”, complementou.
Na opinião da subprocuradora da República, Deborah Duprat, por trás das alegações referentes à soberania nacional esconde-se uma inaceitável concepção etnocentrista. Ela deu um exemplo ilustrativo: nos anos 70, os Yanomami de Roraima foram vítimas de uma cruel matança, conhecida como a “chacina de hashimu”, perpetrada por garimpeiros. Hoje, na praça principal de Boa Vista, capital de Roraima, há uma estátua que homenageia justamente a figura do garimpeiro. Ou seja, as vítimas, além de chorar seus mortos, ainda são obrigadas a aceitar a presença dominante do assassino, ressalta Duprat.
Na véspera do julgamento do STF, marcado para 27 deste mês, diversos povos indígenas, movimentos da sociedade civil e apoiadores realizarão um acampamento e uma vigília em frente ao Supremo, para defender o respeito aos direitos indígenas.
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